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4 CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: PECULATO E

4.14 Peculato e corrupção passiva no projeto de Código Penal

O projeto do novo Código Penal (PLS n. 236, de 2012), que tramita no Senado Federal, conserva os crimes de peculato e corrupção passiva, introduzindo algumas alterações. Inicialmente, os fatos foram incriminados nos artigos 278 e 283 do Código Penal, mas com a emenda substitutiva n.º 1, os artigos foram renumerados (283 e 287), introduzindo-se modificações adicionais. O texto original do projeto e o alterado pelo substitutivo foram publicados em quadro comparativo no dia 9 de junho de 2015. Confira-se os dispositivos:

Peculato

Art. 283. Apropriar-se o servidor público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem

móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, usá-lo indevidamente ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:

Pena – prisão, de quatro a doze anos.

Parágrafo único. Aplica-se a mesma pena se o servidor público, embora não tendo a

posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, concorre para que seja subtraído, ou o obtém mediante fraude, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Corrupção passiva

Art. 287. Exigir, solicitar, receber ou aceitar promessa de receber, para si ou para

outrem, vantagem indevida, direta ou indiretamente, valendo-se da condição de servidor público:

Pena – prisão, de quatro a doze anos.

Corrupção ativa

§1º Nas mesmas penas do caput incorre quem oferece, dá, promete, entrega ou paga a servidor público, direta ou indiretamente, vantagem indevida.

Corrupção em transação comercial internacional

§2º Nas mesmas penas do caput incorre quem oferece, dá, promete, entrega ou paga vantagem indevida para determinar servidor público estrangeiro a praticar, omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial internacional.

Causa de aumento de pena

§3º A pena é aumentada em até um terço se:

I – em consequência da vantagem ou promessa, o servidor retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional;

II – é expressivo o dano causado por agente político ou ocupante de cargo efetivo de carreira de Estado.

O peculato sofreu várias alterações. A pena mínima foi majorada para prisão de

quatro anos – na lei em vigor, a pena mínima é reclusão de dois anos –, ressaltando-se que o

projeto não faz mais a distinção vigente entre “reclusão” e “detenção”. Há apenas uma sanção privativa de liberdade, denominada genericamente de prisão.

O peculato culposo tornou-se atípico e, por conseguinte, foram retirados os dispositivos relacionados ao perdão judicial e à causa de diminuição de pena nesses casos. Decerto, a incriminação da conduta carecia de fundamento, infringindo os princípios da fragmentariedade, subsidiariedade, necessidade e culpabilidade. Mais apropriado é que haja efetividade no âmbito civil e administrativo, para compelir o agente público a reparar os danos causados, aliás, como já prevê o artigo 37, §5º, da Constituição da República, com caráter de imprescritibilidade. Frente a essa rede de proteção do patrimônio público contra atos lesivos culposos, a norma penal é totalmente inócua e desproporcional.

A redação do dispositivo peca pela ausência de técnica: no início do artigo 283 menciona a elementar típica “servidor público”, assim como no início do parágrafo único. Porém, no final do paragrafo único utiliza-se do termo “funcionário”. A respeito, o projeto não usa mais o termo “funcionário público”, substituindo-o por “servidor público”, na norma explicativa do artigo 292 (artigo 282, no projeto original).

Por outro lado, faz-se necessário tipificar o peculato de uso, conduta extremamente danosa à administração pública e aos administrados, capaz de trazer mais prejuizões que a apropriação direta de bens públicos. Não pode ficar somente na esfera da improbidade administrativa, nomeadamente porque, no período eleitoral, abusa-se da máquina administrativa para cooptar eleitores, desequilibrando a disputa.

Anote-se que no anteprojeto de reforma da parte especial do Código Penal, elaborado em 1998, tipificou-se o peculato de uso, mas o projeto não obteve prosseguimento. A comissão juristas incumbida de elaborar o documento, presidida pelo então ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luiz Vicente Cernicchiaro, justificou a medida em razão do “evidente prejuízo para a Administração Pública”285.

Em sua essência, a corrupção passiva permanece com as mesmas elementares típicas, substituindo-se apenas a expressão “funcionário público”, por “servidor público”, pelos mesmos motivos já mencionados em relação ao peculato. A sanção foi majorada para quatro anos de prisão.

O legislador prevê a transposição de dois tipos penais para o mesmo dispositivo. A corrupção ativa, que consiste na atuação do extraneus, foi inserida no §1º do mesmo

285 No referido anteprojeto, o peculato de uso estava previsto no artigo 305, §2º, com a seguinte redação: “art. 305 [...] § 2º. Utilizar o funcionário público, indevidamente, ou permitir que alguém o faça, dinheiro, valor, serviço ou qualquer outro bem móvel ou imóvel de que tenha posse em razão do cargo ou função, em proveito próprio ou alheio. Pena - Reclusão, de dois a cinco anos, e multa”. Todavia, a utilização de dinheiro, nesse caso, confundiria o intérprete, já que bens fungíveis caracterizam o peculato propriamente dito, conforme salientado acima.

dispositivo, mas mantendo-se intacta sistemática do código atual. Quando praticada a corrupção ativa no contexto do comercio internacional, aplica-se o §2º do mesmo artigo.

No §3º, manteve-se a majorante já existente e criou-se outra causa de aumento de pena de um terço se “é expressivo o dano causado por agente político ou ocupante de cargo efetivo de carreira de Estado”. São requisitos cumulativos: expressividade do dano e o servidor deve ser agente político ou ocupante de cargo da carreira de Estado, referida no artigo 247 da Constituição da República.

O artigo 41 do projeto original previa a responsabilização penal da pessoa jurídica pelos atos praticados contra a administração pública, “nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade”. Porém, após o substitutivo, o preceito foi deslocado para o artigo 38, extraindo-se a punição nessa hipótese (manteve-se apenas em atos praticados contra a ordem econômico-financeira e o meio ambiente).

Por fim, tanto o peculato quanto a corrupção passiva, foram inseridos no rol dos crimes hediondos (artigo 51, inciso VI, do projeto).

4.15 A tutela penal da administração pública face ao concurso de pessoas nos crimes de

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