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CAPÍTULO 1 O PROCESSO: CONTEXTUALIZAÇÃO E FINALIDADES

1.7 RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL

A vida em comum se processa por uma relação de pessoas que convivem em sociedade. Estas, poderão ter diversas origens e finalidades distintas, mas haverá sempre entre os seus membros um vínculo ou uma relação, que os uma em torno dos objetivos que têm.

O processo, como o direito, provém de uma história social, de uma cultura coletiva, e, por isso mesmo, tem a função de solucionar um conflito de interesses. Este, traduz uma relação malsucedida, tanto que transferida para a Justiça a solução daquele vínculo malogrado.

Por isso, é possível dizer que o processo é relacional, ou, com melhor propriedade “no processo se contém uma relação jurídica, (...) precisamente uma relação entre pessoas”73. Vislumbra-se a relação com a apresentação da petição

72SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 1º v., 9. ed.atual., São Paulo:

Saraiva, 1981.p. 238.

73SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil: adaptadas ao novo Código de

Processo Civil. 5ª ed. 1º v. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 267. Igualmente, José Frederico Marques no Manual de Direito Processual Civil, 1º v., 9ª ed., manifesta a unidade da relação que existe no processo, posto que proposta a ação, há um Estado-juiz que jurisdiciona o processo, com deveres expressos aos juízes e tribunais, competindo ao autor e juiz a submissão às decisões dos órgãos

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inicial ao juiz, ou seja, o exercer do direito de ação, de invocar a prestação jurisdicional do Estado, promove o processo que orienta a formação da relação processual.

A inicial do pedido dirigido ao juiz é o início da formação da relação processual, que se integra com a ciência da outra parte, contra a qual a ação foi proposta. Tem-se, pois, o autor solicitando a prestação jurisdicional, o juiz despachando-a e o réu conhecendo do pedido, por meio da citação que lhe foi dirigida.

Assim o diz José Frederico Marques:

Como o processo constitui, em sua essência estrutural, um actus trium

personarum, apresentando-se o juiz, o autor e o réu como sujeitos principais

da relação processual, por encarnarem subjetivamente, individualizando-as de forma devida, a jurisdição, a ação e a defesa, posições funcionais em que se apóia a referida relação jurídica.74

É possível, à luz de dispositivos do CPC, constatar o momento da formação da relação processual, uma vez que a iniciativa do autor de propor uma ação, se harmoniza com o preceito que realça o início do processo por iniciativa da parte (art. 262, do CPC). Outrossim, considera-se proposta a ação quando houver sido distribuída, onde existirem mais de uma vara, ou simplesmente despachada pelo juiz, quando este for único da comarca (art. 263, do CPC). Completa-se a relação jurídica processual quando citado o réu, o que se impõe por força da regra que assegura a validade processual com a indispensável citação inicial do réu (art. 214, do CPC).

É a síntese de uma relação jurídica processual, que, constituída, passa a ter três sujeitos que são o autor, ou o proponente da ação; o réu, o agente contra quem ela foi proposta; e o juiz, representado o Estado e o Poder Estatal, apto a dirimir as controvérsias.

Como se deduz, uma relação jurídica processual é muito distinta da relação social que se constata todos os dias. Um vínculo que une todos em busca da solução de um conflito, dando uma unidade à relação, mesmo na hipótese de possíveis modificações subjetivas (relacionadas com as parte e o juiz), ou objetivas (voltadas para o pedido). Uma relação processual que se apresenta complexa, por

jurisdicionais, o que resulta numa relação processual, ou seja “uma relação entre as pessoas que atuam no processo, regulada juridicamente pelas normas do Direito Processual Civil”(p.133).

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força da multiplicidade de direitos, obrigações, faculdades e ônus que atingem às partes ou a uma delas isoladamente, conforme for o caso. Do mesmo modo uma relação dinâmica, que suporta sucessivos atos independentemente da vontade dos demandantes por causa do impulso oficial75.

Afora estas constatações, a relação jurídica processual é uma relação de direito público, tanto que as partes se submetem às normas processuais, que são públicas e de obrigatório acatamento por todos. Por isso mesmo, a ética comportamental, intitulada no processo de lealdade processual, é um dever de todos, sob sanções àqueles que a descumprirem. Esta é a razão pela qual as partes processuais não poderão agir, segundo a vontade própria e individual de cada uma delas. A relação processual é pública, por isso os deveres impostos às partes são de observância obrigatória, sob pena de incidirem elas na litigância de má-fé e suportarem as sanções respectivas.

Oportuno dizer, apesar de identificados os sujeitos processuais, pelos quais se consolida a relação processual, da importância do advogado. É este profissional, dotado do ius postulandi, que permite verter para o direito os anseios das partes, levando-os à consideração do juiz. Da Constituição Federal (art. 133) ao Código de Processo Civil, no art. 36, é palmar a indispensabilidade do advogado à realização da Justiça.

Constituída a relação processual, passo seguinte é que ela se desenvolva, porque, representando o processo, deve estar validamente constituída e regularmente formada, de modo a produzir resultados, dentre os quais o conhecimento da lide e a subseqüente decisão do pedido. Ou, então, se assim não for, é provável que haja um desperdício de tempo e de atos improsperáveis, com flagrante violação ao princípio da economia processual, por terem sido preteridos os requisitos que tornam eficazes a relação jurídica processual.

É prudente observar se a relação jurídica processual se constituiu validamente, para que o processo possa ir adiante. Os atores processuais precisam estar identificados com as normas processuais, capacitados para exercerem suas pretensões e habilitados para os múnus que a lei lhes confere, sob pena de não

75CPC, art. 262. “O processo civil começa por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso

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existir relação jurídica processual.76 Juízes devem estar investidos de jurisdição, ser

competentes e imparciais; partes devem ter capacidades de ser parte, capacidade processual e capacidade de postular em juízo. Perfunctoriamente, são estes os requisitos subjetivos (relacionados aos sujeitos processuais) da relação processual.

Também integram os requisitos outros de natureza objetiva: a)extrínsecos à relação processual, tais como a litispendência, o compromisso, a falta de conciliação e de pagamento das despesas feitas pelo réu (art. 268, do CPC); b) intrínsecos à relação processual, tais como a petição inicial com os seus requisitos satisfeitos, a citação e o instrumento de mandato.

76Conforme Moacyr Amaral Santos, “se a petição inicial é despachada por quem não seja ou já não

seja juiz, nenhum vínculo processual se estabeleceu; se despachada por juiz absolutamente incompetente, defeituoso será o vínculo dela resultante. Se uma ou ambas as partes não têm capacidade de ser parte, isto é, não sejam sujeitos de direito, nenhuma relação jurídica se constituiu; se a uma ou ambas as partes faltar capacidade processual, a relação igualmente não se formará, por serem despidos os atos das mesmas de eficácia jurídica.”(in Primeira Linhas de Direito Processual Civil, 1º v., 5ª ed., p. 275).

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