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Breve histórico da política habitacional e do Banco Nacional da Habitação

3 DIREITO À MORADIA COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA

3.5 Moradia – algumas considerações sobre o déficit habitacional

3.5.1 Breve histórico da política habitacional e do Banco Nacional da Habitação

No Brasil, até o início do século passado, a participação governamental no processo habitacional era insignificante. O Governo concentrava sua preocupação nas condições sanitárias das cidades, a fim de evitar epidemias. Na década de 1930, com a intensificação da industrialização, houve uma concentração populacional nas cidades e, em conseqüência, um déficit na oferta de moradias. Foi, então, que o Estado começou a intervir no processo habitacional, criando, dentro do sistema previdenciário, também instituído nesse período, os Institutos de Aposentadorias e Pensões - IAP, que, também, financiavam projetos de habitação.

Em 1946, foi criada a Fundação da Casa Popular, no governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), para cuidar da política nacional de habitação, atendendo a população fora do mercado formal de trabalho, por isso, sem acesso aos IAPs. A má gestão dos recursos

67 Escrito a partir das seguintes leituras: DAMIANI, Amélia Luísa, CARLOS Ana Fani Alessandri, SEABRA, Odette Carvalho de Lima Seabra, O espaço no fim de século – a nova raridade, 1999, p. 123; Revista de Direito da Cidade. UERJ, Rio de Janeiro, 2006, p. 138-144; VALLADARES, Licia do Prado (org), Repensando a habitação no Brasil, Rio de Janeiro, 1983, p. 39-43; MARICATO, Ermínia, Habitação e cidade, São Paulo, 2002, p. 48-51; <http://www.cidades.gov.br/ministerio-das-cidades/historico/?searchterm=BNH>. Acesso em 10 jan. 2008; <http://www.planalto.gov.br/Infger_07/presidentes> Acesso em: 10 jan. 2008; <http://www.sinpro- rs.org.br/extra/jul97/movim1.htm>. Acesso em: 01 fev. 2008; <http://www. presidencia. gov.br/info_historica>.; <http://www.ippuc.org.br/informando/consecon/Termo%20de%20Ref%C3%AAncia_Plano%20Municipal%20d e%20Habita%C3%A7%C3%A3o%20de%20Interesse%20SocialVERS%C3%83O%20FINAL%2008122006.pdf >. Acesso em: 01 fev. 2008; <http://www.sinpro-rs.org.br/ extra/jul97/ movim1. htm>. Acesso em: 01 fev. .2008; <http://veja.abril.com.br/arquivo_ veja/ capa_ 29061983 . shtml> Acesso em: 01 fev. 2008

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públicos, congelamento de aluguéis e a inflação acentuada foram os motivos para a decaída dos programas habitacionais, na década de 1950. Em 1953, tentou-se transformar a Fundação Casa Popular em um banco hipotecário, mas esse intento só seria encaminhado no período do presidente Jânio Quadros (jan. a ago.1961), com a proposta de criação do Instituto Brasileiro de Habitação - IBH, que, ao final, não logrou êxito.

Em 1961, foi criado o Plano de Assistência Habitacional - PAH, cuja inovação era o teto de 20% dos rendimentos para a prestação máxima do financiamento imobiliário. A política habitacional foi contemplada, novamente, em 1963, no governo de João Belchior Marques Goulart (set. 1961 a mar.1964) com o Plano Trienal, de Celso Furtado, então Ministro do Planejamento. Em 1963, o presidente João Goulart propôs uma reforma urbana, como primeiro passo de um programa de crédito para a população de baixa renda.

O golpe político de 1964 impediu, todavia, o desenvolvimento da reforma então proposta. Assume o governo o marechal Humberto de Alencar Castello Branco (abr.1964 a mar.1967), cujo ministro do planejamento, Roberto Campos, sustentava que o proprietário da casa própria não seria afeito a se tornar um aliado da desordem. Foram, então, criados o Sistema Financeiro da Habitação - SFH e o Banco Nacional da Habitação - BNH, cinco meses depois do golpe militar. Como órgão central de um sistema de financiamento, incluía o setor de saneamento. Junto com o BNH foi criada a correção monetária para as prestações do financiamento, com a finalidade de manter a auto-sustentabilidade do sistema.

O BNH foi criado, também, para incentivar a indústria da construção civil, a fim de provocar uma reação na economia. O BNH passou a centralizar a política habitacional do país, agrupando instituições públicas e privadas, sendo que o seu capital provinha de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, criado em 1966. Nessa mesma época foi criado o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo - SBPE para viabilizar uma maior captação de recursos das cadernetas de poupança privadas. Em setembro de 1966, o BNH tornou-se o gestor dos recursos do FGTS e enfrentou o primeiro escândalo de corrupção, com a intervenção na Cooperativa Habitacional da Guanabara. A partir de então, os interesses do BNH estreitaram, cada vez, com os da iniciativa privada, e o déficit habitacional expandiu vertiginosamente. Já no final de década de 1966, os índices de inadimplência mostravam-se elevados e o BNH retomou programas voltados para habitação popular, como as Companhias Habitacionais (Cohab’s), o Plano de Habitação Popular (Planhap) e o Sistema Financeiro de Habitação Popular (Sifhap).

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Com o crescimento de sua atuação, o BNH passou a execução de diversos programas para a iniciativa privada e, entre 1974 a 1980, autorizou os agentes financeiros a operar com juros liberados, o que resultou em financiamentos para as classes média e alta e obras de infra- estrutura e saneamento em loteamentos nobres. Estima-se que menos de 13% dos recursos chegaram às famílias com renda mensal inferior a cinco salários mínimos, classe que, realmente, necessitava da concretização da política habitacional projetada pelo Poder público. A política habitacional não teve o caráter redistributivo planejado, atuando como um mecanismo de aprofundamento de segregação e exclusão social, já que a maior parte dos seus recursos foi destinada ao financiamento de moradias para as classes média e alta.

O desemprego e a forte crise econômica que assolaram o país por volta de 1980 provocaram imensos saques nos depósitos de FGTS e cadernetas de poupança, as duas principais fontes de recursos do SFH. Para tentar ordenar seu caixa, o Governo determinou um reajuste de 128% nas prestações, ocasião em que 53% dos mutuários deixaram de pagar as suas prestações. Nessa época, a Revista Veja, de 29.06.1983, tratou do assunto sob a manchete O sonho interrompido, informou que:

A partir desta sexta-feira, 1º de julho, o fantasma do reajustamento de 128% nas prestações das casas próprias começa a bater à porta dos 3,6 milhões de mutuários do Sistema Financeiro da Habitação. É uma pancada forte, insuportável para boa parte dessa multidão que ocupa dois de cada dez imóveis urbanos do país e, aos poucos, reclama, organiza-se e protesta. [...] A UPC, moeda em que o BNH recebe, subiu 128% nos últimos doze meses enquanto o INPC - Índice Nacional de Preços ao Consumidor -, usado para corrigir a moeda com que são pagos os salários, subiu 118%. Desse paradoxo livraram-se, graças a uma lei esquecida, os funcionários públicos. Um advogado de Brasília descobriu que aos funcionários era dada a garantia de que os reajustes não ultrapassariam as percentagens de seus aumentos. Foi à Justiça e obteve uma liminar. Receoso, o BNH recuou e, por decreto do presidente Figueiredo, os funcionários só pagarão 82% de aumento. A diferença será coberta pelo banco.

Ao final do regime militar, em 1985, o BNH tinha construído 4,3 milhões de moradias, o que era inferior ao déficit habitacional do primeiro governo militar (1964/1967) estimado em 5 milhões de moradias. Entre 1964 e 1985, o BNH financiou 3,2 milhões de unidades para famílias de renda superior a cinco salários mínimos, contra 1,2 milhões de unidades para famílias com rendimento de até cinco salários mínimos.

Em 1986, o BNH foi extinto e seus contratos foram transferidos para a Caixa Econômica Federal-CEF. O fechamento do BNH agravou a situação habitacional da população de baixa

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renda e, de lá para cá, não se apresentaram à população programas habitacionais que possam, de fato, atender à demanda popular, resultando em um processo de desarticulação institucional para reger a política habitacional do país.