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2 EXPOSIÇÃO DO PROBLEMA SOBRE O FUNDAMENTOE O SER DAJUSTIÇA

5.2 Justiça Intergeracional e a Advocacia pela Humanidade

Considerando-se os subitens anteriores apresentou-se série considerável de problemas para o pensamento jurídico: a. o Direito foi enfraquecido por conceitos natimortos como a sustentabilidade; b. o Direito gerou linguagem mal elaborada que acolheu expressões como o desenvolvimento sustentável; c. o Direito acomodou-se àquilo que se denominou “racionalidade da irracionalidade” (Horkheimer) e à “sociedade de risco” que advém da “economia da escassez” (Beck); d. o Direito obscureceu a justiça intergeracional com a sustentabilidade; e. o Direto não qualificou a democracia e o Estado; f. o Direito perdeu a capacidade de gerar segurança jurídica (Ávila); g. o Direito perdeu a capacidade de gerar algo semelhante à parresía, e deixou de dizer a verdade para os jurisdicionados; h. o Direito se transformou em “fetiche”, fenômeno que tolheu vitalidade dos Direitos Humanos (Barretto); i. o Direito não foi capaz de superar e compreender que a complexidade do ser humano (Kant, Gray), da natureza (Hugo) e da sociedade (Horkheimer) através dos pares de opostos indicados supra; j. o Direito legaliza o ilegal em um contexto de pilhagem (Mattei e Nader); k. o Direito não consegue superar barreiras para a transição para o Estado Sócioambiental Democrático de Direito (capítulo 3, item 3.8).

Entre tantos problemas é dever do parresiasta indicá-los, criticá-los e apresentá-los para o debate de todos. Assim, a sustentabilidade se torna nefasta: não traz consigo a exposição nua da verdade. Em contrapartida, se verifica o quão importante se revela a justiça que deve ser feita entre as gerações, tarefa indeclinável da Filosofia, a advogada da Humanidade.406 Höffe naturalmente se aproxima da parresía: técnica que pode formar a essência desta concepção e se deve às condições indicadas para o exercício da parresía. 407 Quem advoga em favor de determinada causa não pertence ao poder diante do qual fala, impossível a parresía incorporar-se ao poder. Pois o poder, pode desejar conservar a si

405 WITTGENSTEIN, Ludwig. Gramática filosófica. Tradução de Luís Carlos Borges. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2010. p. 107: “É na linguagem que tudo é feito” (A Proposição e seu sentido).

406 HÖFFE, Otfried. A democracia no mundo de hoje. Tradução de Tito Lívio Cruz. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 30-33.

407 FOUCAULT, Michel. O governo de si e dos outros. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2013.p. 271-293. (aula de 2 de março de 1983, Primeira hora).

mesmo, hiper-atrofia as leis; especialmentequando estas não apresentam boas e justas. Admitindo-se que a Filosofia deve transmitir para o Direito a parresía – integrando pensamento jurídico e pensamento filosófico – torna-se advogada da humanidade. Concepção que se aperfeiçoacom a justiça intergeracional: tornar-se-ia contraditório advogar pela Humanidade com o conceito de sustentabilidade. Além disso, o instável mundo contemporâneo é criação da sustentabilidade por que nele o Direito não viabilizou a realidade da justiça relativa às gerações que formam a Humanidade.

Höffe elaborou lista integral dos princípios da justiça; –408 ea justiça intergeracional pode facilmente ser pensada como pressuposto do princípio da protojustiça ou do imperativo jurídico universal. Hoffe refere-se sobre a justiça intergeracionale sepulta a sustentabilidade409e argumenta com a idéia de contrato social intergeracional adotando a linguagem a que nunca se poderia ter abandonado: “a natureza em seu estado natural, que não foi criada por nenhuma geração, é uma propriedade comum a toda a Humanidade.”410

De fato, a natureza deve ser denominada natureza ao invés de meio ambiente, expressão que decorre da sustentabilidade e do linguajar impreciso passou a vicejar mundo a fora. Höffe parece compreender ocontrato de Amiel: “Cada aurora é um contrato novo com a existência”. Trata-se de verdade que somente poderá ser expressa pela parresía juntamente com a longa série de problemas que a Humanidade acumulou quando aceitou sem crítica a sustentabilidade e silenciou sobre a justiça intergeracional. A parresía torna saudável o Direito e o pensamento jurídico quando este está em seu nascedouro.

5.2.1 Contrato Intergeracional

Assim, a sustentabilidade não pode ser conteúdo semântico vivo do contrato intergeracional: advogar em favor da Humanidade411 não permite que sejam abertas exceções no ato veridicção e nem permite contemporização com aquilo que a razão não pode aceitar. Assim, é impossível pensar em um suposto contrato de sustentabilidade: a perda expressiva daquilo que é verdadeiro e que deve ser dito para todos (parresía) é imensa. O

408 HÖFFE, Otfried. A democracia no mundo de hoje. Tradução de Tito Lívio Cruz. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 158-160.

409 Ibid., p. 496-501.

410 Höffe, antes deste período específico, usa a expressão meio ambiente natural. Contudo, ao referir-se à

natureza em seu estado natural encontrou expressão mais exata do que a primeira. Ibid., p. 498.

411 Nelson Mandela usou da parresía: a. expôs perigosamente sua própria vida; b. foi preso por longo tempo; c. pronunciou verdades que o colocam como advogado da humanidade. Casos mais contundentes foram os de Sócrates e Jesus: a morte de ambos expôs a verdade com tanta crueza que se internalizaram na vida da Humanidade.

desenvolvimento sustentável deverá dar lugar ao desenvolvimento equitativo intergeracional – expressão que completa em si mesma. Na comparação destas duas expressões se encontra conhecimento nítido:

a) o Estado Socioambiental Democrático de Direito deve ser instituído a partir de um contrato intergeracional;

b) o contrato intergeracional é fundamento para o desenvolvimento equitativo intergeracional;

c) a Filosofia, advogada da Humanidade, deverá ser exercida com a parresía perante as barreiras que impedem a instituição do Estado Sócioambiental Democrático de Direito.

Estas conclusões encontram, retroativamente, suas premissas básicas em cada item e subitem até o momento expostos.

5.2.2 Desenvolvimento Equitativo Intergeracional

Desenvolvimento equitativo intergeracional decorre da justiça intergeracional, norte de todo pensamento que se integra à concepção da filosofia como advogada da humanidade. A rigor, esta proposta está fundada e implícita em todas as proposições kantianas da Ideia de uma História Universal de um Ponto de Vista Cosmopolita, e representa uma das possíveis conclusões de leitura desta obra.412 A reflexão sobre aquelas proposições aproximam esta proposta de uma série de importantes idéias que também estavam submersas pelo discurso sobre a sustentabilidade. Assim, é possível traçar um paralelo esquemático com o intuito de tornar mais nítida a linha de pensamento kantiano. Estes conceitos afins, opostos à sustentabilidade, são os seguintes: a. justiça intergeracional; b. contrato intergeracional; c. desenvolvimento equitativo intergeracional; d. fraternidade; e. Estado Sócioambiental Democrático de Direito; f. aesthetica vitae; g. parresía; h. Direito Cosmopolita; i. Natureza; j. pensamento filosófico e jurídico não sofrem secção (unem-se na concepção da filosofia como advogada da Humanidade.

412 A expressão desenvolvimento equitativo intergeracional está assentada na obra indicada de Kant, mas compreendendo-se que se trata apenas de uma das conclusões possíveis: obra tão rica que é, carrega dentro de si, possibilidades para outras conclusões.

De outro lado, a sustentabilidade alinhou-se com outra série de conceitos que, atualmente, se apresentam problemáticos: a. Sustentabilidade; b. Desenvolvimento sustentável (e outros conceitos afins); c. tolerância; d. Estado de pilhagem (incrustado no Estado de Direito); e. meio ambiente natural (e outros deste derivado); f. secção entre pensamento filosófico e pensamento jurídico; g. ausência de possibilidades para a prática da parresía; h. contemporização com o irracional; i. conformidade com riscos sociais e com a economia da escassez; j. globalização.

Assim se observa o divisor de águas entre aquilo que o Direito atualmente é e aquilo que o Direito pode se tornar se recepcionar integralmente a justiça intergeracional. Este problema remete para o subitem 2.2.1 (segundo capítulo) que expressa o Paradoxo de Sócrates. Paradoxo este que recai sobre o problema das reais possibilidades humanas para estabelecer vida de convivência feliz.413 Com isso se observa claramente que a justiça intergeracional aufere nitidez no quadrado semiótico (subitem 2.4.1, segundo capítulo) e no triângulo de normatividade constitucional (subitem 2.4, segundo capítulo): mas se submeter- se a sustentabilidade a estes dois procedimentos observar-se-á que o resultado é irracional. A sustentabilidade não pode harmonizar-se no horizonte semiótico e nem ingressar racionalmente na normatividade constitucional. De outro lado, a sustentabilidade, diante das antinomias examinadas (subitem 2.3.2.1 e 2.3.2.2, capítulo primeiro) recrudesce a primeira antinomia em desfavor da segunda (que obstaculiza a perpetuação da humanidade). E isto não é tudo para se demonstrar o quão irracional é a sustentabilidade: a sua aceitação agrava os problemas sociais e humanos indicados por Rui Barbosa e Tobias Barreto (subitens 2.7.1 e 2.7.2, capítulo primeiro).

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