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MACEDO, Manuel de Verride [Montemor ‑o ‑Velho], 1839 – Lisboa,

No documento Dicionário (páginas 194-198)

Manuel Maria de Macedo Pereira Coutinho Vas- ques da Cunha Portugal e Menezes nasceu a 10 de Maio de 1839 (AUC, 1839), no seio de uma

família de “estirpe ilustre” (Macedo, 1898, 757), tendo beneficiado de uma precoce e determi- nante formação artística. As profundas altera- ções registadas durante o Liberalismo teriam um forte impacto na vida de Macedo que, vendo -se “sem um real” (Macedo, 1898, 757), optaria por seguir a sua vocação, dedicando -se “incondicio- nalmente” (Macedo, 1898, 757) à criação artísti- ca e, especificamente, ao desenho. Assim, a partir do ano de 1857, o jovem aspirante estudaria com Tomás da Anunciação (1818 -1879) antes de par- tir para o Porto, cidade na qual daria continuida- de à sua formação com Francisco José Resende (1825 -1893), com os irmãos Correia, Guilherme António (1829 -1901) e João António (1822 -1896), além de Francisco Pinto da Costa (1826 -1869) e do aguarelista Alfred Howell (c. 1799 -1875).

A sua formação, dedicação e indiscutível talen- to fizeram de Macedo um desenhador digno de nota, particularmente enquanto retratista e caricaturista de gentes e costumes, um artista atento, minucioso e inteligente, “um pensador” (Chagas, 1872, 4) cujas ilustrações, frequente- mente de tipos populares, animaram assidua- mente os principais periódicos e publicações da época. O seu trabalho de ilustrador capta- ria, inclusivamente, a atenção de D. Fernando II (1816 -1885), cliente de um dos seus álbuns de desenhos (Diversas noticias, 1872) (Fig. 1). No entanto, antes desta intensa incursão pela ilustração ao longo dos anos 1870, Macedo

reinventou -se, apresentando -se como cenógrafo, cujos trabalhos lhe valeriam o reconhecimento como o “primeiro scenographo do seu tempo” (Artur, 1903, 21).

Na sequência de uma doença oftalmológica grave, o eminente artista seria convidado para desempenhar o cargo de conservador do Museu Nacional de Belas Artes e Arqueologia (Mace- do, 1898, 758). Macedo seria, então, o primeiro conservador da instituição inaugurada em 1884, um cargo que desempenhará diligentemente até às vésperas da sua morte, no ano de 1915 (AMNAA 1915, 428) (Fig. 2). Além de conserva- dor, Macedo terá atuado como diretor -interino, substituindo José de Figueiredo (1871 -1937) quando este se ausentava por doença ou no âmbito de comissões de serviço (AMNAA, 1911, 19; AMNAA, 1914, 193; AMNAA, 1915, 383), um aspeto que atesta claramente a sua importância no seio da instituição.

FIG. 1 Capa d’ Occidente, N.º 116, 11 de março de 1882.

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Enquanto conservador, Macedo contactou diretamente com as consequências patrimoniais dos processos de extinção das ordens religiosas femininas e da Lei da Separação do Estado das Igrejas, tendo sido frequentemente convocado para desempenhar a função de perito no contex- to do primeiro (Mariz, 2017). Cabendo -lhe, neste âmbito, o exame e escolha de peças dignas de musealização ou depósito no museu da Acade- mia Real de Belas Artes, Macedo desempenhou um papel importante na formação e desenvol- vimento dos acervos da instituição ao longo da década de 1880, sendo interessante constatar que considerava o museu o “verdadeiro logar” (ANTT, 1886) de obras com valor artístico.

Os primeiros verbetes de algumas das cole- ções do atual Museu Nacional de Arte Antiga terão sido elaborados por Macedo. Este trabalho realizado a partir do dito “inventário antigo” do

museu, terá incidido não só na coleção de pin- tura, mas também nos acervos de miniatura e desenhos da Sala Sequeira (AMNAA, Pintu- ra – Verbetes; Miniatura – Verbetes; Verbetes de desenhos da Sala Sequeira). Estes regis- tos manuscritos, não obstante o seu carácter obrigatoriamente conciso, revelam conside- rável minúcia do autor, incluindo números de inventário, informações relativas à origem, cronologia, medidas, proveniências e breves descrições, designando, pontualmente, auto- rias e materiais. A propósito destes verbetes, cuja finalidade seria, possivelmente, a organi- zação de um inventário, note -se que a elabo- ração de catálogos precederia a inventariação geral, tanto no caso da pintura, tipologia à qual foi dada manifesta primazia, como da cerâmi- ca, escultura, ourivesaria ou têxteis, além do mobiliário e joalharia, duas áreas para as quais a colaboração de peritos foi considerada impor- tante (AMNAA, 1907, 20).

Entre os mais relevantes contributos de Mace- do para o conhecimento, conservação e valo- rização dos acervos do museu, encontra -se um catálogo de pintura organizado por salas, traba- lho possivelmente encetado nos primeiros anos da década de 10 de Novecentos com José Queiroz (1856 -1920) (AMNAA, Catálogo organizado por salas do MNBA). No entanto, apesar do interes- sante conteúdo da introdução a este catálogo, pensado como forma de divulgar a história do museu, o processo construtivo e estado atual do conhecimento acerca da galeria de pintu- ra, esta tentativa de “melhorar quanto possível” (AMNAA, Museu Nacional de Arte Antiga, Pin- tura) edições anteriores só seria divulgada após a morte do conservador (Macedo, 1942). Ainda assim, este estudo revela uma manifesta preocu- pação com a elaboração de um trabalho pedagó- gico e a familiaridade de Macedo com a realidade internacional. Aqui se frisa que, “Perfilhando o alvitre hoje adoptado nos principais museus estrangeiros” (AMNAA, Museu Nacional de Arte FIG. 2 O Antonio Maria, N.º 264, 19 de junho de 1884.

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Tendo dedicado toda uma vida à Arte, à sua produção, proteção e valorização, Macedo seria recordado como um homem que “Só falava do passado – a proposito de tudo. Era um d’estes homens metidos dentro dos livros, dos albuns, das molduras do museu – e que só vêem a vida atravez dos pergaminhos e das telas des- botadas.” (A. de C., 1915, 1). Conservador do mais importante dos museus portugueses num período embrionário das práticas museológicas nacionais durante o qual a formação dos respon- sáveis pelas coleções se limitava à prática pau- latinamente adquirida, Manuel de Macedo terá exercido as suas funções com manifesta com- petência. A sua formação artística, olhar atento e apurada capacidade de análise visual, aliados a uma curiosidade natural e erudição estimula- das e enriquecidas pelo contacto direto com um variadíssimo universo de obras de arte, fizeram de Macedo uma figura indiscutivelmente rele- vante dos primordiais processos de construção, organização, estudo e divulgação dos acervos do atual Museu Nacional de Arte Antiga.

BIBLIOGRAFIA

A. de C.1915. “Palavras leva -as o vento. Manuel de Mace- do”. O Século, 20 de outubro de 1915: 1.

ARTUR, Bartolomeu Ribeiro. 1903. Arte e artistas contem‑ poraneos. Lisboa: Livraria Moderna. Vol. 3.

CHAGAS, Pinheiro. 1872. “Um typo do Macadam”. Artes e Letras, Janeiro de 1872: 4.

“DIVERSAS Noticias”. 1872. Artes e Letras, maio de 1872: 79.

MACEDO, Manuel de. 1885. Restauração de quadros e gravu‑ ras. Lisboa: David Corazzi Editor.

1898. [Sem título]. Sousa Bastos, Carteira do artista. Apontamentos para a historia do theatro portuguez e brazi‑ leiro. Acompanhados de noticias sobre os principaes artistas, escriptores dramaticos e compositores estrangeiros. Lisboa: Antiga Casa Bertrand – José Bastos: 757 -758.

1892. O Muzeu Nacional de Bellas Artes. Apontamentos. Coim- bra: Imprensa da Universidade.

1942. “Introdução de Manuel de Macedo a um catálogo, não publicado, da galeria de pintura”. Boletim do Museu Nacional de Arte Antiga, fascículo 3, vol. I: 117 -130. MARIZ, Vera. 2017. “Is it museum -worthy? Manuel de

Macedo’s activity as an art expert within the suppres- sion of religious orders”. Menezes, Marluci, et al., ed.,

Antiga, Pintura), a publicação incidiria apenas sobre as principais obras, caso dos painéis de pintura quinhentista portuguesa, temática cujo estado da questão é então sumária, mas rigoro- samente apresentado por um conservador que viria a integrar a Comissão de Inventário e Bene- ficiação da Pintura Antiga em Portugal (ANTT 1910). De resto, a atenção concedida às grandes discussões internacionais histórico -artísticas, bem como a sua divulgação em Portugal, serão salutares constantes na carreira de Macedo, um aspeto observável em uma série de artigos publi- cados na revista Arte Portugueza, na qual discu- te ideias de William Morris (1834 -1896) e John Ruskin (1819 -1900), ou mobiliário inglês (Pin- -Sel, 1896; Pin -Sel, 1895).

A divulgação das colecções do Museu Nacio- nal de Belas Artes foi uma das principais mis- sões assumidas por Macedo, conservador que considerava tão curioso como preocupante “a ausencia total de senso artistico que se encon- tra por quasi todo o paiz” (ANTT, 1886). Assim o atesta não só o dito catálogo, cuja publicação não se concretizaria em vida, mas também uma comunicação apresentada no Congresso Pedagógi‑ co Hispano ‑Portuguez ‑Americano (Macedo, 1892). Esta disseminação seria invariavelmente movida por uma manifesta intenção de contribuir para a educação artística nacional. Assim o indicia a colaboração com a Biblioteca do Povo e das Escolas, coleção para a qual escreve o conhecido manual acerca da Restauração de quadros e gravuras (Mace- do 1885), obra didática na qual compila ensina- mentos de tratados reconhecidamente válidos. Igualmente ilustrativos desta preocupação são os artigos publicados na revista Arte Portugueza, sob o pseudónimo Pin -Sel, podendo destacar o estu- do ilustrado dedicado às faianças portuguesas do Museu Nacional de Belas Artes (Pin -Sel, 1895). Finalmente, ainda a propósito desta declarada entrega à educação nacional, registe -se a sua atuação como professor de desenho do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa.

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VERA  MARIZ (1987, Lisboa) é atualmente bolseira de pós‑

‑doutoramento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), no ARTIS – Instituto de História da Arte da Universida‑ de de Lisboa. Neste enquadramento, encontra ‑se a trabalhar a problemática dos agentes, dinâmicas e circunstâncias do Mercado de Arte em Portugal entre os anos de 1833 e 1945. Concluiu o seu Doutoramento em História, especialidade Arte, Património e Restauro, no ano de 2016, tendo igualmente beneficiado de uma bolsa da FCT. A conclusão do Mestra‑ do em Arte, Património e Teoria do Restauro data de 2011. Obteve nas duas teses a nota máxima. Movendo ‑se, sobretu‑ do, entre os séculos XIX e XX, tem como principais interesses de investigação a História e Teoria do Restauro, a História da Arquitetura e a História do Colecionismo e dos Mercados de Arte, problemáticas que tem tratado em diversos estudos publicados ou apresentados em Portugal, Inglaterra, África do Sul e Albânia.

Intangibility Matters. International conference on the values of tangible heritage. Proceedings. Lisboa: LNEC: 75 -84. PIN -SEL. 1895. “Nacionalisação dos Estylos”. Arte Portu‑

gueza: revista illustrada de archeologia e arte moderna, n.º 1: 17 -18.

1895. “Museu Nacional de Bellas -Artes. Faianças Portu- guezas. Arte Portugueza: revista illustrada de archeologia e arte moderna, n.º 4: 74 -76.

1896. “A Segunda Renascença”. Arte Portugueza: revista illustrada de archeologia e arte moderna, n.º 6: 123 -125.

Arquivos

Arquivo do Museu Nacional de Arte Antiga (AMNAA). 1907. Registo de Correspondência expedida, 1, 1905 -1916, n.º 49: 20.

1911. Correspondência, Livro de entradas, n.º1, 1905 -1914, n.º 95: 19.

1914. Correspondência, Livro de entradas, n.º1, 1905 -1914, n.º 412: 193.

1915. Registo de Correspondência expedida, 1, 1905 -1916, L.3.º, n.º 10: 383.

1915. Registo de Correspondência expedida, 1905 -1916, L. 3.º, n.º 104: 428

s/d. Catálogo organizado por salas do Museu Nacional de Belas Arte (MNBA).

s/d. Miniatura – Verbetes originais de Manuel de Macedo. s/d. Museu Nacional de Arte Antiga, Pintura.

s/d. Pintura – Verbetes de Manuel de Macedo (1165 a 1208) em continuação do inventário antigo.

s/d. Verbetes de desenhos da Sala Sequeira, por Manuel de Macedo.

Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC). 1839. Paró- quia de Verride, Livro de baptismos 1829 ‑1843: 64. Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT). 1886. Minis-

tério do Reino, mç. 3762.

1910. PT -ANBA -ANBA -B -005 -00003_m0168.TIF. [V. M.]

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MACHADO, Bernardino

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