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Algumas ponderações sobre a indefinição de função social da propriedade urbana

1.7 Função social da propriedade urbana

1.7.4 Algumas ponderações sobre a indefinição de função social da propriedade urbana

A função social “constitui um princípio ordenador da propriedade privada e fundamento da atribuição desse direito, de seu reconhecimento e da sua garantia mesma, incidindo sobre seu próprio conteúdo” (SILVA, 2007, p. 121), transformando o sentido da propriedade capitalista sem socializá-la, embora tenha condicionado o seu exercício ao bem comum. A função social da propriedade urbana, porém, não tem sido analisada no tocante a sua significação. Os estudos sobre o assunto enfocam sempre a função social como exigência de utilização da propriedade, sem, contudo, definir o que seja. Diz-se que a propriedade utilizada em prol do bem comum, atenderá a sua função social, manifesta “na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e utilização dos bens.” (SILVA, 2007, p. 121). Definir a função social não é, de fato, uma tarefa fácil diante da ordem jurídica. A Constituição Federal assegura o direito de propriedade no artigo 5º, XXII, XXIII, e determina que a propriedade atenda a sua função social. O artigo 170 da CF/1988, ao tratar da ordem econômica, afirma que a existência digna deve ser assegurada a todos, observados, dentre outros, os princípios da propriedade privada e da função social dessa propriedade (incisos II e III, do artigo 170). O artigo 182 da CF/1988 diz, no seu § 2º, que a propriedade urbana cumpre a sua função social quando atende as exigências fundamentais de ordenação da cidade, expressas no plano diretor.

As normas se enleiam; uma assegura o direito de propriedade que atenda a sua função social, outra diz que a existência digna requer observância à propriedade privada e sua função social. Uma terceira norma afirma que a função social estará realizada quando forem observadas as diretrizes do plano diretor, obrigatório para as cidades com mais de 20 mil habitantes. Não bastasse esse enredo, a propósito da propriedade privada, os artigos 182 e 183, da Constituição Federal promulgada em 05 de outubro de 1988, que tratam da política

urbana, aguardaram quase 13 anos para a sua regulamentação, ocorrida em 10 de julho de 2001, data em que o Estatuto da Cidade (Lei nº. 10.257) foi sancionado, o que não deixa de ser uma evidência do desinteresse em dar efetividade ao texto fundamental.

Deste modo, para definir a função social seria necessário, ao primeiro exame, conhecer o plano diretor de cada cidade, o que, convenha-se, é inviável, para não dizer, impossível. O próprio Estatuto da Cidade não facilita o significado de função social da propriedade urbana, visto que, novamente, os textos legais se imbricam. No seu artigo 39, ao cuidar do Plano Diretor, estabelece a necessidade do atendimento das necessidades do cidadão quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no artigo 2º do Estatuto.

O artigo 2º do Estatuto da Cidade trata da política urbana para o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, em 16 incisos, dos quais o inciso I parece o mais apropriado para abalizar uma definição de função social da propriedade urbana. As diretrizes gerais traçadas pelo inciso I do artigo 2º são: garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as gerações presentes e futuras.

Os outros 15 incisos cuidam da gestão democrática, cooperação entre governos, iniciativa privada no processo de urbanização, planejamento das cidades, ordenação e controle do solo, recuperação de investimentos públicos que tenham resultado em valorização de imóveis urbanos, proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico, regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda, simplificação das leis de parcelamento, normas edilícias, dentre outras diretrizes gerais, que não auxiliam, significativamente, na definição de função social da propriedade urbana.

Definir a função social da propriedade urbana, para muitos, é desnecessário, pois um conceito hermético não alcança o desiderato, já que se deixou aberto o conteúdo, de propósito, para preenchimento de acordo com a particularidade de cada local. É, porém, uma explicação digna de respeito, mas que não reúne essência que justifique a “função social da propriedade urbana”.

O emaranhado de artigos que se vinculam, demonstra, com clareza, um alheamento legislativo quanto ao tema, pois muito se disse e nada, absolutamente nada, ficou especificado

quanto à função social da propriedade urbana, diferente do que ocorreu com a propriedade agrária, cujos contornos estão delineados no artigo 186 da Lei Magna vigente:

A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

O legislador constituinte não teve esse cuidado em relação à propriedade urbana, o que pode ser decorrência de entendimentos de que os artigos 182 e 183 da Constituição Federal em vigor dependiam de regulamentação infraconstitucional, sem, todavia, servir de justificativa para a falta de parâmetros descritivos da função social da propriedade urbana. Para alguns juristas, nem se poderia dizer da inaplicabilidade dos artigos 182 e 183, uma vez que, diante do disposto no § 1º do artigo 5º da CF/1988, os direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Este é mais um elemento para, tão-somente, ampliar a discussão, pois a CF/1988 deixa claro que as normas sobre a política urbana (artigos 182 e 183) são programáticas; tanto são que foram regulamentadas pelo Estatuto da Cidade. As normas citadas confirmam a função social da propriedade urbana como um elemento determinante na utilização da propriedade urbana, que não pode ser excessivamente individualista e inconformada com o interesse social.

Do exposto, uma tentativa de definir a função social da propriedade urbana passa, necessariamente, pela observação do significado das palavras função e social, o que se faz, com base nos ensinamentos de Abbagnano (1998), para quem função:

Corresponde à palavra ergon, do modo como é empregada por Platão, quando diz que a função dos olhos é ver, a função dos ouvidos é ouvir, que cada virtude é uma função de determinada parte da alma e que a função da alma, em seu conjunto, é comandar e dirigir. Função, nesse sentido, é a operação própria da coisa, no sentido de ser aquilo que a coisa faz melhor do que as outras coisas. (ABBAGNANO, 1998, p. 472).

Social significa o “que pertence à sociedade ou tem em vista suas estruturas ou condições; neste sentido, fala-se em ação social, movimento social, questão social. (ABBAGNANO, 1998, p. 912)

A “expressão função social procede do latim functio, cujo significado é de cumprir algo ou desempenhar um dever ou uma atividade.” (FARIAS; ROSENVALD, 2007, p. 197). Com base no exposto e com vistas a esboçar o sentido, ainda que precariamente, da função social da propriedade urbana, conclui-se que: a função social da propriedade urbana

significa e compreende a utilização racional, adequada, econômica e socialmente útil do imóvel, destinando-o a atividades lícitas, ao uso sadio e conveniente ao bem-estar social, resguardados o equilíbrio sócio-ambiental e o patrimônio histórico e artístico, sobrelevado, sempre, o interesse público.

Essa proposição não ambiciona definir a função social da propriedade urbana, mas, sim,

amealhar parâmetros ou idéias para, ao menos, teorizar sobre o que é, afinal, a função social; para muitos, é a própria propriedade, dita agora propriedade-função, quando é, na sua essência, uma forma de exercer o direito privado, com atenção e respeito para o bem-estar social.

A indeterminação do conceito, deixada pelo legislador constituinte e, de igual modo, pelo legislador ordinário, ao regulamentar as disposições constitucionais, não é motivo para que assim permaneça, pois é importante conhecer o conteúdo mínimo da função social, que deverá ser acrescido na sua essência, sempre que se mostrar incompleta.

A propriedade, protegida constitucionalmente e infraconstitucionalmente pelo Estatuto da Cidade, tem que cumprir a sua função social. O caráter eminentemente privado da propriedade não mais é tutelado pelo ordenamento jurídico brasileiro. A invasão de propriedades e sua ocupação desordenada traz sérias conseqüências para a cidade, como, por exemplo, a proliferação de favelas e um agravamento da violência. A conjuntura das cidades e o Estatuto da Cidade integram o próximo capítulo, cuja abordagem minudencia os vários instrumentos de gestão que podem ser utilizados para o cumprimento da função social da propriedade urbana.

CAPÍTULO II

O ESTATUTO DA CIDADE E AS CIDADES

2.1 Espaço e tempo no cotidiano

O conceito de espaço é abstrato. Tem origem latina (spatium) e, para a Geografia, tem significações de intervalo, separação, lugar, porção da superfície, conjunto de superfícies, superfície terrestre. O tempo, tanto quanto o espaço, tem relevância para a Geografia, já que a temporalidade, a periodização está sempre presente nos estudos geográficos.

A relação espaço-tempo é indissociável. Assim, como “os direitos dos povos equivalem precisamente ao seu tempo e se explicam no espaço de sua gestação” (ALTAVILA, 1997, p. 16), as cidades refletem o espaço-tempo de sua criação e desenvolvimento. Conforme Sánchez (1981), espaço é:

O campo de realidade sobre a qual trabalham os geógrafos. Este espaço engloba todas as relações sociais e humanas, e todos os eixos físicos que se encontram ao nosso alcance estão contidos nele. O espaço é, pois, a situação física em que se produzem todas as relações humanas e sociais. (SÁNCHEZ, 1981, p. 21)17

Na análise geográfica, diz Carlos (2004), “o tempo se revela no modo de apropriação do espaço, enquanto uso do espaço enquanto condição de realização da vida humana.” (CARLOS, 2004, p. 78). O espaço e o tempo recortados, sem dúvida, refletem a realidade de cada era.

A temporalidade é um aspecto indissociável na análise do lugar, que, naturalmente, está impregnada das concepções existentes e gestadas à época. Não se pode, com um corte

17 El espacio es el campo de la realidad sobre el que trabajan los geógrafos. Este espacio engloba todas las relaciones sociales y humans, y todos los hechos físicos que se hallan a nuestro alcance están contenidos en él. El espacio es, pues, la situación física en la que se producen todas las relaciones humanas y sociales. (SÁNCHEZ, Joan-Eugeni. La geografia y el espacio social del poder. Barcelona: Los Libros de la Frontera, 1981 (grifos do autor).

temporal, buscar explicações ou justificativas para atos do passado, com base na realidade atual. A análise de cada tempo é feita no contexto histórico de que se revestiu. Em cada tempo e espaço, há uma história que tem continuidade na perpetuidade do próprio tempo e espaço. Ao tratar do ritmo, como um novo campo de conhecimento, Lefebvre (2004) o correlaciona à própria vida, com sua transformação, movimento, mobilidade em geral, indagando se o processo de coisificação ou reificação foi a fundo desvendado. Ele propõe uma análise do dia-a-dia a partir do ritmo, já que nada é estático. O movimento próprio da vida, muitas vezes, fica perdido em meio às muitas percepções, nem sempre, da realidade viva.

A partir da análise do ritmo, Lefebvre (2004) tece estas belíssimas considerações:

Da minha janela por onde vejo pátios e jardins, a vista é muito diferente daquilo que o espaço apresenta. Observando os jardins, as diferenças entre os ritmos habituais (ou diários, portanto, ligados à noite e ao dia) se confundem. Elas parecem desaparecer em uma imobilidade escultural. Exceto é claro, o sol e as sombras, os cantos bem e mal iluminados, contrastes um tanto superficiais. Mas olhe as árvores, os gramados e aqueles bosques. Aos seus olhos eles se situam em uma permanência, em uma simultaneidade espacial, em uma coexistência. Mas olhe mais atentamente e por mais tempo. Essa simultaneidade, até certo ponto, é apenas aparente: uma superfície, um ângulo. Vá mais fundo, além da superfície, ouça atentamente ao invés de simplesmente olhar, de refletir os efeitos de um espelho. Você então perceberá que cada planta, cada árvore, tem seu ritmo, feito de tantos outros: as árvores, as flores, as sementes e frutas, cada uma tem seu próprio tempo. A ameixeira? As flores nasceram na primavera; antes, as folhas; a árvore era branca antes de se tornar verde. Mas nessa cerejeira, por outro lado, existem flores que se abriram antes das folhas, que sobreviverão aos frutos e cairão aos poucos no fim do outono. Continue e você verá esse jardim e os objetos (que não são, em hipótese alguma, coisas) de forma polirítmica ou, se preferir, sinfônica18. (Grifos do autor)

(LEFEBVRE, 2004, p. 31)

18 From my window overlookking courtyards and gardens, the view and the supply of space are very different. Overlooking the gardens, the differences between habitual (daily), therefore linked to night and day) rhytms blur; they seem to disappear into a sculptural immobility. Except, of course, the sun and the shadows, the well lit and the gloomy corners, quite cursory contrasts. But look at those trees, those lawns and those groves. To your eyes they situate themselves in a permanence, in a spatial simultaneity, in a coexistence. But look harder and longer. This simultaneity, up to a certain point, is only apparent: a surface, a spectacle. Go deeper, dig beneath the surface, listen attentively instead of simply looking, of reflecting the effects or a mirror. You thus perceive that each plant, each tree, has its rhythm, made up of several: the trees, the flowers, the seeds and fruits, each have their time. The plum tree? The flowers were born in the spring, before the leaves, the tree was white before turning green. But on this cherry tree, on the other hand, there are flowers that opened before the leaves, which will survive the fruits and fall late in the autumn and not all at once. Continue and you will see this garden and the objects (which are in no way things) polyrhythmically, or if you prefer symphonically. (Grifos do autor)

São criadas novas necessidades, surgem novas realidades, mas “toda forma é produto da relação indissociável espaço-tempo e não podemos deixar de considerar, na sua observação- descrição, a relação dialética lugar-mundo. É no lugar que o mundo se manifesta. Sem o lugar não há expressão do mundo.” (SPOSITO, 2001, p. 434).

O espaço-tempo determina as atitudes da sociedade e para a sociedade, no tocante ao Poder público, sem que, com isso, se as justifique quando não dirigidas para o bem comum ou, quando dirigidas, não alcancem e realizem o bem comum. Nos lugares são encontradas as pessoas, os cidadãos, como agentes e destinatários das ações dirigidas às formas e aos elementos físicos da paisagem e às atividades econômicas, políticas, culturais, sociais e emocionais referentes à vida e às atividades dos habitantes do local. Nos lugares, “o espaço e o tempo constroem e reconstroem incessantemente a habitabilidade dos seres humanos” (LEMOS, 2001, p. 435) e a própria história do homem.

Abordada a relação espaço-tempo, cabe indagar: por que surgem as cidades? Pinsky (1994), ao tratar das primeiras civilizações, diz “Antes de tudo, evitemos os sonhos. Não há como idealizar os homens conscientemente, decidindo-se a fundar uma cidade.” (PINSKY, 1994, p. 43),

Impossível, na esteira do pensamento de Pinsky, que a consciência individual ou de grupo tenha levado pessoas a plantar os alicerces de agrupamentos urbanos no Egito ou na Mesopotâmia, qual bandeirante que, a partir de modelos, e de acordo com objetivos determinados, criou as bases de futuras cidades.

Não há um consenso acerca do surgimento das cidades. Há hipóteses de que teria havido a transformação de pequenas aldeias de agricultores auto-suficientes em aldeias populosas. Os agricultores organizados, e tendo auto-suficiência, passaram a administrar o excedente, partindo para a urbanização. Cogita-se que a atividade agrícola levou à organização do trabalho para a fertilidade da terra e alimento abundante e estaria, nessa relação de trabalho organizado, a base das primeiras civilizações.

A cidade, inegavelmente, é uma construção humana que revela e contempla um processo histórico que leva à impossibilidade de pensá-la isolada da sociedade e do contexto em que se encontra. A observação de Lefebvre (2007) é lapidar:

Considere o caso de uma cidade – um espaço criado, moldado e caracterizado por atividades sociais durante um período histórico finito. Essa cidade é uma obra ou um produto? Tome Veneza, por exemplo. Se definirmos obras como únicas, originais e primordiais, como ocupações de espaço associados a um tempo específico, um tempo de maturidade entre seu

surgimento e declínio, então Veneza somente poderá ser descrita como uma obra. É um espaço tão expressivo e significante, tão único e especial quanto uma pintura ou uma escultura. Mas o que – e quem – ela expressa e significa? Essas questões podem suscitar discussões infindáveis, pois aqui conteúdo e significado não têm limites19. (Grifos do autor) (LEFEBVRE,

2007, p. 73)

As cidades são os pontos de “interseção e de superposição entre as horizontalidades e as verticalidades. Elas oferecem os meios para o consumo final das famílias e administrações e o consumo intermediário das empresas” (SANTOS; SILVEIRA, 2003, p. 280).

Mais que pontos de interseção e superposição entre as expansões horizontal e vertical, as cidades são o ambiente de vivência dos povos, pois o “espaço geográfico compõe uma inescapável dimensão espacial da existência do homem” (NARDY, 2003, p. 128), ou seja, é resultante de um processo histórico.

A cidade, mais que o lugar de habitação, é o espaço onde homens, mulheres, crianças, vivem, unindo e se emocionando, pois, como ambiente de vivência, estão presentes conflitos, tristezas, alegrias, realizações, vitórias, derrotas. No lugar, diz Lemos (2001), “é o onde os homens se humanizam” (LEMOS, 2001, p. 435-436). Nesse contexto, há de se reconhecer que, no espaço-tempo acontecem as experiências do cotidiano das pessoas, para as quais a cidade não tem o significado único de habitabilidade, pois seus sentimentos e emoções estão guardados em ruas, praças, bares, cinemas, escolas, casas etc.

A vida é feita de instantes, já dizia o poeta argentino Jorge Luiz Borges e, nesses instantes diários, ela se manifesta para cada um de acordo com suas experiências, seus anseios, seus sentimentos, suas ideologias, seus sonhos e esperanças, é, no espaço-tempo da cidade, que se revela a obra coletiva produzida pela sociedade, se revela, também, uma obra para cada cidadão, resultante da individualidade de cada um que nela habita.

Essa individualidade se faz coletiva na gestão dos deveres e direitos de cada habitante, mas sua particularidade permanece na paisagem que cada ser enxerga, sempre diferente do enxergar do outro, pois nela se encontram sentimentos próprios e insubstituíveis de cada

19 Consider the case of a city – a space which is fashioned, shaped and invested by social activities during a finite historical period. Is this city a work or a product? Take Venice, for instance. If we define works as unique, original and primordial, as occupying a space yet associated with a particular time, a time of maturity between rise and decline, then Venice can only be described as a work. It a space just as highly expressive and significant, just as unique and unified as a painting or a sculpture. But what – and whom – does it express and signify? These questions can give rise to interminable discussion, for here content and meaning have no limits. (Grifos do autor)

homem. A sensibilidade de Chico Science20 retrata o olhar sobre a cidade e o da própria cidade acerca dos seus habitantes:

O sol nasce e ilumina as pedras evoluídas Que cresceram com a força de pedreiros suicidas Cavaleiros circulam vigiando as pessoas

Não importa se são ruins, nem importa se são boas E a cidade se apresenta centro das ambições Para mendigos ou ricos e outras armações Coletivos, automóveis, motor e metrôs Trabalhadores, patrões, policiais, camelôs A cidade não pára, a cidade só cresce O de cima sobe e o de baixo desce A cidade não pára, a cidade só cresce O de cima sobe e o de baixo desce.

O porquê das cidades leva a pensar que a paisagem, que, na perspectiva geográfica liga-se à produção do espaço, como conseqüência das atividades da sociedade urbana por meio de suas forças produtivas e políticas, não se dissocia da história do homem na sua concepção dos direitos à moradia, lazer, saúde, educação, trabalho, acrescidos e marcados pelos mais diversos sentimentos e significados que o lugar deixa na memória de cada qual. Nessa conjunção, tem-se a cidade como palco de vidas que sonham, realizam, trabalham, sofrem e deixam as suas marcas no espaço-tempo que ocupam ou ocuparam.

Inconveniente, inadequado e impossível pensarem-se as cidades unicamente como um pertence do Poder público que, ao seu talante, traceja os movimentos e as modificações que entende serem adequados para a concretização do seu plano de governo, esquecido de que os