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Onde em Paris se pode ver um cubo quadridimensional?

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 79-83)

François Mitterrand, encarregou o arquiteto dinamarquês Johann Otto von Spreckelsen de construir alguma coisa especial em La Défense, o distrito financeiro de Paris. A construção se alinharia com diversas outras edificações significativas da cidade — o Louvre, o Arco do Triunfo e o obelisco Egípcio —, naquilo que se tornou agora a perspectiva de Mitterrand.

O arquiteto com certeza não decepcionou. Construiu um enorme arco, chamado La Grande Arche, tão grande que as torres de Notre-Dame poderiam passar pelo meio dele, e pesa estarrecedoras 300 mil toneladas. Infelizmente, Von Spreckelsen morreu dois anos antes de o arco ser completado. Essa tornou-se uma construção icônica de Paris, mas talvez o que os parisienses que a veem todo dia não saibam é que aquilo que Von Spreckelsen construiu é um cubo quadridimensional no coração da capital francesa.

Bem, não é efetivamente um cubo quadridimensional porque vivemos num universo tridimensional. Mas assim como os artistas da Renascença foram confrontados com o desafio de pintar figuras tridimensionais em telas bidimensionais, o arquiteto em La Défense captou a sombra do cubo quadridimensional no nosso universo tridimensional. Para criar a ilusão de ver um cubo tridimensional olhando para uma tela bidimensional, o artista podia desenhar um quadrado dentro de um quadrado maior e juntar os cantos dos quadrados para completar a figura de um cubo. Claro que não é um cubo de verdade, mas fornece ao espectador informação suficiente: podemos ver todas as arestas e visualizar o cubo. Von Spreckelsen usou a mesma ideia para construir a projeção de um cubo quadridimensional na Paris tridimensional, consistindo em um cubo situado dentro de um cubo maior com as arestas juntando os vértices do cubo menor e do maior. Se você visitar La Grande Arche e contar com cuidado, poderá ver as 32 arestas que identificamos na seção anterior usando as coordenadas de Descartes.

FIGURA 2.36: La Grande Arche, em Paris, é a sombra de um cubo quadridimensional.

Toda vez que visito La Grande Arche, em La Défense, é sinistro que sempre haja um vento uivando que parece nos sugar pelo centro do arco. Esse vento se tornou tão sério que os projetistas tiveram de erigir um dossel no coração do arco para interromper o fluxo de ar. É como se, ao construir a sombra de um hipercubo em Paris, tivesse se aberto um portal para outra dimensão.

Há outras maneiras de ter a sensação do cubo quadridimensional no nosso mundo tridimensional. Pense em como você faria um cubo tridimensional a partir de um pedaço de cartolina bidimensional. Primeiro você desenha seis quadrados ligados em forma de cruz, um quadrado para cada face do cubo. Então você dobra o desenho para formar o cubo. O desenho na cartolina bidimensional chama-se “malha” da forma tridimensional. De maneira similar, é possível no nosso mundo tridimensional construir uma malha tridimensional que, se houvesse uma quarta dimensão, pudesse ser dobrada de modo a formar um cubo quadridimensional.

Você pode se propor a fazer um cubo quadridimensional recortando e juntando oito cubos. Eles serão as “faces” do seu cubo quadridimensional. Para fazer a malha do cubo quadridimensional, você precisa juntar esses oito cubos. Comece por colar os primeiros quatro numa coluna, um em cima do outro. Depois, pegue os quatro restantes e cole-os nas quatro faces de um dos quatro cubos na coluna. O seu hipercubo não montado deve ter agora a aparência de duas cruzes que se interceptam, como na Figura 2.37.

FIGURA 2.37: Como fazer um cubo quadridimensional a partir de oito cubos tridimensionais.

Para dobrar essa coisa, você teria de começar grudando os cubos da base e do topo da coluna. O passo seguinte seria colar as faces quadradas externas de dois dos cubos grudados em lados opostos da coluna ao tubo inferior da coluna. Então, finalmente, você precisaria grudar as faces dos outros dois cubos laterais às faces restantes do cubo inferior. O problema, naturalmente, é que mal você começa a colar, a coisa fica emaranhada, pois simplesmente não há espaço para tudo no nosso mundo tridimensional. Você necessita de uma quarta dimensão na qual possa fazer as dobraduras como descrevi.

Assim como o arquiteto em Paris foi inspirado pela sombra do cubo quadridimensional, o artista Salvador Dalí ficou intrigado por esse hipercubo não dobrado. Em seu quadro A

crucificação (Corpus Hypercubus), Dalí retrata Cristo crucificado na malha tridimensional do

cubo quadridimensional. Para o pintor, a ideia da quarta dimensão como algo além do nosso mundo material ressoava o mundo espiritual além do nosso universo físico. Seu hipercubo não dobrado consiste em duas cruzes que se interceptam, e a figura sugere que a ascensão de Cristo ao céu está relacionada à tentativa de dobrar essa estrutura tridimensional numa quarta dimensão, transcendendo a realidade física.

Por mais que tentemos retratar essas formas quadridimensionais em nosso universo tridimensional, elas nunca podem nos dar uma figura completa, assim como a sombra ou silhueta no mundo bidimensional pode nos dar apenas uma informação parcial. Quando movemos e viramos o objeto, a sombra muda, mas nós nunca vemos tudo. Esse tema foi colhido pelo romancista Alex Garland no livro O tesseracto, outro nome do cubo quadridimensional. A narrativa descreve visões de diferentes personagens acerca da história central, que se passa no submundo da bandidagem em Manila. Nenhuma narrativa isolada fornece um quadro completo, mas, juntando todas as vozes — da mesma maneira que olhar as muitas sombras diferentes projetadas por uma forma —, você começa a entender a história. Mas a quarta dimensão não é importante apenas para construir estruturas, pinturas e narrativas. Ela pode ser também a chave para o formato do próprio Universo.

No documento Os Misterios Dos Numeros - Marcus Du Sautoy (páginas 79-83)

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