• Nenhum resultado encontrado

Estamos trilhando a ideia de que a arquitetura desde o projeto até sua execução segue o mesmo percurso em direção a desmaterialização, passando do clássico firmitas de Vitruvio para a materialidade líquida da temporalidade que nos traz a transparência, a leveza, o mutável de uma arquitetura que se desloca com eixo do espaço para o do tempo. A crítica que se faz é ao tempo arquitetônico enquanto sucessão de imagens estetizadas e idealizadas e com as abordagens de projeto arquitetônico e seus meios nessa mesma linha de compreensão.

No carácter ideográfico um objetivo é mostrar a ação. É ambíguo e aberto como um mosaico e apto a comunicar, dependendo do contexto, uma multiplicidade de significados. É sempre contextual. O caráter ideográfico da língua a dispõe espacialmente e, portanto oposta a uma sequência discursiva. Seu signo não é arbitrário e nos remete as imagens temporais da natureza. Essa poética fica em uma zona ambígua entre escrita e pintura. É verbico- visual, assim como a poesia Concreta brasileira que inicia no final dos anos 50. Essa escrita é concreta e nos fornece múltiplas percepções, pois não há separação entre forma e tempo. As palavras são plásticas e não separam a coisa da sua ação.

As implicações mais contundentes entre espaço e tempo até agora abordadas nos leva a um afunilamento para melhor compreensão do Tempo, ou das temporalidades que procurarão dialogar com as experiências didáticas que serão apresentadas.

Para Allan Watts “os objetos são também acontecimentos” e nosso mundo é mais um conjunto de processos que de entidades (7). Isso nos põe diante dos elementos básicos da ordem temporal assim como são entendidos: duração, ritmo, frequência, proximidade, repetição, permanência, aceleração, transladação e ressonância que sempre são vistos como uma dimensão complementar e a serviço da espacialidade.

A questão é que a temporalidade, como apresentado pelo filósofo Bergson (8) é sempre entendida e mensurada através da espacialidade, como já dito. Para ele o tempo não pode ser medido pois o que normalmente se mede é o deslocamento de algo no espaço. Quando se mede o tempo está se medindo de verdade o espaço, com suas unidades estanques, fragmentárias, regulares como as de um relógio. O tempo é transformado em espaço para se tornar visível e mensurável. É também entendido como uma extensão e portanto com as qualidades e características do espaço. Por isso Bergson lança o conceito de tempo como Duração que não se coloca como mensurável.

O Tempo enquanto Duração é subjetivo e se faz presente pela Memória viva, e dinâmica de todos e de cada um. Memória que viva repleta de traços intensos que produz diferença ao selecionar o que deve ou não ser esquecido. Memória não homogênea que inunda o presente com resíduos do passado preparando o devir como um desdobramento encorpado e singular. A Duração é também o Tempo como Diferença, diferença dada pela multiplicidade dos tempos e sua heterogeneidade, do tempo de vida e experiências do sujeito, do mundo ao redor e do presente que contrai e presentifica essas diferenças.

O Intervalo que se apresenta como Duração é sempre a construção da Diferença. Aqui marca o início para o entendimento das experiências que realizei e realizo com estudantes de arquitetura no sentido de tornar presente a leitura e transformações de elementos espacios- temporais a partir da temporalidade, estimulando as transformações e mutações de os espaços de caráter arquitetônicos em sua própria dimensão de vida fluída. Mas como chegar, como entrar no objeto tema? Para Bérgson há duas maneiras de se conhecer algo. A primeira é analítica e ocorre por rodeamento da coisa em busca de pontos fixos e redundantes e isso depende do nosso ponto de vista ao rodear e de nosso repertório simbólico. Assim são gerados a maioria dos procedimentos científicos.

os desenhos (C) ou as maquetes (D,E,F) de estudos dos alunos sejam singulares, frutos de quem escolhe e faz como ato. Nesse conjunto de abordagem, de protométodo, o eixo é a potência nas diferenças de linguagens e nos meios projetivos através de intervalos entendidos como Duração e pontos de mudança que provocam a reinvenção de códigos e do próprio objeto tema que apresenta sua mobilidade durante as sete semanas.

C- Desenhos dos alunos: croquis/diagramas D- Maquetes recombinantes de estudos

E- Maquetes recombinantes de estudos F- Maquetes recombinantes de estudos

Conclusões:

É na incerteza da Função que a Arquitetura produz um sujeito. Esse argumento só é possível de entender pois os trabalhos apresentados não se representam como uma Arquitetura de um instantâneo temporal, de um dualismo estanque e previsível como a relação clássica onde para cada Função haverá uma Forma. O movente está nos processos de invenção abertos, dos croquis as maquetes, também na forma como esses trabalhos são problematizados pelo conjunto alunos/professor e ainda como resultados em possíveis arquiteturas. Esses três entendimentos do movente estão nos procedimentos propostos pela diferenças que apresentam no percurso, diferenças essas que funcionam como molas impulsionadoras que lançam para o devir que também se apresentará incompleto na sua característica de signo assim mantendo a mobilidade do que está em aparente mas não em redundante repouso. O intervalo enquanto duração permite uma autoria da ausência e inédita, sendo essa expectação de lenta espera, de observação e tomadas de decisão sobre os trabalhos, apresentam-se cada vez mais semelhante a algo como a arquitetura contemporânea de base temporal que se procura resolver. Essas atitudes põem por terra a perspectiva de sucessão contínua que faz a arquitetura em todos seus procedimentos parecer instantes fotográficos que aprisionam o tempo e seu fluxo evitando a própria correnteza da arte da arquitetura.

O entendimento dessas questões estão em compasso com Os processos de SLOWER da sociedade, de lentidão e interação dos procedimentos, seja nas cidades, arquitetura, alimentação, projetos participativos, processos coletivos diretos de produção, articulação como o DIY, do it yourself que alteram o processo produtivo. Muda a ideia de consumo fácil, alienante e incentiva a produção/participação mais A questão apresentada pensada enquanto professor de um

curso de arquitetura era como trazer as questões do Tempo pra estudantes iniciantes do curso de arquitetura através dos limites das linguagens escrita, falada, desenhada ou construída em escalas. No decorrer das práticas foi e está sendo articulados os entendimentos estratégicos: 1o Trazer como agentes provocadores a produção de arte espacio-temporais, em várias formas, escalas e contextos a partir da Arte Concreta, passando pelo Minimalismo até os Contemporâneos (A). De Vladimir Tatlin, Hélio Oiticica, Gordon Mata Clark, Jesus Rafael Soto, Robert Smithson até Dan Graham. O aluno pesquisa, acolhe o que identifica, o que o mobiliza entre infinitas escolhas pode ser o Imaterial e o Invisível em Soto e Gego ou a diferença das materialidade- temporalidade da Luz em Moholy-Nagy, Dan Flavin e James Turrel. 2o Valorizar caráter arquitetônico do projeto e não a arquitetura como tipologia, deixando-a como signo aberto, não redundante, não dualista tipo forma/função e não simbólica. Nesse momento de pergunta ao conjunto de caráter arquitetônico o que ele deseja ser, como faria Louis Kahn. 3o Desenhar (B,C) a partir dos desejos da arquitetura, de quem arquiteta e adequado a proposta de temporalidade enquanto duração valorizando o fluir no tempo e a diferença que emergirá, utilizando croquis e diagramas. 4o Na mesma linha do desenho produzir em todas as etapas maquetes de estudos (D,E,F). Maquetes volumétricas, fáceis de fazer, que respondam com qualidade aos elementos básicos propostos e abertas a mudanças e metamorfoses para fazerem sentidos.

A- obras referenciais B- Desenhos dos alunos: croquis/diagramas Esse trabalho dos Recombinantes Arquitetônicos dura cerca de sete semanas com sete aulas de quatro horas. Parte-se de dois poliedros divergentes que serão colocados em conflito espaço temporal em que semana após semana serão abordadas novas questões do campo ampliado da arquitetura, mas deriváveis controladas e que alterarão o rumo do projeto. Toda aula os alunos apresentam para a turma o caderninho de desenho, maquete com apresentação individual e aberta a problematização por todos com intensas trocas.

Nesse percurso das aulas ocorrem transformações lentas que arrastam traços não gêmeos de outras memórias artísticas antes estudadas ou metamorfoses sem aparência com os artistas vistos e que revelam-se de outras maneiras como na interação habitante/habitado ou no entendimento da materialidade e ou temporalidade. O importante é que os recombinantes arquitetônicos se retroajam pela diferença, como uma invenção dissimétrica entre todas as origens que geram potências pela diferença de forças na sua estrutura. A diferença dada por dissimetria nos conflitos tanto dos artistas em relação aos recombinantes arquitetônicos, como dos conflitos dos dois poliedros a procura de uma solução, vistos pelo intervalo como duração, permitem que

mais intensa e responsável sobre sua ação.

Essas conjunções permitem articular uma abordagem onde o tempo seja estruturante e faça a diferença. Abordagem que se apresenta preciosa pois é sempre escolha única e que define o sujeito como potência em sua singular complexidade.

Notas:

(1) TAMAI, S. Mestrado I.A. Unicamp - páginas 20/21. (2) HARVEY, D. Condição Pós Moderna - página 190. (3) Ibidem - página 54.

(4) TAMAI, S. Potência signica na passagem dissimétrica entre artes.

Sobre campo ampliado e desmaterialização da cultura.

(5) KRAUSS, E. R. A escultura no campo ampliado página 93. (6) FENOLLOSA, E. e POUND, E. El carácter de la escritura china

como medio poético. (tradução pessoal).

(7) WATTS, Allan. O Zen - página 24. (8) BERGSON, Henri. Duração e simultaneidade.

(9) LISSOVSKY, M. A máquina de esperar - página 7, sobre o conceito

de Expectar.

(10) SOLÀ-MORALES, Ignasi de. Territórios - página 126.

Bibliografia:

BERGSON, Henri. Duração e simultaneidade. Trad. Cláudia Berliner, SP. Martins Fontes, 2006.

DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. Tradução Luiz B. L. Orlandi. Coleção Trans, Editora 34, 1999.

FENOLLOSA, Ernest e POUND, Ezra. El carácter de la escritura china como medio poético. Libro II de la coleccion Visor Literário. Madrid, Editor Alberto Corazon, 1977. HARVEY, David Condição Pós Moderna - Ed. Loyola - 345 pgs - Brasil 1994.

KAHN, Louis I. Forma y Deseño. E. Nueva Visión, Buenos Aires Argentina 63 páginas - 1974

KRAUSS, E. Rosalind. A escultura no campo ampliado. Tradução de Elizabeth Carbone Baez. In: Revista Gávea no.1, Rio de Janeiro, ed. Puc RJ, 1978.

LISSOVSKY, M. A máquina de esperar. Rio de Janeiro RJ - UFRJ - capturado web 2010. http://www.pos.eco.ufrj.br/docentes/publicacoes/ mlissovsky_5.pdf

WATTS, Allan. O Zen Ed. Clivagem - Portugal 235pgs 1978 SOLÀ-MORALES, Ignasi de. Territórios. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2002.

____________________. Diferencias – topografia de La arquitecture contemporânea. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2003.

TAMAI, Sidney. Potência signica na passagem dissimétrica entre artes, Brasília - UNB artigo apresentado no #10Art, 2011.

____________________.Mudanças de sistema projetivo do espaço e tempo através da computação gráfica e suas ressonâncias na sintaxe arquitetônica. Mestrado - Campinas, Instituto de Artes e Multimeios, Unicamp, SP, 1995.

Praxis e Poiesis: da prática à teoria artística -uma abordagem