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1.3 O PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR E OS PRINCÍPIOS DA

1.3.5 Princípio do usuário pagador

Na concepção de Paulo Affonso Leme Machado121: “O uso dos recursos

naturais [tanto] pode ser gratuito, como pode ser pago. A raridade do recurso, o uso poluidor e a necessidade de prevenir catástrofes, entre outras coisas, podem levar à cobrança do uso dos recursos naturais”.

Informa o princípio do usuário pagador que os recursos naturais devem se sujeitar à aplicação de instrumentos econômicos para que o seu uso e aproveitamento se processem em benefício da coletividade, pois “os bens ambientais constituem patrimônio coletivo, mesmo que, em alguns casos, possa incidir sobre eles o justo título de propriedade privada”.122

Quando o uso do recurso natural é gratuito, preleciona Edis Milaré123:

[...] representa um enriquecimento ilegítimo do usuário, pois a comunidade que não usa do recurso ou que o utiliza em menor escala fica onerada. O poluidor que usa gratuitamente o meio ambiente para nele lançar os poluentes invade a propriedade pessoal de todos os outros que não poluem, confiscando o direito de propriedade alheia.

Nos termos do Princípio 5 da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972: “Os recursos não renováveis da terra devem empregar-se de forma que se evite o perigo de seu futuro esgotamento e se assegure que toda a humanidade compartilhe dos benefícios de sua utilização”.124

José Cretella Neto125 entende que, pelo princípio do usuário pagador, os

custos destinados a tornar possíveis a utilização e a reutilização de determinado recurso devem ser suportados exclusivamente pelo beneficiário direto dos recursos

121 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 93. 122 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 93.

123 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência,

glossáriop. 1.076.

124 Princípio 5 da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, de

1972, proferida em Estocolmo. Cf. NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Declaração da Conferência das

Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. 1972. Disponível em: <http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/estocolmo1972.pdf>. Acesso em: 23 fev. 2014. No original: “The non-renewable resources of the earth must be employed in such a way as to guard against the danger of their future exhaustion and to ensure that benefits from such employment are shared by all mankind”.

e não pelo poder público, nem por terceiros. Esse “preço” a ser pago pela utilização do recurso deve levar em consideração sua escassez e outras externalidades.

As autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.126

É importante mencionar que a cobrança pelo uso do recurso ambiental não tem conotação penal, mas sim de remuneração pelo uso – apropriação – do bem ambiental pertencente à coletividade, que é administrado pelo poder público. Não se trata de cobrança pela poluição, mas sim da internalização do custo do uso do recurso ambiental escasso. Trata-se, com efeito, na perspectiva própria do sistema capitalista, de mecanismo criado justamente para evitar que a degradação do meio ambiente e a escassez dos recursos naturais acarretem prejuízos econômicos e, até mesmo, inviabilizem alguns processos produtivos.127

O STF decidiu que o princípio do usuário-pagador significa ‘um mecanismo de assunção partilhada da responsabilidade social pelos custos ambientais derivados da atividade econômica’ (ADI 3.378-6- DF, rel. Min. Carlos Britto, j. 9.4.2008, m.v. (Ementário 2.324-2). O Min. Celso de Mello, citando a opinião do autor, afirmou que o custo a ser imputado ao poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano, mas, na verdade, a uma atuação preventiva. 128

O usuário pagador é o sujeito do “uso outorgado” e dessa remuneração viabiliza a manutenção do recurso dentro das capacidades atuais desenvolvidas e definidas tecnicamente como sustentáveis, isto é, suportadas pelo recurso. No caso do recurso ambiental “água”, a degradação já se faz presente, pois, apesar de monitorado o uso, este causa alterações.

126 Princípio 16 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, proferida no

Rio de Janeiro. NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 1992. Disponível em: <http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf>. Acesso

em: 23 fev. 2014.

127 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência,

glossário, p. 1.076.

128 “Assim, para tornar obrigatório o pagamento pelo uso do recurso ou pela sua poluição não há

necessidade de ser provado que o usuário e o poluidor estão cometendo faltas ou infrações. O órgão que pretenda receber o pagamento deve provar o efetivo uso do recurso ambiental ou a sua poluição.“ MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 94, 95.

Com efeito, em função da realidade hídrica local – no caso do recurso ambiental água –, deve-se apurar o quantum pode ser disponibilizado para o uso, notadamente de pessoa física. Sobre esse quantum, que pode ser estabelecido por critério de cotas, por exemplo, deve recair um valor (preço) inicial, considerado como viável, para assegurar a sustentabilidade, logo a manutenção do acesso ao recurso ambiental (água).129

A inteligência do artigo 19, incisos I e II, da Lei n. 9.433/1997 (Da Política Nacional de Recursos Hídricos), ao determinar a cobrança pelo uso de recursos hídricos, objetiva reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor, bem como incentivar a racionalização do uso do recurso. A receita dessa cobrança deverá ser empregada no processo de reversão da degradação do recurso, assim como propriciar estudos e desenvolvimento de técnicas capazes de prevenir danos e atender, com qualidade, as necessidades do uso.