• Nenhum resultado encontrado

2. BIOGRAFIA, CONTEXTO E INFLUÊNCIAS

2.2. VEBLEN E A ECONOMIA DE SUA ÉPOCA: POR QUE A ECONOMIA NÃO É

2.2.2. As Influências da Filosofia Pragmática Clássica e Suas Lições Psicologistas

2.2.2.3. William James: os princípios da psicologia

Dentre uma série de palestras ministradas entre novembro de 1906 e janeiro de 1907, em Boston e Nova Iorque, William James dedicou uma delas a melhor expressar suas considerações sobre o que seria o pragmatismo59. Com o sugestivo título ―What Pragmatism Means‖60, de maneira bastante didática James estabeleceu ponderações em relação à função da filosofia pragmática e seu caráter psicologista (James [1922] 2009). Segundo James ([1922] 2009), a filosofia pragmática, através de seu método, objetiva liquidar as intermináveis disputas metafísicas através da interpretação dos fatos e seus desdobramentos práticos. Para tal, James argumenta a necessidade de um olhar processual sobre esta perspectiva filosófica, afinal, foge-se de preconcepções teleológicas geradoras de verdades absolutas, atentando-se a ambiente e contexto, ontológicamente falando, como selecionadores relativistas da verdade (James [1922] 2009).

James, então, cede ao pragmatismo o papel fundamental de solução às limitações metodológicas relacionadas às preconcepções racionalistas que, segundo o autor, seriam geradoras de resultados demasiadamente abstratos, sendo, nos melhores dos cenários,

59 No prefácio na obra Pragmatism ([1922] 2009), William James destaca sua insatisfação com o nome

―pragmatismo‖, porém o considera irreversível, considerando a gigantesca dimensão que já havia atingido a terminologia quando buscava-se referenciar às contribuições dessa ―escola‖ filosófica.

aproximações da realidade (James [1922] 2009). Sobre isso, o autor aponta o atrelamento da filosofia pragmática com a realidade empírica e observável, apresentando riqueza de possibilidades de interpretações com base nas verdades relativas (pragmáticas), livres de axiomas e pressuposições reducionistas (James [1922] 2009). Desse modo, pela perspectiva de James, existe grande crítica atrelada ao pragmatismo no que se refere às noções racionalistas. Assim, James ([1922] 2009, p. 29) argumenta que: ―such then be the scope of pragmatism – first, a method; and second, a generic theory of what is meant by truth‖.

Além de desempenhar grande papel na apresentação metodológica do pragmatismo, observa-se também que diferentes autores parecem convergir com a fundamental importância que William James desempenhou como formalizador e divulgador de estudos psicologistas em sua época (Landsman, 1957; Dugger, 1979; Edgell & Tilman, 1989). Como pragmatista, seu papel fundamental foi de desenvolver uma teoria psicológica-filosófica convergente com preconcepções naturalistas – especificamente evolucionárias – em relação ao indivíduo e o seu meio, atentando ao processo de formação do raciocínio humano através de aspectos habituais pautados pela biologia darwiniana (Landsman 1957).

William James, the pioneer, sought to build a new psychology on the basis of Darwinism: a psychology as a natural science. In consequence, he emphasized the biológical nature of consciousness, the biológical basis of habit, the biológical bases of conception, and so on (Landsman, 1957, p.337).

Esta abordagem psicologista em James pode ser melhor entendida através de uma de suas principais obras: The Principles of Psychology, originalmente publicada em 1890. Lá James apresenta um estudo da mente humana pautado em uma psicologia que trabalha os pensamento e sentimentos como fatos científicos a serem melhor abordados e entendidos, apresentando importantes elementos, como por exemplo, método de análise do comportamento, consciência, associação, memória, hábitos, dentre outros (James [1890] 2007)61.

Com base na referida obra, é possível notar que, assim como Peirce e Dewey, James também atribui o comportamento humano à aspectos da socialização dos indivíduos, observando-os e analisando-os como fruto de seu meio, e extrenalizadores de aprendizados socialmente compartilhados (James [1890] 2007). Também assim como os demais pragamtistas anteriormente observados, James destaca a importância dos hábitos na tomada

61

Cabe destacar que devido ao período de publicação da obra, esta seria uma das mais incipientes contribuições ao pensamento e a teorização da psicologia.

de decisão e no comportamento. Segundo James, grande parte das deliberações e ações desempenhadas pelos indivíduos seriam resultado de um comportamento previamente aprendido e incorporado. Tal aprendizado habitual não só corrobora com a socialização e aceitação do indivíduo em seu grupo social, como também o auxilia nas mais diversas ações e deliberações hodiernas, afinal, ―habits diminishes the conscious attention with which our acts are performed‖ (James [1890] 2007, 114).

Observa-se que James apresenta papel significativo na noção de impulsos e instintos na teoria de Veblen. Porém, nota-se que o autor não partilhava integralmente da definição de instintos veblenianos62, conforme bem destaca Almeida (2015b). Segundo James ([1890] 2007) os instintos seriam uma ação que se desencadearia de determinada maneira e visaria determinado fim, sem que houvesse nenhum tipo de ―comportamento aprendido‖ (educação) durante esse processo. Essa distinção é importante, pois, segundo James ([1890] 2007) os hábitos e os instintos apresentam conceitos que são essencialmente diferentes, e também desempenham funções consideravelmente diferentes. James ainda destaca ao caráter instintivo dos seres humanos como um processo de motivação, e aponta que, assim como em qualquer outra criatura animal, nossos instintos seriam cegos em seus objetivos (James [1890] 2007).

Conforme já comentado, James apresenta aos hábitos como comportamentos aprendidos através de uma educação social. Esses hábitos são responsáveis, segundo o autor, por conduzir grande parte da vida dos indivíduos. O caráter não determinístico das habituações na vida dos seres humanos também é destacado por James, de maneira muito semelhante à comentada por Dewey. Segundo James, os hábitos aprendidos por um indivíduo podem ser alterados e reajustas devido ao caráter de ―plasticidade‖ da mente humana em se adaptar a um diferente cenário. Obviamente, o estado habitual tido como tradicional pelo indivíduo, tende a se manter inalterado em um primeiro momento, devido a forte incorporação daquela forma de pensar e agir, afinal, todo comportamento frequentemente repetido tende a ser preservado (James [1890] 2007). Porém, a plasticidade garante que, mesmo com dificuldade, o indivíduo seja apto a alterar tais habituações.

Nesse ponto, podemos observar o objetivo biológico por trás das considerações de James. Afinal, quando o autor estabelece um papel de importância à plasticidade dos indivíduos, é justamente sobre uma perspectiva orgânica que essa afirmativa se baseia. Pelas palavras do próprio James ([1890] 2007, p.105): ―[o]rganic matter, especially nervous tissue, seems endowed with a very extraordinary degree of plasticity of this sort‖. E, baseado nesta

noção da biologia neurológica, James nos apresenta uma de suas proposições sobre o comportamento habitual: ―[…] the phenomena of habit in living beings are due to the plasticity of the organic materials of which their bodies are composed‖ ([1890] 2007, p.105). Ou seja, os indivíduos respondem ao meio que estão inseridos através de ajustamentos habituais que lhes garante aptidão à existência social.

Uma noção importante de se observar quando estuda-se as habituações em James, é atentar ao fato que, assim como em Dewey, as experiências são importantes para se aderir a comportamentos. Porém, James ([1890] 2007) estabelece uma diferença entre o aprendizado via uma experiência pura, e o aprendizado via uma experiência de terceiros. E, justamente para estabelecer essa diferença, James trabalha com o conceito de apropriação. Almeida (2015b) nos auxilia explicando que a apropriação ocorre através da observação do comportamento alheio frente a determinado cenário, como se fosse um processo de aderência comportamental. Não necessariamente o indivíduo estabelece uma relação de experiência com a motivação daquele comportamento, mas sim pauta-se na experiência de terceiros sobre aquele cenário, repetindo um comportamento originário de uma experiência pura de outrem.

Desse modo, pode-se observar uma certa convergência e complementariedade em relação as contribuições de Peirce, Dewey e James. Afinal, como vimos acima, a generalização de uma crença em uma sociedade culmina em uma disseminação social de hábitos, quando não através experiência, através apropriação.

Fica evidente como a característica psicologista relacionada a filosofia pragmática clássica está diretamente atrelada a uma noção habitual do comportamento humano. Grandes convergências podem ser observadas entre os pragamtistas aqui abordados, principalmente quando visa se identificar e entender as suas respectivas influências na teoria de Thorstein Veblen. Conforme veremos na próxima seção, Veblen levou para sua construção teórica os importantes conceitos de instintos, hábitos e instituições. Com base nesses fundamentais conceitos o autor pode, de maneira consistente com sua proposta evolucionária, construir uma teoria convergente com os rápidos processos de mudanças oriundos da sociedade capitalista moderna.

Quadro 2 – Resumo dos Elementos Pragmáticos-Psicológicos

PENSADOR ELEMENTOS

Charles Sanders Peirce

 O comportamento é originário de crenças e dúvidas. o Crenças desencadeiam satisfação pelo

conhecimento acerca do direcionamento das ações.

o Dúvidas desencadeiam irritação pelo desconhecimento acerca do direcionamento das ações.

 Visando evitar as frustrações relacionadas à irritação os indivíduos buscam as crenças.

 As crenças são socialmente compartilhadas quando associadas a êxito.

John Dewey

 O indivíduo é fruto de um processo de aprendizado.

 Os comportamentos são reflexos de habituações aprendidas socialmente.

o O ambiente é um importante selecionador de hábitos.

 Via a psicologia como fundamental no entendimento filosófico do indivíduo.

o Há uma ligação entre emoções, experiência e comportamento.

 Os hábitos são condicionadores fundamentais do comportamento humano, mas não o explicam em totalidade.

William James

 Maior divulgador da incipiente psicologia.

 Os hábitos têm o papel de diminuir as deliberações do dia-a-dia.

 A matéria orgânica neurológica possibilita alterações cognitivas via habituações.

o O indivíduo possui a capacidade orgânica de adaptação cognitiva aos diferentes ambientes.

 Os hábitos são provenientes de experiências puras e apropriação.

o Experiência pura é uma experiência vivida pelo próprio indivíduo.

o Apropriação é uma experiência obtiva através da identificação da experiência pura de terceiros.

 Os instintos não são comportamentos aprendidos. Representam tropismos63.

Elaboração própria.