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A qualidade do acolhimento feito pelas instituições na perspectiva dos conselheiros tutelares: “é bem bacana” ou “é uma coisa que tem que melhorar muito”?

Sumário

Fluxograma 10 – Como os conselheiros tutelares lidam e o que dizem à criança no momento em que a retiram

6.4 A chegada da criança na instituição de acolhimento: “não precisa chorar, vamos

6.4.2 A qualidade do acolhimento feito pelas instituições na perspectiva dos conselheiros tutelares: “é bem bacana” ou “é uma coisa que tem que melhorar muito”?

Assim como os profissionais das instituições tiveram a oportunidade de falar sobre suas percepções a respeito da retirada da criança de seu contexto familiar e/ou de origem, buscou-se também conhecer a percepção dos conselheiros tutelares sobre a forma como a instituição acolhe a criança que chega.

A conselheira Patrícia refere ter boa impressão do acolhimento feito pelas instituições:

Pesquisadora: E como você sente normalmente essa interação, de quem tá recebendo a criança, com a criança?

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Patrícia: Ah, são educadores, assim, tranquilos. Eu acho legal, chega: "Oi, tudo bem? Vem com a tia"; se já é bebezinho, ou de colo, já pega no colo, sabe? Então, assim, tem uma primeira abordagem. Se é maiorzinho, também, pega na mão, leva, "Vem aqui, vamos brincar" [...]. Eu acho que tem acolhimento, porque o treinamento que eles têm é que o acolhimento deve ser muito tranquilo, muito gostoso para a criança, que é a primeira impressão que ela vai ter dali. Então, assim, eu vejo como adequado; nunca presenciei nada que não fosse adequado [...]. (Patrícia, conselheira tutelar).

Patrícia evidencia o protagonismo dos educadores. Considera que a condução desse momento é adequada e tranquila, uma vez que eles se dirigem à criança, pegam no colo ou em sua mão e convidam-na para brincar. Supõe até que os educadores recebem treinamento específico para lidar com a criança nesse momento.

A conselheira Daniela fala sobre sua percepção:

Daniela: [...] Isso de vir todo mundo receber com alegria, acho que isso é muito bom [...], então, se tivesse condição de todo mundo vir receber aquela criança, mas isso não é comum [...]. (Daniela, conselheira tutelar).

Daniela diz que é muito bom quando o acolhimento é coletivo e alegre. Todavia, ressalta que a prática não é frequente.

O conselheiro Pedro conta que a forma de acolher difere, dependendo do período (se de dia ou de noite) em que a criança chega na instituição:

Pesquisadora: E, da sua experiência, do que você já presenciou, o que acontece assim que a criança chega na instituição?

Pedro: Então, depende, se é de dia [...] é uma abordagem bem bacana, porque é um profissional, um psicólogo, que vai conversar com ela, para explicar para ela, passar as regras do novo lugar, principalmente, quando é criança que já entende um pouquinho [...]. Então, assim, eu acho que é mais tranquilo [...]. O problema são os abrigamentos urgentes, assim, de madrugada. Quando chega de madrugada, fica todo mundo naquela situação, não tem profissional [...], não é igual, a abordagem.

Pesquisadora: E o que é feito?

Pedro: Geralmente, assim, eles vão [...] suprir as necessidades físicas e [...] pôr elas para dormir e só vai conversar com elas no dia seguinte porque também a casa tá todo mundo dormindo [...]. (Pedro, conselheiro tutelar).

De acordo com Pedro, o que difere no acolhimento durante o dia daquele que é feito à noite é, sobretudo, a (in)existência de um espaço de conversa com a criança que, aparentemente, é do domínio do técnico, mais especificamente, do psicólogo.

A conselheira Aline diz que fica muito angustiada com a forma como eles (crianças e a adolescentes) são recebidos:

Aline: Não é grande coisa, é uma coisa que tem que melhorar muito, fico muito angustiada. Eu acho, eu acho não, eu tenho certeza que o pior dia para mim é

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quando tenho que levar uma criança para um abrigo. Porque eu fico muito angustiada com a forma como eles são recebidos.

Pesquisadora: Como eles são recebidos?

Aline: Ah, não tem, Ivy, não é uma coisa assim [...]. Acho que a prioridade deveria ser a criança que está chegando, porque é muito duro. A gente tem que se colocar no lugar da criança, porque é retirada da família, levada para um lugar que ela não conhece ninguém [...], na maioria das vezes, numa situação de grande angústia, de sofrimento [...]. Então, é uma situação toda desfavorável e chega no lugar e não tem assim, não tem uma técnica que já chega e já leva para uma sala, para conversar com ela. Às vezes, chega e a gente fica esperando lá, com a criança [...]. Esse dia, eu quase surtei com eles, sabe, porque veio uma menina que [...] não se apresentou, [...] era uma pessoa do administrativo: "Não, não vamos receber sem a guia de acolhimento". Na frente da criança, sabe. Ninguém chegou: "Oi!", pelo menos. O conselheiro não tem que ter atenção, quem tem que ter atenção é a criança. Conversa com a criança, acolhe, recebe, depois protocola o documento que o conselheiro está levando, que qualquer pessoa do administrativo faz. A criança não é recebida de uma forma, assim, não é [...]. A equipe não é preparada para essa chegada. (Aline, conselheira tutelar).

A conselheira menciona que a criança é ignorada. E, novamente, a conversa com a criança é referida como algo que poderia tornar o momento inicial na instituição mais acolhedor e humanizado, se conduzido por uma técnica (possivelmente, psicóloga ou assistente social). Então, conclui que a equipe está despreparada para receber a criança que chega.

Nos relatos citados, observam-se divergências e convergências de opiniões sobre o que é acolher e acolher com qualidade. Cada conselheiro recorreu a parâmetros pessoais para “avaliar” as formas e os procedimentos utilizados para recepcionar/acolher a criança. Assim, para a conselheira Patrícia, o contato físico e a distração da criança parecem ser os aspectos mais valorizados. Daniela, por sua vez, menciona que o acolhimento deveria ser coletivo, feito por todos e de maneira alegre. Pedro e Aline destacam o espaço para a palavra, para a conversa com a criança, como aquilo que contribui (ou contribuiria) para qualificar de maneira positiva esse momento.

Há muitas maneiras de olhar e conceber o processo de acolhimento inicial da criança e, a partir dessas diferentes perspectivas, indaga-se: o que é receber e acolher? Quem deve fazer isso? O objetivo principal é distrair ou conversar com a criança? Quem pode conversar com ela e sobre o que podem falar?

Ao longo desse tópico, certamente, essas questões são respondidas pelos participantes, de acordo com suas concepções e expectativas sobre esse momento inicial do acolhimento.

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