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Dever de definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus

No documento João Emmanuel Cordeiro Lima (páginas 104-107)

4. O DIREITO CONSTITUCIONAL AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE

4.2. Os contornos do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

4.2.3. As normas-instrumento

4.2.3.2. Dever de definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus

permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção (art. 225, § 1º, III)

O Brasil é o quinto maior país do mundo em área territorial212, totalizando 8.515.767,049 km2. Essa extensa área possui solos e climas variados, levando à existência de seis diferentes biomas terrestres espalhados pelos diferentes estados da

211 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência.

Glossário. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 159.

212 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/cartografia/default_territ_area.shtm. Acesso em: 15 ago. 2015.

federação, quais sejam, Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa.

A manutenção desses biomas em seu estado original seria medida incompatível com a ocupação humana e com o desenvolvimento econômico e social. Por outro lado, sua completa devastação pode resultar em desequilíbrios ecológicos cujos efeitos sequer é possível antever com precisão. Visando a evitar que isso pudesse ocorrer, a Constituição atribuiu ao Poder Público o dever de instituir espaços especialmente protegidos em todas as unidades da federação com vistas a preservar, ainda que parcialmente, esses biomas.

Para regular esse tema em âmbito nacional, editou-se a Lei Federal nº. 9.985, de 18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Em seu art. 2o, I, essa lei definiu unidade de conservação como “o espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.

Discute-se se o conceito de espaços territoriais especialmente protegidos indicados na Constituição abrangeria qualquer espaço territorial criado com finalidade de proteger determinados componentes ou apenas as unidades de conservação. A discussão tem especial relevância na medida em que tanto serve para aferir o cumprimento de um dever constitucional como da definição do regime jurídico a que fica submetido o espaço, em especial no que diz respeito à sua alteração e à vedação de qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.

Em obra conjunta, os coautores José Morato Leite, Patryck de Araújo Ayala, Germana Parente Neiva Belchior e Heline Sivini Ferreira inclinam-se pela primeira opção, asseverando o seguinte:

As Unidades de Conservação, sejam elas de Proteção Integral ou de Uso Sustentável, encontram-se inseridas no amplo conceito de espaços territoriais especialmente protegidos. Assim sendo, é possível afirmar que

toda Unidade de Conservação constitui espaço territorial protegido, muito embora a recíproca não seja verdadeira.213 (Grifo nosso)

Édis Milaré, por seu turno, defende posição contrária. Para o autor, o conceito de espaço territorial especialmente protegido previsto na Constituição aplica-se, exclusivamente, às unidades de conservação, como se pode ver na passagem abaixo:

Desse breve enfoque da questão, parece-nos possível e didático sustentar que no conceito de espaços territoriais especialmente protegidos, em sentido estrito (strictu sensu), tal qual enunciado na Constituição Federal, se subsumem apenas as Unidades de Conservação típicas, isto é, previstas expressamente na Lei 9.985/2000, e, por igual, aquelas áreas que, embora não expressamente arroladas, apresentam caraterísticas que se amoldam ao conceito enunciado no art. 2o, I, da Lei 9.985/2000, que seriam então

chamadas de Unidade de Conservação atípicas.214

O debate é relevante na medida em que a posição adotada pelos primeiros implica em uma menor liberdade de conformação do legislador para o tratamento de qualquer área com algum tipo de proteção, como é o caso das áreas de preservação permanente. Esse estaria impedido, por exemplo, de estabelecer uma lei geral que admita alteração desses espaços em determinadas situações, como se dá no atual Código Florestal, já que a proteção constitucional tem por objetivo justamente garantir um debate e uma decisão legislativa para cada alteração ou supressão.

Acreditamos que a razão está com Édis Milaré nesse debate. Primeiro, porque ao falar na criação de espaços em cada unidade, o texto constitucional sinaliza no sentido de que objetiva era proteger algo específico e previamente delimitado existente em cada local e não criar um regime geral de proteção que abarcasse qualquer área sujeita a restrições. Fosse essa a ideia, razão não haveria para se falar em espaços em cada unidade da federação, o que denota ideia muito mais próxima à de criação de unidades de conservação, e sim em uma vedação à alteração de qualquer área sujeita a proteção ambiental. Segundo, porque a vedação geral poderia levar ao absurdo de se exigir a aprovação de uma lei específica para cada intervenção realizada, por

213LEITE, José Rubens Morato. (Coord.). Manual de Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2015. p.

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214 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência.

exemplo, em áreas de preservação permanente, prejudicando severamente o direito ao desenvolvimento.

Assim, em termos de atribuição de conteúdo ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, pode-se dizer que a Constituição estipulou o direito dos cidadãos de viver em unidades da federação nos quais haja espaços territoriais especialmente protegidos. Também definiu que a alteração desses espaços, que podem ser criados por meio de atos infralegais, fica sujeita à edição de lei específica e que sua utilização não poderá comprometer a integridade dos atributos que justificam sua proteção.

4.2.3.3 O dever de exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade

No documento João Emmanuel Cordeiro Lima (páginas 104-107)