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2.3 EXTERNALIDADES E INTERNALIZAÇÕES NA INDÚSTRIA: UM DIÁLOGO

2.3.1 Externalidades ambientais: duas vertentes

Abordar objetivamente o fenômeno das externalidades, que se manifesta de múltiplas formas e em distintas situações, requer um exercício de síntese200.

199 ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra. Coimbra, Coimbra Editora, 1997, p. 32.

200 Síntese: operação mental pela qual se reúne em um todo coerentemente estruturado e

As externalidades, os efeitos sociais secundários da produção ou do consumo, tanto podem ser favoráveis como desfavoráveis, estes, regra geral, costumam não ser considerados contabilizados nas decisões de produção ou de consumo de quem desenvolve a atividade que os gera.

As externalidades são, portanto, a representação concreta dos benefícios ou dos custos originados com a produção ou consumo de bens e serviços, que podem gerar ora benefícios (positivas) ora prejuízos (negativas).

Externalidades podem ser comprendidas como custo ou benefício externo a uma empresa, em decorrência da sua atividade ou de atividade de outro(s) agente(s) econômico(s).

As externalidades são negativas quando há poluição; a sua natureza negativa se caracteriza por gerar custos (poluição a natureza: atmosférica201, de

recursos hídricos, da terra e danos às pessoas ou aos bens destas). As externalidades negativas são provocadas pela própria indústria ou por terceiros em função dos produtos que fabricam.

As externalidades são positivas quando os agentes econômicos ou a comunidade se beneficiam de investimentos governamentais ou privados em infraestrutura e tecnologia, geração de empregos e de atividade econômica (lojas, escolas, empresas de serviços etc.).

Segundo Ana Maria de Oliveira Nusdeo202:

Externalidades positivas, assim, geram benefícios a pequenos ou grandes grupos de agentes que não participaram de uma transação de mercado para sua obtenção. Em certas situações, esses benefícios caracterizam-se por serem não exclusivos e não rivais. No primeiro caso, não é possível, ou é muito custoso, excluir outras pessoas do uso ou do benefício gerado pela externalidade. No

análise). Cf. SACCONI, Luiz Antonio. Grande dicionário Sacconi da língua portuguesa: comentado, critico e enciclopédico, p. 1.871.

201 “A poluição atmosférica refere-se a mudanças da atmosfera susceptíveis de causar impacto a

nível ambiental ou de saúde humana, através da contaminação por gases, partículas sólidas, líquidos em suspensão, material biológico ou energia. A adição dos contaminantes pode provocar danos directamente na saúde humana ou no ecossistema, podendo estes danos serem causados directamente pelos contaminantes, ou por elementos resultantes dos contaminantes. Para além de prejudicar a saúde, pode igualmente reduzir a visibilidade, diminuir a intensidade da luz ou provocar odores desagradáveis.3 Esta poluição causa ainda mais impactes no campo ambiental, tendo acção directa no aquecimento global, sendo responsável por degradação de ecossistemas e potenciadora de chuvas ácidas.” Cf. WIKIPEDIA. Poluição atmosférica. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Poluição_atmosférica>. Acesso em: 28 fev. 2014.

202 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Pagamento por serviços ambientais: sustentabilidade e disciplina

segundo, significa que o montante fornecido do bem para um indivíduo não reduz o montante disponível aos demais. A biodiversidade e estabilidade climática, portanto, são bens públicos de âmbito global. Outros serviços ambientais se caracterizam também como bens públicos, mas talvez em benefício de grupos menores, como os habitantes de um país ou de uma região.

As externalidades podem manifestar-se de incontáveis formas. Marcelo Abelha Rodrigues203 apresenta exemplos e comentários peculiares:

a) Pense-se em uma grande rede de lanchonetes instalada em uma região erma da cidade, conhecida por casos de violência acaba aumentando a circulação de pessoas no local, tornando mais segura a área. Claro está, neste caso, que o empreendimento trouxe um verdadeiro ganho social, não estando, certamente, embutido no preço dos produtos ali vendidos. Tem-se, aí, um exemplo de externalidade positiva.

b) E exemplo de externalidade negativa do ponto de vista ambiental alude à hipótese de uma grande empresa que produz recipientes plásticos, resíduo sólido de difícil reaproveitamento. Este produto, pelo lento processo de decomposição, gerará enormes quantidades de lixo e, portanto, será um fator de degradação ambiental.

Dessa forma, fica claro que o preço de um bem colocado no mercado só teria uma medida correta ̶ um valor justo ̶ se no valor que lhe fosse atribuído estivessem computados tanto os ganhos sociais advindos de seu consumo e também como as perdas sociais surgidas com a produção desse bem, além, é claro, dos custos de sua produção e do lucro.

Na conclusão da sua lição, o precitado autor assevera que as externalidades são um desvio de mercado.204

Conforme lição de Maria Alexandra de Sousa Aragão205: “As

externalidades reúnem duas características: a interdependência entre as decisões

203 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Direito ambiental esquematizado, p. 299-300.

204 Segundo a Teoria econômica, o equilíbrio de mercado é alcançado no ponto em que os

consumidores estão dispostos a adquirir certa quantidade de bens ou serviços (demanda) por um determinado preço, o qual deve cobrir os custos do produtor (oferta). No caso das externalidades que não incluem custos (há aquelas que incluem) o ponto de equilíbrio entre oferta e demanda acha-se desviado em relação àquele que deveria ser o real.

205 ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 32, 33.

dos agentes económicos e a inexistência de compensações. Quem causa estorvos a outrem não os paga, quem cria benefícios não é compensado”.

Pois bem. Para os fins deste estudo, as externalidades negativas serão agrupadas segundo a origem do dano: (a) danos provocados pela indústria; (b) danos provocados por outros agentes econômicos.

Em ambos os caso, qualquer que seja o autor, sempre haverá vítimas, seja o ambiente, cuja recuperação ou atenuação dos efeitos demanda iniciativas, providências e custos, seja a comunidade, cuja compensação é basicamente monetária.

O custo das externalidades, de uma forma ou de outra, reflete-se na empresa, isto é, pode encampar custos que nada têm que ver com o seu ciclo produtivo: é a internalização das externalidades.

Como mencionado na seção intitulada “O ‘P’ de poluidor – quem é o poluidor?”, a identificação do poluidor pagador nem sempre é clara e isto se deve às externalidades.

Não é incomum o proprietário de um veículo imputar ao fabricante o custo da poluição provocada. Tal situação fica mais evidente quando decorre de uma frota de caminhões poluidores.

Na hipótese, caberia perguntar se deveria o fabricante arcar com os custos de prevenção da poluição e reparar os danos. Em outra situação, pode-se atribuir custos a determinado produtor de pesticidas, ainda que a poluição venha a ser causada pelo uso inadequado pelos agricultores? Em se tratando de aeroportos, a poluição sonora pode ser o transportador, a autoridade aeroportuária ou até mesmo o governo que autorizou a infraestrutura (inadequada): quem arcaria com os custos? No transporte de produtos químicos perigosos, feito por transportadoras especializadas e independentes, quando um acidente provoca danos diversos, como água, ar e terra, quem deve arcar com o prejuízo? Essa polêmica será abordada nas seções seguintes.