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Superação do Problema Mediante Gestão dos Contratos Públicos

5.1 Efeito do Enquadramento

5.1.3 Superação do Problema Mediante Gestão dos Contratos Públicos

análise custo-benefício, design das instituições, além de outras competências e visões exigíveis da Administração Pública moderna.

Em que pese a complexidade dos contratos ser muitas vezes reconhecida, em especial nas privatizações de serviços essenciais e infraestrutura, existe uma tendência tradicional de considerar tais questões como sendo da esfera política332; entende-se que a decisão de privatizar não levanta questões legais, salvo em pontos específicos.

Essa visão estreita do papel do Direito Público, contudo, se revela insuficiente.

Em síntese, é importante que seja contemplada a necessidade de aquisição de informação por parte do ente público no que se refere às compras públicas, tanto por parte do legislador quanto por parte do executor do contrato. Para tanto, é necessário um enquadramento adequado do problema, que reconheça a eventual insuficiência das informações então disponíveis, e a consequente necessidade de aquisição de novas informações. Caso o enquadramento do problema não permita vislumbrar a necessidade de criação de mecanismos de aquisição de informação, é possível que surjam embaraços durante a execução dos contratos administrativos.

A gestão de contratos administrativos implica assumir um comportamento ativo, no qual cabe ao contratante elaborar de antemão um plano de ação que tem como finalidade lidar com as adversidades que podem surgir no decorrer do contrato.

O contratante assumirá, após a adjudicação, uma postura de vigília, a fim de acompanhar a execução do contrato na maior medida possível. Caso seja necessário, terá condições de tempestivamente reajustar o curso da execução contratual da forma que melhor atenda ao interesse público334.

Conforme ensina Pedro Costa Gonçalves, pode-se definir gestão de contratos administrativos como sendo “todas as providências adotadas pelo contraente público e o esforço por este despendido no sentido de assegurar o cumprimento pontual dos contratos celebrados”335. Por sua vez, John van der Puil e Arjan van Weele conceituam gestão de contratos como o processo de garantir que todas as partes cumpram com suas obrigações, no sentido de atingir os objetivos operacionais do contrato, bem como satisfazer os objetivos estratégicos dos seus beneficiários336.

Para John Cibinic, James Nagle e Ralph Nash, autores da obra Administration of Government Contracts, a gestão de contratos inclui todas as relações entre o poder público contratante e o particular contratado que emanam da performance do contrato, envolvendo todas as negociações entre as partes, desde a adjudicação do contrato até o momento em que o objeto do contrato é finalizado e aceito, o pagamento é realizado, bem como eventuais conflitos são encerrados337.

Partindo dos conceitos acima, percebe-se que a natureza das atividades que compõem a gestão do contrato, isto é, o conteúdo das medidas a serem adotadas a título de gestão, dependerão da relação contratual que for estabelecida, podendo demandar um maior ou menor envolvimento da Administração Pública nas atividades do contraente privado338. Não raro o contrato será por demais simples, de consumação instantânea, dispensando maiores esforços do gestor de contratos. Em contrapartida, há contratos que demandam outro tipo de atenção pela Administração Pública, seja em razão da complexidade do seu objeto, seja pela sua longa duração. O conteúdo das

334 Moreira, Sávio Henrique Damasceno. Inobservabilidade na Gestão dos Contratos Administrativos: entre a derrocada e a reforma contratual, p. 09.

335Gonçalves, Pedro Costa. Direito dos Contratos Públicos, p. 515-516.

336Puil, John Van der; Weele, Arjan Van. International Contracting: Contract Management

in Complex Construction Projects, p. 35.

337Cibinic, John; et al. Administration of Government Contracts, p. 39.

338Idem, p. 40.

medidas de gestão do contrato pode variar a depender do objeto da relação contratual.

Estas medidas, em geral, não se encontram pré-definidas em lei, mas sim, amoldam-se às especificidades de cada caso. Neste amoldam-sentido, Pedro Costa Gonçalves afirma que a atividade de gestão de contratos é complexa e multifacetada339, sendo difícil encerrar toda a sua noção em uma curta definição.

Quantos às finalidades da gestão de contratos administrativos, conforme já defendido em outro trabalho340, podem ser resumidas da seguinte forma: (i) revelar informações quanto ao adimplemento do contrato; (ii) adotar ou apontar medidas que visem o seu adimplemento; (iii) solucionar conflitos de interesses entre as partes; (iv) adaptar o contrato ao contexto histórico e à experiência; (v) garantir maior eficiência ao contrato.

Pelo que se percebe, a atividade de gestão dos contratos administrativos está intimamente ligada ao tema da informação. Apesar de complexa, e não podendo ser encetada em uma fórmula rígida, a gestão de contratos possui um eixo central, qual seja, o de uma administração baseada em evidências. Gerir o contrato é reconhecer a importância dos processos decisórios que são compreendidos pela execução dos contratos; esse reconhecimento, por sua vez, demanda a tomada de meta-decisões no que tange à instituição de mecanismos de informação, a fim de que os processos decisórios sejam baseados na melhor evidência possível. É o reconhecimento, por exemplo, de que deve o contratante acompanhar o fiel adimplemento do contrato e, se for necessário, impor as sanções cabíveis (tomada de decisão quanto à imposição de sanção); para tanto, deve o contratante, antecipadamente, instituir meios que o permitam observar o adimplemento do contrato (meta-decisão quanto à instituição dos mecanismos de aquisição de informação).

A atividade de gestão leva à superação dos efeitos deletérios do enquadramento, uma vez que questiona, de antemão, a capacidade do contratante em observar o adimplemento do contrato, bem como compreende o planejamento sobre como superar a situação, ponderando riscos e custos. A gestão do contrato compreende a análise crítica: (a) da suficiência da quantidade e qualidade das informações então disponíveis; (b) da eventual necessidade de instituição de

339Gonçalves, Pedro Costa. Gestão de Contratos Públicos em Tempo de Crise, pp. 17-18.

340 Moreira, Sávio Henrique Damasceno. Inobservabilidade na Gestão dos Contratos Administrativos: entre a derrocada e a reforma contratual, p. 15.

mecanismos de aquisição de informação; (c) dos custos e riscos que envolvem a instituição destes mecanismos.

A gestão dos contratos admite que (a) as informações não são plenas e nem facilmente adquiridas, bem como que (b) a mente humana é muitas vezes irracional e limitada quanto ao armazenamento e processamento de informações. Por consequência, reconhece os efeitos do enquadramento e busca estabelecer os seus limites, para de forma estratégica os superar. Mais uma vez, vale dizer: a gestão dos contratos é uma busca pela administração baseada na melhor evidência possível.

Deixa-se de lado decisões precipitadas, fundadas na intuição e em sentimentos pessoais, para dar lugar à técnica e à evidência.

A administração baseada em evidências é o reconhecimento de que o mundo é complexo, friccional, com grande fluxo de informações que envolvem custos e riscos341. Tendo como premissa tais dificuldades, busca-se superá-las com base na técnica da gestão342. No que diz respeito à administração baseada em evidências e ao reconhecimento da importância do tema da informação, será melhor explorado nas linhas abaixo.

5.2 Administração Baseada em Evidência

A necessidade de meta-decisões quanto à instituição de mecanismos de aquisição de informação advém do reconhecimento da imprescindibilidade de uma administração baseada na melhor evidência possível. É possível verificar que o tema da informação ganha espaço à medida que as sociedades se tornam mais complexas, com maior fluxo de informações, maior grau de riscos e elevados custos.

À medida que o tempo passa as sociedades de forma geral se transformam. As circunstâncias em que se vive hoje não são as mesmas de ontem, e igualmente se diferem daquelas de amanhã. Os investimentos em pesquisa e desenvolvimento permitem um grau cada vez maior de eficiência, em diversos aspectos. A qualidade de vida, em geral, avança cada dia mais. Novas ferramentas e novos meios surgem a todo momento, permitindo uma constante evolução na forma como as pessoas exercem as suas atividades.

Dentre todas as transformações que vem sendo operadas recentemente, talvez a mais exponencial delas esteja relacionada ao campo da informação. A evolução da

341Martins, Licínio Lopes. Empreitada de Obras Públicas, p. 599.

342Bibas, Stephanos. Prosecutorial Regulation versus Prosecutorial Accountability, p. 963.

tecnologia e inovação trouxe ferramentas formidáveis à sociedade, alcançando um número razoável de pessoas. Supercomputadores que cabem na palma da mão, amplo acesso à internet, redes sociais e colaborativas, dentre várias outras novidades. A capacidade das pessoas de produzir, consumir, armazenar e processar informações nunca foi tão alta.

Ante a evolução tecnológica, a capacidade dos computadores tem dobrado a cada dezoito meses nos últimos anos. O custo de transmissão de informações a longa distância é ínfimo, e praticamente negligenciável; a quantidade de informação que pode ser transmitida no mundo virtual aparenta ser infinita. O crescimento da Internet e da World Wide Web tem sido exponencial, e o seu tráfico de informações dobra a cada cem dias343.

A capacidade do ser humano de relacionar-se e viver em sociedade depende basicamente de comunicação, e naturalmente, as grandes mudanças que a humanidade experimenta derivam de descobertas tecnológicas relacionadas à comunicação344. O que diferencia o ser humano dos demais seres vivos é sua capacidade de cooperar com flexibilidade e em grandes grupos345. Cooperação significa diálogo, intercâmbio de ideias, consenso. Isto posto, quanto mais aprimorado forem os meios para a troca e aquisição de informações, mais cooperação é viabilizada, e consecutivamente mais desenvolvimento.