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As conquistas humanas estão ligadas, de um modo geral, ao poder aquisitivo. Esse liame exclui uma grande parcela da população das mínimas condições de sobrevivência, resultante da inacessibilidade aos bens necessários para uma vida digna. A falta de renda expressa suas conseqüências no relacionamento entre os homens, pois as diferenças sociais, políticas, econômicas e culturais acabam por consolidar uma desigualdade efetiva, em contraposição à igualdade constitucional.

O universo é uma harmonia de contrários, dizia Pitágoras, e esses pólos antagônicos se mostram na ocupação das cidades. Estão juntas as chamadas ocupações legais e as ilegais, como são conhecidas as favelas e, nesse espaço de ambiência, os contrastes se mostram e convivem. As razões que levam ao aparecimento das favelas são variadas e, sem dúvida, ligadas à exclusão social.

Na maioria dos casos, “a exclusão social tem correspondido também a um processo de segregação territorial, já que os indivíduos e grupos excluídos da economia urbana formal são forçados a viver nas precárias periferias das grandes cidades, ou mesmo em áreas centrais que não são devidamente urbanizadas.” (FERNANDES, 2000, p. 13).

As questões físicas (infra-estruturais, urbanísticas e ambientais), sociais (econômicas, culturais e existenciais), ecológicas e de segurança do cidadão, como parte de políticas públicas, podem ser o eixo para combater o apartheid social, a cidade partida entre excluídos e incluídos nos benefícios da urbanidade.

As favelas nas cidades brasileiras, e em outras latino-americanas, surgem no final do século XIX, associadas à campanha higienista que pretendeu combater os cortiços, um tipo de moradia coletiva com precárias condições de habitabilidade, adotado pelas famílias de baixa renda. A perseguição aos cortiços aconteceu em todo o Brasil e, com isso, a população pobre das áreas centrais da cidade foi sendo expulsa para as periferias, passando a ocupar terrenos sem infra-estrutura, inaugurando a tipologia residencial designada por favela, que se tornou, já há um século no Brasil, a segunda alternativa de moradia para a população de baixa renda32. Com o passar dos anos, a dinâmica da urbanização fez com que a cidade crescesse para além dessas ocupações e as favelas, que de início formavam um anel ao redor da cidade, fizeram-se presentes em todo o tecido urbano, pontuando a malha formal com manchas de ocupação irregular33.

Importante salientar que os loteamentos irregulares ou clandestinos, em que a infra- estrutura inexiste ou é precária, também constituem favelas. Os loteamentos chamados irregulares são aqueles aprovados pela prefeitura, mas executados em desacordo com o plano aprovado. Os loteamentos clandestinos são aqueles sem aprovação do Poder público. Os compradores desses terrenos, quase sempre, não têm título de domínio, e constroem casas sem licença e sem as necessárias condições de habitabilidade, que, acabam, também, por se constituírem favelas.

As favelas surgem e se expandem; diz-se que a cidade está se favelizando; diz-se que o Poder público tem a maior parcela de culpa, ao permitir essa invasão do espaço; para uns, o problema é o sistema de governo no país, que não distribui, convenientemente, a renda. Para outros, a favela está ligada à violência, que mais se evidencia no tráfico de drogas, mas está ligada, também, a outras condutas ilícitas.

Acredita-se que pelos menos 10% da população das favelas estão envolvidas em atividades ilícitas e os outros 90% constituem, na sua maioria, a força de trabalho dentro e fora da favela, pois é claro que muitos estão integrados ao mercado de trabalho formal ou informal. Embora não se os tenha como causa exclusiva, é de se pensar que a maioria dos

32 Cf. ALFONSIN, Betânia de Moraes, 2001, p. 196-197 33 Id., ibid.

moradores das favelas está nessa condição por falta de programas públicos que atendam às suas necessidades e possibilitem o acesso aos serviços básicos, principalmente, à moradia. A história mostra que a desfavelização, a exemplo da Cidade de Deus, no município do Rio de Janeiro, não é a solução, pois os moradores daquele local, que hoje se designam refavelados, foram compelidos a abandonar as imediações da urbanidade para morar em um lugar sem nada, no meio do nada; hoje, ironicamente, estão ameaçados de expulsão, pois a cidade formal já os alcançou.

Constata-se, pois, que a divisão do espaço não considerou a dimensão social, como adverte Sánchez (1981), demonstrando que essa preocupação não é e nem deve ser, apenas, local:

Na medida em que ao largo da história os espaços sociais vão aumentando progressivamente em sua dimensão geográfica (pensemos na distinta dimensão do espaço social próprio de uma tribo dentro de um Estado médio contemporâneo), a divisão do espaço deve adaptar-se a cada dimensão histórico-social média34. (SÁNCHEZ, 1981, p. 153-154),

As favelas não são explicáveis somente pelas formas de segregação espacial e as desigualdades quanto à habitação. Há um contexto a ser considerado. As desigualdades sociais, econômicas e políticas entre as classes sociais estão na raiz dessa ocupação do espaço. Os cidadãos, que deveriam ter as mínimas condições para uma vida digna, com acesso aos bens e serviços básicos de uma cidade, são excluídos e entregues ao seu próprio destino, nada alvissareiro. E, assim, constroem favelas, onde lutam pela sobrevivência física e moral, já que, por serem marginalizados, são naturalmente considerados suspeitos de atos criminosos. Não raro, a resistência a essas desigualdades sociais é tida como atos de violência, consubstanciados na mobilização e lutas para a conquista de direitos sociais, trabalhistas e civis, por exemplo. Essa violência é praticada pelo “outro”, por aquele que não integra a sociedade formal, conhecido e tratado como o vândalo, o bandido, o não-cidadão.

Observa Koga (2003) “relacionar os pobres com uma deficiência moral que pode levar a comportamentos suspeitos na sociedade parece uma idéia ultrajante ou mesmo inconcebível

34 “En la medida en que a lo largo de la historia los espacios sociales han ido aumentando progresivamente en su dimensión geográfica (pensenos en la distinta dimensión del espacio social propio de una tribu respecto al de un Estado medio contemporáneo), la división del espacio ha debido adaptarse a cada dimensión histórico-social media.” (SÁNCHEZ, Joan-Eugeni. La geografia y el espacio social del poder. Barcelona: Los Libros de la Frontera, 1981, p. 153-154).

nos dias de hoje, de fato incongruente com os discursos sobre os direitos humanos e de cidadania apregoados nos mais diversos contextos.” (KOGA, 2003, p. 48)

Ao escrever sobre o Direito da cidade: o direito no seu lugar, Coutinho (2006) cita uma proposição sobre os problemas urbanos brasileiros, no sentido de que:

A exclusão social também corresponderia, na maioria dos casos, a um processo de segregação territorial, com os contingentes excluídos da economia urbana formal sendo compelidos a viver nas periferias das grandes cidades, áreas de precária disponibilidade de equipamentos urbanos indispensáveis (saneamento básico, transportes de massa, fornecimento regular de energia elétrica etc). (Grifos do autor) (COUTINHO, 2006, p. 2)

O território da favela foi constituído por uma mansa transgressão, preservando-se os padrões de socialização existentes na cidade formal. A praça, as ruas, as esquinas são resguardadas, também, como lugares de encontro, enfatizando o caráter público que lhes é inerente. Tida como problema, a favela é, na verdade, uma solução, resultante de condições sociais adversas, construída pelos chamados cidadãos de segunda classe, sem dúvida, integrantes da cidade, ainda que precariamente, malgrado a existência de uma sociedade em que as distâncias e desigualdades sociais são evidentes.

As cidades informais, caracterizadas pelas áreas onde se localizam as favelas, os loteamentos irregulares e clandestinos, as ocupações de áreas protegidas ambientalmente, as ocupações coletivas de área urbana, os conjuntos habitacionais sem infra-estrutura são situações que evidenciam a necessidade de uma política urbana efetiva, diante da carência do ser humano de ter um lugar digno para morar.

Além das cidades informais, não podem ser ignoradas as pessoas sem-casa, que utilizam espaços públicos como moradia. Essas pessoas são segregadas e, em conclusão, também faveladas, já que excluídas socialmente do direito à moradia digna, expandindo-se, nesse ponto, o sentido de favela, para entendê-lo como moradia sem casa e em lugares sem infra- estrutura. Desse modo, aqueles que moram nas ruas, embaixo de pontes e viadutos, não estão em lugares com infra-estrutura, e, não se pode deixar de enquadrá-los como favelados, ou, simplesmente, segregados, pois lhes faltam oportunidades iguais de acesso aos direitos sociais, tidos como piso vital para uma existência digna.

A constatação de Lefebvre (2004), de que a casa é um complemento da própria condição humana, mostra que o fenômeno social da segregação sócio-espacial é grave, amplo e mundial. De acordo com informações do Jornal Folha de São Paulo, de 7 de outubro de 2003,

se não forem tomadas medidas de combate à pobreza e adotadas políticas de emprego e de habitação, a população mundial que vive em favelas deve duplicar e chegar a 2 bilhões em 30 anos, conforme dados divulgados pelas Organizações das Nações Unidas – ONU, extraídos do documento O Desafio das Favelas, o Programa de Alojamento Humano da ONU. No prefácio desse documento, o então secretário da ONU, Kofi Annan, afirma que as favelas representam o pior da pobreza urbana e da desigualdade35. De acordo com esse documento:

[...]

A maior parte desse crescimento, diz o relatório, estará concentrada nos países em desenvolvimento, onde a população das cidades aumenta a uma taxa anual de 2,3%, contra 0,4% nos países desenvolvidos. A pobreza, que foi no passado um fenômeno característico de regiões rurais, se “urbaniza” de forma acelerada.

O documento da ONU não traz dados globais sobre o Brasil, mas analisa a situação das favelas no Rio e em São Paulo. No caso do Rio, o relatório faz elogios ao programa “Favela Bairro” lançado nos anos 90, mas aponta o excesso de burocracia, a escassez de financiamento para moradias e o pouco uso de tecnologias alternativas na construção civil como empecilhos à melhoria das condições de vida nas favelas. Em São, diz o documento, a proporção de favelados passou de 5,2%, em 1980, para 19,8% da população. No caso paulistano, a ONU critica a falta de continuidade nos programas para as comunidades pobres, “freqüentemente paralisados por mudanças na administração pública e subseqüentes viradas políticas.36”

Daí, a pertinência das indagações de Corrêa (2003):

As rápidas e dramáticas transformações, gerando novas grafias e novas práticas espaciais, criando novas metáforas e metonímias, novos valores e novas paisagens urbanas, estão construindo o futuro. Mas que futuro é este? É o futuro que queremos? Ou é, por intermédio de simulacros diversos, a continuidade do presente? (CORRÊA, 2003, p. 159).

A favela é uma organização social concreta, que surgiu da adaptação da pobreza à necessidade de subsistência, no vácuo do estado social. Nesse território são construídas as suas instituições, passando a existir uma intensa troca de informações, favores e proteção recíproca, reforçada pela contigüidade, pelo convívio mais próximo e regular e pela solidariedade.

35 Cf. dados disponíveis <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/noticias/gf071003g.htm>. Acesso em: 14 mai. 2007.

36 Informações do jornal Folha de São Paulo. Disponível em:

As relações humanas na favela refletem as estratégias de subsistência, pois, o seu morador, em sua maioria, é um habitante que depende do trabalho, da renda para sobreviver. O auto-aperfeiçoamento da favela é uma constante, ou seja, os moradores encontram meios para conseguir a infra-estrutura mínima de que necessitam. Por meios lícitos ou ilícitos, energia, água, transporte, escolas acabam por chegar às favelas. E, nesse sentido, o fazer e refazer são contínuos, a fim de o morador aperfeiçoar e adaptar a sua residência às suas necessidades e possibilidades. Isto vai resultar em uma cidade inclusiva, isto é, as favelas vão se autodesenvolvendo até a sua urbanização tornar-se realidade e, então, o Poder público, atento ao mal menor, acaba por considerá-la parte da cidade legal.

Considerado um livro de história viva, onde o passado se mistura ao presente, Alfama, hoje um bairro típico de Lisboa, antigo lar de delinqüentes e desafortunados, foi uma favela no seu passado, criada pelo povo como uma solução residencial daquela época.

A liberdade dos seus antigos moradores de aperfeiçoar e adaptar suas residências levou ao progressivo desenvolvimento de Alfama, conferindo-lhe inserção na cidade. Historicamente, é sabido, também, que, em Sevilha – Espanha, a Juderia, antigo bairro judeu, com construções que remontam ao século XVI, era uma favela, hoje integrada à cidade formal e um dos seus maiores atrativos turísticos.

Entre nós, a Cidade de Deus, situada na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, começou a ser construída e ocupada no decurso dos anos 60 do século XX, por ocasião da remoção sumária da população residente em favelas. Em poucos anos, o bairro cresceu em população e os mais de 120 mil moradores hoje convivem com a falta de saneamento básico, infra- estrutura, opções culturais e muita violência.

Com o objetivo de incentivar uma transformação social, o Espaço Cultural Cidade de Deus promove atividades educacionais, sócio-culturais e esportivas. Isto releva que os seus moradores, em não encontrando o necessário apoio do Poder público, desenvolveram, em conjunto com moradores de outras favelas, uma forma de se organizar, criando a Central Única de Favelas – Cufa e a Agência de Notícias de Favelas – ANF.37

A Central Única de Favelas, conforme informa seu sítio, surgiu de reuniões de jovens de várias favelas do Rio – geralmente negros – que buscavam espaço na cidade para manifestar seus pensamentos, sua arte ou, apenas, sua vontade de viver. Esses jovens, em sua maioria, pertenciam ao movimento hip hop e descobriram que, juntos, poderiam se organizar para

37 Central Única de Favelas – Cufa. Disponível em: <www.cufa.com.br>. Acesso em: 10 mar. 2007. ; Agência de Notícias de Favelas. Disponível em: <www.anf.org>. Acesso em: 10 mar. 2007.

transformar as favelas, demonstrar seus talentos para uma sociedade que não superou, ainda, seus preconceitos de cor, classe social e origem.

A Central Única de Favelas, além do movimento hip hop, procurou ampliar e alcançar outras formas de expressões, passando a funcionar como um pólo de produção cultural e, por intermédio de parcerias, apoios e patrocínios, a formar e informar jovens das comunidades, oferecendo-lhes oportunidades de inclusão social.

A central promove, também, atividades educacionais, de lazer, esportivas, culturais e de cidadania, trabalhando com os chamados oito elementos do hip hop: graffiti (movimento organizado nas artes plásticas em que o artista aproveita espaços públicos, criando uma nova identidade visual em territórios urbanos); DJ (artista que alia a técnica ao desempenho, utilizando pick-ups e discos de vinil); break (estilo de dança de rua originário do movimento

hip hop); rap (ritmo e poesia, estilo musical culturalmente herdado das populações latinas e

negras, cujas letras retratam o cotidiano das periferias); audiovisual (valorização da imagem, como instrumento de mobilização social); basquete de rua (esporte oficialmente embalado pelo rap); literatura (quando os jovens expressam a sua arte e as suas vivências por meio da escrita e obtêm conhecimentos relativos às obras ou aos escritores literários) e projetos sociais (conjunto de ações por uma transformação social, a partir das comunidades).

Além disso, promove, produz, distribui e veicula a cultura hip hop em publicações, discos, vídeos, programas de rádio, shows, concursos, festivais de música, cinema, oficinas de arte, exposições, debates, seminários e outros meios.

A central objetiva conscientizar o povo da periferia de sua cidadania, cuja voz precisa ser ouvida, de acordo com sua identidade, que retrata a favela como ela é, falando de dentro para dentro. Os mais variados projetos são desenvolvidos pela central, dentre eles, cursos de audiovisual, com equipamentos digitais de última geração, destinados a produzir videoclipes, documentários e filmes, eventos culturais, curso de teatro, oficinas temáticas, com ênfase em racismo e direitos humanos.

A central tem base em vários estados da federação e já cadastrou diversas favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná, conforme tabela anexada ao final.

A Agência de Notícias das Favelas foi lançada pela organização não-governamental - ONG - Casa da Cidadania, para informar à imprensa e à sociedade o que acontece nas favelas do Rio. Foi lançada em 2001, como um projeto, mas reconhecida pela Reuters, como a primeira agência de notícias de favelas do mundo.

A Agência de Notícias das Favelas se constituiu juridicamente como uma organização não-governamental para dar continuidade aos seus projetos de democratizar as informações, procurando integrar as favelas ao mundo e, nesse conjunto, alcançar melhores condições de vida. É perceptível que, também nas favelas, os seus habitantes têm, fazem e encontram os seus referenciais.

Constata-se, ainda, que as favelas – as chamadas cidades ilegais – estão, a cada dia, buscando alternativas para a sua inclusão formal e reconhecimento pela sociedade, pois, incluídas já estão e, se as políticas públicas não as alcançam espontaneamente, os moradores as procuram e as tornam alcançáveis, ainda que minimamente.

É inevitável reconhecer que, atualmente, existem favelas e favelas. Há favelas urbanizadas, outras buscando serviços mínimos para os seus habitantes e outras, ainda, sem acesso a qualquer tipo de serviço básico. As favelas, ao longo do tempo, passam por um processo de adensamento e, gradativamente, os moradores vão se organizando para melhorar suas condições de vida. Não é o desejável, pois todos deveriam ter uma moradia digna, mas é uma realidade que não pode ser ignorada.

Em muitos casos, as favelas acabam se tornando, também, refúgio de infratores, que não são, necessariamente, seus efetivos moradores. É que, nas favelas, o esconderijo torna-se mais fácil, por dificuldade de acesso, e seguro, porque a força policial nem sempre se apresenta nessas áreas para trabalhos de prevenção. Muitas vezes, os moradores, com receio dos infratores e das forças de segurança pública, guardam silêncio acerca desses infiltrados. O Poder público não deveria consentir na urbanização das favelas, mas é impelido por sua própria falha no necessário cumprimento da Constituição Federal, elaboração de políticas públicas e ações proativas para impedir ocupações e a fixação de favelas. Claro, também, que a favelização não passa apenas pela falta de políticas públicas para habitação, pois, na raiz do problema, não se pode descartar a precária distribuição de renda e o desemprego, como componentes. A igualdade formal, muito provavelmente, por bom tempo, continuará existindo apenas na norma, pois a riqueza dificilmente será distribuída igualitariamente. Como se nota, o problema das favelas não é explicável apenas pela segregação espacial e desigualdades relativas à habitação; pode, muito mais, ser explicado pelo processo de degradação social que ocorre nas cidades. “Os favelados são pobres [...] mas, a falta de amor é a maior das pobrezas”, já dizia Madre Teresa de Calcutá.

Com a propriedade costumeira, lembra Koga (2003), que “o autoritarismo da sociedade brasileira apresenta-se mais cruel, ao circunscrever as classes pobres à condenação à exclusão,

à falta de perspectiva num país onde são denominados pelo próprio governo como ‘inimpregáveis’.” (KOGA, 2003, p. 50).

De acordo com os dados divulgados pelas Organizações das Nações Unidas – ONU, extraídos do documento O Desafio das Favelas, o Programa de Alojamento Humano da

ONU, “em 2001, havia 924 milhões de favelados, ou 31,6% dos moradores de zonas urbanos

no mundo, afirma o relatório. Nas regiões em desenvolvimento, os favelados correspondem a 43% dos que moram nas cidades38.”

As favelas já não podem mais ser consideradas intrusas no espaço. A cidade formal ao chegar até elas, as tem, queira-se ou não, como extensão de si mesma. Renegar essa evidência só contribui para rechaçar uma realidade posta e da qual não há como se esquivar. De nada adianta dar vida ao preconceito, instalando-se em condomínios fechados, com vidros à prova de balas nas residências e edifícios, porque esse cotidiano, indesejável para muitos, está vivo e se tornou inarredável. Não é o que a sociedade deseja e espera de um país que deu ampla proteção, em sua Carta Magna, aos direitos fundamentais do homem.

Hoje, a democracia deve ser um empecilho à construção de outra Cidade de Deus para expulsar os favelados para longe da visão dos cidadãos considerados incluídos. Afinal: