• Nenhum resultado encontrado

Projeto: “MAPEPS” – Extensão e formação na prática

CAPÍTULO 3 EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E EDUCAÇÃO NA

3.4   Os três projetos analisados na pesquisa

3.4.3 Projeto: “MAPEPS” – Extensão e formação na prática

O Programa de Extensão Educação em Saúde, do Departamento de Metodologia

do Ensino – DME, surgiu em 1999 e tem como objetivo “o desenvolvimento de ações

educativas no sentido de melhoria da qualidade de vida das comunidades a partir do processo saúde-doença e a contribuição no estudo de processos de ensino e aprendizagem comunitários na área da saúde e sua sistematização” (UFSCAR-PROEX, 2012, p.149). De acordo com o relatório de Avaliação dos Programas de Extensão da UFSCar 2009-

2010, o programa atende totalmente o princípio da indissociabilidade entre ensino,

pesquisa e extensão, sendo classificado como Exemplar e Consolidado. Nele se insere o

MAPEPS – Mapeamento de Práticas de Educação Popular e Saúde, criado em 2006. O

objetivo do MAPEPS está divulgado em sua página, na internet, onde se lê:

Promover processos de Educação Popular e Saúde através do diálogo e da troca entre práticas e saberes populares e técnico-científicos no âmbito do SUS e da Universidade, aproximando os sujeitos da gestão, dos serviços de saúde, dos movimentos sociais populares, das práticas populares de cuidado e das instituições formadoras.31

Segundo essa página da internet, o grupo é formado por professores e estudantes da Universidade Federal de São Carlos, pela ONG Círculo de São Francisco e por

membros da Ecovila Tibá. Os professores e estudantes da UFSCar, por sua vez, integram o Grupo de Pesquisa Práticas Sociais e Processos Educativos (cadastro CNPq - 1998), na linha de pesquisa Educação, Participação, Direitos e Saúde, e as atividades da

Unidade Saúde-Escola – USE, da UFSCar.

O Projeto MAPEPS pretende atender ao Plano Operativo da Política Nacional de

Educação Popular e Saúde no âmbito do SUS – PNEPS-SUS –, instituído pelo Ministério

da Saúde através da Portaria 2761, de 19/11/201332. O documento afirma, em seu artigo segundo:

Art. 2º A PNEPS-SUS reafirma o compromisso com a universalidade, a equidade, a integralidade e a efetiva participação popular no SUS, e propõe uma prática político-pedagógica que perpassa as ações voltadas para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a partir do diálogo entre a diversidade de saberes, valorizando os saberes populares, a ancestralidade, o incentivo à produção individual e coletiva de conhecimentos e a inserção destes no SUS (Brasil, Portaria 2761/2013, art.2)

Desse modo, por meio de ações de formação profissional junto aos cursos de graduação da área da saúde da UFSCar, o projeto desenvolve Oficinas de Educação

Popular e Saúde, atuando também em Espaços de Cuidado nas unidades de saúde em

parceria com os grupos que praticam a medicina popular. Além disso, desenvolve uma assessoria junto à Secretaria de Saúde do município de São Carlos para sensibilização e formação continuada dos profissionais envolvidos na oferta de práticas populares integrativas e complementares de saúde no SUS.

Ao longo dessa atuação, o Projeto MAPEPS solicitou à Proex uma bolsa de extensão com a seguinte justificativa:

A bolsista prestará auxílio no planejamento e acompanhamento das atividades e sua avaliação, fará contatos com as comunidades onde serão realizados os espaços de cuidado e com as coordenações de curso da área de Saúde onde serão realizadas as oficinas. Realizará acompanhamento e participação no planejamento da assessoria às ações de educação permanente junto aos profissionais de saúde envolvidos no projeto da Secretaria Municipal de Saúde de oferta de Práticas Populares de Saúde no SUS (PROEX, 2017c).

Procurando conhecer a prática do projeto, entrevistamos a estudante bolsista do MAPEPS, graduanda do curso de Terapia Ocupacional, no momento em que

32 Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt2761_19_11_2013.html> - Acesso em 16.12.2017.

acompanhava o 3o Encontro de Práticas Populares de Saúde, ocorrido na USE-UFSCar

entre os dias 10 e 11/11/2017 (Entrevista, Apêndice C).

A estudante, antes de associar-se ao projeto, matriculou-se na ACIEPE Práticas

Populares de Saúde, participando das oficinas de Permacultura, Reiki, Terapia

Vibracional Integrativa – TVI, Auriculoterapia, Yoga, entre outras. A ACIEPE teve duração de seis meses e, logo em seguida, tornou-se bolsista do MAPEPS. A própria ACIEPE é uma das atividades desenvolvidas pelo MAPEPS.

Segundo ela, o ingresso nas atividades extensionistas conferiu uma nova dinâmica à sua graduação:

Bom, eu fiquei sabendo... acho que meu primeiro contato foi em 2015, quando eu participei desse encontro que tá acontecendo hoje... foi o segundo encontro de Práticas populares de saúde... e... participei das oficinas, das vivências, fiquei encantada, porque na época eu tava... eu tava muito feliz com meu curso, mas a cidade... tipo, as coisas que aconteciam aqui na federal não... não que não me agradavam, mas não tinha achado uma coisa, assim, que eu... brilhasse meus olhos, assim, sabe... que eu falasse nossa, caramba... que... muito legal isso, eu

quero participar... então... foi um momento que eu tava meio assim, e daí eu

fiquei muito feliz de ter encontrado um lugar com essas práticas... (Entrevista, Apêndice C).

A estudante já praticava yoga antes da faculdade e, de certa forma, estava contente com o curso, porém, a cidade e a universidade não atendiam inteiramente suas expectativas. Tudo mudou, no entanto, a partir de sua participação na ACIEPE e, logo em seguida, nos projetos extensionistas da universidade. A extensão significou uma vivência de práticas de cuidado e saúde que de outra forma não ocorreria. Segundo ela:

O que me levou a participar? Ah, foi querer tá mais próxima dessas... dessas práticas... porque... eu sou uma pessoa que acredito muito pouco na... na eficácia da medicalização... assim, eu acredito que tem uma eficácia pra alguns casos, mas a gente tá medicalizando a vida, né... então, acredito muito nessas outras formas de cuidado... então, foi uma coisa que me chamou muito atenção... falei, meu,

quero tá aí... (Entrevista, Apêndice C).

Assim, na perspectiva da estudante, existe uma medicalização da vida que não contempla as reais necessidades do ser humano, sendo que o resgate de outras práticas, mais tradicionais, desenvolvidas pelo projeto, ampliou o horizonte de perspectivas para sua atuação profissional.

Além da organização dos encontros de formação continuada em Práticas

graduação de vários cursos da área da saúde, a estudante atua em um grupo de Terapia

Vibracional Integrativa – TVI. O grupo surgiu dos participantes da ACIEPE, como

trabalho de conclusão do curso, oferecendo uma prática popular de saúde na própria universidade. Atende estudantes e a comunidade em geral, todas as quintas-feiras, das 12:30 às 14:00 horas, na UFSCar.

De maneira geral, a estudante manifesta uma rica experiência das temáticas desenvolvidas pelo projeto extensionista, inclusive com comentários acerca de sua dimensão política e econômica. A esse respeito, questionada acerca dos interesses do capital sobre a educação universitária, a estudante relata a existência de situações que estão prejudicando a formação acadêmica de alguns graduandos:

Eu tenho alguns relatos de uns amigos que fazem produção... mas daí acho que... é uma... é a área deles, né... mas tem alguns que... que reclamam, assim, por... pela produção ser tão imersa no mercado, na indústria... e linha de produção mesmo... é... e visando a produção e o consumo... e... meio que fora do que eles acreditam, assim, enquanto pessoas... então, eu tenho várias pessoas que estudam e tão na área da produção que tão muito mal, assim... psicologicamente... viram que não é isso que eles querem... pra vida deles, assim, então... (Entrevista, Apêndice C).

Ou seja, a notícia é de que, em razão da implantação de uma dinâmica de mercado em um dos cursos de graduação, colegas estão se sentindo mal, psicologicamente, pois as experiências formativas estão distantes das expectativas iniciais. Segundo ela,

[...] tem alguns que sofrem muito... se bem, num lugar, que, tipo, entraram achando que fosse uma coisa, na verdade... se depararam com outra, completamente diferente... eles estão nesse processo de... pá... eu já fiz quatro

anos... não vou desistir agora... eu vou concluir... mas aquela coisa que eles vão

sentindo, assim, tipo, de chegar... de tá num estado depressivo já avançado... porque não concorda com aquilo... não concorda com a forma com que é dada. (Entrevista, Apêndice C).

Nesse sentido, ela tem contato com outros estudantes que vivenciam quadros de depressão, mas acredita que se trata de uma realidade circunscrita àquela área de estudos, não percebendo a possibilidade de a mesma dinâmica ocorrer em sua área de atuação.

Em relação ao 3o Encontro de Práticas Populares de Saúde, ocorrido na USE-

UFSCar, em novembro de 2017, e organizado pelo MAPEPS, o objetivo principal foi favorecer o diálogo entre as práticas e saberes populares e o conhecimento técnico- científico. Para isso, os organizadores convidaram os interessados a enviarem e apresentarem trabalhos científicos, estudos e reflexões durante o evento. Os Anais

publicados33 confirmam a participação de 13 produções. Com isso, o encontro buscava também ampliar o debate sobre a implementação da Política Nacional de Práticas

Integrativas e Complementares no SUS e da Política Nacional de Educação Popular em Saúde no SUS.

São iniciativas importantes para articular a ação extensionista com a reflexão política mais ampla da integração das práticas complementares de saúde no SUS, mas, por outro lado, parecem não abranger aspectos significativos relativos à saúde pública. Com efeito, as enormes carências enfrentadas pela população nesse âmbito, a ausência de recursos financeiros, a falta de aparelhamento de hospitais e postos de saúde, a escassez de remédios e profissionais, permite suspeitar que os esforços pela integração de práticas populares no SUS acabam desviando a atenção do quadro maior de precarização das instituições públicas em benefício do setor privado, cada vez mais atuante no mercado da saúde/doença. Embora exista o reconhecimento de que tais práticas são complementares, não ficou clara a existência de debates a esse respeito e a condução de uma discussão entre os agentes acerca de tais aspectos.

Desse modo, o projeto trabalha com práticas integrativas e complementares de saúde, realiza encontros e oficinas para capacitação de profissionais da rede pública, oferece uma ACIEPE em que apresenta essas práticas aos estudantes da UFSCar e discute a integração dos saberes populares com a medicina científica, estimulando o reconhecimento dos saberes tradicionais. A própria ACIEPE, integrando ensino, pesquisa e extensão em suas atividades, renova o modelo tradicional extensionista de cursos e palestras, porém parece carecer de uma crítica mais ampla, relativa às enormes contradições que tais fazeres e práticas denunciam num contexto marcado pela diminuição de investimentos no SUS, pela crescente exploração da saúde por parte do setor privado, sem falar nas discrepâncias entre recursos aplicados em medicina de ponta e ausência de insumos para a atenção básica da população, entre outros aspectos.

Em relação aos recursos utilizados pelo Programa Educação em Saúde, do DME, o relatório da Avaliação dos Programas de Extensão da UFSCar 2009-2010 (UFSCAR- PROEX, 2012), curiosamente, não traz a prestação de contas do período.

33 Fonte: <https://drive.google.com/file/d/1pemtaZGdBqlHenWPKxN47wXNlA9GKP0W/view> - Acesso em 20.06.2018.

Outline

Documentos relacionados