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O (revogado) art 17, §1º, da Lei de Improbidade Administrativa e seu histórico descompasso com a progressiva abertura do Direito Administrativo à consensualização.

No documento Convenções processuais e poder público (páginas 84-91)

1 A CONSENSUALIDADE ADMINISTRATIVA NO DIREITO BRASILEIRO

1.4 MANIFESTAÇÕES DA CONSENSUALIDADE ADMINISTRATIVA NO DIREITO BRASILEIRO

1.4.9 O (revogado) art 17, §1º, da Lei de Improbidade Administrativa e seu histórico descompasso com a progressiva abertura do Direito Administrativo à consensualização.

No capítulo destinado à Administração Pública, a Constituição Federal de 1988 inseriu o §4º no seu art. 37, estabelecendo sanções variadas aos agentes que praticassem atos de improbidade administrativa (suspensão de direitos políticos, perda de função pública, indisponibilidade de bens, dever de ressarcimento ao erário, sem prejuízo de ter contra si ajuizada a ação penal cabível). O artigo em referência, no entanto, limitou-se a prever, no seu

caput, o princípio da moralidade, e a preconizar, no aludido §4º, a necessidade de combate

aos atos que o malfiram, sem, contudo, especificá-los.

A identificação dos atos de improbidade administrativa e as suas disciplinas material e processual foram integradas ao ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 8.429/1992, apelidada de Lei de Improbidade Administrativa. Referido diploma legal contemplava, em seu art. 17, §1º, vedação expressa à celebração de transação, acordo ou conciliação em ações de improbidade170.

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DIAS, Maria Tereza Fonseca. A mediação na Administração Pública e os novos caminhos para a solução de

problemas e controvérsias no setor público. Disponível em:

<http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/maria-tereza-fonseca-dias/a-mediacao-na-administracao-publica- e-os-novos-caminhos-para-a-solucao-de-problemas-e-controversias-no-setor-publico>. Acesso em: 28/04/2016. A autora acredita que a mediação encontrará caminho promissor na seara dos processos administrativos disciplinares.

169 O papel da mediação na valorização da participação popular na esfera pública é examinada, com base na

teoria habermasiana do agir comunicativo, por: SPENGLER, Fabiana Marion; GHISLENI, Ana Carolina. A mediação como meio de construção de uma administração pública democrática. Revista Alcance – Eletrônica,

v. 16, n. 01, p. 91-102, jan.-abr./2011. Disponível em:

<http://siaiap32.univali.br/seer/index.php/nej/article/download/3272/2054>. Acesso em: 28/04/2016.

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Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. §1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput (...)”

A previsão legislativa encartada no art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 lastreava-se, à época, em duas razões basilares. A primeira delas consistia na simetria que o instituto da improbidade administrativa sempre buscou com relação ao processo penal. Quando do advento da Lei nº 8.429/1992, o sistema processual penal repudiava soluções negociadas, pautando-se, rigidamente, no princípio da indisponibilidade da ação penal. Como reflexo, a ação de improbidade tampouco admitiu qualquer solução de natureza negocial. A segunda razão residia na concepção de que o interesse público seria, sempre, absolutamente indisponível171.

A Medida Provisória nº 703, de 18 de dezembro de 2015, que promoveu alterações na Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) para dispor sobre acordos de leniência, havia expressamente revogado, em seu art. 2º, I, o dispositivo legal em tela (art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992). Além disso, a MP nº 703/2015 havia alterado a redação do art. 30 da Lei Anticorrupção, prevendo a possibilidade de o acordo de leniência celebrado com base em tal Lei incluir penalidades decorrentes de ato de improbidade administrativa, influindo, portanto, nos respectivos processos de responsabilização pela prática de tais atos (art. 30, I, da Lei nº 12.846/2013).

Era questionável a constitucionalidade, no particular, da Medida Provisória nº 703/2015, uma vez que revogou regra de Direito Processual, deixando de observar, portanto, o limite material consignado no art. 62, §1º, I, b, da Constituição Federal de 1988172. A temática tornou-se, no entanto, superada com a expiração do prazo de vigência da referida Medida Provisória, fato ocorrido em 29/05/2016 e declarado no Ato Declaratório do Presidente da Mesa do Congresso Nacional nº 27, de 2016. Não se consumou, assim, a revogação expressa do art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992.

A perda de vigência da Medida Provisória nº 703/2015 não é, todavia, fundamento suficiente a que se afaste, de lege lata, a possibilidade de negociação em ação de improbidade administrativa. Nenhum dos fundamentos que outrora conferiram lastro ao surgimento do texto normativo inserto no art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 se mantém nos dias atuais. O texto normativo que consagrou vedação de negociação em ação de improbidade administrativa não se coaduna com o sistema jurídico pátrio atual, tendo sofrido inequívoca revogação tácita, como se demonstrará.

171 DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de direito processual civil. 10. ed. Salvador:

Juspodivm, 2016, v. 4, p. 315-316.

172 Nesse sentido: DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de direito processual civil. 10.

Entre o momento do surgimento do art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 (em junho/1992) e os dias atuais, ou seja, no interstício de cerca de vinte e quatro anos, verificou-se uma verdadeira fossilização do enunciado normativo e, consequentemente, a obsolescência da regra dele decorrente. O seu descompasso com o ordenamento jurídico há muito se tornara evidente.

É certo que uma das razões que deram ensejo ao surgimento do texto normativo em exame foi a sincronia entre a ação de improbidade administrativa e o Processo Penal (que àquela época não se coadunava com a adoção de soluções negociadas em matéria de persecução criminal).

Sucede que o Direito Penal (por natureza sancionador) passou a admitir, ao surgimento da Lei nº 9.099/1995 (Juizados Especiais Criminais) a possibilidade de celebração de transação penal, para os crimes de menor potencial ofensivo, e de suspensão condicional do processo (que abrange outros crimes não enquadrados naquela categoria). No primeiro caso (art. 76), a negociação cinge-se à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou à redução da multa penal. É aplicável a contravenções penais e a delitos cuja pena máxima abstratamente cominada não extrapole dois anos, cumulada ou não com multa (art. 61).

Já a suspensão condicional do processo dirige-se aos crimes cuja pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano (art. 89). Neste caso, suspende-se o curso do processo para que o demandado, desde que primário e não sujeito a outra persecução penal, repare o dano provocado (se possível), deixe de frequentar determinados locais, dentre outras condições apostas no §1º do art. 89 da Lei nº 9.099/1995. Ao final, cumpridos os requisitos, extingue-se a punibilidade.

O sistema jurídico passou, assim, a albergar situação no mínimo incoerente. O agente público que, por exemplo, aplicasse verba pública de modo irregular estaria sujeito a ter a sua conduta enquadrada, a um só tempo, como ato de improbidade administrativa (art. 10, XI, da Lei nº 8.429/1992) e como crime contra a Administração Pública (emprego irregular de verbas ou rendas públicas, sujeito a pena de detenção de um a três meses ou multa – art. 315 do CP). Diante desse quadro, o agente poderia, na esfera penal, celebrar transação penal ou obter a suspensão condicional do processo com superveniente extinção da punibilidade. Mas não poderia, segundo disciplinava o art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992, celebrar acordo

concernente à conduta caracterizada como improbidade administrativa, mesmo que se tratasse de ato de pequena repercussão financeira173.

Mais tarde, com o advento da Lei nº 12.850/2013, houve ainda maior ampliação do âmbito de consensualidade no processo penal, com a atribuição, ao instituto da colaboração premiada, de autêntico caráter negocial misto (penal e processual penal), do qual poderá advir, em favor do acusado, o perdão judicial, a redução da pena privativa de liberdade ou a sua conversão em pena restritiva de direito.

Poder-se-ia argumentar que o fenômeno de consensualização verificado na seara penal não haveria de influir no âmbito administrativo, tendo em vista a (relativa) independência entre as esferas. Muito embora esse fundamento possa ser rebatido174, sequer se faz necessário este esforço.

O Direito Administrativo sancionador também sofreu o influxo da consensualização, descaracterizando-se, assim, o segundo fundamento sobre o qual se estruturava a regra extraída do art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992. Em matéria de defesa da concorrência, há previsão de celebração de acordo de leniência desde o ano 2000 (Lei nº 8.884/1990, alterada, no particular pela MP nº 2.055/2000, cuja quarta reedição foi convertida na Lei nº 10.149/2000). No combate à corrupção, o acordo de leniência é instrumento consensual regrado desde 2013 (Lei nº 12.846/2013), com previsão de aplicação, ainda, ao âmbito licitatório.

A justificativa que historicamente lastreou o art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 perdeu paulatinamente substância com a abertura do Direito Administrativo sancionador à consensualidade. Cresceu o descompasso da regra com a realidade e sua manutenção no sistema tornava-o incoerente e desigual.

Basta que se tome como exemplo a prática, por determinada pessoa jurídica, da conduta ilícita descrita no art. 5º, I, da Lei nº 12.846/2013 (Lei da Empresa Limpa ou Lei Anticorrupção). O referido dispositivo reputa ato lesivo à Administração Pública, nacional ou

173 Essa ponderação quanto ao sistema menos rígido no âmbito criminal e mais rígido na seara administrativa

(embora sem referência a exemplos) foi objeto de reflexão por MIRANDA, Gustavo Senna. Princípio do juiz natural e sua aplicação na Lei de Improbidade Administrativa. São Paulo: RT, 2007, p. 248 e por CABRAL, Antonio do Passo. A Resolução nº 118 do Conselho Nacional do Ministério Público e as convenções processuais. In: CABRAL, Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (coord.). Negócios processuais. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 547.

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Poder-se-ia afirmar que a indisponibilidade do direito em jogo também se revela presente (e com ainda maior força) no Direito Penal, jungido ao princípio da obrigatoriedade da ação penal, este que é relativizado pelo uso de instrumentos como a colaboração premiada.

estrangeira, aquele consistente em dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público ou a alguém a ele relacionado.

A existência do ilícito administrativo em debate pressupõe, necessariamente, a presença de um agente público que receba (levando em consideração essa específica conduta e não as de oferecer ou prometer, também relacionadas no mesmo inciso) a vantagem indevida. E, ao fazê-lo, incorrerá na prática de ato qualificado na Lei nº 8.429/1992 como de improbidade administrativa (art. 9º, I a III, da referida Lei).

Diante desse quadro e à vista de duas condutas ilícitas necessariamente conjugadas (sem a pessoa jurídica que conceda a vantagem não há o recebimento desta pelo agente público e vice-versa), ambas configuradoras de ilícitos administrativos (apenas destinados a sujeitos ativos diferentes), o ordenamento jurídico a elas conferia, abstratamente, soluções absolutamente distintas.

O sistema brasileiro consentia que a pessoa jurídica infratora pudesse celebrar acordo de leniência e o agente público infrator não dispunha de qualquer mecanismo para buscar uma solução consensual (que será ou não adotada, logicamente, a depender do caso concreto).

O art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 encontra-se tacitamente revogado. E dois são os fundamentos possíveis para sustentar esta conclusão. O primeiro concerne à análise sistemática do dispositivo à luz do ordenamento jurídico pátrio. Com o surgimento da Lei nº 12.846/2013, implementou-se no sistema jurídico brasileiro um verdadeiro microssistema de combate a atos lesivos à Administração Pública175. A previsão de celebração de acordos de leniência naquele diploma, que guarda um espaço de interseção com o âmbito de aplicabilidade da Lei de Improbidade, sustenta o posicionamento doutrinário quanto à possibilidade de uso atípico desse instituto em ações de improbidade176.

Mas ainda que não se admita a superação do texto normativo em razão dessa estruturação sistemática em sentido divergente ao da norma que dele antes se extraía, o fato é

175 Defendendo a existência de um microssistema de combate à corrupção formado não apenas pelas Leis nº

8.429/1992 e 12.850/2013, mas, também, pelas Leis nº 12.529/2011 e 12.846/2013 e, com base nessa premissa, sustentando que, por razões de lógica e coerência, as disposições concernentes à colaboração premiada devem ser estendidas e aplicadas às ações de improbidade administrativa: DINO, Nicolao. A colaboração premiada na improbidade administrativa: possibilidade e repercussão probatória. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (org.). A prova no enfrentamento à macrocriminalidade. Salvador: Juspodivm, 2015, p.457-458.

176 CABRAL, Antonio do Passo. A Resolução nº 118 do Conselho Nacional do Ministério Público e as

convenções processuais. In: CABRAL, Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (coord.). Negócios processuais. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 547; DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de direito processual civil. 10. ed. Salvador: Juspodivm, 2016, v. 4, p. 316.

que também a Lei nº 13.140/2015 (Lei de Mediação) refere-se, expressamente, à possibilidade de acordo em procedimento de mediação quando a matéria objeto do litígio estiver sendo discutida em ação de improbidade administrativa, desde que haja expressa anuência do juiz da causa ou do ministro relator (art. 36, §4º).

O dispositivo legal em comento, de caráter genérico, disciplina a temática relativa à convencionalidade na ação de improbidade administrativa de forma dissonante e incompatível com aquela estabelecida no art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992. Assim fazendo, promoveu, indubitavelmente, a revogação tácita desse texto normativo, nos termos do art. 2º, §1º, da LINDB.

O cenário legislativo atual não contempla, portanto, restrição geral à celebração de acordo que tenha por objeto ato de improbidade administrativa. Ao revés, há previsão que expressamente consigna essa possibilidade. Tal circunstância é significativa, uma vez que a Lei nº 13.140/2015 afastou, tacitamente, regra que tradicionalmente sustentou o fundamento doutrinário de que o Estado não poderia celebrar acordos substitutivos em matéria sancionatória, dada a indisponibilidade do direito em jogo, pertencente à coletividade177.

Acerca de tal dispositivo ora revogado, parte da doutrina defendia uma imediata releitura da vedação legal, relativizando-a para o fim de ajustá-la a parâmetros consentâneos à razoabilidade, o que pressuporia, por exemplo, a admissão da conciliação nos casos de dano decorrente de ato culposo178. Outra parcela doutrinária entendia errônea a rigidez normativa e

177 José Antônio Lisbôa Neiva centra-se em tal argumento para apontar a correção do art. 17, §1º, da Lei nº

8.429/1992, texto normativo que, para ele, seria até mesmo dispensável. O único negócio jurídico admissível, segundo o autor, seria o negócio unilateral que implicasse no reconhecimento da procedência do pedido pelo demandado (NEIVA, José Antônio Lisbôa. Improbidade administrativa: legislação comentada artigo por artigo, doutrina, legislação e jurisprudência. Niterói, RJ: Impetus, 2009, p. 173-174).

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Nesse sentido, entendendo possível a celebração de acordo em ação de improbidade (antes da revogação tácita do art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992) quando se busque apenas a reparação do dano (ou a restituição de valor) ou quando as demais penas houverem sido atingidas pela prescrição: GAJARDONI, Fernando da Fonseca et. al. Comentários à Lei de Improbidade Administrativa. São Paulo: RT, 2010, p. 315. Bruno Takahashi, por sua vez, defendeu o cabimento de solução consensual em sede de improbidade administrativa, com a celebração de termos de ajustamento de conduta naquela demanda (valendo-se, para tanto, do regramento previsto no art. 5º, §6º, da Lei nº 7.347/1985), nos quais não haja disposição de bens ou de valores (descontos, renúncia ao crédito), limitando-se a matéria concertada a ajustes secundários atinentes à reparação dos danos ou ao ressarcimento ao erário (condições, prazo de pagamento, modo de reparação) e à tutela preventiva do patrimônio público (TAKAHASHI, Bruno. A solução consensual de controvérsias e o art. 17, §1º, da Lei de Improbidade Administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 102, v. 927, jan./2013, p. 32-35). Marino Pazzaglini Filho reputava possível a celebração da transação quando a demanda judicial se limitasse a vindicar a restituição do acréscimo patrimonial indevidamente recebido pelo praticante da conduta ímproba ou por terceiro ou, ainda, a reparação da lesão patrimonial causada ao erário (PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada: aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal. Legislação e jurisprudência atualizadas. São Paulo: Atlas, 2002, p. 176). Em sentido semelhante, Carlos Frederico Brito dos Santos defendia que, por razões lógicas, a legislação não vedava a realização de acordo para mero parcelamento do valor integral do débito, devidamente atualizado. Apontava,

necessária a sua superação, mas a condicionava a alterações legislativas futuras (soluções de

lege ferenda)179. Havia quem, por fim, reputasse acertado o comando normativo, sem buscar excepcioná-lo180.

Na jurisprudência, o art. 17, §1º, da Lei nº 8.429/1992 foi invocado em recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça (anteriores à revogação tácita do dispositivo), reafirmando-se o descabimento de autocomposição em sede de ação de improbidade181.

Ainda não houve maturação doutrinária e jurisprudencial quanto à revogação tácita ocorrida. Afina-se ela, inegavelmente, ao espírito do Código de Processo Civil de 2015, no tocante ao estímulo à adoção de soluções consensuais de conflitos182, bem como à tendência

ainda, a ausência de razoabilidade na proibição legal de realização de acordo quando o ato de improbidade fosse praticado culposamente, embora reconhecesse a vedação legal, no particular (SANTOS, Carlos Frederico Brito dos. Improbidade administrativa: reflexões sobre a Lei nº 8.429/92. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 145-146). Hélio do Valle Pereira posicionava-se no sentido de reputar possível a celebração de termo de ajustamento de conduta para questões relativas à Lei de Improbidade, com base no art. 5º, §6º, da Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985), ao menos para disposição quanto a questões atinentes ao prazo e ao modo de pagamento do débito (PEREIRA, Hélio do Valle. Manual da fazenda pública em juízo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 521).

179 MIRANDA, Gustavo Senna. Princípio do juiz natural e sua aplicação na Lei de Improbidade Administrativa.

São Paulo: RT, 2007, p. 248. Gustavo Miranda, na obra em referência, propugnava por mudança legislativa que possibilitasse a composição quando o ato ímprobo houvesse sido praticado sem dolo ou se revelasse de pequena monta e desde que o agente público não fosse reincidente. Marcelo Figueiredo, antes mesmo do advento das leis que disciplinaram os acordos de leniência no Direito Administrativo brasileiro, já defendia, de lege ferenda, a possibilidade de utilização desses acordos em ações de improbidade administrativa, com lastro em experiências já vivenciadas nos direitos norte-americano e italiano, reduzindo-se penas imputadas a agentes públicos que colaborassem com a instrução processual ou que manifestassem intenção de ressarcir integralmente o dano causado ao erário, por exemplo. De lege lata, o autor admitia acordo para regular a forma em que se daria o ressarcimento do dano causado ao erário (FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa: comentários à Lei 8.492/92 e legislação complementar. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 92-93). Defendendo, de lege ferenda, a utilização da colaboração premiada em ações de improbidade: MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 362-363.

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NEIVA, José Antônio Lisbôa. Improbidade administrativa: legislação comentada artigo por artigo, doutrina, legislação e jurisprudência. Niterói, RJ: Impetus, 2009, p. 173-174; FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade administrativa: doutrina, legislação e jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 456-457; MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da Lei nº 8.429/92. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004, p. 501-502 (posteriormente, Mauro Mattos passou a admitir a desistência da ação pelo Ministério Público quando se tratar conduta de menor potencial ofensivo, face ao princípio da insignificância: MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: comentários à Lei nº 8.429/92. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 537-540); SPITZCOVSKY, Celso. Improbidade administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 256-257. Afirmando ser a impossibilidade de transação um dos pontos distintivos dos ritos da ação de improbidade administrativa e da ação civil pública (e, portanto, reconhecendo a inviabilidade de acordo naquela demanda, sem apresentar qualquer juízo crítico ao dispositivo, do que se conclui pela sua aceitação sem ressalvas): PAVAN, Dorival Renato; CAPELARI, Bruna. O art. 17 da Lei nº 8.429/92 e os principais aspectos processuais da ação de improbidade administrativa. In: LUCON, Paulo Henrique dos Santos; COSTA, Eduardo José da Fonseca; COSTA, Guilherme Recena (coord.). Improbidade administrativa: aspectos processuais da Lei nº 8.429/92. São Paulo: Atlas, 2015, p. 76.

181

Este posicionamento foi externado no RESP 1198424/PR (Relator Ministro Mauro Campbell Marques, publicado no DJE de 18/04/2012) e no RESP 1217554/SP (Relatora Ministra Eliana Calmon, publicado no DJE de 22/08/2013), ambos da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

182 Apontando essa conformidade e fazendo referência, especificamente, aos arts. 3º, §3º (que prevê, como norma

fundamental do processo civil brasileiro, o estímulo às soluções consensuais de conflitos) e 174 (criação de câmaras de mediação e conciliação pelos entes estatais) do CPC/2015: ROMERO, William; POMBO, Rodrigo Goulart de Freitas. Aplicação subsidiária do NCPC ao mandado de segurança e à ação de improbidade

de expansão da consensualidade administrativa que vem transformando o Direito brasileiro. Mudança tardia, mas, ainda assim, de extrema relevância para conferir sentido e coesão ao trato da prerrogativa sancionatória da Administração Pública, que não deve continuar a ser vista de modo desconectado da realidade social, política e jurídica brasileira.

1.5 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA COMO DESTINATÁRIA DA REGRA

No documento Convenções processuais e poder público (páginas 84-91)

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