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2.2 REPRESSÃO DA POLUIÇÃO NO MEIO AMBIENTE INDUSTRIAL

2.2.1 Dano e responsabilidade ambiental

2.2.1.2 Responsabilidade civil ambiental industrial

A responsabilidade civil é um instituto jurídico que pressupõe o nexo causal entre o dano e a culpa do agente violador de um dever jurídico, entretanto, sendo o meio ambiente indivisível, e pertencente a todos, não pode ter tratamento de direito subjetivo344, somado o fato de a poluição ser complexa e difusa345. Daí

florescem o “princípio do pluidor pagador” e a “responsabilidade objetiva.346

O Código Civil, sem prejuízo da reponsabilidade subjetiva, impõe expressamente ao causador do dano a obrigação de repará-lo, independentemente de culpa (não se exige a demonstração da culpa do agente, basta apenas a demonstração do fato/ato, do dano e do nexo de causalidade), nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem347 – tendo adotado

o risco como fundamento da responsabilidade civil.

Importa salientar, por se tratar de dano difuso, dificilmente se pode identificar a vítima do dano ambiental, bem como o causador; por isso, no direito ambiental, adota-se o princípio da “solidariedade passiva”348, tal qual no direito civil.

Dessarte, não cabe nenhum tipo de causa que possa eximir a responsabilidade do causador do dano, nem sequer a intervenção de terceiros ou qualquer causa excludente.349

A lei aponta e o entendimento jurisprudencial corrobora que a Ação Civil Pública poderá ser proposta contra o responsável direto pelos danos causados ao meio ambiente, contra o responsável indireto, ou contra ambos.

344 NERY JUNIOR, Nelson. Responsabilidade civil por dano ecológico e ação civil pública. Justicia,

126/169, jul.-set. 1984. Apud D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental econômico e a ISO

14000: análise jurídica do modelo de gestão ambiental e certificação ISO 14001.

345 NERY JUNIOR, Nelson. Responsabilidade civil por dano ecológico e ação civil pública. Justicia,

126/169, jul.-set. 1984. Apud D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental econômico e a ISO

14000: análise jurídica do modelo de gestão ambiental e certificação ISO 14001, p.108.

346D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental econômico e a ISO 14000: análise jurídica do

modelo de gestão ambiental e certificação ISO 14001, p. 108.

347 Parágrafo Único do art. 927 do Código Civil Brasileiro.

348“Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação

do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos reponderão solidariamente pela reparação.” (CC, art. 942).

Nesse sentido é o acordão proferido pelo eminente ministro Carlos Meira, nos autos do REsp 604.725-PR, em que é recorrente o Estado do Paraná e recorrido o Ministério Público Federal, cujo teor é o seguinte:

Acão Civil Pública. Dano causado ao meio ambiente. Legitimidade passiva do ente estatal. Responsabilidade objetiva. Responsável direto e indireto. Solidariedade. Litisconsórcio facultativo. Art. 267, IV, do CPC. Prequestionamento. Ausência. Súmula 282 e 356 do STF. 1. Ao compulsar os autos verifica-se que o Tribunal ‘a quo’ emitiu juízo de valor à luz do art. 267, IV, do Código de Ritos, e o recorrente sequer aviou embargos de declaração com o fim de prequestioná-lo. Tal circunstância atrai a aplicação das Súmulas 282 e 356 do STF. 2. O art. 23, inc. VI, da Constituição da República fixa a competência comum para União, Estados e Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas. No mesmo texto, o art. 225, caput, prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

3. O Estado recorrente tem o dever de preservar e fiscalizar a preservação do meio ambiente. Na hipótese, o Estado, no seu dever de fiscalização, deveria ter requerido o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório, bem como a realização de audiências públicas acerda do tema, ou até mesmo a paralisação da obra que causou o dano ambiental.

4. O repasse das verbas pelo Estado do Paraná ao Município de Foz do Iguaçu (ação), a ausência das cautelas fiscalizatórias no que se refere às licenças concedidas e as que deveriam ter sido confeccionadas pelo ente estatal (omissão) concorreram para a produção do dano ambiental. Tais circunstâncias, pois, são aptas a caracterizar o nexo de causalidade do evento, e, assim, a responsabilização objetiva do recorrente.

5. Assim, independentemente da existência de culpa, o poluidor, ainda que indireto (Estado-recorrente) (art. 3º da Lei 6.938/81), é obrigado a indenizar e reparar o dano causado ao meio ambiente (responsabilidade objetiva).

6. Fixada a legitimidade passiva do ente recorrente, eis que preenchidos os requisitos para a configuração da responsabilidade civil (ação ou omissão, nexo de causalidade e dano), resulta-se, também que tal responsabilidade (objetiva) é solidária, o que legitima a inclusão das três esferas de poder no polo passivo na demanda, conforme realizado pelo Ministério Público (litisconsórcio facultativo). 7. Recurso especial conhecido em parte e improvido.

ACÓRDÃO – Vistos, relatados e discutidos os autos e que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: ‘A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto do Sr.Ministro Relator’. Os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins, Eliana Calmon, Franciulli Netto e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente,

justificadamente, o Sr. Ministro Franciulli Neto [Grifo nosso].’350

Isso significa dizer, junto com Edis Milaré351, que:

O legislador constituinte (art. 225, § 3º, da CF) não limitou a obrigação de reparar o dano, o que conduz à reparação integral. O dano deve ser reparado integralmente, o mais aproximadamente possível, pela necessidade de uma compensação ampla da lesão sofrida. O agente é obrigado a reparar todo o dano, sob pena de redundar impunidade. Risco criado pela conduta perigosa do agente, impondo-se ao mesmo um dever-agir preventivo, como meio de se eximir da reparabilidade integral do eventual dano causado. A eventual aniquilação da capacidade econômica do agente não contradiz o princípio da reparação integral.

Anthony Giddens352, afirma que risco é expressão característica de

sociedades que se organizam sob a ênfase da inovação, da mudança e da ousadia. Esta lição vem a propósito dos questionamentos sobre a prudência da ciência em lidar com as inovações tecnológicas e ambientais, que, não obstante os benefícios, estão causando riscos sociais não mensuráveis. Esta incerteza pode ocasionar riscos ecológicos concretos ou abstratos.353

Toda essa difusão subjetiva, temporal e especial das situações de risco, perigo e dano leva à concepção de novos e diferenciados contornos ao dano ambiental, superando, portanto, o modelo jurídico tracional, não obstante, vale salientar, alguns instrumentos possibilitadores da gestão dos novos riscos estarem contemplados pelo direito ambiental brasileiro354, faltando apenas, para a sua

350 SIRVINSKAS, Luis Paulo. Manual de direito ambiental, p. 260.

351 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 830-831. Apud SIRVINSKAS, Luis Paulo. Manual de direito ambiental, p. 257.

352 GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. 2. ed.

Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 44-45. Apud LEITE, João Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. Teoria e prática, p. 114.

353 LEITE, João Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao coletivo

extrapatrimonial. Teoria e prática, p. 114.

354 Nesse sentido, o “seguro ambiental” pode ser uma das alternativas viáveis e necessárias para a

reparação dos danos ambientais no futuro. A propósito: “Roberto Durço traz, após muita pesquisa sobre seguro ambiental, o seguinte esclarecimento: Representantes de 35 principais companhias de seguro fundaram a iniciativa da indústria de Seguros para o Meio Ambiente, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). A formação dessa associação é uma consequência do lançamento, em novembro de 1995, pelo PNUMA, da Declaração de Compromisso Ambiental para a Indústria e Seguros, que já foi assinada até agora por 70 seguradoras de 25 países. A ideia é torná-la um veículo para transformar a declaração em ação, criando oportunidade para o lançamento de novas atividades e projetos de pesquisa nos campos ambientais e de seguros”. Cf. DURSO, Roberto. Seguro ambiental. In: FREITAS, Vladimir Passos de (Org.). Direito ambiental em

aplicação efetiva, vontade política e participação da coletividade355. Ainda assim, é

certo que, da aplicação efetiva desses instrumentos, o escopo de que se reveste a repressão ambiental – repressão e reparação – pode ser alcançado, qual seja, prevenção do dano (antecipar e evitar o dano), recuperação imediata do meio ambiente quando o dano já tiver sido causado e promoção da educação ambiental do poluidor.

A teoria da responsabilidade objetiva, segundo a qual cabe àquele que exerce atividade suscetível de contaminar o meio ambiente o dever de indenizar, já estava prevista na legislação ambiental, nos termos da Lei n. 6.938/1981, art. 14, § 1º, litteris:

Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos – causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

A Lei n. 6.938/1981 adotou a responsabilidade objetiva do poluidor, afastando a necessidade de comprovação da culpa. Em 1988, a disciplina foi consagrada pela Carta Magna, no que tange à responsabilização decorrente de dano ambiental.356