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Capítulo III – Teorias sobre o Primeiro Templo

1. Teoria de Finkelstein e Silberman

1.3 Os Estábulos, Cidades e Portões do Rei Salomão

Finkelstein e Silberman209 afirmam que o cerne do debate não ocorreu sobre a evidência das conquistas de Davi, mas sobre sua consequência. Segundo os estudiosos, na questão de Salomão ter estabelecido glorioso domínio sobre o reino conquistado por Davi, embora não exista traço do Templo de Salomão e o palácio de Jerusalém jamais tenha sido identificado, existiam muitos outros lugares para os estudiosos procurarem. Conforme os autores, a narrativa bíblica descreve a reconstrução das cidades de Megiddo, Hazor e Gezer ao norte por Salomão (1 Reis 9,15). Quando uma dessas cidades, Megiddo, foi escavada por uma expedição do Instituto Oriental da Universidade de Chicago, nas décadas de 1920 e 1930, que encontrou alguns dos mais impressionantes remanescentes da Idade do Ferro, que foram atribuídos a Salomão.

Segundo os estudos dos pesquisadores210, a cidade de Megiddo, localizada em um ponto estratégico no qual uma estrada internacional do Egito, no sul, até a Mesopotâmia e a Anatólia, no norte, desce das colinas para o vale de Jezrael, Megiddo era uma das cidades mais importantes do Israel bíblico. Afirmam os autores que, além do livro de 1 Reis 9,15, ela também é mencionada em 1 Reis 4,12 na lista dos distritos do estado salomônico. Informam os estudiosos que o nível da cidade, chamado estrato IV – o último a ser quase totalmente exposto na área do antigo cômoro –, continha dois conjuntos de grandes prédios públicos, cada um formado por uma série de câmaras longas, ligadas umas às outras numa fileira. Conforme as pesquisas de Finkelstein e Silberman, cada uma das câmaras individuais dividia-se em três corredores estreitos, separados um do outro por uma divisória de paredes baixas de pilares de pedra e cochos.

Afirmam os autores que um dos diretores da expedição, P.L.O. Guy, identificou esses edifícios como estábulos, datados do tempo de Salomão, e foi reconhecido por sua interpretação se basear na descrição bíblica das técnicas de construção salomônicas em Jerusalém (1 Reis 7,12), na referência específica às atividades de construção de Salomão em Megiddo, em 1 Reis 9,15, e na menção das cidades salomônicas de bigas e cavaleiros, em 1 Reis 9,19. Apontam os autores que Guy resumiu, dessa forma, sua identificação: “Se nos perguntarmos quem, em Megiddo, imediatamente depois da derrota dos filisteus pelo rei Davi, construiu uma cidade com

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Ibidem, pp. 190-191.

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tantos estábulos, com a ajuda de habilidosos pedreiros estrangeiros, eu acredito que encontraremos a resposta na Bíblia (...) se lermos a história de Salomão, seja nos livros dos Reis ou nas Crônicas, ficamos espantados pela frequência com que as bigas e os cavalos são citados”.

Continuam os pesquisadores que a evidência aparente da grandeza do império salomônico foi intensificada, de modo significativo, na década de 1950, com as escavações de Yigael Yadin, em Hazor, que, por sua vez, em conjunto com a sua equipe, descobriu uma grande cidade pertencente à Idade do Ferro e com um planejamento peculiar: havia uma torre e três câmaras de cada lado do portão, a originar, nesse caso, a expressão “portão das seis câmaras”. Ressaltam os estudiosos que Yadin ficou estupefato, pois um portão semelhante – tanto no desenho quanto no tamanho – fora descoberto vinte anos antes pela equipe do Instituto Oriental, da Universidade de Chicago, em Megiddo. Talvez, segundo os autores Finkelstein e Silberman, fosse esse o sinal, e não os estábulos, da presença de Salomão nas terras de Israel.

Relatam os estudiosos211 que, dessa forma, Yadin foi escavar Gezer, a terceira cidade mencionada em 1 Reis 9,15, como a ser construída por Salomão, mas não em campo, na biblioteca, pois Gezer tinha sido escavada no começo do século pelo arqueólogo britânico R.A.S Macalister. Conforme os autores, enquanto folheava as páginas dos relatórios de Macalister, Yadin ficou perplexo e pasmo, pois no plano de um edifício que Macalister tinha identificado como um ‘castelo macabeu’, datado do século II a.C., Yadin pôde facilmente reconhecer no contorno dos lados o mesmo tipo de estrutura de portão encontrado em Megiddo e em Hazor. Consequentemente, segundo a narrativa dos estudiosos, Yadin não hesitou, e veio diretamente a argumentar que um arquiteto real de Jerusalém desenhara um plano-mestre para as cidades muradas de Salomão, e que esse plano-mestre tinha sido utilizado nas cidades provinciais. O argumento de Yadin diz isso da seguinte forma:

Não existe exemplo na história da arqueologia em que uma passagem bíblica tenha ajudado dessa maneira a identificar e datar estruturas em vários montes artificiais, formados por restos de antigas povoações, na Terra Santa, como essa do livro de 1 Reis 9,15 (...) Nossa decisão de atribuir aquela camada (em Hazor) a Salomão foi baseada primariamente na passagem 9,15 do livro 1º Reis, na estratigrafia e na cerâmica. Mas quando, além disso, encontramos naquele estrato um portão de ‘seis camadas’, duas

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torres, conectado à casamata da muralha, idêntico em plano e nas medidas ao portão de Megiddo, tivemos certeza de que tínhamos identificado com êxito a cidade de Salomão.

Ressaltam Finkelstein e Silberman213, ainda, que as descobertas salomônicas de Yadin não tinham terminado, pois no começo da década de 1960, ele foi a Megiddo com uma pequena equipe de estudantes a fim de analisar e esclarecer a uniformidade dos portões salomônicos, que em Gezer e em Hazor eram conectados à casamata oca da fortificação, mas que só em Megiddo ligava-se a uma parede sólida. Yadin, segundo os pesquisadores, tinha certeza de que a equipe de escavação de Megiddo tinha atribuído, erroneamente, a parte sólida ao portão, a deixar escapar uma casamata subjacente na parede. De acordo com os estudiosos, como o portão havia sido completamente descoberto pela equipe da Universidade de Chicago, Yadin escolheu escavar o lado leste desse portão, no qual a equipe estadunidense havia localizado um aparente conjunto de estábulos, atribuídos a Salomão.

Atentam Finkelstein e Silberman214 que aquilo que Yadin encontrou revolucionou a arqueologia bíblica por uma geração. Sob os estábulos, relatam os pesquisadores, Yadin descobriu os remanescentes de um belo palácio, a medir 558 metros quadrados, construído com grandes blocos de cantaria; segundo os estudiosos, estava edificado na extremidade norte do cômoro e conectado a uma fileira de salas, que Yadin interpretou ser a desaparecida casamata murada, ligada ao portão de seis câmaras. Continuam os autores que, um palácio mais ou menos semelhante, da mesma forma construído com belos blocos revestidos, tinha sido descoberto pela equipe do Instituto Oriental no lado sul do cômoro e também jazia sob a cidade de estábulos.

Segundo os estudiosos, o estilo arquitetônico dos dois edifícios era intimamente análogo a um estilo diferenciado e comum aos palácios da Síria na Idade do Ferro, conhecidos com bit

hilani, os quais consistiam de entrada monumental e fileiras de pequenas câmaras em torno de uma sala oficial de recepção. Ressaltam os autores que esse estilo teria sido, portanto, apropriado para uma residência de um funcionário local, talvez o governador regional, Baana, filho de Ailud (1 Reis 4,12). Continuam Finkelstein e Silberman que, um estudante da equipe de Yadin, já referido anteriormente, David Ussishkin, comprovou de imediato a conexão desses edifícios com

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Ibidem, p. 194.

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Salomão, a demonstrar que a descrição bíblica do palácio que Salomão construíra em Jerusalém cabia perfeitamente para os de Megiddo.

Conforme a observação dos pesquisadores, a conclusão parecia inevitável, pois os dois palácios e o portão representavam a presença de Salomão em Megiddo, enquanto os estábulos pertenciam efetivamente a uma cidade posterior, construída pelo rei Acab, do reino de Israel, no começo do século IX a.C. Afirmam os autores que esta última conclusão constitui alicerce fundamental na teoria de Yadin, já que uma inscrição assíria do século IX descrevia a tropa de bigas do rei Acab de Israel.

No raciocínio de Finkelstein e Silberman 215, para Yadin e muitos outros, a arqueologia parecia servir à Bíblia mais acuradamente do que nunca, pois a Bíblia descreveu a expansão territorial do rei Davi: de fato, para os estudiosos, antigas cidades de Canaã e da Filisteia tinham sido destruídas pelo fogo por todo o país, e a própria Bíblia contou as atividades de construção de Salomão em Hazor, Megiddo e Gezer; seguramente, afirmam os estudiosos, os portões similares revelaram que as três cidades foram construídas ao mesmo tempo, com um plano unificado. Ainda acentuam os pesquisadores que a Bíblia afirma que Salomão foi aliado de Hirão, rei de Tiro, e que ele era grande construtor; de fato, ressaltam os autores, os magníficos palácios de Megiddo mostram relações com o norte em sua arquitetura e eram os prédios mais bonitos achados no estrato da Idade do Ferro, em Israel.

Continuam os autores216 que, por muitos anos, os portões de Salomão simbolizaram o mais importante suporte da arqueologia para a Bíblia. Mesmo assim, conforme o pensamento dos pesquisadores, questões básicas de lógica histórica posteriormente enfraqueceram o seu significado, pois em nenhum outro lugar da região – da Turquia Oriental ao norte, através da Síria, até a Transjordânia, ao sul – existia algum sinal de instituições reais desenvolvidas de modo tão similar ou em construções monumentais no século X a.C. Conforme foi visto, ressaltam os autores, a terra natal de Davi e de Salomão, em Judá, era conspicuamente subdesenvolvida, e não existe nenhuma evidência de riqueza de um grande império, gerada e a fluir dali.

E, de acordo com os estudiosos, há um problema cronológico ainda mais perturbador, que os palácios de bit hilani da Idade do Ferro na Síria – que supostamente seriam os protótipos para os palácios de Salomão em Megiddo – aparecem pela primeira vez na Síria no século IX a.C.,

215

Ibidem, p. 196.

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pelo menos meio século depois do tempo de Salomão, e aparentemente, não é possível que os arquitetos de Salomão fizessem uso de um estilo arquitetônico ainda desconhecido. Finalmente, concluem Finkelstein e Silberman, existe a questão do contraste de Megiddo e Jerusalém, há a questão se por um acaso um rei que construiu palácios fabulosos de cantaria numa cidade provincial tenha governado uma pequena aldeia, remota e subdesenvolvida. Como veio a acontecer, conforme os pesquisadores, conhece-se agora que a evidência arqueológica para a vasta extensão das conquistas de Davi e para a grandeza do reino de Salomão resultou de datas erradas e incorretamente determinadas como será apresentado a seguir.

Conforme estas observações de Finkelstein e Silberman, apenas levantam críticas das tentativas de legitimação da existência de Salomão através de obras nas quais os arqueólogos afirmavam, sem titubear a autoria de Salomão, o que será desdobrado no próximo item.