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Julgamento da Natureza Pecaminosa

Coisas Realizadas por Cristo em seu Sofrimento e Morte

V. A Propiciação em Relação a Deus

VI. 0 Julgamento da Natureza Pecaminosa

Pelo sofrimento e morte, Cristo operou com igual precisão e eficácia a solução do problema dos pecados pessoais e da natureza pecaminosa. Ele "morreu pelos nossos pecados" (1 Co 15.3), e "ele morreu para o pecado" (Rm 6.10). Nas páginas anteriores, que tratam da doutrina da substituição, a morte de Cristo pelo pecado pessoal, ou "nossos pecados", já foi estudada. Neste ponto, somos confrontados com a verdade mais profunda e complexa, a saber, que Cristo morreu para o

pecado. A luz é lançada sobre este tema, quando se observa que em Romanos 6-8,

e em 1 João 1, há uma distinção indicada entre o pecado, que é uma falha pessoal ou transgressão, e o pecado, que é uma natureza. Embora o mesmo termo pecado seja usado, o contexto e o caráter da verdade revelada determinam onde e quando uma ou outra verdade está em foco.

Como uma ilustração dessa distinção importante, pode ser visto que 1 João 1.8: "Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós", diz respeito à natureza pecaminosa, sobre a qual excelentes pessoas podem facilmente ser auto-enganadas; não obstante, a verdade não é aquela que assevera que elas não possuem natureza pecaminosa. Em oposição a isto, e como uma tese totalmente diferente, 1 João 1.10 afirma: "Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós". Nesta esfera do pecado pessoal, não pode haver um auto-engano. O Espírito entristecido (quando não a consciência) no crente o deixa afetado com a realidade de seu pecado. O crente sabe também que ele falhou em obedecer às instruções que lhe foram dadas na Palavra de Deus e que o Senhor claramente declarou que ninguém está livre de pecar à Sua vista. Declarar que alguém nunca pecou é fazer de Deus u m mentiroso e resulta em não ser beneficiado por sua Palavra.

Portanto, o método divino de tratar com a natureza pecaminosa do crente é primeiro pô-la sob julgamento. Isto foi feito por Cristo quando Ele "morreu de uma vez por todas para o pecado" (Rm 6.10); mas não pode enfatizar que este julgamento consiste da natureza do pecado, que é destruída, nem que o seu poder essencial seja diminuído. Assim como Satanás foi julgado por Cristo na cruz (Jo 16.11; Cl 2.14, 15) e está, todavia, ativo - talvez, como o deus deste século, esteja mais ativo do que antes - de igual modo, a natureza pecaminosa é julgada, embora o seu poder não o seja, por causa desse julgamento, ela diminuiu. A segunda provisão no tratamento divino com a natureza pecaminosa é que ela deve ser controlada no crente pelo poder superior da habitação do Espírito Santo. E uma forma de racionalismo afirmar que a natureza pecaminosa é descartada ou erradicada de qualquer crente, enquanto ele está neste mundo.

Este erro, tão dominante em muitos setores, será analisado devidamente sob o tema maior de pneumatologia. É suficiente dizer aqui que, como os inimigos dos cristãos são três, a saber, o mundo, a carne e o diabo (a natureza pecaminosa, ou o "velho homem", é apenas uma porção de um deles) e nenhum deles jamais é removido ou erradicado, é muito contrário à Escritura e irrazoável afirmar que a natureza pecaminosa é deposta. Semelhantemente, pode haver uma semelhança

O JULGAMENTO DA NATUREZA PECAMINOSA

de justificação, pois uma teoria de erradicação só é possível se qualquer pessoa já demonstrou tal coisa na experiência. Em oposição a todas as suposições de tal racionalismo, está a verdade de que a Palavra de Deus ensina tão claramente que o Espírito de Deus é dado ao cristão como o recurso pelo qual ele pode conquistar vitória sobre cada inimigo, inclusive a natureza pecaminosa, que a afirmação da Escritura, na medida em que ela diz respeito à natureza pecaminosa, fosse vontade de Deus a sua erradicação, essa afirmação seria sem propósito.

O julgamento perfeito que Gnsto fez da natureza pecaminosa em sua morte teve em vista a provisão de uma base justa sobre a qual essa natureza pode ser totalmente controlada pelo Espírito de Deus. O problema é aquele que é ligado a Deus e a sua santidade. Por ser totalmente má, a natureza pecaminosa pode somente ser julgada diretamente por Deus, ou num Substituto de sua escolha. O Espírito de Deus, por ser santo, não poderia tratar com essa natureza má em qualquer vida a não ser trazê- la para um julgamento meritório, se não tivesse sido antes julgada. Visto que ela é perfeitamente julgada por Cristo, todo o poder do Espírito Santo é livre de restnção, para realizar a tarefa diária e constante da vitória sobre a natureza pecaminosa. Tratar somente do fruto da árvore - os pecados pessoais - e não com a raiz - a natureza pecaminosa - seria um procedimento inútil.

Deus claramente declarou o seu propósito e método de tratar com a raiz - a natureza pecaminosa — e por dar atenção a isto o cristão pode mostrar inteligência nos passos que dá em direção a uma santificação experiencial da vida diária. Gomo os não-regenerados podem continuar não-salvos por causa de seu erro em não crer na verdade de que Cristo morreu pelos pecados deles, de igual modo, os regenerados podem permanecer ainda presos ao mal em suas vidas por causa da falha deles em crer na verdade de que Cristo morreu pela natureza pecaminosa deles.

Romanos 6.2-8.13. A passagem central que trata do julgamento da natureza

pecaminosa, ou "velho homem", pela morte de Cristo e a explicação da nova base pela qual, em vista do julgamento, a vida do crente pode ser vivida, é Romanos 6.1-8.13. Assim como Romanos 1-5 revela o caminho da salvação para a vida eterna e uma posição perfeita, mesmo a justificação eterna, para aqueles entre os não-salvos que crêem — e que por causa da obra consumada de Cristo como uma redenção (3.24), como uma reconciliação (5.10), e como uma propiciação (3.25), assim também Romanos 6.1—8.13 revela o modo de vida que honra a Deus para aquele que é salvo, e essa maneira de vida é através daquilo que pode ser chamado de a obra consumada de Cristo para o cristão. Pois, porumjulgamento infinitamente perfeito e completo da natureza pecaminosa, o andar pelo novo princípio de vida, pelo poder capacitador do Espírito Santo (8.4), é tornado possível para o cristão, que pela fé conta-se a si mesmo como morto para a natureza pecaminosa e vivo para Deus, e se fia no poder suficiente do Espírito Santo.

É de importância insuperável que o "velho homem" seja [foi] crucificado com ele [Cristo] (6.6). Com base nisso, o corpo do pecado, ou o poder do pecado de manifestar-se, pode ser anulado — não destruído, como está traduzido em algumas versões. Embora este grande conjunto de verdades seja brevemente considerado no presente contexto em relação à morte de Cristo, ele

será considerado mais detidamente no tema geral de pneumatologia, quando relacionado à obra capacitadora do Espírito Santo.

Tanto a morte de Cristo pelos pecados quanto a sua morte para o pecado são substitutivas no seu grau mais alto, e em nenhum texto da Escritura esta substituição é tão enfatizada como em Romanos 6.1-10. Quatro passos em que o crente participa são itemizados - crucificação, morte, sepultamento e ressurreição. É significativo que um contexto mais forçoso e explícito que trata da morte de Cristo pelos não-salvos apresente os mesmos particulares, mas sem o aspecto da crucificação. O texto a seguir declara: "Ora, eu vos lembro, irmãos, o evangelho que já vos anunciei; o qual também recebestes, e no qual perseverais, pelo qual também sois salvos, se é que o conservais tal como vo-lo anunciei; se não é que crestes em vão. Porque primeiramente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras; que foi sepultado; que foi ressuscitado ao terceiro dia, segundo as Escrituras" (1 Co 15.1-4).

Em Romanos 6.1-4, que apresenta a base da santificação experimental do crente, ou o seu andar diário, no poder capacitador do Espírito Santo, está escrito: "Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que. abunde a graça? De modo nenhum. Nós, que já morremos para o pecado, como viveremos ainda nele? Ou, porventura, ignorais que todos quantos fomos batizados em Cnsto Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele pelo batismo na morte, para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim andemos nós também em novidade de vida". E a isto é acrescentado no versículo 6: "sabendo isto, que o nosso homem velho foi crucificado com ele, para que o corpo do pecado fosse desfeito, a fim de não servirmos mais ao pecado". O contexto todo, Romanos 6.1-10, deve ser mantido em seu pensamento de substituição que uma parceria - co- crucifixão, co-morte, co-sepultamento, e co-ressurreição - está indicada.

Visto que não pode haver uma necessidade de qualquer desses aspectos ser ordenado em nome de Cristo, tudo é operado em favor daqueles cuja natureza pecaminosa Ele assim julga. Este texto tão vital, sobre o qual repousa toda a doutrina da natureza adâmica, é apenas uma ampliação de uma questão com a qual o contexto se inicia, a saber: "Nós que já morremos para o pecado, como viveremos ainda nele?" Isto significa a maneira de sua morte para o pecado que envolve uma participação quádrupla — co-crucificação, co-morte, co-sepultamento, e co- ressurreição. Na verdade, isto foi um julgamento divinamente operado do "velho homem" (cf. v. 6), e forma a base de uma emancipação perfeita pelo Espírito Santo do poder reinante do "velho homem" - a natureza pecaminosa.

Considerando que a afirmação clara de que esta é uma morte para o crente no sentido dele participar daquilo que Cristo operou em sua morte para o pecado, deve ser lamentado que alguns têm interpretado essa passagem como a ordenação da auto crucifixão. Semelhantemente, deveria ser lembrado que se essa passagem é aceita como o controle do assunto do batismo ritual (ou de água), como alguns a têm considerado, a verdade vital a respeito da morte de Cristo como um julgamento da natureza pecaminosa, é descartada, visto que a passagem não poderia apresentar ambas as ideias; e se a passagem determina

O JULGAMENTO DA NATLKLZA PECAMINOSA

o assunto do batismo ritual, a verdade central que proporciona a base de uma possível liberdade do "velho homem", é sacrificada. O contendor mais ardoroso da alegação de que o batismo ritual é uma representação da morte de Cristo, dificilmente desejaria relacionar essa ordenança à santificação ou à vida vitoriosa pelo Espírito Santo, mas exigiria que a ordenança fosse relacionada com a salvação do pecador, ou com a morte de Cristo por pecadores.

Neste aspecto a passagem - 1 Coríntios 15.1-4 - é uma base mais razoável para a ordenança, pois Romanos 6.1-10 é, sem dúvida, uma apresentação da morte de Cristo como a base da santificação expenencial e não da salvação dos perdidos. N e n h u m batismo ritual jamais une uma pessoa a Cristo no sentido de ela partilhar vital e perfeitamente de tudo o que Cristo é e de tudo o que Ele fez, mas isto é exatamente o que o batismo com o Espírito Santo realiza. Assim, por ser batizado em Cristo pelo Espírito, é assegurada uma real participação na sua crucificação, morte, sepultamento e ressurreição.

Em seus aspectos principais, o desenvolvimento do argumento de Romanos 6.1-8.13 é o seguinte:

(1) Cristo morreu para o pecado com a finalidade cie que o crente não continue em pecado. Está escnto: "Não reine, portanto, o pecaco e:r. vosso corpo mortal, para obedecerdes às suas concupiscências" (6.12). A implicação não pode ser evitada de que, se desimpedido, a natureza pecaminosa, embcra luigada. afimiará o seu poder no corpo mortal. Está também implícito que o seu dcmínio não é uma necessidade, o que seria se ela não fosse julgada, e igualmente está implícito que a responsabilidade agora pertence ao cristão "não deixar o pecado reinar", e para isso, obviamente, ele deve usar os meios divinos e os recursos disponíveis através do Espírito Santo.

(2) O sistema todo de mérito, com seu apelo às obras e ao esforço humanos, representado nos relacionamentos da lei, não foi deixado ao cristão, e aqueles que empregam este princípio de andar na sua própria força são derrotados por causa da incapacidade deles de controlar a natureza pecaminosa (Rm 7.1-25).

(3) Há uma vitória triunfante na qual toda vontade de Deus é realizada no crente, mas nunca pelo crente. (Rm 8.1-13). Nesta divisão final desze contexto, está reafirmado que a libertação é pelo poder, ou lei, do Espírito da vida em Cristo Jesus (Rm 8.2) e com base na verdade de que um novo princípio de realização é assegurado, e é muito mais eficaz quanto o poder de Deus é maior do que o da impotente carne. A verdade toda é sumarizada em dois versículos (Rm 8.3-4) em que ambos, o julgamento da morte de Cristo com respeito à velha natureza e a energia imediata do Espírito, são apresentados: "Porquanto o que era impossível à lei, visto cue se achava fraca pela carne, Deus, enviando a seu próprio Filho em semelhança ca carne do pecado, e por causa do pecado, na carne condenou o pecado, para que a -usta exigência da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a came, mas segundo o Espírito".

Pode ser concluído, então, que, em sua morte, e como um objetivo maior, Cristo assegurou o julgamento da natureza pecaminosa com base no Espírito Santo que com justeza pode libertar do poder dessa natureza, e o fará com todos "que não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito" (8.4). Andar segundo o Espírito é andar numa consciência dependente do Espírito. É andar por meio do Espírito (cf. Gl 5.16).