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planejando além da colheita

No documento Gestão Da Qualidade_Livro (páginas 47-51)

No capítulo anterior conhecemos a importância do planejamento para a implementação da qualidade total. Uma produção agrícola que se pretenda de qualidade não foge à regra. Deve ser cuidadosamente planejada, desde a

seleção do solo e das sementes ou mudas até o transporte para os centros de distribuição, passando pela colheita e armazenamento dos frutos. A gestão adequada dessas etapas é a única forma de se garantir a qualidade ao longo de todo o processo.

Vamos a um exemplo. O Vale do São Francisco, polo vitivinícola citado há alguns pará- grafos, responde por 99% da produção das uvas de mesa consumidas no Brasil, o que seria inimaginável há alguns anos. Como isso foi possível? Graças a um rigoroso planejamento, que considerou, entre outras coisas, as espécies a serem cultivadas, bem como um sistema de irrigação adequado e de um sistema de colheita, armazenamento e distribuição dos frutos Jacob, ao fazer tal afirmação, está contando a história do arado e, involuntariamente, revelando a evolução quali- tativa de uma ferramenta para atender às necessidades de seus usuários. Segundo Jacob, o arado já existia, mas tinha de ser puxado por vários ca- valos ao mesmo tempo, uma vez que era feito de lâminas de aço presas a um pesadís- simo varal em madeira. Um ferreiro simples e sem estudo chamado John Deere teve, um dia, a ideia de fazer todo o arado em aço, o que o tor- nou muitíssimo mais leve, a ponto de poder ser levado ao campo sobre os ombros do lavrador. Além disso, o novo arado mostrou-se espanto- samente eficaz, não só pela redução do peso, mas tam- bém porque suas lâminas de aço eram mais lisas, e a ter- ra não grudava tanto nelas, minimizando a necessidade de limpeza constante. Seu inventor ficou famoso. A gi- gante Deere & Company, fun- dada no longínquo ano de 1837, é hoje uma das maiores fabricantes mundiais de ma- quinário agrícola.

capaz de garantir que suas qualidades intrínsecas chegassem preservadas à mesa dos brasileiros.

No caso de produtos sensíveis como as uvas, alguns

pontos são especialmente merecedores de atenção. Tome- mos como exemplo o transporte dos frutos; se durante esse processo as bagas forem amassadas, a qualidade da uva que chegará ao consumidor seguramente não será a mesma. Logo, o planejamento de um empreendimento agrícola como esse deve identificar possíveis problemas e agir preventiva- mente para sua resolução, de modo que parte do possível lucro não se perca em virtude de frutos estragados ou de aparência ruim.

Assim como ocorreu no caso dos produtos industria- lizados, o movimento em direção à qualidade no setor agrícola brasileiro foi provocado pela chegada de concorrentes estrangeiros. Com certa frequência, é possível encontrar em grandes supermercados algumas frutas importadas a preços bastante semelhantes aos das nacionais. Isso mostra que a globalização chegou também à agricultura, obrigando nossos produtores a pensar na competitividade; afinal, diante de preços semelhantes, o consumidor buscará sempre o produto de melhor qualidade.

Em princípio, a qualidade na agricultura não difere da qualidade em qualquer outra área. Também aqui sua gestão deve servir para reduzir custos, aumentar a produtividade e satisfazer os clientes. O produto agrícola, porém, é um produto que carrega uma expectativa a mais por parte dos consumidores, intrinsecamente ligada ao fato de ele servir de alimen- to — a expectativa de que seja um produto seguro e saudável. Com efeito, se a segurança alimentar não fizesse parte dos quesitos de muitos clientes, os alimentos transgênicos pos- sivelmente já estariam sendo plantados em maior escala.

A crescente demanda por produtos orgânicos é outro bom exemplo de como a preo- cupação com segurança e saúde vem norteando a exigência dos consumidores. Mas como saber se um produto comprado é o que diz ser? Uma fruta não é como um eletrodoméstico; se o consumidor a compra e a consome, pode nem perceber que o “produto” tinha algum defeito. É difícil para o consumidor saber se a batata foi geneticamente modificada para resistir a pragas, ou se o tomate está realmente livre da carga de agrotóxicos conforme o produtor apregoa.

É nesse sentido que surge a certificação como forma de dar ao consumidor a certeza de

que ele está comprando o produto seguro e saudável que espera.

Um exemplo de certificação bem conhecida do consumidor brasileiro é o selo de pureza da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), que, desde seu lançamento, em 1988, contribuiu para diminuir de 30% para 5% a proporção de marcas de café no Brasil com impurezas ou adulterações. Do mesmo modo, já são familiares no nosso mercado as denomi- Essas e outras informações

sobre a produção de uvas e vi- nhos em nosso País podem ser encontradas no site <www.si- tedovinhobrasileiro.com.br>. O site da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária — Em- brapa (<www.embrapa.br>) também é uma importante fonte de informações sobre o setor agrícola, especialmente no que diz respeito à evolução técnico-científica.

nações de origem controlada presentes nos rótulos dos vinhos importados e, recentemente, também nos de alguns vinhos nacionais.

Mais recentemente, em 2009, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil (Mapa) lançou o selo de produto orgânico, a ser conferido pelo Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica (Sisorg). Esse selo permitirá ao consumidor saber se dado produto é efetivamente orgânico.

Para tanto, o produto terá de passar por um desses três mecanismos de controle de qualidade:

1. certificação por auditoria, ou seja, por empresas certificadoras credenciadas pelo

Mapa;

2. certificação pelos Sistemas Participativos de Garantia da Qualidade Orgânica, quer

dizer, por associações de produtores, armazenadores, transportadores, consumido- res e outros agentes envolvidos na cadeia de produção, devidamente credenciadas pelo Mapa;

3. controle social na venda direta, incidente sobre produtos que são vendidos direta-

mente ao consumidor por produtores participantes do Cadastro Nacional de Produ- tores Orgânicos.

O interesse por produtos orgânicos vem crescendo enormemente no mundo todo, mas ele é apenas uma parte da questão da qualidade agrícola, parte esta que reflete a preocupação com o uso excessivo de agrotóxicos, fertilizan- tes e demais substâncias químicas empregadas para tornar as colheitas mais fartas. Com o aumento da população, a demanda mundial por alimentos em geral tende a crescer na mesma proporção. Para o Brasil, esta é uma excelente opor- tunidade de aumentar sua participação no mercado interna- cional. Temos água e terras férteis, temos espaço para cultivo, e só nos falta, no momento, incorporar definitivamente a qualidade na produção de alimentos.

Outro bom exemplo de iniciativa em prol da qualidade da produção agrícola é o siste- ma de Produção Integrada de Frutas (PIF), lançado pelo Mapa em parceria com o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro). O PIF apresenta um conjunto de diretrizes e normas para a produção de frutas em nosso País. Foi criado pre- cisamente para satisfazer as exigências dos mercados importadores e considera aspectos relativos ao produto em si, tais como sabor, aroma, textura e valores nutricionais, bem como os relativos ao processo de produção, como, por exemplo, sustentabilidade econômica e ambiental, segurança alimentar e relações de trabalho estabelecidas na produção.

A Figura 2.1 mostra os aspectos considerados pelo PIF e resume o que se pode conside- rar um produto agrícola de qualidade.

Um dos selos de qualidade mais antigos do Brasil é usa- do no setor de pecuária. Tra- ta-se do carimbo do Sistema de Inspeção Federal (SIF), que desde 1915 atesta que os pro- dutos de origem animal estão aptos para consumo do ponto de vista sanitário e tecnológi- co, conforme a legislação vi- gente no País.

Há selos que certifi cam a qualidade dos produtos agríco- las também em nível internacional. A vantagem de adotá-los é, justamente, a possibilidade de expandir-se para esse mercado.

Dante Scolari, pesquisador da Embrapa, afi rma: Para ser competitivo, o País precisa de uma cultura expor- tadora, com conceitos desenvolvidos de qualidade, confor- midade a padrões globais, preços competitivos e susten- tabilidade ambiental (produtos e processos limpos, com origem, rastreabilidade e certifi cação) e visão estratégica de integração de cadeias produtivas. (SCOLARI, 2006, p. 68.) A “fórmula da competitividade” citada pelo autor não nos é estranha. Trata-se de adaptar nossa produção agrícola às exigências dos mercados externo e interno, mantendo

preços convidativos. Ganha o País e ganham os produtores, que, ao implantarem a qualidade total em suas empresas, atuarão fortemente no sentido de minimizar as perdas, tão comuns no setor.

No entanto, ainda há muito a amadurecer, no Brasil, quando se fala de certifi cação de qualidade para alimentos. A realidade do nosso mercado mostra que os produtos certifi cados têm preço mais elevado. A presença de um selo de qualidade transforma-se em um diferencial, sim, mas ainda acessível a poucos. Contudo, esse cenário deve-se alterar naturalmente quando a certifi cação de produtos se tornar uma

Figura 2.1 Aspectos de um produto agrícola de qualidade, considerados pelo PIF.

Aspectos relativos ao produto Aspectos relativos ao processo

Sustentabilidade econômica e financeira Segurança alimentar Relações de trabalho Sabor Aroma Textura Valores nutricionais Produto agrícola de qualidade Na década de 1990, um sur- to da doença da vaca louca, cientifi camente chamada de encefalopatia bovina espon- giforme, tomou a Europa. Al- gum tempo depois de ingerir a carne de animais contami- nados, muitos humanos de- senvolveram uma variação da Doença de Creutzfeldt- -Jakob, que causa sintomas como confusão mental, con- trações musculares e perda da coordenação motora, po- dendo levar à morte. Desde então, os europeus tor- naram-se particularmente preocupados com a seguran- ça alimentar.

prática mais difundida. Tal como está acontecendo com os alimentos orgânicos, a certificação parece ser uma forma prática de garantir a qualidade tão desejada pelo consumi- dor. Afinal, o selo mostra ao consumidor que aquele alimento foi produzido dentro de padrões determinados.

No documento Gestão Da Qualidade_Livro (páginas 47-51)