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Efeitos da declaração de nulidade

No documento João Emmanuel Cordeiro Lima (páginas 145-148)

5. O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO

5.6. Efeitos da declaração de nulidade

Como visto, por meio do controle de constitucionalidade se verifica a compatibilidade de uma lei com a Constituição. Se passar por essa análise, a lei seguirá no sistema normalmente. Aliás, pode-se dizer até que seguirá ainda mais forte, pois diferentemente das demais normas, terá passado por uma verificação de sua constitucionalidade. Entretanto, se verificada sua incompatibilidade, será extirpada do sistema.

Questão que se coloca aqui diz respeito aos efeitos da decretação da inconstitucionalidade. Dois possíveis entendimentos existem sobre a matéria. O primeiro é o de que ela resultaria no reconhecimento da nulidade da lei questionada, razão pela qual a decisão teria caráter eminentemente declaratório. A segundo é que tal reconhecimento na verdade resultaria na anulação da norma, tendo a decisão caráter constitutivo.

A diferença fundamental dessas posições reside no fato de que, se aceita a tese da nulidade e do caráter declaratório da decisão, essa teria efeitos ex tunc, atingindo todas as situações jurídicas constituídas desde a edição da norma inválida. Se a lei é nula, é como se nunca tivesse existido no sistema. Por outro lado, aceitando-se que a lei é anulável e que a decisão teria caráter desconstitutivo, apenas as situações futuras serão atingidas pela decretação da inconstitucionalidade. Ou seja, a decisão teria efeitos ex nunc. Segundo Mauro Cappelletti282, é da tradição do sistema norte americano o primeiro entendimento e do modelo austríaco o segundo.

282CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado.

No Brasil, que, como visto, adota um modelo híbrido de controle, tanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal283 como a maior parte da doutrina nacional adotam o primeiro entendimento como regra, conforme ressalta Luís Roberto Barroso:

A teoria da nulidade da norma inconstitucional foi amplamente acolhida no Direito brasileiro desde o início da República, quando Ruy Barbosa averbou que toda medida legislativa, ou executiva, que desrespeitar precedentes constitucionais, é, de sua essência, nula. Na mesma linha seguiram os autores de textos clássicos sobre o tema – como Francisco Campos, Alfredo Buzaid, Castro Nunes e Lúcio Bittencourt -, em substancial reprodução da doutrina americana na matéria.284

Entretanto, a própria legislação pátria admite exceções a essa regra, tendo o art. 27 da Lei Federal nº. 9.868 de 10 de novembro de 1999, que disciplina o processo e julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, estabelecido o seguinte:

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Como se vê, por meio da referida lei outorgou-se à Corte Suprema a faculdade de restringir os efeitos da declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Além disso, mesmo em situações em que a modulação dos efeitos não é possível, como ocorre no controle pela via de exceção, o Supremo vem admitindo o temperamento da regra geral da nulidade em prol da realização de princípios relevantes como a boa-fé e segurança jurídica285.

283

Nesse sentido o julgamento da ADI 1434, que recebeu a seguinte ementa: - “(...)A declaração de inconstitucionalidade, no entanto, que se reveste de caráter definitivo, sempre retroage ao momento em que surgiu, no sistema de direito positivo, o ato estatal atingido pelo pronunciamento judicial (nulidade ab initio). É que atos inconstitucionais são nulos e desprovidos de qualquer carga de eficácia jurídica (RTJ 146/461). (ADI 1434 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 29/08/1996, DJ 22-11-1996 PP-45684 EMENT VOL-01851-01 PP-00141)

284 BARROSO, Luís Roberto. O Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 6. ed. São

Paulo: Saraiva, 2012. p. 73

285 Nesse sentido foi o julgamento do RE n.º 276546, que recebeu a seguinte ementa: (...)

Essa possibilidade de modulação dos efeitos da decisão que declara a inconstitucionalidade de determinada norma encontra lugar nos julgamentos envolvendo leis ambientais. Exemplo dessa realidade se deu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 1.0000.07.456706-6/000286 pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Nessa, após reconhecer a inconstitucionalidade da lei estadual que autorizava a implantação de reserva legal fora dos limites da microbacia, em desacordo com o Código Florestal então vigente, a Corte reconheceu o efeito ex tunc da decisão, mas resguardou as reservas particulares já́ instituídas e publicadas sob a égide da legislação estadual para fins de compensação de reserva legal.

Na verdade, a tendência de se abrandar o rigor técnico da teoria em face de exigências de ordem prática não é privilégio nacional. Tanto os países que adotaram como regra a retroatividade, como aqueles que abraçaram a irretroatividade dos efeitos das decisões tomadas no exercício do controle acabaram fazendo concessões, como assevera Mauro Cappelletti:

De outra parte, como na Áustria as exigências práticas levaram, em 1929, a uma atenuação do rigor teórico da doutrina da não-retroatividade, assim, por outro lado, nos Estados Unidos da América, como já foi aludido, e igualmente, na Alemanha e na Itália, as exigências práticas induziram a atenuar notavelmente a contraposta doutrina a eficácia ex tunc, ou seja, da retroatividade.287

Feitas essas considerações sobre a estrutura e funcionamento do sistema de controle de constitucionalidade brasileiro e fixadas algumas ideais importantes para avaliação específica de sua incidência sobre as leis ambientais, passaremos agora a abordar a legitimidade desse sistema e a relevância da definição de parâmetros específicos para sua utilização.

declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria em grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso Extraordinário conhecido e, em parte, provido.(RE 276546, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 31/03/2004, DJ 21-05-2004 PP-00035 EMENT VOL-02152-03 PP-00518)

286

ADI nº. 1.0000.07.456706-6/000, Rel. Des. Roney Oliveira, publicado em 07.11.2008.

287CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado.

6. A LEGITIMIDADE DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E OS

No documento João Emmanuel Cordeiro Lima (páginas 145-148)