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sustentabilidade e cultura da empresa

No documento Gestão Da Qualidade_Livro (páginas 174-176)

Há pouco afirmamos que o objetivo das organizações é obter lucro prestando à socie- dade serviços ou fornecendo produtos de que ela necessita, com qualidade. É claro que nem todas as organizações se preocupam com qualidade, mas as que não o fazem estão fadadas ao fracasso. Podem lucrar por um período, mas não se manterão no mercado.

Também sinalizamos, ao longo dos capítulos anteriores, que a sustentabilidade é, atual-

mente, parte integrante da qualidade. No entanto, para compreender a amplitude dessa afirmação, é necessário que exploremos melhor o conceito de sustentabilidade.

A primeira área que nos vem à mente quando falamos em sustentabilidade é a ambien- tal. Notadamente, nas últimas décadas, tem havido uma preocupação crescente com o uso dos recursos naturais do planeta, motivada pela constatação — talvez um pouco tardia — de que tais recursos poderão não durar para sempre. Com efeito, a preocupação com a susten- tabilidade ambiental no meio empresarial veio de fora, ou seja, é oriunda da sociedade civil, que começou a ver a exploração dos recursos naturais pelas empresas como o grande vilão da degradação ambiental do planeta. Dentro das empresas, a sustentabilidade só entrou em pauta quando passou a ser um fator de competitividade. A crescente demanda dos consumi- dores por produtos ambientalmente corretos tem motivado as organizações a se adequarem a esse novo paradigma. Mas essa é apenas uma das dimensões da sustentabilidade.

O termo sustentabilidade refere-se à propriedade de

ser sustentável e não se restringe a áreas específicas. Um sistema sustentável deve poder, efetivamente, sustentar-se,

autoabastecer-se, ao longo de sua existência. Em outras pa- lavras, um sistema sustentável gera, ele próprio, os insumos necessários à sua manutenção.

Logo, o raciocínio usado para a sustentabilidade am- biental pode ser facilmente extrapolado para outras áreas. Por exemplo, quando alguém é submetido a tensões extre- mas e constantes em um ambiente de trabalho, começa a se questionar se sua situação profissional é sustentável, ou seja, se terá recursos físicos e psíquicos para se manter nela por muito tempo. De maneira análoga, a crise financeira de- sencadeada pelo estouro da “bolha imobiliária” nos Estados Unidos em setembro de 2008 alertou o mundo para a não sustentabilidade do modelo econômico vigente. Vale o mes- mo para a crise social, que vemos emergir de forma dramáti- ca todos os dias e que nos alerta para a não sustentabilidade dos modelos sociais escolhidos.

O conceito de desenvolvimento sustentável nasceu da consta- tação de dois fatos: 1) quanto mais o mundo se desenvolveu do ponto de vista tecnológi- co e econômico, mais o meio ambiente foi degradado; 2) por mais que o mundo tenha se de- senvolvido, as benesses oriun- das desse desenvolvimento não estão igualmente distribuí- das entre os diferentes povos, tampouco entre os cidadãos de um mesmo país, ou seja, as profundas diferenças sociais se acentuam cada vez mais. O desenvolvimento sustentá- vel consiste, portanto, em um modelo de desenvolvimento econômico que busca mini- mizar, ou quiçá resolver, am- bos os problemas.

A tentativa de aculturação dos povos indígenas brasileiros te- ve, infelizmente, bastante su- cesso. É sabido que os coloni- zadores europeus impuseram sua própria cultura aos indí- genas e para isso se valeram de instrumentos diversos, dos quais a língua e a religião tal- vez tenham sido os mais sig- nificativos. Porém, para que houvesse a possibilidade de imposição das mudanças cul- turais, era necessário que hou- vesse, antes, a comunicação. O código que ficou conheci- do, no Brasil Colônia, como língua geral baseava-se em grande medida na língua dos índios tupis e tupinambás, que foi aprendida tanto pelos colonizadores quanto pelos escravos africanos e por todos os mestiços descendentes da interação entre esses povos. O resultado dessa aprendizagem não foi, como se poderia es- perar, a preservação da língua tupi, mas sim, como é sabido, sua destruição — o que mos- tra a apropriação, por parte do elemento externo, de uma manifestação cultural interna, resultando em posterior modi- ficação dessa manifestação. Esse é um exemplo de como uma cultura muda a partir de seus próprios elementos. Uma organização que se pretenda sustentável deve lidar adequadamente com os di- ferentes aspectos, ou dimensões, da sustentabilidade, garantindo a própria sobrevivência em termos financeiros, valendo-se dos recursos naturais de forma responsável e estabele- cendo relações de trabalho e negócio justas. Só assim contribuirá efetivamente para o que se convencionou chamar desenvolvimento sustentável, conceito fundamental para o futuro

da humanidade.

Com a qualidade nas organizações não é diferente. Fre- quentemente, vemos exemplos de companhias empolgadas com a obtenção de uma certificação ou a adoção de um pro- grama de qualidade, mas que não sustentam esse progra- ma por muito tempo. Nesses casos, os resultados, inclusive financeiros, que poderiam ser obtidos com tais programas nem chegam a aparecer ou se revelam pouco impactantes, pois a organização não manteve o padrão de qualidade por tempo suficiente para colher seus frutos.

A qualidade não é algo que, uma vez implantado, conti- nue a acontecer sem exigir da empresa nenhum esforço. Um sistema ou programa de qualidade precisa, ele também, ser sustentável dentro da organização. E, para que isso aconteça, precisa fazer parte da cultura organizacional.

A cultura, de maneira geral, pode ser definida como o conjunto de crenças, costumes, saberes, técnicas e práticas de um grupo ao longo do tempo ou em um determinado período de tempo. É nesse sentido que empregamos o termo quando nos referimos a cultura oriental, cultura indígena, cultura renascentista etc. A cultura é fruto do desenvolvi- mento humano e, ao mesmo tempo, exerce sobre ele um po- der inconteste. uma cultura não pode ser mudada senão

a partir de suas próprias manifestações, ainda que em inte- ração com outras manifestações culturais. Sob essa ótica, a cultura é um ótimo exemplo de sustentabilidade, pois gera, ela mesma, os recursos para mudar a si própria, para se re- novar e para garantir o constante crescimento.

Com a cultura organizacional não é diferente. Ela é fruto do ser, do pensar e do fazer das pessoas que compõem a or- ganização. Por isso, a qualidade só se sustenta quando passa a ser o modo de ser, de pensar e de fazer dessas pessoas. Da mesma forma, qualquer mudança só é possível se partir dos elementos da própria cultura organizacional. Se pensarmos

em termos de melhoria contínua, de estabelecimento de patamares cada vez mais altos de qualidade, veremos que isso se confirma.

Ao analisarmos a influência japonesa sobre a questão da qualidade nas empresas oci- dentais, vemos que o raciocínio exposto também se aplica. A qualidade nas organizações ocidentais desenvolveu-se por força da guerra de competitividade imposta pela cultura da qualidade das empresas nipônicas. Ao mesmo tempo, para se tornarem competitivas, as companhias ocidentais partiram de suas próprias culturas, buscando aplicar nelas os precei- tos da qualidade que haviam feito tanto sucesso no Japão.

Você deve ter observado que temos frisado, às vezes até de maneira repetitiva, o quan- to a qualidade deve ser difundida por toda a organização, o quanto os padrões devem ser

seguidos e o quanto isso depende do comportamento orga- nizacional. Ora, em uma empresa na qual haja a cultura do fazer tudo correto desde a primeira vez, do não-desperdício, do melhoramento contínuo, ao mesmo tempo em que os tra- balhadores contribuem para alimentar essa cultura, eles são estimulados por ela a agirem conforme seus pressupostos, criando um círculo virtuoso que se reflete na verdadeira qua- lidade — esta sim, sustentável — buscada pelas organizações e esperadas por seus clientes.

No documento Gestão Da Qualidade_Livro (páginas 174-176)