• Nenhum resultado encontrado

Quadro VI Comissão Administrativa do PRN após o II Congresso

14. O Ministério Rodrigues Gaspar

O governo de Rodrigues Gaspar formou-se com base no bloco parlamentar que deu origem ao governo anterior, tendo o apoio determinado do sector conservador e o apoio condicional do sector radical do PRP, do Grupo Parlamentar de Acção Republicana910 e dos independentes, pelo que a sua formação acabou por ser bastante demorada e difícil911. Os católicos, à semelhança do que vinha sendo a sua prática, apoiariam o governo sempre que a sua acção fosse ao encontro dos interesses dos católicos912. O executivo só tomou posse a seis de Julho de 1924, ainda com alguns ministros a ocupar os cargos interinamente. Para o anterior ministro da Agricultura, Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro, este novo ministério era “um governo de

906

António Ginestal Machado, Diário de Lisboa, 1-7-1924, p. 8.

907 Diário de Lisboa, 1-7-1924, p. 5; Álvaro de Castro, Diário da Câmara dos Deputados, 10-7-1924, pp.

17-21; Diário da Câmara dos Deputados, 6-7-1925, p. 49.

908

Diário de Lisboa, 2-7-1924, p. 8; idem, 9-7-1924, p. 8.

909 Cf., entrevista a José Domingos dos Santos, Diário de Lisboa, 15-7-1924, p. 5.

910 O apoio incondicional do grupo de Acção Republicana ao novo executivo não foi fácil de conseguir. O

deputado Joaquim Ribeiro de Carvalho e o senador José Augusto Ribeiro de Melo mostraram não confiar no governo de Rodrigues Gaspar, tendo o primeiro ponderado apresentar uma moção de desconfiança. Contudo, depois da reunião do grupo de Acção Republicana com Álvaro de Castro, acabou por desistir da sua intenção, cf., Diário de Lisboa, 9-7-1924, p. 8; idem, 9-7-1924, p. 8.

911 O governo Rodrigues Gaspar formou-se contando com a representação das várias facções do Bloco. O

PRP ficava com a maioria dos ministérios, sendo os restantes entregues a: António Abranches Ferrão, Instrução, Independente; Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro, Comércio, Grupo Parlamentar de Acção Republicana; Rodolfo Xavier da Silva, Trabalho, Grupo Parlamentar de Acção Republicana, cf., Diário

de Lisboa, 5-7-1924, p. 8.

912

Sobre a posição dos católicos face ao novo governo veja-se: Lino Neto, Diário da Câmara dos

verão, com o espírito financeiro de Álvaro de Castro, até que se afirme o gabinete Afonso Costa”913. Vaticinou que haveria “governo para dois meses”, já Sá Pereira mais pessimista disse que o gabinete podia “não ter mais do que oito dias de vida...”914

. O governo fez a sua apresentação na Câmara dos Deputados a nove de Julho. Durante a leitura da declaração ministerial, Rodrigues Gaspar confirmou que o governo se alicerçava no “bloco que vinha constituindo a maioria parlamentar”915

e que iria seguir, no essencial, a política do anterior governo no sentido de atingir o equilíbrio orçamental e a valorização do escudo916. Pretendia assim, reduzir as despesas e desenvolver novas fontes de riqueza, para criar matéria colectável, produtiva e duradoura917.

O deputado Vitorino Guimarães encarregou-se, em nome do PRP, de declarar o apoio ao novo governo, sem esquecer de saudar Álvaro de Castro e os seus ministros pelo serviço público que tinham prestado ao país918. Cunha Leal, em nome da minoria nacionalista, começou por declarar que o novo ministério tinha nascido com “maus agoiros” e estranhou as palavras de Vitorino Guimarães que tinha elaborado a “moção que tinha derrubado o gabinete de Álvaro de Castro”, condenando-o pela sua acção e pela “falta de homogeneidade e organização dos seus membros”. Era enfim, a “própria condenação do bloco parlamentar”. Contudo, nesse momento, Vitorino Guimarães não se coibiu de louvar o exercício do anterior governo. A manutenção do bloco parlamentar levantava sérias dúvidas a Cunha Leal, levando-o a colocar a seguinte questão: “Mas então como é possível constituir blocos políticos com pessoas que tão fundamentalmente desconfiam umas das outras e que até contestam” os grupos com os quais se vão ligar? Este bloco terá a homogeneidade suficiente para poder “garantir a vida de qualquer entidade que esteja na Presidência do Ministério?” E concluiu que o apoio que o Sr. Álvaro de Castro está dando a este Governo é um apoio de vingança, dizendo [...]: «Vocês hão-de morrer da mesma forma por que eu morri»”. Quanto à necessidade de se recorrer sistematicamente a Afonso Costa era sintomático de que o PRP não tinha coesão, nem disciplina, e assim nenhum governo formado por este partido teria a certeza de poder governar com estabilidade. Assim, “a chegada do Sr. Afonso Costa era necessária para resolver a crise de um partido e não a crise de uma Nação!”. Cunha Leal terminou a sua intervenção apresentando uma moção, em nome do PRN, na qual reconhecia que o novo governo não satisfazia “as legítimas exigências do país” 919

. O Bloco, desta vez em uníssono, defendeu o novo governo rejeitando a moção por 50 votos contra 21, bem como a apresentada pela minoria monárquica920.

O PRN considerava que o novo governo de Rodrigues Gaspar tinha sido arrancado a ferros do seio do Partido Democrático. No executivo estava representada a corrente de uma das facções em que esse partido se acha estilhaçado, tendo contra si a manifesta má vontade das outras facções. Considerava que o governo apenas contava com o apoio do grupo que dentro do democratismo constituía a facção António Maria da Silva. O apoio que Álvaro de Castro prometeu ao Governo Rodrigues Gaspar, não invalidada o facto de o novo ministério estar “sujeito como qualquer outro, neste momento ao grande embate político”921

. O Partido Republicano Nacionalista prosseguiu

913 Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro, Diário de Lisboa, 7-7-1924, p. 4. 914 Diário de Lisboa, 10-7-1924, p. 8.

915 Rodrigues Gaspar, Diário da Câmara dos Deputados, 9-7-1924, pp. 5-6. 916 Cf., Rodrigues Gaspar, Diário da Câmara dos Deputados, 16-7-1924, pp. 8-11. 917

O Jornal, 2-7-1924, p. 1.

918 Vitorino Guimarães, Diário da Câmara dos Deputados, 9-7-1924, pp. 6-8. 919 Cunha Leal, Diário da Câmara dos Deputados, 9-7-1924, pp. 9-15. 920

Diário da Câmara dos Deputados, 16-7-1924, p. 22.

nos meses seguintes na ideia de que o governo “deve cair fatalmente mais dia, menos dia”. Por isso, persistiu na sua estratégia de negar-lhe “todas as autorizações que, por ventura venham a pedir às Câmaras”. Os nacionalistas continuavam determinados a “governar, mas a governar sozinhos”922

.

Os sucessivos adiamentos dos trabalhos parlamentares não foram suficientes para se aprovar orçamento. Na Câmara dos Deputados a discussão do orçamento foi-se eternizando, em parte por culpa do obstrucionismo dos nacionalistas, dos monárquicos e de alguns deputados democráticos. O governo sentiu, então, necessidade de apresentar uma proposta de duodécimos e autorizações parlamentares para se cumprir a legalidade. A proposta ao ser apresentada na Câmara dos Deputados no dia 6 de Agosto de 1924 foi preterida na discussão, por estar-se nesse momento a analisar-se a questão do inquilinato. José Domingues dos Santos, deputado da maioria e líder da facção radical apresentou os seus argumentos: “eu sei que o Governo precisa da votação dos duodécimos; sei que são indispensáveis para o Governo viver, mas a oportunidade é que não foi boa. Estamos a discutir a proposta do inquilinato, e o Sr. Presidente do Ministério não desconhece a responsabilidade que o Parlamento assume em preterir um assunto de tamanha gravidade”923

. A proposta de duodécimos e as autorizações parlamentares acabaram por ser aprovadas na generalidade na Câmara dos Deputados, embora os nacionalistas, por intermédio de Pedro Pita e Lelo Portela, tenham levantado dúvidas sobre a extensão do regime de duodécimos até 31 de Dezembro e sobre a autorização de remodelação dos serviços públicos924. A proposta de duodécimos e as autorizações parlamentares foram negociadas no Parlamento entre o PRP e o PRN925 e acabariam por ser aprovadas na especialidade com algumas modificações, numa longa sessão, que começou na tarde do dia 13 de Agosto e que acabou às 4 horas da madrugada do dia seguinte926.

No dia 21 de Agosto de 1924 o Parlamento interrompeu os seus trabalhos para férias. Nos dias anteriores o governo teve de enfrentar uma série de moções de confiança e desconfiança, devido a um acordo com a Companhia de Tabacos, que o bloco foi conseguindo superar927. O PRN também participou no chorrilho de moções através do deputado Ferreira da Rocha928.

Mesmo com o Parlamento encerrado, a oposição ao governo, e em especial do ministro das finanças, Daniel Rodrigues, tendeu a agravar-se por parte oposição minoritária e perante o Bloco que suportava o executivo. O directório do PRP reuniu na noite de 3 de Setembro na sua sede, na Travessa da Água da Flor, para apreciar a questão dos tabacos e a situação do ministro das finanças, Daniel Rodrigues. Decidiram enviar uma delegação no dia seguinte para se avistarem com o presidente do ministério, Rodrigues Gaspar e para lhe entregarem uma moção aprovada na noite anterior sobre a questão dos tabacos929. O governo, mesmo tendo a oposição de uma parte do PRP

922 António Ginestal Machado, Diário de Lisboa, 26-7-1924, p. 5. 923

José Domingues dos Santos, Diário da Câmara dos Deputados, 6-8-1924, p. 15.

924 Diário da Câmara dos Deputados, 7-8-1924, pp. 9-18; Diário de Lisboa, 7-8-1924, p. 8. 925 Diário de Lisboa, 9-8-1924, p. 8.

926 Diário da Câmara dos Deputados, 13-8-1924. Cf., Ana Bela Nunes, “Os Debates Orçamentais durante

a Primeira República” in Nuno Valério (Coord.), Os Orçamentos no Parlamento Português, Lisboa, Dom Quixote /Assembleia da República, 2006, pp. 121-159.

927 Cf., Diário da Câmara dos Deputados, 18-8-1924; idem, 19 e 20-8-1924; idem, 21-8-1924; Diário de

Lisboa, 20-8-1924, p. 8; idem, 22-8-1924, p. 8.

928

Veja-se a Moção de Ferreira da Rocha: Diário da Câmara dos Deputados, 19 e 20-8-1924, p. 46.

decidiu manter-se em funções, pois só o Parlamento o poderia destituir e este estava encerrado. O PRP teria pois de convocar as Câmaras para deixar cair o executivo930.

Do lado do Grupo Parlamentar de Acção Republicana a insatisfação perante o governo também era crescente. Os deputados Carlos de Vasconcelos e Xavier da Silva deslocaram-se à Beira para se encontrarem com Álvaro de Castro, para lhe dar a conhecer a moção do PRP. Os líderes da Acção Republicana estavam descontentes por o governo não ter seguido a orientação política do anterior e por terem ocorrido algumas substituições de algumas figuras administrativas da Acção Republicana, sem prévia auscultação dos seus máximos dirigentes. Por outro lado, consideravam a moção do directório do PRP, uma espécie de moção de desconfiança ao governo. Por isso, a liderança da Acção Republicana ponderava a demissão dos seus ministros – Xavier da Silva e Pires Monteiro931. No entanto, o caso foi debatido numa reunião entre os parlamentares e ministros do Grupo Parlamentar de Acção Republicana. Desta reunião onde as divergências internas foram evidentes, resultou a elaboração de uma moção que foi entregue ao presidente do conselho de ministros defendendo a convocação antecipada do Congresso. No entanto o chefe do executivo decidiu não acatar esta indicação, defendendo que o Congresso só deveria reunir no período regimental em finais de Novembro932.

Entretanto, as posições entre o directório do PRP e o chefe do executivo radicalizaram-se. O directório do PRP entendia que o chefe de governo deveria convocar o Congresso em Outubro, enquanto Rodrigues Gaspar julgava que só devia convocá-lo em meados de Novembro e que se os parlamentares quereriam reunir, então que angariassem as 60 assinaturas necessárias933. O Directório acabou por aprovar uma moção mais radical, no dia 10 de Outubro, apelando aos correligionários, para que cumprissem os seus deveres partidários, retirando o apoio ao governo934. O presidente do ministério, Rodrigues Gaspar, respondeu, dizendo que não tinha “receio algum dela”935

.

O PRN não se queria envolver nesta questão, nem na possível queda do governo, uma vez que, segundo António Ginestal Machado, tudo dependia “das combinações da maioria”. Em termos políticos o PRN encontrava-se “firme no seu propósito de intervir quando chegar o seu tempo” 936

.

O Governo também enfrentava dificuldades na rua, tanto à direita como à esquerda. Várias organizações económicas protestaram contra o aumento dos impostos nas bebidas engarrafadas e nos perfumes e pelas dificuldades na obtenção de crédito e de divisas estrangeiras. Por isso, publicaram um manifesto “Ao País” elaborado pela comissão instaladora da União dos Interesses Económicos937. O comércio de Lisboa organizou uma greve no dia 14 de Outubro de 1924, fechando as portas dos estabelecimentos comerciais em sinal de protesto contra o decreto da selagem938. Algumas fábricas fecharam também no dia seguinte e o presidente da associação comercial de Lisboa, João Pereira Rosa, chegou a ser detido939. Durante estes dias a 930 Diário de Lisboa, 6-9-1924, p. 8. 931 Diário de Lisboa, 9-9-1924, p. 8. 932 Diário de Lisboa, 10-9-1924, p. 8. 933 Diário de Lisboa, 20-9-1924, p. 8.

934 Diário de Lisboa, 10-10-1924, p. 8. António Maria da Silva e Vitorino Guimarães votaram contra a

moção, Diário de Lisboa, 13-10-1924, p. 8.

935

Rodrigues Gaspar, Diário de Lisboa, 11-10-1924, p. 1.

936 António Ginestal Machado, Diário de Lisboa, 24-9-1924, p. 8. 937 Diário de Lisboa, 14-10-1924, p. 3.

938

Diário de Lisboa, 14-10-1924, p. 8.

Câmara dos Deputados recebeu dezenas de telegramas de múltiplas associações económicas protestando contra a selagem e solidarizando-se com a Associação Comercial de Lisboa940. Os nacionalistas solidarizando-se com os agentes económicos, que rejeitavam a rápida valorização do escudo, defenderam a estabilidade cambial, uma vez que, como afirmava António Ginestal Machado: “A descida rápida da libra traria enormes, espantosos prejuízos”941

. A esquerda radical também se movimentava e no dia 16 de Outubro de 1924 foram presos vários elementos do Partido Republicano Radical que estavam reunidos na Rua Nova do Carmo. A P.S.E., comandada por Barbosa Viana, recebeu uma denúncia que indicava que estes elementos estavam preparando uma revolução. Entre eles estavam o Senador Procópio de Freitas, que saiu de imediato em liberdade em virtude da imunidade que goza942. A direita também conspirava, tendo o nacionalista Filomeno da Câmara aliciado muitos políticos e militares para uma intentona revolucionária que apenas se concretizou alguns meses mais tarde, pois Filomeno da Câmara acabaria por ser preso e transferido para Caminha943.

Com a aproximação da abertura dos trabalhos parlamentares os rumores adensaram-se sobre o futuro do governo. Uma fonte do PRP disse a um repórter do

Diário de Lisboa que estava em preparação um rompimento do actual Bloco para a

formação de um outro, que permitisse a formação de um governo de concentração ou mesmo nacional. Estavam empenhados nessa estratégia “do lado do PRP os Srs. António Maria da Silva e Vitorino Guimarães. E do PRN os Srs. Tomé de Barros Queirós, Moura Pinto e Ferreira da Rocha”. No entanto, opunham-se “terminantemente a esta ideia os Srs. Cunha Leal, Pedro Pita e Lelo Portela”944

. Pedro Pita explicou claramente a sua posição sobre a possibilidade de o seu partido integrar governos de concentrações: “Confesso que não gosto e que com o meu voto, o meu partido só irá para eles em caso de perigo evidente para a Pátria ou para a República”945

.

O Parlamento voltou a abrir as portas a 4 de Novembro de 1924, tendo o chefe do executivo apresentado um relatório dos trabalhos do governo durante o interregno parlamentar946. A falta de coesão no Bloco começou a ser evidente, intensificando-se as críticas à acção do governo. Os parlamentares democráticos reuniram nesse dia e houve um primeiro duelo entre os bonzos e os esquerdistas para a eleição do líder do PRP na Câmara dos Deputados. José Domingues dos Santos foi o vencedor obtendo 28 votos, contra António Maria da Silva, que obteve 24 votos e Vitorino Guimarães que obteve 19 votos947. O clima político só acalmou um pouco nos dias seguintes porque o chefe do executivo adoeceu e não compareceu no Parlamento. No dia 18 de Novembro já com o presidente do ministério a participar nos trabalhos da Câmara dos Deputados a oposição ao governo do sector esquerdista do PRP veio ao de cima. Rodrigues Gaspar lembrou que quando foi escolhido pelo seu partido para formar governo, outro membro do seu partido já tinha o ministério constituído e que desde o início do seu mandato que um jornal próximo do PRP fazia uma perseguição cerrada ao seu governo. Mas, o facto que mais o magoara tinha sido o directório do PRP, de que ele também fazia parte ter elaborado uma moção crítica ao seu governo, sem antes lhe ter comunicado quais os

940

Diário da Câmara dos Deputados, 5-11-1924, p. 15.

941 Diário de Lisboa, 31-10-1924, p. 4. 942 Diário de Lisboa, 17-10-1924, p. 8.

943 Cunha Leal, As minhas memórias, Vol. II, edição do autor, 1967, pp. 408-413; Aniceto Afonso,

História de uma conspiração. Sinel de Cordes e o 28 de Maio, Lisboa, Editorial Notícias, 2000, pp. 75-

82.

944 Diário de Lisboa, 20-10-1924, p. 8.

945 Pedro Pitta, Diário de Lisboa, 8-11-1924, p. 5. 946

Rodrigues Gaspar, Diário da Câmara dos Deputados, 4-11-1924, pp. 8-17.

assuntos com os quais discordava da acção do governo948. Quanto à Acção Republicana, depois de Sá Cardoso ter dito que tinham “dado liberdade aos seus membros para votarem como entendessem” a moção sobre as dívidas de Angola, o presidente do ministério, Rodrigues Gaspar, concluiu o seguinte: “o «bloco» é feito de pedra solta”949

. No PRP a coesão do grupo parlamentar também estava a desagregar-se. O deputado Júlio Gonçalves ao proclamar que o partido tinha dado “liberdade a todos os seus membros para manifestarem a sua opinião”950

, foi imediatamente interrompido por Vitorino Guimarães e António Maria da Silva questionando-o sobre “quem deu essa liberdade”951

. A moção de confiança apresentada por António Maria da Silva acabaria por ser rejeitada por 46 votos desfavoráveis, contra 43 votos favoráveis952. Os monárquicos, os nacionalistas, os católicos e as «pedras soltas do bloco», de que falava Rodrigues Gaspar, foram os principais responsáveis pela queda do governo. As «pedras» vieram maioritariamente do lado esquerdista do PRP, liderado por José Domingues dos Santos.

O governo apresentou a demissão na manhã do dia 19 de Novembro ao Presidente da República, tendo então iniciado as consultas da praxe. Do PRN deslocaram-se a Belém os Drs. Augusto de Vasconcelos e António Ginestal Machado. Voltaram a defender que estando o bloco desfeito, o executivo devia ser entregue ao PRN, mas só desde que lhe fossem dados os meios constitucionais necessários ao exercício do poder, ou seja, a dissolução parlamentar953. O Grupo Parlamentar de Acção Republicana (AR) reuniu-se na Câmara dos Deputados e resolveu aconselhar ao Presidente da República “a formação de um governo saído do Bloco presidido por uma alta figura do PRP ou da AR e, sendo possível pelo Dr. Afonso Costa”954. Os representantes do directório e do grupo parlamentar do PRP depois de uma longa discussão decidiram apresentar ao Chefe de Estado a manutenção do Bloco, mas com a formação de um governo das esquerdas, presidindo por José Domingues dos Santos. A eleição não foi pacífica dentro do PRP, uma vez que alguns bonzos faltaram à reunião, o que retirava legitimidade à escolha. Porém, as negociações com Álvaro de Castro permitiram manter o bloco, pelo que Teixeira Gomes, respeitador escrupuloso da Constituição e dos poderes parlamentares, encarregou José Domingues dos Santos pela formação do ministério955.

948

Rodrigues Gaspar, Diário da Câmara dos Deputados, 18-11-1924, pp. 31-38.

949 Diário da Câmara dos Deputados, 18-11-1924, p. 41.

950 Júlio Gonçalves, Diário da Câmara dos Deputados, 18-11-1924, p. 47. 951

Vitorino Guimarães, Diário da Câmara dos Deputados, 18-11-1924, p. 47.

952 Diário da Câmara dos Deputados, 18-11-1924, pp. 49-50.

953 Cunha Leal chegou a Lisboa no dia 19 de Novembro de 1924, às 14.30h, proveniente de Angola.

Ainda dentro do barco e sabendo da crise ministerial voltou-se para os seus amigos políticos que o tinham vindo receber e disse:

“- Temos Afonso, ou não temos Afonso?... Não lhe respondem. E nos perguntámos: Em que condições vai o seu partido ao Poder?

- Ou nos dão os meios constitucionais para podermos governar sozinhos ou então governem os outros...”.

Diário de Lisboa, 19-11-1924, p. 5.

954 Diário de Lisboa, 19-11-1924, p. 8.

955 Diário de Lisboa, 20-11-1924, p. 8. Cf., António José Sousa Monteiro de Queirós, A Esquerda

Democrática e o final da Primeira República, volume I, Tese de Doutoramento, Faculdade de Letras da

Outline

Documentos relacionados