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6.4 Aquisição de Informação Como um Trade-Off

6.4.2 Tecnologia

informação não visa lucro. De outro lado, o dever de alimentar o sistema pelo usuário não é mandatório; as pessoas não são empregadas do sistema, mas sim, doam informações ao sistema. Para o cidadão não existe a obrigação, legal ou contratual, de produzir informação. Desta feita, surgem problemas relacionados à força motriz de alimentação do sistema, os quais podem se revelar em (i) risco de subprovimento do sistema e (ii) risco quanto à qualidade da informação391. A um, a alimentação do sistema gera um custo para o usuário – ainda que mínimo, mesmo que signifique tão somente perda de tempo, de alguns minutos –, e ele pode não estar disposto a arcar com este custo. Se assim for, o sistema pode padecer por carência de alimentação, já que o seu conteúdo depende da produção gratuita pelo usuário. A dois, a qualidade da informação deve ser observada, pois da mesma forma que não existe obrigação de alimentar o sistema, também não é forçoso que o sistema seja alimentado com informações fidedignas. Ademais, ainda que as informações sejam autênticas, é possível que a estrutura de incentivos existente faça com que apenas as pessoas insatisfeitas alimentem o sistema (ou o contrário). Desta forma, o sistema informacional refletiria apenas meia realidade, podendo levar o contraente público a conclusões enviesadas.

Reafirmando, os sistemas de informação são complexos, nada impedindo que todas essas pessoas, ao mesmo tempo, os componham, cada um com o seu papel definido. A alocação destas pessoas nos sistemas, e a definição dos seus papéis, constitui um verdadeiro trade-off, havendo vantagens e desvantagens em relação a cada uma das opções. Portanto, não existe receita pronta. O contraente público, notadamente nos contratos complexos, figura como um verdadeiro arquiteto dos sistemas de informação, sendo responsável pela observação dos custos de oportunidade relativo ao design conferido aos mecanismos de aquisição de informação.

aplicações mobile, ou seja, os programas que governam as operações dos dispositivos, tanto em termos de sistema quanto de tarefas específicas; (c) sistemas de base de dados, composto de uma coleção de informações organizada em dois ou mais arquivos de dados; (d) redes de computadores, a internet, e computação em nuvem, que conectam dispositivos entre si e permite interação entre eles392.

Vale repisar que os sistemas de informação não se confundem com tecnologia da informação, sendo que aqueles independem desta. É possível que haja um sistema de informação composto apenas de pessoas, sem que haja computadores, aparelhos eletrônicos e softwares. Contudo, a tecnologia encontra-se atualmente em estágio avançado de evolução.

Várias são as pessoas que, para tarefas comezinhas, já se encontram dependentes da tecnologia. Ademais, inúmeras são as ferramentas de software, bem como serviços de computação em nuvem, que já se encontram disponíveis gratuitamente, ou a preço bastante acessível. A internet, da mesma forma, encontra-se cada vez mais ao alcance de todos; é crescente o acesso a pacotes de dados ilimitados, bem como disponibilidade de internet em locais públicos via wi-fi.

Ante a acessibilidade atualmente existente no que tange a toda essa tecnologia da informação, torna-se cada vez mais raro um sistema de informação que dispense o uso de recursos tecnológicos. No que tange à Administração Pública, esta hipótese torna-se ainda mais difícil de ocorrer. Isso porque as atividades afetas ao interesse público carecem de transparência. É difícil pensar numa forma melhor de conceder transparência às informações do que por meio da tecnologia, tais como portais eletrônicos. Ainda, informações afetas ao interesse público carecem de ser armazenadas por longo prazo, para futura eventual necessidade de resgate. Diferente de empresas privadas, que encontram sua derrocada na falência, a Administração Pública tende a ser perene. Ademais, gestão participativa e democrática implica rotatividade dos gestores, os quais precisam ter acesso a informações relativas às gestões anteriores. É difícil pensar na custódia de toda essa informação com renúncia à tecnologia da informação.

Ainda, a tecnologia pode representar uma grande economia ao serviço público.

À medida que aplicações e sistemas são disponibilizados aos servidores públicos permitindo-os trabalhar de forma remota, utilizando-se do próprio celular ou aparelho

392Stair, Ralph; Reynolds, George. Principles of Information Systems, p. 11-18.

doméstico, significa que a Administração Pública transfere ao particular (servidor público) gastos com pacote de dados, equipamentos, energia elétrica, dentre outros. É o que acontece com o denominado teletrabalho, ou home working. No caso a Administração Pública utiliza-se de um efeito carona, pois transfere custos aos seus próprios servidores.

A tecnologia utilizada nos sistemas de informação afigura-se uma verdadeira pedra angular, sendo que o seu design representa importante definição para todo o funcionamento do sistema. O leque de opções disponíveis no mercado é amplo, com uma variada gama de ferramentas e formatações. A definição da tecnologia da informação a ser utilizada impacta o sistema, pois o seu design pode permitir ou restringir ações dos usuários. Para ilustrar, vale citar o exemplo trazido por Gabriele Piccoli e Federico Pigni, no sentido de que a escolha de uma coleta de dados com a utilização das tabelas do Microsoft Excel faz com que as informações fiquem limitadas ao design destas tabelas e às funcionalidades do respectivo software; de outro lado, a escolha de um sistema gerenciador de banco de dados relacional, tal como MySQL, permitiria diferentes funcionalidades393.

Tomadas de decisão relativas à escolha da tecnologia da informação a ser utilizada possuem altíssimo impacto no que diz respeito à chamada dependência tecnológica (path dependence). Significa que quando um padrão ou formato é escolhido e utilizado em larga escala, qualquer oferta de uma nova tecnologia enfrentará grande resistência394. Para ilustrar, tenha-se o modelo de teclado QUERTY, bem como o tráfego britânico (cujo sentido de circulação é pela esquerda). Nestes casos, as externalidades positivas de rede são de tal monta que superam os benefícios da substituição por uma nova tecnologia. Assim, a dependência tecnológica pode ter dois efeitos395: (a) tende a “prender” os usuários a uma tecnologia inicial inovadora (efeito de lock-in), somente podendo ser abandonada a um custo muito alto396; e (b) deixa de fora novas alternativas (efeito de lock-out), as quais não conseguem superar a estandardização posta.

393Piccoli, Gabriele; et al. Information Systems for Managers – Texts anda Cases, p. 80.

394Hovenkamp, Herbert. The Antitrust Enterprise: Principle and Execution, posição 3592 (edição kindle).

395Freire, Maria Paula dos Reis Vaz. Eficiência Económica e Restrições Verticais, p. 522.

396Balmann, Alfons; Brandes, Wilhelm; Odening, Martin; et al. Path-dependence Without Increasing Returns to Scale and Network Externalities, p. 160.

No que toca à viabilidade da adoção de uma nova tecnologia pela Administração Pública, não se pode esquecer o óbvio: a necessidade de avaliar o benefício trazido pela tecnologia em relação ao seu custo direto. Em que pese existam muitas opções gratuitas ou a baixo custo, soluções tecnológicas ainda custam muito caro no geral. Além disso, aquisição de tecnologia possui os seus melindres, uma vez que contratos de tecnologia são complexos397; a natureza do produto ou serviço comprado, a velocidade com que se atualizam, o efeito disruptivo de novos modelos, questões envolvendo compatibilidade, tudo isso são pontos a serem observados na aquisição de novas tecnologias pela Administração Pública. Afinal, as amarras normalmente existentes para o poder público quando da realização de suas compras não combinam com a versatilidade e evolução pulsante da tecnologia, o que pode levar a implementações ineficientes.

Além do custo direto, a implementação de novas tecnologias da informação merece outros pontos de atenção. Alguns complementos são necessários para o sucesso de um sistema de informação que adota nova tecnologia: (a) funcionários bem treinados, ou seja, é preciso que os envolvidos entendam a necessidade do novo sistema, que cada um tenha clareza do seu papel e saibam operar a tecnologia empregada; (b) suporte de sistema, o que permite a funcionários mais experientes e treinados compartilhar com os demais meios de superar as dificuldades iniciais de implementação e adicionar valor ao sistema; (c) trabalho em equipe, no sentido de que os envolvidos devem estar motivados e entender a importância de se trabalhar em conjunto, como um único time; (d) redefinição de processos, uma vez que a implementação de nova tecnologia demanda a repaginação de processos de trabalho, com automação de algumas rotinas; (e) novos poderes de decisão, isto é, os envolvidos devem entender e aceitar seus novos papeis e responsabilidades, inclusive quais pessoas serão responsáveis pela tomada de quais decisões398.

Ante todo o exposto é possível concluir que dificilmente se concebe, atualmente, sistemas de informação que não tenham como seu componente elementos de tecnologia. O constante avanço tecnológico permite um acesso cada vez maior a ferramentas poderosas, e tais alternativas não podem ser relegadas. Entretanto, não se pode olvidar que a implementação de tecnologias da informação demanda alguns

397 Ryall, Michael; Sampson, Rachelle. Formal Contracts in the Presence of Relational Enforcement Mechanisms - Evidence from Technology Development Projects, p. 906 ss.

398Stair, Ralph; Reynolds, George. Principles of Information Systems, p. 9.

custos, seja o seu preço de mercado, os efeitos decorrentes da dependência tecnológica ou os percalços de sua inserção na organização. Mais uma vez, cabe à Administração Pública, no seu papel de arquiteta dos sistemas de informação, debruçar-se sobre as alternativas existentes e eleger aquelas que melhor podem contribuir para a aquisição de informação durante a execução dos contratos.