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2.1 QUESTÕES INERENTES AO PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR (PPP)

2.1.1 O ‘P’ de princípio – por que um princípio?

O princípio do poluidor pagador era, inicialmente, um simples princípio econômico – basicamente uma discussão sobre medidas preventivas, custos, responsabilidades e a quem caberia arcar com os custos – e visava à eficácia153 na

internalização dos custos ambientais. Com o passar do tempo, foi evoluindo e desde a década de 1990 é considerado um princípio geral de direito ambiental internacional. É um princípio que ainda não foi amplamente codificado, pois seu conteúdo se modifica constantemente.

153 La Destination Universelle des Biens de la Terra – Une Nocion Classique de I’ Enseignement

Social de I’Église à Résonance Écologique. Objectif Europe, n. 13-14, 1991, p. 50,51. Apud ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1997, p. 211.

Segundo o relato de Henri Smets154:

O princípio do poluidor pagador (PPP) foi adotado pela OCDE em 1972, enquanto princípio econômico visando à imputação dos custos associados à prevenção e à luta contra a poluição. Ao longo destes vinte anos, o PPP evoluiu muito, a ponto de se tornar um princípio jurídico universalmente reconhecido.

A toda evidência, o princípio do poluidor pagador é basilar para a proteção e reparação do meio ambiente. É um princípio que imputa ao poluidor a obrigação de suportar os custos dispendidos por medidas determinantes no controle e na prevenção da poluição a ser lançada no meio ambiente.

Em rigor, o princípio dá suporte à exigência de regulamentar a utilização dos bens da coletividade, portanto, é um princípio vetor, que direciona o pensamento do legislador e as condutas e ações do poluidor em prol da minimização dos efeitos da poluição. Em tese, se o poluidor cumprir com todas as regras e normas de proteção ambiental, poderá desenvolver-se sustentavelmente.

No estágio atual, a tendência predominante é tornar o poluidor mais consciente de sua responsabilidade para com o meio ambiente, de modo que não seja necessário “pagar pela prevenção, mas sim investir nela”. 155

Com a promoção de medidas sustentáveis, o poluidor seria beneficiado ou receberia algum tipo de prêmio e, assim, aliviaria o fardo econômico que a poluição representa para o poder público e para os afetados diretamente pela poluição.

A positivação desse princípio no direito ambiental brasileiro ocorreu com a instituição da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/1981, art. 3º, inc. IV), posteriormente ratificado pelo § 3º do art. 225 da Constituição Federal. O reconhecimento internacional foi obtido com a definição do Princípio 16 da Declaração do Rio de Janeiro, de 1992.

É bom frisar que o princípio do poluidor pagador não tem a finalidade de apenas compensar as agressões ao meio ambiente, mais que isso, sua função principal é fazer com que os agentes econômicos busquem minimizar os riscos

154 SMETS, Henri. Le Principe Pollueur Payeur, un Principe Économic Érige em Principe de Droit de I’ Environnement? Revue de Droit International Public, n. 2, avril-juin, 1993. p. 340. Apud ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 211.

inerentes às suas atividades poluentes, como indica a “Directiva 2004/35/CE del Parlamento Europeo Y del Consejo”, de 21 de abril de 2004, sobre responsabilidade em relação à prevenção e reparação de danos ao meio ambiente.156

A prevenção e a reparação de danos ambientais devem ser feitas mediante a aplicação do princípio do poluidor pagador, segundo o qual ‘quem polui paga’ tal como previsto no Tratado e em consonância com o princípio do desenvolvimento sustentável. O princípio fundamental da presente diretiva deve consistir, portanto, no fato de que o operador cuja atividade tenha causado danos ao meio ambiente, ou que esteja na eminência de fazê-lo, seja responsabilizado financeiramente, a fim de induzir os operadores a desenvolver e adotar medidas práticas para minimizar os riscos de danos ambientais, de modo que sua exposição a passivos financeiros seja reduzido [Tradução nossa].157

A concretização do princípio do poluidor pagador ocorre quando o poluidor suporta os custos das medidas adotadas para reparar os danos ou evitá- los, isso porque o bem ambiental tem caráter difuso. Sendo assim, o responsável pela utilização de um bem ambiental, em proveito próprio, deve arcar com os custos de prevenção do dano. “Esse aspecto é extremamente importante, pois com uma conduta preventiva, os custos da efetiva prevenção serão arcados por aquele que produz. No entanto, eventual custo repressivo ou reparatório também deve ser creditado ao degradador”.158

Para Herman Benjamin159: “[...] o direito ambiental, queiramos ou não, gira

em torno do princípio do poluidor-pagador, já que é este que orienta – ou deve orientar – sua vocação redistributiva, ou seja, sua função de enfrentamento das deficiências do sistema de preços”.

156 PENSANDO VERDE 2011. O princípio do poluidor pagador. 21 maio 2011. Disponível em:

<http://pensandoverde-direitodoambiente.blogspot.com.br/2011/05/o-principio-do-poluidor- pagador.html>. Acesso em: 5 dez. 2013.

157 EUR-LEX. Directiva 2004/35/CE del Parlamento Europeo y del Consejo de 21 de abril de 2001. Diario Oficial de la Unión Europea. 20.04.2004. L 143/56. Disponível em:

<http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2004:143:0056:0075:ES:PDF>. Acesso em: 5 dez. 2013. No original: “La prevención y reparación de los daños medioambientales debe llevarse a cabo mediante el fomento del principio con arreglo al cual «quien contamina paga», tal como se establece en el Tratado y coherentemente con el principio de desarrollo sostenible. El principio fundamental de la presente Directiva debe, por tanto, consistir en que un operador cuya actividad haya causado daños al medio ambiente o haya supuesto una amenaza inminente de tales daños sea declarado responsable desde el punto de vista financiero a fin de inducir a los operadores a adoptar medidas y desarrollar prácticas dirigidas a minimizar los riesgos de que se produzcan daños medioambientales, de forma que se reduzca su exposición a responsabilidades financeiras.”

158 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário, p. 69. 159 HERMAN BENJAMIN, 1992, p. 229. Apud LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário, p. 69.

Maria Alexandra de Sousa Aragão160 reafirma esse pensamento, ao

sustentar que o objetivo do princípio do poluidor pagador é onerar o poluidor, em conformidade com as regras de justiça e eficácia evitando distorções de mercado. Na avaliação da autora, é a internalização de custos que está subjacente neste princípio, pois mesmo sabendo que as funções de prevenção e reparação podem ser levadas a cabo pelo Estado, prefere-se atribuí-las ao agente poluidor. A entidade competente, por sua vez, só será chamada quando o infrator não conseguir suportar os respectivos custos, marcando-se, aqui, o último recurso. Anota que o dever de prevenção e reparação surge a título imediato, não necessita de ser exigido, nasce por si, após a consumação da infração.

Na “Recomendação do Conselho sobre Princípios Orientadores relativos aos Aspectos Econômicos Internacionais das Políticas Ambientais”, o Conselho da OCDE dá a seguinte definição do princípio do poluidor pagador:

O princípio que se usa para afectar os custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para estimular a utilização racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções ao comércio e ao investimento internacionais, é o designado ‘princípio do poluidor pagador’. Esse princípio informa que o poluidor deve suportar os custos do desenvolvimento das medidas acima mencionadas decididas pelas autoridades públicas para assegurar que o ambiente esteja num estado aceitável. Por outras palavras, o custo destas medidas deveria refletir-se no preço dos bens e dos serviços que causam poluição na produção ou no consumo. Tais medidas não deveriam ser acompanhadas de subsídios que criariam distorções significativas ao comércio e aos investimentos internacionais [Tradução nossa].161

160 ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política

comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1997, p. 59, 60.

161 Recomendação C(72)128, de 26 de maio de 1972: “Guiding Principles Concerning International

Economic Aspects of Environmental Policies” apud ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de

Direito Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 60. No original: “The principle to be used for allocating costs of pollution prevention and control measures to encourage rational use of scarce environment resources and to avoid distortions in international trade and investment is the so- called Polluter-Pays Principle. The principle means that the polluter should bear the expenses of carryng out the above mentioned measures decided by public authorities to ensure that the environment is in an acceptable state. In other words, the cost of these measures should be reflected in the cost of goods and services which cause pollution in production and/or consumption. Such measures should not be accompanied by subsidies thet would creat significant distortions in international trade and investment”.

Ramón Martin Mateo162 acrescenta que o princípio do poluidor pagador é

um princípio social na medida em que obriga a criação de normas que alterem a ordenação espontânea de valores gerados a partir das regras do mercado (ordenação esta que redunda na subjugação da parte mais fraca à mais forte) e que esta é uma contribuição para se alcançar o bem-estar e a justiça social.

Maria Alexandra de Sousa Aragão163 analisa que o princípio do poluidor

pagador é também um princípio relativamente indeterminado, uma vez que sua formulação não transmite com precisão o conteúdo que lhe é próprio, e acredita que, por essa razão, dúvidas podem surgir na sua concretização legislativa. Acrescenta que, sendo os poderes públicos os destinatários diretos do referido princípio, os poluidores são apenas os seus destinatários indiretos, devendo a intervenção concretizadora do legislador servir para definir o âmbito subjetivo, o conteúdo, a extensão e os limites das obrigações dos poluidores.

Dessas lições, extrai-se que o princípio do poluidor pagador é complexo e se interrelaciona com inúmeros subprincípios.