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Sentimentos e reações da criança ao chegar na instituição.

Sumário

Fluxograma 19 Sentimentos e reações da criança ao chegar na instituição.

As coordenadoras Manoela e Lara dizem que as crianças sentem e reagem de maneiras diferentes.

Sentimentos e

reações da criança Tempo de adaptação

Sentimentos e reações dos profissionais

Resultados e Discussão 189

Manoela: [...] cada caso é um caso [...]. (Manoela, coordenadora do abrigo institucional Hortência).

Lara: Cada um é de um jeito [...]. E assim, então, não tem como ter padrão. (Lara, coordenadora do abrigo institucional Rosa).

Como não há um padrão, ambas sentem dificuldade para descrever os sentimentos e as reações mais comuns das crianças (outro trecho de entrevista no Anexo AQ).

Porém, apesar das especificidades de cada caso, identificam-se reações e sentimentos variados manifestos pelas crianças.

Sofia: [...] uns que chegam e choram muito, passa dois, três dias chorando, chora bastante. Acalenta ali, um pouquinho, mas na hora de dormir, ele chora, na hora de comer, chora [...]. (Sofia, educadora do abrigo institucional Rosa).

Fernanda: [...] choram muito [...]. Na maioria, é choro [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Lourdes: [...] tem aquelas que já chega chorando muito [...]. Tem aquelas que chora até dormir [...]. (Lourdes, educadora do abrigo institucional Tulipa).

Foram muitos os relatos que apontam o choro como a mais frequente reação da criança

(outros trechos de entrevistas no Anexo AR).

De acordo com Vitoria e Rossetti-Ferreira (1993), é comum os educadores de creche/educação infantil considerarem o choro como uma reação inevitável da criança, nesse momento de separação da família e adaptação à instituição. E quando não há um trabalho orientado especificamente para esse momento, ou seja, de recepção e acolhimento da criança, muitas vezes, os educadores acreditam que o melhor é deixá-la chorar, sem lhe dar muita atenção, pois, caso contrário, o choro se prolongará e a criança se tornará manhosa, requerendo atenção a todo momento, o que não é possível em instituições de educação e cuidados coletivos. E, por isso, “permanecem passivos frente ao choro, acreditando que, com o tempo, a criança se acostuma e para de chorar até por esgotamento físico e emocional” (p. 60). No entanto, ao agirem assim, podem estar contribuindo para que a criança se torne ansiosa, medrosa, passiva, desconfiada e com dificuldade para estabelecer novos vínculos afetivos. A fala da psicóloga Angélica permite aprofundar essa discussão.

Angélica: [...] Tem bebês que choram o tempo todo [...], eles se autoembalam, porque não estão processando aquela separação [...]. (Angélica, psicóloga do abrigo institucional Tulipa).

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Angélica, talvez tendo como referência a obra de Spitz (2004), relata o comportamento de autoestimulação em bebês institucionalizados como um efeito pernicioso da separação materna. Todavia, é fundamental considerar outros estudos, como, por exemplo, o de O’Connor (195638 apud Rossetti-Ferreira, 1984, p. 5), que se propuseram a avaliar as características das instituições e relações sociais nelas (in)existentes, os quais apontam que os prejuízos no desenvolvimento das crianças deviam-se muito mais à privação geral de estímulos do que à privação materna em si. Então, a questão que fica é: qual a qualidade da proposta de acolhimento que se tem endereçado às crianças e, especificamente, aos bebês? Mais adiante será feita uma discussão sobre esse assunto (ver Fluxograma 30, com considerações sobre o acolhimento de bebês). Há outras reações, além do choro.

Manoela: [...] quando ela passa do portão para dentro, ela entra assustada, porque são pessoas que ela nunca viu [...]. (Manoela, coordenadora do abrigo institucional Hortência).

João: Eu vejo muito medo no rosto dela, eu vejo muito medo, uma criança assustada no meio de desconhecidos, de outras crianças [...]. (João, pedagogo do abrigo institucional Tulipa).

Beatriz: [...] Teve uma que vai fazer 3 (anos), [...] a gente via a expressão de assustada, não chorando, mas a expressão de assustada. Ela tava no colo da oficial e não queria sair. Ela sentou no sofazinho com ela ali na recepção e ficou. Aí, na hora que ela foi embora, ela ficou olhando, assustada. Aí, depois, eu sentei do lado dela e falei: “Tudo bem, olha ali, que legal, o parque, você quer ir lá?” e ela só balançava a cabeça com aquele olhar, a expressão de assustada. Então, [...] começou a chegar a perua com as crianças voltando da escola, “olha quanta criança ali, você não quer ir lá no parque? Eles vão brincar no parque, daqui a pouco”. Aí, ela já ergueu os braços para vir comigo. Na hora que eu peguei ela no colo, [...] ela tava trêmula. Não era tremer de frio, por exemplo. Era um tremor talvez de medo, de nervoso [...]. E, às vezes, parava o olharzinho de assustada [...]. (Beatriz, assistente social do abrigo institucional Rosa).

Sentir-se assustada e com medo também foi uma das reações apontadas pelos profissionais (outros trechos de entrevistas no Anexo AS).

Flávia: [...] As crianças maiores, ficam meio receosas, não deixam muito a gente chegar [...]. (Flávia, educadora do abrigo institucional Tulipa).

Ana: [...] De cara, eles não aceitam carinho, às vezes você vai fazer carinho e ela já fica assim se protegendo, achando que você vai fazer alguma coisa. Geralmente são crianças que sofreram uma agressão, então até elas verem que não é nada daquilo, aí vai pegando confiança em você [...]. (Ana, educadora do abrigo institucional Hortência).

38 O’Connor, N. (1956). The evidence for the permanently disturbing effects of the mother-child separation. Acta

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Há, também, as crianças que se sentem receosas e, por vezes, arredias à aproximação das pessoas (outros trechos de entrevistas no Anexo AT).

Lourdes: [...] tem aquelas que [...] não quer nada, não quer banho, não quer comer... Acho que sente muita a falta dos pais, da mãe, não sei [...]. Aí, é mais difícil [...]. (Lourdes, educadora do abrigo institucional Tulipa).

Sofia: [...] tem uns que não aceitam bem, assim, chega e não tem uma boa aceitação, sabe, não quer comer, não gosta de tomar banho [...]. (Sofia, educadora do abrigo institucional Rosa).

Outras manifestam-se com resistência, negam-se a aceitar o que as pessoas lhe oferecem ou pedem para que faça (outro trecho de entrevista no Anexo AU).

Lourdes: [...] A emoção é muito grande, muito forte, assim, acaba não conseguindo comer [...]. (Lourdes, educadora do abrigo institucional Tulipa).

Fernanda: [...] não come ou demora para comer [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Talvez seja menos por resistência, mas por inapetência; sentir fome e alimentar-se, nesse momento inicial do acolhimento, não é fácil para algumas crianças. Vitória e Rossetti- Ferreira (1993) apontam que essa é uma reação comum em crianças pequenas que estão em período de adaptação à creche/escola.

Algumas crianças sentem raiva e podem manifestar-se com agressividade e revolta (outro trecho de entrevista no Anexo AV).

João: [...] no momento de chegada, eu sinto que eles sentem raiva, parece que para eles nós somos os culpados do acolhimento dele [...]. (João, pedagogo do abrigo institucional Tulipa).

Sílvia: outros [...] bem difícil de aceitar, querem bater em todo mundo [...]. Pesquisadora: E por que você acha que eles reagem assim?

Sílvia: Eu acredito que porque é maior e entende melhor que a mãe não tem condições [...]. (Silvia, educadora do abrigo institucional Lírio).

Ana: [...] os grandes vêm muito revoltados, então eles acham que a culpa de eles estarem aqui é sua também, então ele vai fazer de tudo para te agredir [...]. (Ana, educadora do abrigo institucional Hortência).

Questionar, fazer perguntas é outra maneira que a criança encontra para lidar com a situação (outro trecho de entrevista no Anexo AW).

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Cássia: Quando eles chegam? Não reagem bem não. É um ambiente que eles nunca viram, assim, diferente, eles ficam perguntando por que ele tá aqui, o que aconteceu... (Cássia, educadora do abrigo institucional Hortência).

Manoela: [...] outros questionam onde está a mãe [...]. (Manoela, coordenadora do abrigo institucional Hortência).

O contrário também acontece, e a criança se cala.

Fernanda: [...] ficam muito quietos, num canto [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Lourdes: [...] Tem criança que é mais fácil de você lidar [...] é quietinha [...]. (Lourdes, educadora do abrigo institucional Tulipa).

Há, ainda, aquelas que se intimidam e se sentem envergonhadas.

Fernanda: [...] vergonha das pessoas [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Lara: [...] Tem criança que é mais tímida [...]. (Lara, coordenadora do abrigo institucional Rosa).

Acontece, também, de haver regressões a etapas anteriores do desenvolvimento.

Fernanda: [...] as crianças maiores voltam a fazer xixi na cama ou as que tiraram a fralda [...] voltam para a fralda [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Em consonância com o que Fernanda diz, Sayão (2010) aponta que experiências traumáticas podem interferir no curso do desenvolvimento. Assim, aquisições importantes, tal como desenvoltura no nível da linguagem, podem pelo menos momentaneamente estancar ou retroceder, devido à separação familiar.

A criança pode chamar pelos pais.

Janaína: [...] eles ficam no portão gritando pela mãe, pelo pai, durante um bom tempo. (Janaína, psicóloga do abrigo institucional Hortência).

João: [...] vontade da família, eles falam tanto da família na chegada, que eles querem a mãe, o pai. Então, eles querem voltar, mesmo sofrendo as violências. É a referência deles [...]. (João, pedagogo do abrigo institucional Tulipa).

Agitar-se é, do mesmo modo, uma reação possível.

Lia: [...] tem criança que chega um pouco mais agitada [...]. (Lia, psicóloga do abrigo institucional Rosa).

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Fernanda: [...] Teve uma criança, especificamente, [...] ela se escondia e a gente tinha que: “cadê a criança?” [...], tava num cantinho, embaixo da cama, tava atrás da porta [...]. (Fernanda, psicóloga do abrigo institucional Lírio).

Todavia, quanto tempo a criança leva para se adaptar à instituição? (Fluxograma 20).

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