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Os parâmetros estabelecidos pelo Direito do Trabalho

PARTE II O DIREITO À PROTEÇÃO SOCIAL CONFIGURADO NO TRABALHO

4 Controvérsias que envolvem o assalariado na Previdência Social

4.2 O empregado e o dilema da sua caracterização como rurícola

4.2.1 Os parâmetros estabelecidos pelo Direito do Trabalho

As discussões e dúvidas em torno dos elementos para se caracterizar o empregado como rural não são recentes. Dado o seu caráter de natureza trabalhista, essa questão surge com o advento da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (em 1943), que ao determinar a não aplicação dos seus preceitos aos trabalhadores rurais, formulou critério de caracterização desses trabalhadores pelo método da prática do trabalho rural. Assim, para a CLT, seriam trabalhadores rurais “... aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem como industriais ou comerciais” (art. 7º, inciso “b”, CLT). Logo, seriam trabalhadores

industriários ou comerciários, aqueles que trabalhavam em atividades tipicamente industriais ou comerciais, ainda que o empregador estivesse estabelecido na área rural.

Como aponta Maurício Godinho Delgado, o critério de diferenciação, estabelecido pela CLT, baseado nos métodos e nos fins da atividade laboral sofreu severas críticas. De um lado, porque não guardava consonância com o critério dominante no direito brasileiro de enquadramento de empregado, cuja sistemática para determinar as categorias profissionais funda-se no segmento de atividade do empregador. É o que ocorre, por exemplo, com o segmento bancário, ferroviário, comercial, metalúrgico, etc. De outro lado, a crítica incidia no fato de a CLT consentir que houvesse diferenciação entre trabalhadores vinculados a um mesmo empregador, ou seja, o empregador poderia ter empregados rurais e urbanos sob sua regência, gerando problemas de ordem operacionais bastante complexos para tocar o empreendimento168.

Com a Lei n.º 5.889, de 8 de junho de 1973, que regula o trabalho rural e atualmente em vigência, mudou-se por completo o critério celetista. Nesse sentido, o empregado rural passou a ser concebido como sendo “(...) toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário” (art. 2º da Lei n. 5.889/73). A caracterização do empregado rural se completa com o conceito de empregador rural considerado como sendo “(...) a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividade agro-econômica, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregado” (art. 3º, da Lei n. 5.889/73).

Assim, o enquadramento do empregado rural foi ajustado à regra clássica e hegemônica do Direito do Trabalho, de modo que a condição de rurícola passou a estar vinculada à natureza da exploração econômica do empregador rural, relativizando-se,

portanto, a natureza da atividade obreira. Com isso, a caracterização do empregador rural tornou-se condição sine qua non à caracterização do empregado rural, sendo que dois elementos conceituais extraídos da norma reguladora do trabalho rural passaram a ser determinantes a essa caracterização: a) a prestação de serviços em propriedade rural ou prédio rústico; b) e a exploração de atividade agro-econômica pelo empregador. Nesse sentido são as ponderações de Dirceu Galdino e Aparecido Domingos Erreiras Lopes:

A CLT (art. 7º) adotava o critério finalístico da atividade. O trabalhador rural, embora trabalhasse em empreendimentos agrícolas, era categorizado de acordo com a finalidade das operações, sendo considerado comerciário ou industriário. Entretanto, com o advento da Lei n. 5.889/73 deu-se prevalência à localização da unidade produtiva conjugada à finalidade econômica rural.169

Dessa maneira, a propriedade rural ou prédio rústico procura demarcar a localização da prestação dos serviços do empregado rural. A definição de propriedade rural não enseja controvérsia, pois está atada ao próprio senso comum, referindo-se à zona geográfica situada no campo, exterior às áreas urbanizadas. Já o conceito de prédio rústico é utilizado juridicamente para designar aquele imóvel que, do ponto de vista econômico e laborativo, está alinhado às atividades agropastoris, mas que se encontra incrustado no espaço urbano. Assim, é considerado rurícola o empregado que trabalhe tanto em uma grande fazenda manejando gado ou em um pequeno sítio ou chácara, cultivando hortaliças, flores, etc., ainda que localizados nos centros urbanos, pois o que importa é a natureza da atividade do empreendimento com finalidade econômica.

No pertinente à exploração da atividade agroeconômica esse é um elemento decisivo à caracterização do empregador rural, entendendo-se que na expressão agroeconômica englobam-se atividades agrícolas, pecuárias e agroindustriais que tenham destinação ao mercado. A Lei n. 5.889/73 ainda ampliou o conceito de empregador rural ao considerar como atividade agroeconômica a exploração industrial em estabelecimento agrário

169 GALDINO, Dirceu; LOPES, Aparecido D. E. Manual do direito do trabalho rural. São Paulo: LTr, 1995,

não compreendido na Consolidação das Leis do Trabalho (art. 3º, § 1º). Não obstante, a noção de indústria rural foi delineada por critérios bastantes restritivos estabelecidos pelo Decreto n. 73.626/74, regulamentador da Lei n. 5.889/73, ficando, portanto, a industrialização rural restrita “... às atividades que compreendem o primeiro tratamento dos produtos agrários in natura sem transformá-los em sua natureza...” (art. 2º, § 4º do Decreto n. 73.626/74). O Decreto foi além e exemplificou o que seja o processo de industrialização rural, informando ser “o beneficiamento, a primeira modificação e preparo dos produtos agropecuários e hortigranjeiros e das matérias primas de origem animal e vegetal para posterior venda ou industrialização”, e ainda, “o aproveitamento dos subprodutos oriundos das operações de preparo e modificação dos produtos in natura, referidas no item anterior” ( art. 2º, § 4º, incisos I e II). Com isso, por força do regulamento normativo, deixou de ser caracterizada como indústria rural aquela que, “...operando a primeira transformação do produto agrário, altere a sua natureza, retirando-lhe a condição de matéria-prima” (art. 2º, § 5º), como ocorre, por exemplo, com as indústrias de produção de açúcar e álcool e tantas outras que estão localizadas no campo. Isso, em tese, constitui-se num elemento potencial para descaracterizar a condição rurícola de todos os empregados dessas indústrias, mesmo que exercendo o labor rural.

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