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doutorado abordando o tema da aprendizagem em rede; a realização de três laboratórios abertos anuais, AB’12, AB’13 e AB’14; e, a participação em novembro deste ano, no Laboratório Iberoamericano de Inovação Cidadã como proponente de um dos 12 projetos selecionados. para desenvolvimento colaborativo. Caminhando para sua quarta edição, fez-se necessário organizar seu banco de dados, que inclui: registros em fotografia, vídeo, texto, documentação de processo, programas dos softwares produzidos, áudios, site, etc. Processo que remete a demanda de compreender o significado e alcance do que está por trás da materialidade dos objetos produzidos como representação daquilo que o projeto reclama em sua nomeação: a potência da experiência colaborativa, o aprender, o brincar.

A experiência é o lugar do invisível. É algo que não é exatamente palpável e traduzível, requer uma linguagem própria que lhe confira uma expressão. Jorge Larossa (2014) a considera uma categoria livre, algo que nos sucede, nos toca, nos transforma, algo que não se pode definir nem tornar operativo. Portanto, optamos por olhar seus efeitos indiretos, no que é revelado pelo afeto como modus de passagem de um estado a outro. Spinoza (2013, p.163) compreende o “afeto como as afecções do corpo pelas quais sua potência de agir é aumentada ou diminuída, estimulada ou refreada”. Quando vários corpos reunidos em um mesmo ambiente afetam- se mutuamente para a alegria, essa potência é de um crescente que transborda. O que esperamos, pois, de uma experiência que seja colaborativa, é propiciar que, juntos, isto é, com os outros, possamos ir para além de nossas bordas e nos vincular. Criar múltiplas conexões, emaranhados de vínculos que se entrecruzam, ganhar território, gerar espaço de circulação de fluxo. Laborar para o crescimento. Se há aumento, crescimento, evolução, o verbo aprender se fez presente. Por sua vez, crescer, evoluir brincando, esta diretamente relacionado com a atitude própria do explorar, experimentar e investigar estando em presença e no presente, o que caracteriza o brincar da criança. A presença é solicitada, o corpo que sente, o corpo que é afetado, corpo que afeta.

Quando a criança brinca no fundo o que ela está fazendo? A criança brinca com uma pedrinha, com um graveto, com as próprias mãos, com a palavra, com a escada de maracá, o jabolô... Brincando a criança está, o tempo inteiro, e inteira no tempo investigando, experimentando, explorando. Estes três temperos explorar, experimentar, investigar, formam a base da Construção do Conhecimento (Marques, 2007 apud Melo, 2008, p.73)

Conhecimento conectado com o modo de vida e que afirma a vida prática. Para tanto necessário criar um ambiente que exorte à vivência que aproxima-nos do lugar da experiência, buscando uma produção de presença dada na relação espacial com o mundo e seus objetos, com aquilo que pode ser tangível por mãos humanas e, portanto, afetar nossos corpos e ser afetado (Gumbrecht, 2010). Um ambiente organizado para a produção coletiva e que reclama o corpo, um corpo em movimento, em atividade, em relação com outros sujeitos e objetos, um ambiente que ajuda a nos

Resumo

O presente trabalho constitui-se como um inventário de experiências e objetos desenvolvidos ao longo dos laboratórios abertos do projeto Aprender Brincando: uma experiência colaborativa, realizados no período de 2012 a 2014, no Colégio de Aplicação da UFRJ. Nos laboratórios, artistas, designers, programadores, educadores de diversas áreas e alunos da educação básica foram convidados para desenvolver projetos colaborativos que articulam arte, ciência e tecnologias tradicionais e digitais. Na edição de 2014, denominada Objetos de Afeto e tramas da escola: tecendo redes, unimos o bordado tradicional e a tessitura manual com linhas e fios, com a programação e a tessitura digital de redes mesh e objetos interativos. Dentre os objetos de afeto produzidos, selecionamos apresentar a instalação Sente Zen, o pirate box e o livro objeto bordado em suas versões como objeto, livro impresso e digital intencionando, a partir da força poética dessas bordaduras, ativar experiências sensíveis no presente, que carregam em si um mesmo teor da densidade crítico-poética com que foram originalmente vividas, ainda que, necessariamente, distintas da experiência original. Esse desafio é lançado por Suely Rolnik ao discutir as possibilidade e potência de um inventário voltado para a produção de um arquivo “para” e não “sobre” a experiência artística ou sua mera catalogação objetiva. Tais objetos falam da potência do afeto, da produção colaborativa de conhecimento e do papel que a arte e a ciência desempenham na produção de outras realidades possíveis e valores na educação e na vida.

Palavras-Chave: bordadura, afeto, projetos colaborativos

Inventário - s.f. do Latim inventarium, “lista de trabalho, catálogo de coisas”, que vem do verbo invenire, “descobrir, achar”. O que vem a ser e como se configura um inventário de experiências e objetos que constitui-se enquanto escritura? Dos objetos podemos criar uma lista, catalogá- los e recuperar seus rastros, das experiências a partir das quais originaram-se e que suscitaram podemos invenire, isto é, descobrir formas de “ativar experiências sensíveis no presente, que carregam em si um mesmo teor da densidade crítico-poética com que foram originalmente vividas” (Rolnik, 2013, p. 227). Aprender Brincando : uma experiência colaborativa é um projeto que nasceu com essa proposta, ainda que somente no ato de inventariá-lo esse fato tenha sido apreendido. Nasceu da participação e observação de experiências vivenciadas em laboratórios abertos de oficinas de programação interativa e computação física utilizando plataformas como Processing e Arduíno. O modo de organização e o ambiente propiciado foram afetos que potencializaram uma futura participação como colaboradora no laboratório aberto de produção colaborativa do programa Visualizar’11, Medialab Prado, Madrid, Espanha. Como educadora percebi que havia ali algo de novo que poderia apontar para a criação de outras realidades na educação. A potência desse afeto gerou desdobramentos: a escritura do projeto agraciado com o III Prêmio Instituto Claro - inovar e empreender com as TICs na educação; uma tese de

1 Doutora em Comunicação e Semiótica (PUC/SP), docente do quadro permanente do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Contatos: belgoudart@gmail.com; +5521996957255.

ancestrais e tradicionais que nos possibilitem realizar a transição para novas formas de gestão do cotidiano, dos vínculos, da tessitura de redes afetivas, autônomas e livres. Segue um pequeno inventário e uma catalogação de alguns fragmentos de objetos produzidos ao longo dos laboratórios. Ao partilhar suas histórias, narrá-las, tecer seus fragmento e bancos de dados, versões, intencionados realizar bordaduras.

Arquivo número 1:

página bordada retirada do livro-objeto, 2014

“O bordado marca o suporte, decompõe o tempo no tecido, decompõe a vida. A linha impregna-se de tecido, adentra-se em suas tramas, entranha-se. Cada ponto bordado é um registro e um desejo de permanecer” (GUIMARÃES, 2014).

Arquivo número 2:

fragmento de texto recortado para o livro impresso

Arquivo número 3: redes sociais, narrativas do instanragmento

tornarmos atentos, estar presente no presente, isto é, a nos expormos ao que está acontecendo, ao que nos sucede, ao que nos toca, à experiência em si. Transpomos para o ambiente escolar os laboratórios abertos.

Laboratórios abertos como comunidades livres onde educandos e educadores compartilham novos ambientes de aprendizagem que privilegiam a circulação de informação, a experiência e a construção de conhecimento pelo aprendiz e o aprendizado e vivência do afeto enquanto cognição. Ambientes onde o conhecimento é artesanalmente construído por todos, através de princípios como colaboração, transmissão de conhecimentos, participação e partilha, onde a experiência do fazer e pensar redes é comum, na existência de uma experiência coletiva ligada a um trabalho e a um tempo partilhados em um mesmo universo de prática e linguagem, como uma obra aberta em constante formação e adaptação, cada rede como o desejo de um nova e uma outra. Laboratórios que articulam arte, ciência, cultura e tecnologia no desenvolvimento de projetos colaborativos e aprendizagem em rede.

A colaboração emerge como um padrão de comportamento de rede que favorece a diversidade de pontos de vistas, de experiências, de saberes (práticos, científicos, comuns), que, junto com a flexibilidade, possibilita que o sistema permaneça sobrevivendo às perturbações e adaptando-se às condições mutantes. Por sua vez, as parcerias fundadas na confiança e na solidariedade propiciam que ambos os parceiros aprendam e mudem, co-evoluam. Esses são princípios de organização de ecossistemas, uma ecologia de rede. (Goudart, 2012, p. 138-139)

Do encontro entre a bordadura nas artes visuais e a ciência da programação, surgiu a terceira edição do Aprender Brincando, o laboratório aberto Objetos de Afeto e tramas da escola: tendo redes, parceira com o projeto Arte do Fio, coordenado por Mariana Guimarães, artista e educadora. Mariana propõe a bordadura como um modus, onde o bordar é um ato, o bordado é um nome e a bordadura é um modus de produzir experiência, afeto, vínculo e autonomia. No ato de bordar instala-se um tempo de silêncio e narrativa. Agulha que perfura o pano e carrega consigo a linha, linha que cobre o risco e permanece como escritura do gesto, tessitura que carrega no fazer com as mãos a ancestralidade do fazer coletivo; na intersecção dos dois projetos encontramos pontos em comuns, semelhanças. Dessa colaboração, a bordadura foi incorporada ao digital como um modus de produzir experiência, afeto, vínculo e autonomia a partir de subjetividades conectadas, de uma estética conectiva. As mãos no teclado perfuram a tela, inscrevem linhas de código, arquivam dados, no direito da interface, linguagem de máquina traduzida em visualidades, sonoridades e textualidades, “no meio fluido da virtualidade, o arquivo torna-se dispositivo dinâmico, com entradas multiplicadas e conexões que se produzem veloz e infinitamente” (Farkas, Solange in Pato, 2012, p.8). Em tempos onde a experiência tem se perdido na impossibilidade de sua transmissão e/ou assentamento devido o acelerar constante das mudanças e transformações de hábitos e da multiplicação dos objetos que nos afetam, é tarefa da arte, por sua própria natureza de lidar com as possibilidades do real, preparar nossa sensibilidade para a criação de futuros possíveis e viáveis para a manutenção da vida, da espécie e do planeta. É tarefa da ciência propor formas e soluções para este fim. Arte e ciência são formas de conhecimento que auxiliam seres humanos a pensar novas formas de adaptação e, assim como outros conhecimentos, prescindem que atem as mãos em nossos tempos. Necessário também resgatar e preservar saberes

Instruções para uso: faça o download do aplicativo QRcode Reader. Aponte a câmera de seu celular para a imagem acima e navegue pelas narrativas. Curta a página!

Arquivo número 4: a arte de bordar e tecer

Por coisas singulares compreendo aquelas coisas que são finitas e que têm uma existência determinada. E se vários indivíduos contribuem para uma única ação, de maneira que sejam todos, em conjunto, a causa de um único efeito, considero-os todos, sob este aspecto, como um única coisa singular. (Spinoza, 2013, p. 81)

Arquivo número 5: linhas de código Referências Bibliográficas

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