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Como você gosta de tomar seu chá?

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 56-58)

As formas tornaram-se assunto candente não só para os fabricantes de bolas de futebol, mas também para os tomadores de chá da Inglaterra. Durante gerações nos contentamos com o simples quadrado, mas agora as xícaras estão inundadas de saquinhos de chá em forma de círculos, esferas e até pirâmides, na busca nacional de criar a suprema xícara de chá.

O saquinho de chá foi inventado por engano, no começo do século XX, por um comerciante de Nova York, Thomas Sullivan. Ele enviara aos clientes amostras de chá em pequenos sacos de seda, mas, em vez de tirar o chá do saquinho, os clientes presumiram que deviam pôr a embalagem inteira na água. Foi só na década de 1950 que os britânicos ficaram convencidos dessa mudança tão radical no hábito de tomar chá, mas hoje estima-se que mais de 100 milhões de saquinhos são mergulhados na água quente, no Reino Unido.

Durante anos, o confiável quadrado tem permitido que os tomadores de chá preparem uma xícara sem o aborrecimento de lavar as folhas usadas das chaleiras. O quadrado é uma forma muito eficiente — é fácil fazer saquinhos quadrados e não há desperdício de pedacinhos não

utilizados de matéria-prima. Durante cinquenta anos, a PG Tips, principal fabricante de saquinhos de chá, recortou bilhões de unidades em suas fábricas por todo o país.

Mas em 1989 sua principal concorrente, a Tetley, deu um passo ousado para conquistar o mercado, ao mudar o formato do saquinho de chá: introduziram os saquinhos circulares. Embora a mudança fosse pouco mais que uma jogada estética, funcionou. As vendas do novo formato explodiram. A PG Tips percebeu que teria de dar um passo além se quisesse conservar os clientes. O círculo podia ter entusiasmado os consumidores, mas ainda assim era uma figura plana, bidimensional. Então, a equipe da PG Tips resolveu dar um salto para a terceira dimensão.

A equipe da empresa sabia que somos um bando impaciente quando se trata de chá. Em média, o saquinho permanece na xícara por apenas vinte segundos antes de ser retirado. Se você abrir um saquinho bidimensional médio depois de ter ficado imerso apenas vinte segundos, descobrirá que o chá, no meio do saquinho, está completamente seco, não teve tempo de entrar em contato com a água. Os pesquisadores da PG Tips achavam que um saquinho tridimensional se comportaria como uma minichaleira, dando a todas as folhas a possibilidade de entrar em contato com a água. Chegaram a recrutar um especialista em termofluidos do Imperial College, da Universidade de Londres, para gerar modelos computadorizados a fim de confirmar sua crença no poder da terceira dimensão para melhorar o sabor do chá.

Aí veio o passo seguinte no desenvolvimento: qual seria o formato? Uma seleção de diferentes formas tridimensionais foi preparada para testes com os consumidores. Experimentaram saquinhos cilíndricos e outros que pareciam lanternas chinesas, bem como esferas perfeitas. A esfera é bem atraente porque, como bem sabe a bolha, é a forma tridimensional que, para um dado volume fechado, requer a mínima quantidade de material para fabricar o saquinho. Mas também é extremamente difícil de se fabricar, especialmente se você parte de uma lâmina plana de musselina — como qualquer um que já tenha tentado embrulhar uma bola de futebol como presente de Natal sabe muito bem.

Partindo de um pedaço plano de papel, as formas tridimensionais com faces planas eram as alternativas óbvias a considerar, e a PG Tips começou observando as formas que Platão e Arquimedes haviam descrito 2 mil anos antes. Como os fabricantes de artigos esportivos descobriram, a bola de futebol formada de pentágonos e hexágonos aproxima-se muito bem de uma esfera, mas foi a forma na outra ponta do espectro que começou a interessar os encarregados de desenvolver os saquinhos de chá. O tetraedro, de quatro lados, ou pirâmide de base triangular, engloba o volume mínimo para dada área superficial. Olhando positivamente, é a forma que requer o menor número de faces para ser feita (não há como juntar três faces planas para construir uma forma tridimensional).

A PG Tips, obviamente, estava atenta para não desperdiçar muito a matéria-prima do saquinho, de modo que o formato devia ser eficiente e ter um visual atraente. Além de tudo, como pretendiam abastecer uma nação que toma mais de 100 milhões de xícaras de chá por dia, devia ter um formato que pudesse ser produzido em ritmo acelerado: ninguém queria fábricas cheias de operários costurando quatro triângulozinhos para formar pirâmides. A grande sacada veio quando alguém surgiu com uma maneira extremamente bonita e elegante de fazer um saquinho de chá em forma de pirâmide.

Um tubo cilíndrico é costurado na base, enchido de chips e depois fechado no topo, na mesma direção. Mas veja o que acontece se em vez de fechar o topo na mesma direção que a base girarmos o saco em 90°, mantendo-o na vertical, e só aí costuramos. De repente, estamos segurando na mão um saco tetraédrico. O tetraedro tem seis arestas: duas onde foram feitas as costuras e quatro ligando cada extremidade à costura oposta. É uma maneira linda e eficiente de construir uma pirâmide. Substituindo o pacote de chips por um saquinho de chá fechado com esse giro, teremos saquinhos de chá piramidais. Não há desperdício de material, e uma máquina consegue recortar e costurar cerca de 2 mil unidades por minuto — mais que o suficiente para atender às necessidades de tomar chá do país. A máquina foi tão inovadora que entrou na lista das cem melhores patentes registradas no século XX.

Após quatro anos de desenvolvimento, o saquinho de chá em forma de pirâmide foi lançado em 1996. Não só se revelou eficiente, como os consumidores acharam que o formato dava uma sensação moderna, diferente. A nova campanha publicitária certamente constituiu uma mudança bem-vinda para a trupe de macaquinhos fantasiados que a empresa vinha usando havia anos para vender chá, e a PG Tips recuperou a liderança nas vendas de saquinhos de chá. Mas se o tetraedro trouxe à tona o sabor do chá, outro sólido platônico é o formato de algo muito mais sinistro.

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 56-58)

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