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Reflexo nacional das críticas ao desenvolvimento sustentável

3.5 CONTESTAÇÕES, CONTRADIÇÕES E CRÍTICAS AO DESENVOLVIMENTO

3.5.4 Reflexo nacional das críticas ao desenvolvimento sustentável

Segundo Clarissa Ferreira Macedo D’Isep285:

A característica primordial do ecodesenvolvimento é a busca contínua efetiva de conciliação entre o desenvolvimento, a preservação ecológica e a qualidade de vida do homem. É de suma importância que se atente para a ideia de continuidade implícita na noção de desenvolvimento sustentável, não só no sentido já exposto, de transmissão de um meio ambiente sadio para as futuras gerações, mas, sobretudo, no sentido de, numa mesma geração, otimizar sempre o desempenho econômico sobre o meio ambiente, em que pesem opiniões diversas.

Enganam-se aqueles que não vislumbram na imposição legal o conceito e comando de melhoria contínua. Ele é nítido, toda vez que a lei se reporta ao desenvolvimento sustentável, ou quando impõe um comando de preservação. Isso se deve ao fato de que ele, simplesmente, busca conciliar dois fatores que são dinâmicos, como veremos: tanto a natureza como a atividade econômica estão em constante movimento, logo movimento também – dinamismo – deve ser atribuído a todo instrumento a elas vinculado.

Paulo Affonso Leme Machado286, analisando a questão, faz o seguinte

comentário:

O antagonismo dos termos – desenvolvimento e sustentabilidade – aparece muitas vezes e não pode ser escondido, nem objeto de silêncio por parte dos especialistas que atuam no exame de programas, plano e projetos de empreendimentos.287

A Associação de Direito Internacional, em sua 70ª Conferência, realizada em Nova Delhi288, de 2 a 7 de abril de 2002, expressou que

o desenvolvimento sustentado, entre outros fins, visa a realizar o

285 Em sentido contrário, Clóvis Cavalcanti aponta duas saídas básicas para a sustentabilidade de um

processo econômico: “(a) austeridade da vida; e (b) renúncia ao desenvolvimento. Prima pela não- maximização da produção dos bens e serviços, mas simplesmente a aquisição daqueles bens e serviços necessários a uma existência gratificante, o que se revela num paradigma que se recusa a excitar o desejo humano além dos limites razoáveis – [...] um meio de colocar freios éticos no comportamento econômico dos indivíduos” (Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável, p. 167-170. Apud D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental

econômico e a ISO 14000: análise jurídica do modelo de gestão ambiental e certificação ISO 14001,

p. 50, 51.

286 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 73. 287 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 74.

288 “Declaration du New Delhi sur les principes du Droit International relative au développement

durable” (appendix Nico Schrijver., The evolution of sustainable development in international law: inception, meaning and status. Recueil des Cours – Académie de Droit International (2007). Leiden/Boston, Martinus Nijhoff Publishers, 2008, p. 217-412 Apud MACHADO, Paulo Affonso Leme.

direito de todos os seres humanos a um nível de vida suficientemente correspondente à sua participação ativa, livre e útil no desenvolvimento e na repartição das vantagens daí decorrentes, levando em conta devidamente as necessidades e os interesses das gerações futuras.289

E arremata: “Desenvolvimento sustentável é uma locução verbal em que se ligam dois conceitos. O conceito de sustentabilidade passa a qualificar ou caracterizar o desenvolvimento”.290

289 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 71. 290 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 73.

SEGUNDA PARTE

MEIO AMBIENTE INDUSTRIAL JURÍDICO

O meio ambiente industrial é um espaço urbano construído291, com a

finalidade de desenvolver atividade específica, qual seja, transformar matéria-prima em produtos e bens de consumo, necessitando para isso de força humana, maquinários e energia.

A atividade econômica desenvolvida no meio ambiente industrial produz vários tipos de poluição, expondo o meio ambiente a riscos de danos irreversíveis, daí a necessidade de se tutelar tão especificamente esta atividade.

O meio ambiente industrial possui aspectos negativos e aspectos complexos. Diz-se aspectos negativos porque, regra geral, toda atividade humana é poluidora. A produção industrial, em especial, por ser uma atividade altamente consumidora de recursos naturais e causadora de grande parte da poluição no meio ambiente, quando não regrada, acarreta invariavelmente prejuízos a toda a coletividade (inclui-se aqui a poluição inevitável).

Os aspectos complexos aludem ao fato de a atividade industrial carregar uma responsabilidade econômico-social muito importante, abrangendo também as normas existentes para o controle de seu exercício.

O meio ambiente industrial jurídico compreende uma complexidade jurídica que busca conciliar estrategicamente o desenvolvimento desta atividade econômica, tão peculiar, pelas razões acima mencionadas, com um meio ambiente ecologicamente equilibrado, em especial do seu entorno, mediante a aplicação de normas e regulamentações, que façam com que a indústria atue e se desenvolva segundo os ditames legais, causando um impacto ambiental mínimo e, a partir daí, abra caminho para o desenvolvimento sustentável.

Portanto, o meio ambiente industrial deve compreender a sustentabilidade como um todo, qual seja, uma complexidade jurídica que envolva o desenvolvimento

291“Meio ambiente artificial é compreendido pelo espeço urbano construído, consiste no conjunto de

edificações (chamado espaço urbano fechado) e pelos equipamentos denominados públicos (espaço urbano aberto. Desta forma, todo espaço construído, bem como todos os espaços habitados pela pessoa humana, compõe o meio ambiente artificial” Cf. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de

econômico, social (incluindo o trabalho humano) e a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

1 A ATIVIDADE INDUSTRIAL

Com a expansão do desenvolvimento econômico, a partir do século XVIII, a indústria passou a exercer drásticas modificações no ecossistema, com o emprego de tecnologias, muitas vezes poluentes, tudo visando à obtenção de maiores lucros em detrimento do meio ambiente e da qualidade de vida.292

Para atender à demanda do consumo de produtos e serviços, a indústria aumentou, e vem aumentando gradativamente, a utilização de matéria-prima, principalmente a advinda dos recursos naturais não renováveis. Essa engrenagem, por consequência, aumenta o consumo de insumos básicos para o processo de transformação de matéria-prima em produto acabado, bem como energia e água, provocando a escassez destes recursos naturais.

Atender à crescente demanda por produtos e serviços, por vezes, não sustentáveis, aumenta o volume de resíduos, que, quando não administrado de forma eficiente, contamina o meio ambiente e afeta, diretamente a vida das pessoas.

Esse movimento evidencia um círculo vicioso, em que a população, desejosa de consumir cada vez mais, impulsiona a indústria a produzir em escala crescente, causando, consequentemente, impactos negativos sobre o meio ambiente, traduzidos pela anunciada escassez dos recursos naturais, pela contaminação do solo, da água e do ar, pelo aumento de resíduos ou emissão de gases e substâncias poluentes.

292 ROCHA, Geraldo César; MACÊDO, Jorge Antônio B. de. O perigo mora ao lado. Anais...

Seminário Cultura de Segurança e Avaliação de Riscos Ambientais. Juiz de Fora, MAMM/UFJF, 6 de junho de 2008. [Textos sobre riscos ambientais publicados na imprensa (1999 a 2009). Juiz de Fora. 2009. Fadepe. MJR Editora Gráfica, p. 67].

A atividade industrial gera um tipo de poluição específico, nominado poluição industrial293, que tem como principais causas a emissão de poluentes, a

utilização de tecnologias ultrapassadas, de sistemas de tratamentos de efluentes inadequados, de instalação desordenada dessas unidades em solos agrícolas, ou em zonas ecologicamente sensíveis, causando impactos, muitas vezes irreversíveis, com prejuízos para as culturas, a fauna e a flora.

O avanço científico e tecnológico do século XX intensificou a atividade industrial e, apesar de fazer uso de técnicas de produção sofisticadas, continua a provocar riscos e danos ao meio ambiente, em todas as suas modalidades, afetando a humanidade. Essa constatação faz repensar as formas de produção até aqui adotadas e concluir que a consciência ambiental deve fazer parte do processo produtivo.

Paulo Affonso Leme Machado294 corrobora:

[…] a revolução tecnológica aumenta a capacidade de impacto ambiental, [é] quando vemos surtir os efeitos em nível planetário (camada de ozônio, ar atmosférico), o que exige dos Estados a mobilização no fito de comprometerem-se a promover o desenvolvimento sustentável.

Fato é que a atividade industrial295 está, inevitavelmente, associada à

degradação ambiental, pois não existem processos de fabricação totalmente limpos. Os poluentes emitidos pelas indústrias variam com o tipo de indústria, com as matérias-primas utilizadas, com os processos de fabricação, os produtos fabricados ou as substâncias produzidas.

293 A poluição industrial está conceituada no artigo 1º, do Decreto Legislativo n. 76.389/1975, que

assim dispõe: “[…] considera-se poluição industrial qualquer alteração das propriedades físicas, químicas ou biológicas do meio-ambiente, causadas por qualquer forma de energia ou de substância, sólida, líquida ou gasosa, ou combinação de elementos despejados pelas indústrias, em níveis capazes, direta ou indiretamente, de: I – prejudicar a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II – criar condições adversas às atividades sociais e econômicas; III – ocasionar danos relevantes à flora, à fauna e a outros recursos naturais”.

294 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 93.

295 Consoante anotação de Cesar Geraldo Rocha e Jorge Antônio B. De Macedo: “[…] destacam-se

as indústrias metalúrgicas e metal-mecânica e da área de componentes elétrico-eletrônicos (circutos eletrônicos, cabos para área de informática) com características de diversificação na produção de bens de capital utilizados, por exemplo, na indústria automobilística”. (O perigo mora ao lado. Anais... Seminário Cultura de Segurança e Avaliação de Riscos Ambientais. Juiz de Fora, MAMM/UFJF, 6 de junho de 2008).

Na linha de raciocínio de Clarissa Ferreira Macedo D’Isep:

[...] a primeira manifestação de desconforto com a poluição ambiental foi no interior da indústria, no tocante às condições desumanas de labor, seja no aspecto salubridade, seja quanto a remuneração e critérios de trabalho, desqualificando qualquer concepção de qualidade de vida […].296

Não obstante a sua carga poluidora, é conhecida a relevância da atividade industrial para o desenvolvimento socioeconômico, o que legitima impor ao Estado um dever de perscrutar o meio ambiente contra o desvario da indústria.

Nesse sentido, o desafio é fazer o mapeamento do processo industrial, definir as possibilidades de uso do solo e de recursos naturais que contribuam para a geração de renda, emprego, aumento da qualidade de vida e o desenvolvimento, sem prejuízo da conservação e proteção do meio ambiente.

2 PANORAMA DAS CARACTERÍSTICAS E PECULIARIDADES DO MEIO AMBIENTE INDUSTRIAL

As empresas que exercem atividade industrial têm grande carga de responsabilidade para com o meio ambiente.

Mesmo concebendo que, apesar da poluição, a produção industrial é um “mal necessário” no que diz respeito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado ou, quiçá, um mal suportável, em função dos benefícios que traz para a economia e para o desenvolvimento social do indivíduo – sadia qualidade de vida –.

Nessa senda, algumas importantes iniciativas é o que se espera dos empreendedores de atividades industriais: investimento em tecnologias eficientes e aptas a minimizar os impactos inevitáveis ao meio ambiente; aplicação de medidas preventivas, por meio de processos de licenciamentos e de zoneamento, previstos nas legislações vigentes e controle eficiente dessas medidas; capacitação de equipes de profissionais para atendimento de aspectos legais; manejo de passivos ambientais e adoção de métodos de produção mais limpa, seja pela substituição de

296D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Direito ambiental econômico e a ISO 14000: análise jurídica do

produtos, seja pela modificação de processos produtivos; e, por fim, respeito aos princípios constitucionais, principalmente no que tange ao trabalho humano, à função social da atividade industrial e à proteção ao meio ambiente.

Aos órgãos públicos e instituições financeiras fiscalizadoras e regulatórias cumpre: incrementar a legislação regulatória e definir instrumentos para aplicação das normas regulamentadoras (licenciamentos); capacitar equipes técnicas de órgãos ambientais e aumentar a fiscalização sobre agentes poluidores; criar instrumentos de incentivos (linhas de créditos) especiais para empresas e empreendimentos que atuem sob a égide do desenvolvimento sustentável – que valorizem ações benéficas às áreas industriais e ao seu entorno –; promover a educação e a consciência ambiental pública para a preservação do meio ambiente.

A propósito, vale destacar que o Brasil conta com um arcabouço legal muito bem desenvolvido, que possibilita o exercício da atividade industrial sem comprometer a proteção ambiental, conforme se abordará a seguir.

2.1 PREVENÇÃO E CONTROLE DA POLUIÇÃO NO MEIO AMBIENTE