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MEIO DO CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS

3 O CUMPRIMENTO DOS DEVERES ESTATAIS DE FAZER OU NÃO FAZER MEDIANTE TUTELA JURISDICIONAL ADEQUADA E EFETIVA

3.3 A TUTELA DOS DEVERES DE FAZER OU NÃO FAZER CONTRA O ESTADO: MEDIDAS DE EFETIVIDADE PROCESSUAL

3.3.2 A tutela específica da obrigação e o resultado prático equivalente

A tutela executiva das obrigações de fazer e não fazer, por implicar na realização de determinada prestação em sua forma específica, exige, mais do que em qualquer outra hipótese, uma preocupação reforçada em se alcançar o ideal proposto no clássico escólio de Chiovenda, pelo qual “o processo deve dar, quanto for possível praticamente, a quem tenha um direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir”.142

Ensina Marcelo Lima Guerra que a técnica processual da tutela específica da obrigação destina-se a atender às necessidades do correspondente direito material, mais especificamente os relativos a obrigações não monetárias, materializáveis em prestações de entregar coisa, fazer ou não fazer, que devem ser satisfeitas pelo devedor exatamente como previstas no título executivo, admitindo-se a conversão em pecúnia somente nas hipóteses em que se mostrar inviabilizada a realização da tutela na sua forma específica.143

140 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação

extravagante. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 807 e 1.685.

141 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A eficácia dos direitos fundamentais sociais. In: Revista de direito constitucional

e internacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 54, jan. 2006, p. 36.

142 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. 1. ed. Campinas: Bookseller, v. 1, 1998, p.

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Já o resultado prático equivalente, igualmente estabelecido na legislação processual como meio de efetivação de obrigações da mesma espécie, diferencia-se da tutela específica unicamente por realizar-se esta com o auxílio de medidas coercitivas, de caráter indireto, que visam exercer pressão psicológica sobre a vontade do devedor. No primeiro método citado, porém, a prestação pode ser obtida sem a participação do obrigado, atuando o Poder Judiciário por meios sub-rogatórios. Dispõe o juiz, contudo, em ambas as hipóteses, de amplos poderes para impor as medidas necessárias que proporcionem ao credor precisamente o resultado concreto a que faça jus.144

Cumpre atentar, em síntese, que nosso direito processual civil contempla tanto medidas diretas (ou sub-rogatórias), nos casos em que estas se revelem adequadas para assegurar a satisfação da almejada obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa, mediante provimentos executivos lato sensu, voltados para a obtenção do resultado prático equivalente ao adimplemento voluntário da prestação, como também providências coercitivas, próprias de ordens mandamentais, para as situações em que, conforme as peculiaridades do caso concreto e as disposições de direito material aplicáveis, seja exigível o cumprimento forçado pelo próprio devedor.

Em relação à admissibilidade de concessão da tutela específica da obrigação ou obtenção de seu resultado equivalente nas ações movidas em face do poder público, consigne- se que, embora haja posicionamento doutrinário pela impossibilidade de aplicação de medidas sub-rogatórias, especificamente, contra o Estado, sob pena de invasão judicial indevida da esfera própria do Executivo,145 a orientação dominante é no sentido contrário, entendendo-se que não há, na espécie, violação ao princípio da separação dos poderes, devido à necessidade de submissão de todos os órgãos estatais ao império da ordem jurídica.146

Para igual norte converge a jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que tem decidido no sentido de que é dever do juiz, para assegurar a autoridade de suas decisões, “fazer uso de todos os meios disponíveis, desde que não proibidos pelo legislador, incompatíveis com os princípios reitores do Estado de Direito Democrático e do direito

144 GUERRA, Marcelo Lima. Execução indireta. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 45-48. 145 GRECO FILHO, Vicente. Tutela constitucional das liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 76.

146 MEDINA, José Miguel Garcia. Processo civil moderno: processo de execução e cumprimento de sentença. 4.

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processual moderno, ou ofensivos à dignidade da justiça”,147 admitindo, para tanto, a adoção

de medidas bastantes à efetivação da tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente.148

Quando da especificação, pelo órgão judicante, dos meios executivos aplicáveis em desfavor da Administração Pública e de seus agentes, no âmbito de demanda em que seja pleiteada a satisfação de direitos prestacionais, é que assumem relevância as particularidades da tutela executiva contra o poder público, do que cuidaremos em capítulo próprio.

É digno de registro, nesse passo, que o nosso ordenamento processual superou o princípio da tipicidade dos meios executivos, no tratamento legal atribuído ao cumprimento das obrigações de fazer, não fazer ou entrega de coisa, conferindo maiores poderes ao magistrado para determinar a modalidade da tutela executiva e as medidas práticas mais adequadas ao caso concreto, como autêntico reflexo do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.149

Já lecionava Liebman, a propósito, que, quanto maior a flexibilidade e a riqueza dos meios executivos à disposição do juiz, maior também será a probabilidade de se poder realizar a execução em sua forma específica.150

De fato, na execução por quantia certa o interesse do titular do direito limita-se à satisfação de seu crédito pecuniário, de modo que a atuação jurisdicional pode orientar-se de modo restrito quanto aos meios de constrição patrimonial sobre os bens do devedor, em razão de haver previsibilidade suficiente para que a lei processual possa enunciar regras preordenadas sobre os atos de penhora, avaliação e expropriação, com oportunidade de defesa ao executado, conforme o disposto nos arts. 523 e seguintes do Código de Processo Civil.

Diferentemente, as obrigações de fazer, não fazer ou entrega de coisa reclamam uma maior liberdade do julgador para conformar os meios executivos às especificidades do caso concreto, visando nortear a construção do melhor método para a obtenção da tutela específica

147 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (1ª Seção). REsp 863055/GO, Relator Min. Herman Benjamin.

Brasília, 27 fev. 2008. DJe de 18 set. 2009. Disponível em:

<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200601424418&dt_publicacao=18/09/200 9>. Acesso em: 17 mar. 2016.

148 Id. Superior Tribunal de Justiça (1ª Seção). REsp 1069810/RS, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho.

Brasília, 23 out. 2013. DJe de 06 nov. 2013. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200801389284&dt_publicacao=06/11/201 3>. Acesso em: 17 mar. 2016.

149 MARINONI, Luiz Guilherme. Controle do poder executivo do juiz. In: DIDIER JÚNIOR, Freddie (Coord.).

Execução civil: estudos em homenagem ao professor Paulo Furtado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 228-229.

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da obrigação ou de seu resultado equivalente, observados os parâmetros estabelecidos na lei processual.

Não obstante o teor expresso da norma contida desde o art. 461 do CPC revogado, repetida no art. 536, § 1º, do novel diploma processual civil, enunciando claramente o caráter exemplificativo das medidas executivas de natureza direta ou indireta destinadas à satisfação do interesse jurídico tutelado na demanda,151 convém atentar, ainda, para o disposto no art. 139, inciso IV, do Código de Processo Civil em vigor, que estabelece como dever genérico do juiz “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

Trata-se, na verdade, de uma ampliação, pelo novo CPC, do âmbito de abrangência dos meios executivos atípicos outrora restritos ao cumprimento das obrigações de fazer, não fazer e entrega de coisa, para passar a compreender, até mesmo, as ordens judiciais emitidas em ações destinadas ao adimplemento de prestação pecuniária, diversamente do regime do Código anterior.152

A escolha da modalidade de efetivação da obrigação, se por meios sub-rogatórios ou coercitivos, bem como a especificação das medidas judiciais incidentes em cada hipótese concreta, embora possa partir de um rol de alternativas deveras ampliado, não é absolutamente livre ao julgador, devendo ser orientada por critérios jurídicos próprios, sobre os quais discorreremos logo a seguir, estando sempre presente, ressalte-se, a preocupação quanto à efetividade da atuação jurisdicional, como expressão dos direitos fundamentais do devido processo legal e do acesso à justiça.

3.4 CRITÉRIOS JURÍDICOS PARA A ESCOLHA DOS MEIOS EXECUTIVOS

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