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A possibilidade de ampliação dos limites do homem por meio das máquinas foi busca de muitos artistas do Renascimento italiano, como Da Vinci, e angústia de cineastas como Charles Chaplin ou Fritz Lang, no início do século passado. A contemporaneidade, tanto por meio do desenvolvimetno tecnológico, quanto por meio das artes, tem redesenhado essa relação e suas consequências, promovendo novas práticas nas quais a criação e fruição da arte tem ampliado enormemente suas possibilidades mediante a utilização das novas ferramentas tecnológicas.

Nesta conjuntura, o ciberespaço e o meio digital se articulam como principal ente para a construção de novas poéticas para o artista, nas quais a presença do público fruidor da obra de arte evolui até se conformar como parte integrante e dialogante da práxis artística.

Esta nova concepção, que está presente na gênese da cibercultura, já foi defendida pela avant-garde para os quais a presença do público era outro elemento a mais no processo criativo. Para Marcel Duchamp, em sua obra O ato criador (1965), “o ato criador não é executado pelo artista sozinho; o público estabelece o contato entre a obra de arte e o mundo exterior, decifrando e interpretando suas qualidades intrínsecas e, desta forma, acrescenta sua contribuição ao ato criador” (citado por Battcock, 1973).

A presença do público na sala de exposição, já não é concebida da mesma forma que nos séculos passados, a passividade da contemplação e da percepção da obra de arte está sendo modificada por aquela de um público ativo que explora de modo interativo, e menos contemplativo, o objeto artístico, se configurando como uma das características da nova forma de se relacionar e entender a arte na atualidade. Mesmo obras da hsitória da humanidade, sejam pinturas, esculturas, ou mesmo a arquitetura, tem tido sua mediação redesenhada por meio de programas gráficos e holográficos que permitem ao público se colocar na obra, ou ter a noção de como era um templo romano no apogeu de sua existência como edificação habitada. As novas formas de mediação digital tem nos levado a experiências estéticas ímpares.

Nesta nova dinâmica as Tecnologias da Informação e da Comunicação, com a Internet como principal paradigma, assim como os novos dispositivos que permitem interagir com o meio digital e o ciberespaço, têm sido os aliados para uma nova relação entre artista, obra e público nos espaços expositivos do século XXI. A obra de arte, em sua intrínseca função comunicadora, é novamente chave para a consolidação deste novo modo de agir com as práticas e experiências culturais; ela, a arte, toma para si a capacidade de levar o público, graças ao uso dessas novas tecnologias, à promoção de um novo diálogo e interação com o público.

A obra do artista capixaba Attilio Colnago, que centra a nossa experiência, torna-se especialmente relevante em referência ao papel comunicativo da arte. As representações e trabalhos do artista formam uma rede que combina elementos de memória pessoal do artista, assim como imagens icônicas da história da arte que ficam reconfigurados em uma nova

imagens pessoais que o artista reformula na pintura durante o ato da concepção (Figura 5).

Figura 3. Attilio Colnago, Hasta que me olvides (2009). QR code colocado na sala de exposição com acesso aos conteúdos digitais.

Figura 4. Attilio Colnago, El vacio que dejas en mi (2014). Conteúdos digitais do QR code.

Figura 5. Attilio Colnago, Humilitate (2014). Conteúdos digitais do QR code.

Desta forma, os QR codes na sala de exposição se mostram como intermediários entre a prática criativa do artista e do público, comunicando a mensagem que é uma parte intrínseca da obra, descobrindo em cada acesso um novo detalhe, uma chave que ajuda à compreensão e fruição total da obra. A interatividade que se estabelece com os conteúdos digitais, e através de equipamentos de telefonia móvel – que hoje se configuram como acessos aos nós das redes de significação e possibilidades do

envolvimento mais significativo e ampliado do visitante na obra do artista.

Figura 1. Sala da Memória. Edição fac-símile do caderno de estudos do artista.

Figura 2. Sala de Memória. Estudos originais nas paredes e telas sensíveis ao toque com os cadernos do artista, que podia ser “folheados” pelo público.

Como uma extensão do projeto curatorial para a Sala de Memória, se colocaram diferentes QR codes1 em algumas das obras da mostra (Figura 3). Estes códigos tinham uma missão de revelação, pois atuavam como pontos de acesso a informações hospedadas na Web (http://attiliocolnago. wix.com/oencantado), e mostravam conteúdos inéditos sobre o processo criativo do trabalho que acompanhavam. Certamente no espaço de exposição a obra se mostra no momento final da mesma, a exibição. Mas, este resultado se acompanha de outros referentes que compõem o trabalho anterior, o processo criativo do artista, e que falam das motivações e os estudos prévios.

São aquelas alusões à memória afetiva do artista, e a sua relação com os grandes mestres da história da arte que reinterpreta com novos significados. Como André Malraux nos falou, em seu livro Le Musée Imaginaire (1947), na obra de arte não só participa a visão do artista, mas também fazem parte da mesma outras obras. E, é assim que encontramos exemplos da Magdalena de Rogerd van der Vaiden do tríptico Braque em “El vacio que dejas en mi” (2014), que é acompanhada por outros símbolos da memória afetiva do artista (Figura 4), ou a obra de Giotto, Sao Francisco de Assis renuncia aos bens terrenos, que em “Humilitate” (2014), é reinterpretada com um mosaico de

sobre interatividade e interfaces digitais. Tendências XXI, no 2, pp. 19 - 29. Lisboa, 1997.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999. LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean. A tela global: mídias culturais e cinema na era hipermoderna. Porto Alegre: Sulina, 2009.

MALRAUX, André. Le musée imaginaire. Paris: Gallimard, 2010.

1 QR Code: é um código de barras bidimensional para ser usado a partir de telefones celulares equipados com câmera. Esse código é convertido em texto (interativo), um endereço URL, um número de telefone, uma localização georreferenciada, um e-mail, um contato ou um SMS, enfim, esse código remete a informações para além de si, permitindo uma interatividade que amplia a informação sobre o local ou objeto no qual está aplicado.

ciberespaço -, oferecem enormes possibilidades vivenciais, estéticas e, porque não, didáticas na fruição e estudo da imagem ao permitir que o usuário, um usuário ativo, possa navegar no interior de uma obra concreta, para visionar um detalhe interessante e se introduzir dentro da mente criativa do artista, para deste ponto ir a sem limites da experiência estética na web.

Conclusões

Novas formas de comunicação e fruição da arte parecem ter como destino ocupar os espaços expositivos do século XXI, que será interdisciplinar, plural, ou não se efetivará. Agora, a relação que se estabelece entre o público, a obra de arte e o artista se aproximam cada vez mais, tornando a experiência museística num ato de comunicação social, com forte impacto na formaçnao subjetiva dos sujeitos. Uma qualidade que é intrínseca à arte desde os tempos pré- históricos e que através das novas tecnologias, amparadas nos novos conceitos abordados na cibercultura como nova forma de entender o mundo, nos proporcionam novos modelos de interação e ampliam a experiência artística, as quais expandem as práticas sensíveis do ser humano. É o que André Lemos fala, se referindo à retribalização eletrônica:

A cibercultura, baseada nas tecnologias de princípio digital- interativo proporciona, nesse fim de século, um “revival” de interações sociais tribais. Vemos que o que importa hoje, é muito mais a interação social através das novas tecnologias, que a simples melhoria da relação homem- máquina. O computador é um exemplo nesse sentido; surgindo como máquina de calcular sofisticada, ele se transforma num verdadeiro instrumento convivial e interativo. No reino das tecnologias digitais e do ciberespaço, somos todos anjos da interatividade, imersos num “temps d’illumination” (1997, p. 29). Assim, a capacidade de interagir com os conteúdos digitais, tais como as que oferecem as telas digitais ou os QR code, fornece elementos que reduzem o fosso entre a mente criadora e a sociedade do seu tempo, e além disso também representa uma nova dimensão, pois estabelece novos âmbitos de fruição e conhecimento através do (ciber) espaço de exposição.

Referências

BATTCOCK, Gregory. A nova arte. Sao Paulo: Perspectiva, 1973.

BELLIDO, María Luisa. Arte, museos y nuevas tecnologías. Gijón: Trea, 2001.

KUTSCHAT, Daniela. Visualização de dados e “tangibilização” da informação: una questão cognitiva. Em: Giselle Beiguelman e Ana Gonçalves Magalhães (Org.). Futuros possíveis. Arte, museus e arquivos digitais. pp. 266 - 276. São Paulo: Peirópolis, 2014.

Proposta de uma Estratégia de Design em associação às