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CORDEIRO, Luciano Mirandela, 1844 – Lisboa,

No documento Dicionário (páginas 67-71)

Luciano Baptista Cordeiro de Sousa foi jornalis- ta, escritor, político, fundador e secretário per- pétuo da Sociedade de Geografia de Lisboa (Fig. 1). Ocupando diversos cargos públicos ao longo da sua vida, destacou -se como grande defensor dos interesses portugueses nas colónias ultra- marinas e esteve envolvido em importantes questões da sua época na área do património e da museologia.

Após a conclusão do Curso Superior de Letras, iniciaria em 1867 a sua carreira no jornalismo, vindo a assumir a direção do jornal A Revolução de Setembro apenas dois anos volvidos, cargo deixado vago por António Rodrigues Sampaio, entretanto chamado a desempenhar funções governativas. Luciano ocuparia pouco tempo essa função, continuando no entanto como reda- tor do jornal por mais alguns anos. Os diversos artigos que escreveu e publicou em folhetins n’A Revolução no âmbito da crítica de arte foram reu- nidos em dois volumes: o Livro de Crítica: Arte e Literatura Portugueza d’Hoje, de 1869, e o Segundo Livro de Crítica – Livros, Quadro e Palcos, publicado em 1871. O tom mordaz de Luciano relativamen- te ao panorama artístico português da época é constante e bem exemplificado num texto incluí- do no segundo volume, quando, referindo -se às exposições realizadas pela Sociedade Promoto- ra de Belas -Artes, afirma que em Portugal não existia o salon, mas sim a baraque, “e ainda bem que a temos, que nem eu sei como nesta época de economias, não se lembrou o ministério do reino de economizar o armazém onde vegeta a Academia de Belas Artes, mandando pendurar

os quadros nos postos dos telégrafos” (Cordei- ro, 1871, 5). Durante a década de 1870 Luciano deu especial atenção à crítica e à história de arte, interesse esse que se manifestou em mais duas publicações: Thesouros d’Arte, 1875 e Da Arte Nacional, 1876. A crítica severa mantém -se,

fazendo referência, em Thesouros d’Arte, ao “esta- do d’anemia artística do paiz” (apud Leandro, 2007, 17), salientando a desconsideração que a sociedade portuguesa manifestava pela arte, fazendo também, em Da Arte Nacional, um ataque à excessiva influência que a arte francesa exercia na arte portuguesa, afirmando que “temos uma arte: é franceza, ou antes uma arte francelha, que ou veste umas gallas convencionaes e fidalgas, e se diz académica (…) ou então não veste cousa alguma” (Cordeiro, 1876, 20).

O ano de 1875 será de especial importância na vida de Luciano: é um dos fundadores da Socie- FIG. 1 Luciano Cordeiro (1844 –1900), s. d. Imagem disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Luciano_ Cordeiro©

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de Promotora de Belas -Artes. Sousa Holstein apresentaria à comissão um relatório, redigido por iniciativa própria, intitulado de Observa‑ ções sobre o actual estado do ensino das artes em Portugal, a organisação dos museus e o serviço dos monumentos históricos e da arqueologia. Aí pro- punha, quanto à questão do museu nacional, o aproveitamento de uma construção já existente na capital para a instalação do museu em detri- mento de uma construção de raiz, indo assim de encontro às recomendações governamentais da maior contenção económica possível no pro- dade de Geografia de Lisboa (SGL), em conjunto

com Emílio Augusto Cardoso, Cândido Figuei- redo e Rodrigo Afonso Pequito, e participa na comissão nomeada por decreto governamental, na qualidade de secretário e relator, encarregada de apresentar propostas para a reforma do ensi- no artístico, para criação de um museu nacional e definição de medidas para conservação dos monumentos históricos e objetos arqueológicos.

A Sociedade de Geografia corporizou à data, sobretudo na pessoa de Luciano, um movimento de defesa e de estudo das colónias ultramarinas portuguesas, por esses anos sob forte cobiça das outras potências europeias colonizadoras, sendo também de destacar a criação do seu museu associado. O museu foi aberto ao público em 1884, com o intuito de que fosse crescendo “pela colheita directamente obtida e pelo depósito com que quaisquer pessoas nos queiram honrar de objectos dignos de figurar nele”, como é referido numa circular dirigida ao sócios, datada de 15 de fevereiro desse ano (apud Aires -Barros 2015, 9). Em 1892, o Estado decidiu incorporar no Museu da SGL as coleções do Museu Colonial de Lis- boa, à data tutelado pela Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Ultramar, emergin- do dessa fusão o Museu Colonial e Etnográfico da SGL. Em 1897 é decidida a mudança de ins- talações da Sociedade para o edifício que ainda é hoje a sua sede, na Rua das Portas de Santo Antão. O projeto de obras de reabilitação e adap- tação do edifício foi realizado pelo arquiteto José Luís Monteiro, que contou com a estreita colabo- ração de Luciano em todo o processo. A Luciano coube também a responsabilidade da distribui- ção das coleções pelas três galerias da Sala Por- tugal (Cantinho, 2005, 523) (Fig. 2).

Relativamente à comissão nomeada por decreto governamental, há que destacar, do vasto conjunto de personalidades que a cons- tituía, o papel do marquês de Sousa Holstein (1838 -1878), à data vice -inspector da Acade- mia de Belas -Artes e presidente da Socieda-

FIG. 2 Sociedade de Geografia de Lisboa, Sala de Portugal, ant. 1910. © Arquivo Municipal de Lisboa/CML. Fotografia de Paulo Guedes (1886 ‑1947).

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Importa ainda salientar o importante papel de Luciano, primeiro enquanto impulsionador, juntamente com Marcelino Ribeiro Barbosa, e depois como diretor -geral, na realização, em 1879, da Exposição Portuguesa no Rio de Janei- ro, no edifício da Tipografia Nacional, promovi- da pela Companhia Fomentadora das Indústrias e Agricultura de Portugal e suas Colónias. Foi da sua responsabilidade a elaboração do programa e regulamento da exposição, que pretendia pro- mover no Brasil o que de melhor se fazia em Por- tugal ao nível da agricultura, indústria e artes, assim como a definição das categorias de objetos a serem admitidos. Por último, releva mencio- nar o parecer elaborado por Luciano, enquanto vice -presidente da Comissão dos Monumentos Nacionais, acerca do projeto de conclusão de obras do Mosteiro dos Jerónimos, que tinha o intuito de colocar término às obras de restauro que se prolongavam há muito, tendo em vista também as comemorações do IV centenário da chegada de Vasco da Gama à Índia, que se realizariam em 1898. O parecer materializar- -se -ia numa publicação intitulada As Obras dos Jeronymos: parecer apresentado à Commissão dos Monumentos Nacionaes, datada de 1895. Neste, Luciano criticava as obras que se vinham a rea- lizar ao longo dos anos e apresenta uma série de recomendações que acabaram por não ser consideradas pelos responsáveis governativos. Luciano faleceria em Lisboa, a 24 de dezembro de 1900.

BIBLIOGRAFIA

AIRES -BARROS, Luís. 2015. “Os 140 Anos da Sociedade de Geografia de Lisboa”. Aires -Barros, Luís; Cantinho, Manuela. Sociedade de Geografia de Lisboa 1875 ‑2015: 140 anos. Lisboa: Sociedade de Geografia de Lisboa: 5 -18. BAIÃO, Joana. 2009. “Museus de Museus”. Uma reflexão.

Proposta para uma definição. Dissertação de Mestrado em Museologia, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa.

CANTINHO, Manuela. 2005. O Museu Etnográfico da Socie‑ dade de Geografia de Lisboa: Modernidade, Colonização e

cesso. Para enquadrar esta tomada de posição não se poderão descurar as graves dificulda- des financeiras em que se encontrava o tesouro público à data. O relatório de Sousa Holstein foi muito bem recebido e elogiado pelos seus pares, chegando mesmo Luciano, enquanto secretário da comissão, a pedir ao Governo que se man- dasse fazer uma tiragem de 4000 exemplares do opúsculo, apelando também aos redatores dos jornais que publicassem uma apreciação do mesmo nas suas páginas (Xavier, 2014, 287- -288). Não será, portanto, de estranhar que o relatório final da comissão, redigido por Lucia- no e entregue ao ministro e secretário de Esta- do dos Negócios do Reino, fosse na sua essência uma síntese das ideias apresentadas por Sousa Holstein nas suas Observações, somando -lhe uma proposta concreta de criação de um Museu Nacional de Arte e Indústria e as atas das reu- niões da comissão em que foram discutidas as várias possibilidades da instalação do mesmo. Entre elas figuraram, pela seguinte ordem, uma ala do Mosteiro dos Jerónimos, o Convento da Estrela, o Palácio do Marquês da Ribeira Gran- de e o Palácio dos Patriarcas, chegando -se a uma proposta final de instalação do museu no Palácio do Marquês de Abrantes, em Santos. No entanto, a legação de França, que ocupava o palácio desde 1870, não se mostrou interes- sada na rescisão do contrato, acabando por não se concretizar por isso a proposta apresentada pela comissão. A solução para o problema da inexistência de um museu nacional, que em muito envergonhava o país, só seria resolvida anos mais tarde, em 1884, já após a morte de Sousa Holstein e com Delfim Guedes a suceder- -lhe no cargo de vice -inspector da Academia. Foi decidido que o museu nacional se instala- ria em definitivo no Palácio Alvor, já não como Museu Nacional de Arte e Indústria, como tinha sido projetado pela comissão, mas antes com a designação de Museu Nacional de Belas -Artes e Arqueologia.

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ANDRÉ LOPES MARES (Setúbal, 1992) Licenciado em Pintu‑

ra pela Faculdade de Belas ‑Artes da Universidade de Lisboa (2014). No âmbito da prática artística participou em diversas exposições de artes plásticas. Atualmente frequenta o mestra‑ do de Museologia na Faculdade de Ciências Socias e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Alteridade. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian/Fun- dação para a Ciência e a Tecnologia.

CANTINHO, Manuela. 2015. “O Espólio Cultural da Socie- dade de Geografia de Lisboa: a Biblioteca, a Cartoteca, a Fototeca e o Museu Etnográfico e Histórico”. Sociedade de Geografia de Lisboa 1875 ‑2015: 140 anos. Lisboa: Socie- dade de Geografia de Lisboa.

CANTINHO, Manuela. 2015. Sociedade de Geografia de Lis‑ boa 1875 ‑2015: 140 anos. Lisboa: Sociedade de Geografia de Lisboa: 19 -30.

CORDEIRO, Luciano. 1871. Segundo Livro de Crítica: Arte e Literatura Portugueza d’Hoje – Livros, Quadros e Palcos. Porto: Typographia Lusitana.

CORDEIRO, Luciano. 1876. Da Arte Nacional. Lisboa: Typo- graphia do Jornal O Paiz.

LEANDRO, Sandra. 2007. “Teoria e Crítica de Arte em Portugal no final do século XIX…”. Leandro, Sandra (coord.). Seminários de Estudos de Arte: Estados da Forma I. Évora: CHAIA: 13 -43.

NETO, Maria João. 2014. “A Exposição Portuguesa no Rio de Janeiro em 1879, Ecos de um Diálogo entre Arte e Indústria”. Valle, Arthur; Dazzi, Camila; Portella, Isabel (Orgs.) – Oitocentos: Intercâmbios Culturais entre Brasil e Portugal, Tomo III. Rio de Janeiro: CEFET/RJ: 357 -370. XAVIER, Hugo. 2014. O Marquês de Sousa Holstein e a for‑ mação da Galeria Nacional de Pintura da Academia de Belas Artes de Lisboa. Tese de Doutoramento em História da Arte, especialização em Museologia e Património Artís- tico, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Univer- sidade Nova de Lisboa.

[A.L.M.]

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CORREIA, António Mendes

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