VISTOS, ETC.
Cuida-se de AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE c/c REPARAÇÃO DE DANOS aforada por CALMINAS
ÓXIDOS DE CÁLCIO, MAGNÉSIO E FERTILIZANTES LTDA. contra EDER PEREIRA DE SOUZA, GILMAR GERALDO DA SILVA, DÁRIO JOSÉ DE OLIVEIRA, EDUARDO SOARES DOS SANTOS, RAIMUNDO XAVIER SILVA e HÉLIO CAROLINO DA COSTA. Diz-se possuidora e proprietária do imóvel rural FAZENDA FRUTUOSO,
em Paracatu/MG, com área de 10,13,78 ha, de cuja posse teria sido esbulhada pelos requeridos em 07.09.2005. Pede, desde a concessão liminar, a ordem de reintegração, assim como a reparação de danos (f. 03-05). Junta do-
cumentos (f. 06-31).
Vieram os autos da Comarca de Paracatu (f. 34).
Visita em 06.10.2005 (f.43-45).
Da concessão liminar da ordem (f. 46 v.) o M.P. interpôs agravo de instrumento (f. 55-81), a que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em 03.11.2005, concedeu efeito suspensivo (f. 85-87) e, ao fim, deu provimento (AI no 1.0024.05.812006-4/001 – f. 164-170). Contudo, a ordem fora cumprida já em 18.10.2005 (f. 116-117).
Citação (f. 104, 106, 108, 112, 114 e 119). Homologação (f. 131v) da desistência da ação (f. 129) quanto ao
requerido não citado, JOÃO EUSTÁQUIO DE SOUZA, ouvido o M.P. (f. 131).
Contestação, pelo Curador Especial nomeado aos requeridos revéis, argüindo, em preliminar, inépcia da ini- cial, a que faltaria causa de pedir (posse anterior); no mérito, alegam descumprimento da função social; exercício
de posse por si, requeridos, dando destinação social à propriedade; e direito subjetivo às condições mínimas de vida digna. No mais, contestam por negativa geral (f. 139-147).
Impugnação (f. 151-152).
As partes não especificaram provas (f. 154).
Memorial com razões finais, só pelos requeridos (f. 156v).O M.P. é pela improcedência do pedido inicial
(f.158-162). É o relatório.
ii – FuNDAmENtAção
* (...) *
3 – o cASo NA ESpEciAliDADE
Estabelecidas as premissas a cuja luz decidir-se-á a lide, passamos aos termos do caso na especialidade.
1 – De início, anoto que a nomeação de Curador Especial aos revéis citados pessoalmente refoge ao devido
processo legal (art. 9o, II do C.P.C.), motivo por que é de se ter por anódinas as peças de f. 139-147 e 156v, não
sem antes louvar a prestimosa participação no feito do douto e combativo Defensor Público.
Contudo, o mero decreto de revelia, na espécie, não induz o efeito de reputarem-se verdadeiros os fatos ale- gados, em face do interesse público ínsito à função social da posse, matéria de mérito por excelência nas lides
possessórias, marcadamente as coletivas.
2 – O boletim de ocorrência lavrado em 07.09.2005 relata o esbulho nos seguintes termos: “conversamos com
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133reclamaram a falta de cuidados do terreno e, por isso, o invadia (sic); o ato estava em fase inicial, vários lotes estavam sendo marcados (cercados)” (f. 10-11).
3 – Entretanto, no que diz respeito à qualidade da posse exercida no período imediatamente anterior àquele ato,
a prova dos autos é nenhuma. Conforme bem aponta o Ministério Público (f. 72), instruem o feito tão-somente os títulos de propriedade (f. 16-23), certificados de cadastro do imóvel no INCRA, relativos aos períodos de 1998/2002 (f. 24-25) e guias de recolhimento de Imposto Territorial Rural referentes aos exercícios de 1995 a 2005 (f. 26-31),
nenhum deles apto a demonstrar o exercício de qualquer posse.
O Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, dando provimento ao agravo interposto da decisão concessiva liminar, anotou que “não há como aferir no caso se cumpre-se ou não a função social da propriedade e da posse. O autor da ação de reintegração de posse não traz nenhuma comprovação de que a função social vem sendo observada. Além disso, os documentos acostados nos autos que comprovam a propriedade do bem não o legitimam a interpor a referida ação, uma vez que eles não certificam a posse direta ou mesmo indireta do bem em litígio. Sendo assim, não há como admitir cumpridos os requisitos autorizadores da medida liminar, uma vez que o autor da ação não observou o disposto no art. 927, I do CPC, o que só poderia ser feito depois de realizada audiência de justificação.” (AI no 1.0024.05.812006-4/001, Rel. Desembargador DÁRCIO LOPARDI MENDES – f. 169).
Atente-se para o fato de que, em segunda instância, entendeu-se insuficientemente instruída a petição inicial até mesmo para fundamentar a decisão concessiva liminar, ainda que proferida em sede de cognição sumária e não- exauriente. Pois bem. A par dos documentos em que se arrima a inicial, nenhuma outra prova foi produzida no
curso do processo, deixando a requerente passar em branco a oportunidade quanto a demonstrar, por qualquer
meio, o exercício de posse em cumprimento da função social (f. 154).
De mesma sorte, o prejuízo material de que a requerente se pretendia ver indene restou tão-somente alegado, sem vir aos autos sequer indícios de sua ocorrência.
Por certo, a participação no processo tem viés de faculdade e não de dever, arcando a parte, entretanto, com os ônus de sua omissão. Não se desincumbindo a requerente do encargo processual de comprovar os fatos constitutivos de seu direito, impõe-se a improcedência do pedido.
Na espécie, porém, a omissão da requerente deixa transparecer, antes, reprovável senso de oportunidade, es- tampado no satisfazer-se com a tão-só obtenção de provimento de caráter essencialmente provisório, levado a efeito anteriormente à comunicação de sua suspensão, pelo T.J.M.G.
Olvida-se a requerente de que o dever de provar o cumprimento da função social vai muito além dos estreitos limites do interesse individual na obtenção do bem da vida objeto do litígio. Cuida-se, pelo contrário, de respon-
sabilidade social maior, à vista do interesse público ínsito ao uso da propriedade orientado ao benefício da cole- tividade em geral e das gerações presentes e futuras.
Ao abandonar o feito na fase de instrução, depois de pôr em marcha o dispendioso aparato estatal, a requerente revela nos autos uma postura de ausência de seriedade e má-fé, pretendendo, por via canhota, dar foros de pereni- dade a decisão cunhada pela provisoriedade.
Faltando com o dever de proceder com lealdade e boa-fé processuais, a conduta da requerente subsume-se à hi- pótese de prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição, tipificada no art. 14, II do C.P.C. e penalizada com
multa em percentual máximo, dada a gravidade do agir contrário à ética social, em manipulação da assoberbada
máquina estatal e com dispêndio perdulário de energia processual.
Devido ao caráter de trato sucessivo da obrigação de cumprimento da função social, registre-se, alfim, que a decisão de improcedência do pedido não salvaguarda nem autoriza qualquer invasão, à vista de possível modificação do substrato fático jacente, decorridos já dois anos da propositura desta ação.
iii - DiSpoSitivo
POSTO ISSO, e considerando o mais quanto dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO AVIADO NA INICIAL POR CALMINAS ÓXIDO DE CÁLCIO, MAGNÉSIO E FERTILIZANTES LTDA. con-
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SOARES DOS SANTOS, RAIMUNDO XAVIER SILVA e HÉLIO CAROLINO DA COSTA, REVOGANDO A LIMINAR CONCEDIDA.
Condeno a requerente nas custas processuais e em multa de 20% (vinte por cento) do valor atualizado da causa, pela prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição, a ser paga em 05 (cinco) dias do trânsito
em julgado desta decisão (art. 14, parágrafo único do C.P.C.). Sem condenação em honorários, ante a revelia dos requeridos.
Transitada em julgado, arquivar, com baixa. P.R.I.C.
Belo Horizonte, 3 de outubro de 2007. (Publicação Minas Gerais, 6.10.2007) Osvaldo Oliveira Araújo Firmo