Apresentada no seminário Internacional “Arranjos Experimentais | Cultura Numérica Audiovisual” – “Performa Paço”2, no Paço das Artes, em 2013. Evento coordenado por Patrícia Moran, do LAICA, do Programa de Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Foi uma das performances audiovisuais brasileiras convidadas para este evento, que teve participação de renomados artistas e pesquisadores do Brasil e de outros países.
Performance multimídia e live-image com projeções audiovisuais, criada a partir de atuações de uma dançarina de Butoh e jogadores de Capoeira, num arranjo que integra as culturas brasileira, africana e japonesa. As imagens pré- gravadas da dança japonesa Butoh (atuação de Emilie Sugai) foram manipuladas ao vivo em processamento computacional e interagiam, através de interface de sensores e câmeras, com comandos gerados pelos movimentos de Capoeira (atuação do Mestre Griot Alcides Lima, Mestre Dorival dos Santos e do grupo de Capoeira Ceaca) e com a música criada por Roger Bacoom. O espetáculo opera entre os signos dos corpos e seus movimentos, das interfaces e dos sistemas computacionais, das telas em grande escala e das performances audiovisuais expandidas.
Figura 01: Corpo Cinesis, 2013. Fotos: Ana Rosa
Resumo
Relato da pesquisa “Criação de conteúdos audiovisuais digitais em interatividade, multitelas, multiplataformas e ambientes imersivos, em especial, a análise dos espetáculos audiovisuais “Corpo Cinesis”, “Corpo 4K”, “O Apanhar do Sonho-Tempo” e “Copan Thriller Revisitado”. Apresentações em formato de cinema expandido/VJing/ live-image, em que estão em jogo processos de direção e atuação ao vivo, transmissão em streaming em redes celulares 3G/4G e em rede fotônicas de fibra óptica de super alta velocidade, projeção de imagem em multitelas grandes e em resolução HDTV e UHDTV/4K (vídeo de super alta qualidade) e pressupostos poéticos e estéticos que perpassam a poesia, a arte e a tecnologia.
Palavras-chave: Cinema Expandido, VJing, Live-Image,
Vídeo 4K Super UHDTV, Streaming 3G/4G
Introdução
A pesquisa “Criação de conteúdos audiovisuais digitais em interatividade, multitelas, multiplataformas e ambientes imersivos”, desenvolvida por mim dentro do Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais e no Departamento de Cinema, Rádio e Televisão da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo investiga conceitos de hibridização entre mídia, arte e tecnologia, hibridismo cultural, estudos interculturais e estudos do dispositivo cinema em sua “expansão” de enunciação. O cerne da pesquisa é a exploração dos recursos de sistemas computacionais na criação de conteúdos audiovisuais digitais em interatividade, multitelas, multiplataformas e ambientes imersivos. Busco, na criação desses conteúdos, a elaboração de estética e poética técnico-narrativas.
A partir da criação estética e poética e da prática tecnológica de aparatos, interfaces computacionais e dispositivos cinematográficos e televisivos/videográficos, realizo reflexão teórica, em que as obras advindas dessas pesquisas possam ser analisadas a partir do pensamento contemporâneo sobre as artes e tecnologias e suas hibridizações.
Interatividade, multitelas, multiplataformas e ambientes imersivos são tópicos que aparecem em diversas etapas de minhas pesquisas, sejam, por exemplo, no uso de dispositivos eletrônicos e sensores, no uso do Middleware Ginga, do sistema brasileiro de televisão digital (ISDB- Tb), ou no desenvolvimento de APPs e APIs para locais específicos e mídias móveis e locativas, o que se busca é a sinergia entre o humano e os aparatos tecnológicos das artes.
Trato aqui de quatro obras audiovisuais advindas da pesquisa, “Corpo Cinesis”, “Corpo 4K”, “O Apanhar do
1 Doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão e do Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Contato: alalmas@gmail.com / +55 11 991034266
audiovisual, assistentes de direção, produção e câmeras, iluminadores e técnicos de som; músico, Roger Bacoom, trilha sonora e mixagem ao vivo; performer de dança Butoh, Emilie Sugai; performers capoeiristas, Mestre Griot Alcides Lima e Fábio Rocha Soneca; equipe de rede, coordenada por Fernando Frota Redigolo, associada ao Laboratório de Arquitetura e Redes de Computadores do Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (PSC/ EP/USP), sob Direção Técnica de Tereza Cristina Melo de Brito Carvalho; equipe de engenharia de compressão e digitalização em 4K do LAVID (Laboratório de Aplicações de Vídeo Digital), do Departamento de Informática da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), sob a direção do Prof. Dr. Guido Lemos; equipe de integração técnica, comandada por Thiago Afonso de André, do PPGMPA e do CINUSP, um dos Organizadores do Congresso Internacional Cinegrid Brasil 2014; o público participante sentado nas cadeiras da plateia do teatro.
Figuras 04 e 05: Corpo 4K, 2014. Fotos: Oskr Garcia
Na narrativa do espetáculo, há a projeção da dança Butoh em mixer com a dança do capoeirista, no palco, ao vivo. Sendo que a performer de dança Butoh, Emilie Sugai, encontra-se sozinha em uma sala separada do palco em que o público se encontra a aproximadamente 500 metros de distância; o capoeirista, Fábio Rocha Soneca, se encontra no palco, diante do público. O capoeirista atua (dança/ joga a capoeira), no palco, em resposta aos movimentos executados pela dançarina de Butoh. O diretor/VJ performa, ao vivo, em tempo real e direto, a mixagem (montagem/ edição) das imagens ao vivo, provenientes dos imputs em UltraHD4k e FullHD. Imagens UltraHD4K são do registro ao vivo da dançarina de Butoh na sala remota e imagens em FullHD do banco de dados de vídeos previamente estabelecidos pelo diretor/VJ e da câmera ao vivo no palco, que capta a performance do capoeirista. Há a trilha sonora executada ao vivo pelo músico Roger Bacoom. Essa trilha é enviada em dois canais separados, o primeiro para o palco/ teatro, onde a ação toda se passa e é ouvida pelo público e pelo capoeirista em cena; e o segundo canal, via rede para a sala remota, para que a dançarina de Butoh dance Contou com a participação criativa dos videoartistas e VJs
Rogério Borovik e Paulo Costa, que também cuidou da programação de captura de movimento; do músico Roger Bacoom; da dançarina de Butoh Emilie Sugai; do Mestre Griot Alcides Lima; do Mestre Dorival dos Santos; e de membros do Grupo de Capoeira Ceaca, Silvia Gonsales, Fábio Rocha Soneca, Rodrigo Martins Pança e Valter Souza.
Figuras 02 e 03: Corpo Cinesis, 2013. Fotos: Ana Rosa
O espetáculo teve uma duração de 32 minutos. A atuação dos capoeiristas se dava ao vivo, enquanto que a dançarina de Butoh surgia em projeções videográficas de material gravado em estúdio e nas ruas de São Paulo. Os capoeiristas contracenavam com a dançarina em tempo real, num jogo entre virtual e real, entre o espaço cênico do set de Vjing e as telas grandes (em três telas arranjadas uma ao lado da outra).
Foram detalhado no roteiro escrito as entradas ao vivo, as distribuições das imagens nas telas, a intervenção da captura de movimento via Kinect e os climas musicais, com as especificações de entrada e saídas dos músicos de capoeira e da performance eletrônica ao vivo do músico Roger Bacoom.
Corpo 4K
3Foi exibida em 2014, na programação do Evento Internacional Cine Grid4, no Teatro da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. É uma segunda versão da performance “Corpo Cinesis”, descrita acima. O 4K associado ao título vem em função da tecnologia aplicada a essa versão e a experimentação proposta com as imagens em resolução Ultra HD 4K. A performance rememora situações culturais vivenciadas pelo diretor/ VJ. Foram agentes: VJ/diretor, Almir Almas, performance audiovisual ao vivo em tempo real; Equipe técnica
2 “Arranjos Experimentais | Cultura Numérica Audiovisual” – “Performa Paço”, contou com apoio da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, do CINUSP Paulo Emílio, CNPq e FAPESP; da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e do Departamento de Cinema, Televisão e Rádio da ECA/USP. O evento apresentou, dentre seus convidados, pensadores e artistas tais como Mary Ann Doanne, Mia Makela, Cornélia Lund, Steve Dixon, Ana Carvalho, Arlindo Machado, André Parente e Katia Maciel, Alexandre Rangel, Henrique Roscoe (HOL), Marcus Bastos, Caio Fazolin e Coletivo Audiovisual Embolex. - http://www2.eca.usp.br/laica/seminarios/arranjos-experimentais- cultu- ra-numerica-audiovisual-2/
a partir do que se executa ao vivo. O ritmo da sonoridade é controlado pelo músico, que cria climas narrativos de acordo com roteiro estabelecido pelo diretor/VJ, como por exemplo, a mistura de sonoridades de instrumentos de capoeira, como berimbau e atabaque, com instrumentos tradicionais japoneses, como Shamisen e Shakuhachi.
Figura 06 e 07: Corpo 4K, 2014. Fotos: Oskr Garcia
Como uma obra que se propõe como um processo de híbridismo (ou hibridização), Corpo 4K coloca no jogo natureza das relações culturais entre Japão e Afro-Brasil. Essa concepção é evidente desde o roteiro preparado por mim para o espetáculo, com indicações de interação entre os diversos elementos que compõem a obra e de como se dá a natureza do entrelaçamento desses elementos. Como visto no artigo apresentado neste congresso, como diretor/VJ elaborei um arranjo técnico com diagramas para as necessidades tecnológicas que o trabalho exigia, pensando em como as soluções técnicas pudessem atender às demandas poéticas e estéticas colocadas em jogo. Foi necessário pensar no esquema de captura, ingest, codificação/decodificação, transmissão e projeção das imagens UltraHD4K; no arranjo das imagens FullHDTV; em como realizar o mixer das duas resoluções e suas projeções; em arranjos para o som e para a luz; em especial os canais de som para a sala remota e para o palco (performers/público).
Uma câmera 4K JVC foi usada na captação das imagens em UltraHD4K; uma sala preta, remota, foi montada para a performance da dançarina de Butoh; montou-se uma estrutura de rede fotônica, de 1Gbps, tendo em uma ponta um Live encoder/decoder 4K, com equipamento Fogo Sender e na outra ponta um equipamento Fogo Receiver, com saída para o projetor 4K Sony.
As imagens em FullHD eram processadas pelo programa Modul8 em um notebook Mac. E na projeção as imagens UltraHD4K e FullHD era mixadas para o projetor central e as em FullHD era direcionadas também aos monitores de 60 polegadas, nas laterais.
Figura 08: Corpo 4K, 2014. Foto: Oskr Garcia
O Apanhar do Sonho-Tempo
5Em formato cinema expandido/live-image e haiku expandido, contou com codireção de Clélia Mello, apresentada no “Seminário Human Connection Project - segunda edição”, organizado por Cecília Saito, em Sorocaba/SP, em 2014. Eu e a codiretora Clélia Mello (com a participação de Carlos José Martins na trilha sonora ao vivo) projetamos numa piscina e em recortes por três telas de peneiras de aço. As duas primeiras peneiras são redondas e a terceira peneira é retangular, sendo que as redondas ficam próximas ao projetor FullHD e a retangular sobre a lâmina d’água (a piscina).
As peneiras redondas são peneiras que se usam no garimpo de diamantes e na “panha” de café, em Minas Gerais. Essas peneiras redondas fizeram parte do universo, tanto da minha infância e adolescência, quanto na da codiretora, Clélia Mello.
Figuras 09 e 10: O Apanhar do Sonho-Tempo, 2014. Foto: Almir Almas Foto: Inês Correa
A linha principal da apresentação foi meu haiku publicado em 1997, no livro “Haiku”. Nesse poema, falo do primeiro sonho do ano (o kigo do haiku: hatsuyume) e da saudade de Estrela do Sul, terra natal de meus pais.
Figuras 11, 12 e 13: O Apanhar do Sonho-Tempo, 2014. Fotos: Almir Almas Foto: Inês Correa