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Quem inventou o sudoku?

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 118-120)

O espírito do sudoku pode ser encontrado num quebra-cabeça que se desenvolveu a partir do fascínio dos matemáticos pelos quadrados mágicos. Pegue as cartas nobres (reis, damas e valetes) e os ases de um baralho comum e tente arrumá-las numa grade de 4 × 4 de modo que

nenhuma linha ou coluna tenha uma carta da mesma figura nem do mesmo naipe. O problema foi formulado pela primeira vez em 1694, pelo matemático francês Jacques Ozanam, que pode ser considerado o inventor do sudoku.

Outro matemático que certamente pegou essa comichão foi Leonhard Euler. Em 1779, poucos anos antes de morrer, Euler surgiu com uma diferente versão do problema. Pegue seis regimentos, com seis soldados em cada regimento. Cada regimento tem uniforme de uma cor: pode ser vermelho, azul, amarelo, verde, laranja e roxo. Os soldados de cada regimento têm diferentes escalões: digamos, um coronel, um major, um capitão, um tenente, um cabo e um soldado raso. O problema é distribuir os soldados numa grade 6 × 6 de modo que em cada coluna (ou cada linha) não se veja outro soldado do mesmo escalão ou do mesmo regimento. Euler apresentou a questão para uma grade 6 × 6 porque acreditava ser impossível arranjar satisfatoriamente os 36 soldados. Foi só em 1901 que o matemático amador francês Gaston Tarry provou que Euler estava certo.

Euler também acreditava que o quebra-cabeça era impossível de se resolver para grades 10 × 10, 14 × 14 e 18 × 18, e assim por diante, somando 4 a cada vez. Mas não era, conforme se descobriu. Em 1960, com o auxílio de um computador, três matemáticos mostraram que, na verdade, era possível distribuir dez escalões de soldados de dez regimentos diferentes numa grade 10 × 10, de uma forma que Euler julgava impossível. Eles foram adiante, negando totalmente o palpite de Euler, e mostrando que a grade 6 × 6 é a única em que tal distribuição é impossível.

Se você quiser tentar a versão 5 × 5 da charada de Euler, baixe o arquivo apropriado no site Num8er My5teries, recorte os cinco escalões em cinco regimentos e veja se consegue arranjá-los numa grade 5 × 5 de modo que em cada linha e em cada coluna não se veja um soldado do mesmo escalão nem do mesmo regimento. Esses quadrados mágicos às vezes são chamados de quadrados greco-latinos. Pegue as n primeiras letras do alfabeto grego e latino e escreva todos os n × n pares de letras latinas e gregas. Agora distribua esses pares numa grade n × n, de modo que cada linha ou cada coluna não contenha a mesma letra grega ou latina.

Vive ndo pe lo quadrado

Um dos quadrados greco-latinos 10 × 10 foi usado pelo romancista francês Georges Perec para estruturar seu livro de 1978, A vida: Modo de usar. A obra tem 99 capítulos, cada um correspondendo a um quarto num prédio de Paris que tem dez andares com dez apartamentos por andar (um quarto, o 66º, não é visitado). Cada quarto corresponde a uma posição num quadrado greco-latino 10 × 10. Mas, no quadrado de Perec, em vez de dez letras gregas e dez latinas, ele usa, por exemplo, vinte autores divididos em duas listas de dez.

Quando escrevia o capítulo para um quarto específico, olhava para ver quais eram os dois autores designados para esse quarto, assegurando-se de citar trechos de ambos os autores durante o capítulo. Para o Capítulo 50, por exemplo, o quadrado greco-latino de Perec lhe dizia para citar Gustave Flaubert e Italo Calvino. Mas não são apenas autores que figuram nesse esquema. Perec usou um total de 21 quadrados greco-latinos diferentes, cada um preenchido com dois jogos de itens que variavam de peças, mobílias, estilo artístico e período histórico até posições corporais adotadas pelos ocupantes de cada quarto.

O sudoku funciona de modo ligeiramente diferente da charada de Euler. Na forma clássica, é preciso distribuir nove grupos de números de 1 a 9 numa grade 9 × 9 de modo que o mesmo número não apareça mais de uma vez em cada linha, em cada coluna e em cada quadrante 3 ×

3. Já há alguns números colocados na grade, e você precisa preencher o resto. Não acredite em ninguém que diga que não é preciso matemática nenhuma para resolver esses quebra- cabeças. Quem diz isso acha que não há aritmética envolvida — o sudoku é uma charada lógica. O tipo de raciocínio lógico que leva você a decidir que o 3 precisa entrar no canto inferior direito é exatamente aquele envolvido na matemática.

Há algumas questões matemáticas interessantes relativas ao sudoku. Uma delas é a seguinte: quantas maneiras diferentes há para arranjar os números numa grade 9 × 9 de modo a satisfazer as regras do sudoku? (Mais uma vez, estamos falando de maneiras “essencialmente” diferentes: consideramos dois arranjos como um só quando há alguma simetria, como inverter o lugar das colunas, o que transforma uma na outra.) A resposta foi calculada em 2006 por Ed Russell e Frazer Jarvis, e resultou em 5.472.730.538 maneiras — o suficiente para dar material para a seção de passatempos dos jornais ainda por um longo período.

Outro problema matemático que surge a partir desses quebra-cabeças ainda não foi totalmente resolvido. Qual o número mínimo de quadradinhos que já precisam vir com um número no começo para que haja apenas uma só maneira de preencher os outros quadrados? Claro que se você tem muito poucos — digamos, três — números na grade, haverá muitas maneiras de completá-la, porque simplesmente não há informação suficiente para forçar uma solução única. Acredita-se que você necessite de pelo menos dezessete números para assegurar que haja apenas uma forma de completar a grade. Essas questões são mais que charadas de recreação. A matemática subjacente ao sudoku tem importantes implicações para os códigos de correção de erros que iremos ver no próximo capítulo.

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 118-120)

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