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JORGE, Artur Ricardo Lisboa, 1886 ‑Lisboa,

No documento Dicionário (páginas 154-157)

Artur Ricardo Jorge, filho do higienista Ricar- do Jorge, foi diretor do Museu Bocage – Secção Zoológica e Antropológica do Museu Nacional de História Natural da Universidade de Lisboa entre 1927 e 1956 (Fig. 1). Foi Ministro da Ins- trução Pública durante um curto período, em 1926. Enquanto naturalista, publicou sobre botâ- nica e invertebrados marinhos. Presidiu o Con- gresso Internacional de Zoologia, em 1935, em Lisboa, e coordenou a Sala do Museu Bocage na Secção Colonial da Exposição do Mundo Portu-

guês, em 1940 (Fig. 2). Este museu zoológico e antropológico era, na altura, um estabelecimento anexo da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e herdeiro da organização interna da Secção Zoológica do Museu Nacional de Lisboa, criado em 1862, e sito na Escola Politécnica de Lisboa. Tradicionalmente um museu essencial- mente dedicado à investigação, as coleções ser- viam em paralelo o ensino das ciências naturais. Com a direção de Artur Ricardo Jorge, a vertente pública e de didática alargada a um público mais vasto ganhou pela primeira vez visibilidade.

Enquanto diretor, Jorge dedicou -se ao apro- fundamento da questão museológica específica dos museus de História Natural e planeou obras de reestruturação das salas do museu. De acor- do com a documentação existente no Arquivo Histórico dos Museus da Universidade de Lis- boa, Jorge modificou a estrutura e a organiza- ção das salas e dos espaços dedicados à Zoologia no 2.º piso do edifício da Faculdade de Ciências. No plano para o museu, não inteiramente rea- lizado, todo o lado nascente seria aberto de modo a constituir uma só galeria pública, com mezanino, permitindo uma circulação muito mais fácil dos visitantes. Alguns dos espaços viram as suas funções alteradas, a biblioteca mudou de lugar, escadarias foram transforma- das em escadas em caracol, ocupando menos espaço para dar mais lugar aos visitantes. Deste modo, foi dada expressão pela primeira vez a uma maior preocupação com a didática introdu- zindo na planificação um corredor de dioramas. Estes dioramas, em uso nos museus de Histó- ria Natural americanos e europeus desde o final do século XIX, nunca chegaram a ser postos em prática em Portugal, embora vitrines com “gru- pos biológicos” tenham tido lugar na exposição pública do museu durante o século XX. Jorge foi um dos primeiros a escrever em Portugal sobre a importância da separação, nos museus de His- tória Natural, entre as coleções científicas e as coleções públicas.

FIG. 1 Artur Ricardo Jorge (1886 ‑1975). Imagem disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Artur_ Ricardo_Jorge#/media/File:Artur_Ricardo_Jorge.jpg ©

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explicativos e de grupos biológicos (dioramas). Menciona ainda a importância da iluminação artificial das coleções públicas, para que os museus possam estar abertos à noite, o que, para além de chegar mais facilmente às “clas- ses trabalhadoras” tem a vantagem de trazer um “belíssimo efeito”. Descreve a vantagem de repensar as etiquetas e os textos explicativos, que considera deverem ser “concisos e despro- vidos de termos técnicos e de todo o pedantis- mo científico, para não se tornarem fatigantes e incompreensíveis”. Em suma, na sua opinião, “a colecção de exposição deve excitar a curiosida- de e enriquecer os conhecimentos do público na medida da sua inteligência, da sua compreensão e da sua instrução” (Jorge, 1941).

Apesar do seu esforço, durante os anos 1930, em transformar o museu de Lisboa numa moder- Em 1952, a sua oração de sapiência na Uni-

versidade de Lisboa, teve o título A dupla mis‑ são – científica e cultural – dos museus de história natural à luz da biologia e museologia modernas. Esta sua tese, baseada no exemplo de outros museus de História Natural que visitou, tinha sido já ensaiada numa versão anterior, em 1941, na sessão de abertura do I Congresso Nacional de Ciências Naturais, o que demonstra a impor- tância que deu ao tema da separação das duas funções, a científica e a didática, ou expositi- va, destes museus (Jorge, 1941; Jorge, 1952). O texto traduz as suas preocupações com o equi- líbrio entre a seriedade da investigação com as coleções científicas e a eficácia de uma exposi- ção zoológica pensada para o grande público, reiterando as suas ideias acerca da didática das exposições e defendendo o uso de modelos

FIG. 2 Aspecto geral da “Sala do Museu Bocage” no Pavilhão da Caça e Turismo, na Exposição do Mundo Português, Lisboa, 1940. © Arquivo Histórico dos Museus da Universidade de Lisboa, Arquivo Museu Bocage.

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do Jorge se preocupou com o aspeto simbólico e emotivo de uma exposição zoológica, anteci- pando o discurso actual dos museus de História Natural.

BIBLIOGRAFIA

ALMAÇA, Carlos. 2000. Museu Bocage. Ensino e Exibição. Lisboa: Museu Bocage.

ALMAÇA, Carlos. 2001. “Artur Ricardo Jorge (1886 -1972). Reorganização científica e pedagógica do Museu Boca- ge”. Simões, Ana (Coord.). Memórias de professores cien‑ tistas. Lisboa: Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, 26 -33.

JORGE, Artur Ricardo. 1941. “Museus de História Natural”. Arquivos do Museu Bocage, 12: 79 -112.

JORGE, Artur Ricardo. 1942. “A Sala do Museu Bocage na Exposição do Mundo Português Lisboa, 1940”. Separata dos Arquivos do Museu Bocage, 13: 87 -118.

JORGE, Artur Ricardo. 1952. “A dupla missão, científica e cultural, dos museus de história natural, à luz da bio- logia e da museologia modernas. Oração de Sapiência, proferida na abertura solene da Universidade Clássi- ca de Lisboa, em 16 de Outubro de 1952”. Separata dos Arquivos do Museu Bocage, 23: 1 -21.

NUNES, Maria de Fátima. 2016. “Ciência e cultura, cole- ções e museus: olhares sobre um «Portugal e a cultura Europeia», no século XX...”. Revista de História das Ideias, 34: 267 -286.

[C.M.]

CATARINA  MADRUGA CIUHCT / Universidade de Lisboa

Catarina Madruga trabalha desde 2001 em colaboração com vários museus e exposições de Lisboa com coleções artísti‑ cas e científicas. Completou em 2006 uma pós ‑graduação em Museologia, pelo ISCTE, e em 2013 um mestrado em História e Filosofia das Ciências, pela FCUL. Desde 2007 que tem vindo a apresentar publicamente investigação sobre museus e cole‑ ções de História Natural (zoologia) no século  XIX, nomeada‑ mente nos aspetos que dizem respeito às práticas de coleção, investigação e exibição, e nos valores culturais, políticos e sim‑ bólicos que lhes estão associados. Atualmente, termina uma tese de doutoramento em História e Filosofia das Ciências na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

na exposição de História Natural, o tamanho reduzido do orçamento e do pessoal do museu não lhe permitiu avançar tão rápido quanto desejava a exibição pública das suas coleções. Não obstante, em 1940, Jorge concebeu e apre- sentou ao público da Secção Colonial da Expo- sição do Mundo Português, a Sala do Museu Bocage. Embora de reduzidas dimensões, esta sala pretendeu ser uma prefiguração de como Jorge pensava reformar o Museu Bocage, usan- do grande impacto visual na exposição pública de espécimes. Nesta sala, um impressionante Peixe -lua dominava o estrado central, repleto de animais de todos os grupos biológicos. Nas paredes apareciam pintados os territórios ultra- marinos do império português e, representando a sua apropriação científica, os nomes de natu- ralistas que em Lisboa e no terreno contribuíram para o desenvolvimento das coleções zoológicas. Em duas das vitrines, expunham -se livros raros “abertos em páginas ilustradas”. A iluminação foi cuidadosamente planeada, uma das vitrines era retro -iluminada de modo a mostrar com toda a eficácia espécimes “diafanizados”, isto é, imersos numa solução química que deixa ver o seu interior, para além da pele e dos músculos, destacando o esqueleto. A vitrine que continha esqueletos montados tinha o fundo pintado de preto, criando alto contraste com o branco das preparações osteológicas. Uma vitrina contin- ha apenas coloridos colibris do Brasil, monta- dos “simulando o voo”, e outra uma coleção de moluscos e equinodermes expostos “sobre um leito de areia fina” (Jorge, 1942). O detalhe e a preocupação de carácter estético que foram conferidos a esta sala de exposição temporária consubstanciam aquilo que Jorge defendia nos seus textos para a modernização do museu de História Natural.

A estratégia expositiva usada na sala de 1940, os planos de renovação do Museu Bocage e os seus ensaios sobre museologia da História Natural permitem -nos afirmar que Artur Ricar-

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