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Avaliação do ordenamento do território, contextos estuarinos e indi cadores – a importância das perspectivas integradas

Chapter 11 gives special attention to the issue of air quality “Air quality, exposure and health, as indicators of development and quality of life in cities: the case of Estarre-

2. Avaliação do ordenamento do território, contextos estuarinos e indi cadores – a importância das perspectivas integradas

A formulação e a consequente implementação de planos de desenvolvimento territorial tem, em geral, associados efeitos positivos e negativos sobre os valores am- bientais do território. Assim, quer o processo de planeamento quer a implementação de planos devem ser acompanhados por um conjunto de informação que permita avaliar os potenciais efeitos sobre o ambiente por forma a aferir e ajustar as acções e medidas tendo em vista a prossecução da sustentabilidade ambiental. Esta informação deve ser estruturada através de indicadores que permitam acompanhar o estado do ambiente, as pressões que sobre ele são exercidas bem como as medidas accionadas e os seus efeitos. Os indicadores permitem: i. compreender os processos e desenvolvimento do território (útil para a identificação e análise de questões relevantes, estados atuais e tendências futuras); ii. definir prioridades (fornecem a informação necessária para a de- finição de prioridades, objetivos e metas); iii. definir a direcção (facilitam a tomada de

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tomada de decisão e contribuem através da monitorização e avaliação para a avaliação do sentido do desenvolvimento); iv. envolver os stakeholders (permitem o estabeleci- mento de pontes de comunicação e a sensibilização) e v. conhecer e resolver conflitos (relevante em contextos controversos no domínio das percepções, objectivos e metas divergentes) (Weiland et al., 2011).

A frequente necessidade de se avaliar os efeitos das pressões que os diversos usos do solo podem exercer sobre os valores ambientais do território, sobre a prosse- cução do desenvolvimento sustentável, bem como, sobre as suas vulnerabilidades em contextos de riscos e alterações climáticas, faz com que a recolha de informação e sua sistematização em indicadores assuma uma crescente importância (Weiland et al., 2011; Zhang et al., 2011). O planeamento territorial, que traduz a convergência das diversas políticas sectoriais sobre o território, em especial ao nível local, deve ser objecto de cuidadoso acompanhamento e monitorização. Esta monitorização permite aferir se o modelo de desenvolvimento territorial e as normas preconizados para o uso do solo estão a garantir a devida protecção e valorização dos valores ambientais e a promover o desenvolvimento dentro da capacidade de carga do ambiente (Zhang et al., 2011). A literatura da especialidade mostra que no contexto do planeamento territorial, a selecção de indicadores surge em geral associada a diversos temas entre os quais se encon- tram a economia, educação, transporte, ambiente, saúde, energia, cultura e uso do solo. Usados de forma integrada, podem ser extremamente úteis para a avaliação e acompa- nhamento das tendências do uso do solo, bem como para a medição dos impactos das políticas e programas implementadas sobre o ambiente e a sustentabilidade, no médio e longo prazo (Rosales, 2011).

A escala municipal é aquela em que a utilização de indicadores para avaliação dos efeitos dos planos territoriais é mais frequentemente referida na literatura da espe- cialidade. Embora menos frequente, a adopção de indicadores de sustentabilidade à escala supra municipal ou regional assume também especial importância. A promoção do uso do solo que garanta a sustentabilidade ambiental, passa pela articulação das diferentes estratégias e modelos territoriais municipais (Braulio-Gonzalo et al, 2015), em especial em áreas em que partilham valores ambientais do território como é por exemplo o caso de zonas estuarinas. A utilização de indicadores de sustentabilidade de forma concertada e articulada entre diferentes municípios contíguos e que partilham zonas ambientalmente sensíveis, permite a avaliação das tendências municipais, a respecti- va comparação e a avaliação do modo como o conjunto das estratégias municipais de desenvolvimento contribui para a preservação e valorização dos recursos ambientais e territoriais comuns. Através desta análise é possível desenvolver ações articuladas para melhorar a qualidade dos planos (Mascarenhas et al., 2012, Braulio-Gonzalo et al., 2015) nos ciclos de revisão subsequentes.

O estudo da utilização de sistemas de indicadores de sustentabilidade no âmbito da monitorização de planos territoriais ao nível local não tem sido muito frequente. Mes-

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mo assim, é possível destacar os contributos Braulio-Gonzalo et al. (2015), Mascarenhas et al. (2015), Weiland et al. (2010), Zhang et al. (2011) e Musakwa e Niekerk (2014) que analisam os sistemas de indicadores mais usados e as respectivas temáticas. Os indi- cados propostos por Braulio-Gonzalo et al. (2015) incidem sobre as dimensões social, económica e ambiental. Os indicadores ambientais integram aspectos como a água, biodiversidade, resíduos, poluição e solo. Adicionalmente, Mascarenhas et al. (2015) pro- põem um conjunto de indicadores que para além dos temas anteriormente referidos, incluem também a pobreza, saúde, segurança, mobilidade, energia e biodiversidade e governação. Weiland et al. (2010) incidem em especial em indicadores sobre a utilização do território e em especial sobre as actividades urbanas tais como habitantes por hec- tare, área de construção, grau de impermeabilização do solo, quantidade de espaços verdes, espaços verdes por habitante, proporção de espaços verdes para a área urba- na, número de pessoas que vivem em áreas propensas a inundação e quantidade de infra-estruturas construídas em áreas com risco elevado de inundação. Também consi- derando apenas o uso urbano do território, Musakwa e Niekerk (2014) acrescentam três indicadores a serem considerados no planeamento territorial das zonas urbanas. Estes incluem a densidade de construção e a construção em altura. Na mesma perspectiva Zhang et al. (2011) acrescentam a estrutura de uso do solo urbano (área total do solo, proporção de solo de construção na área urbana construída, área de estradas, solo cultivado, densidade populacional, investimento dedicado para o tratamento da poluição ambiental e proporção de resíduos sólidos industriais que são tratados e reutilizados). Mais recentemente, começam a encontrar-se novos caminhos de investigação nesta ma- téria designadamente através da avaliação dos contributos de indicadores direccionados para a inclusão dos serviços dos ecossistemas (ver por exemplo Hayek et al, 2016) e das alterações climáticas no planeamento territorial (ver por exemplo Pupphachai e Zuidema (2017). Independentemente das temáticas adoptadas, é evidente nos diversos autores o reconhecimento de que as especificidades territoriais, sociais e económicas podem de- terminar as especificidades dos sistemas de indicadores a adoptar. Em territórios contí- guos e com características semelhantes, contudo, é recomendada adopção de sistemas de indicadores articulados por forma a garantir a comparação e a análise cumulativa dos seus resultados sobre os valores comuns.

A implementação de políticas e planos de ordenamento do território necessi- tam de acompanhamento para assegurar que os seus efeitos conduzem aos objetivos preconizados e, também, ao desenvolvimento sustentável do território. A monitorização através do uso de indicadores permite a medição do desempenho das intervenções reali- zadas, analisar os resultados atingidos e ajustar as políticas e as medidas aos objectivos propostos. A utilização de indicadores neste processo permite fornecer informação aos decisores sobre a adequação das suas intervenções bem como dos seus impactos.

Neste contexto, merecem especial destaque as referências a monitorização e a in- dicadores na Lei de Bases da Política de Ambiente (Lei n.º 19/2014 de 14 de Abril) e na Lei

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de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n.º 31/2014 de 30 de Maio). A tabela 1 (adaptada de Santos, 2016) sistematiza estas referências. Tanto a Lei de Bases da Política do Ambiente como a Lei de Bases de Política Pública do Solo, Ordenamento do Território e Urbanismo prevêem a utilização de indicadores para avaliação da implementação dos planos. A Lei do Ordenamento prevê também que a informação recolhida no âmbito da avaliação seja disponibilizada publicamente através de meios informáticos adequados para a promoção da comunicação e interacção a nível nacio- nal, regional e local (ponto 3 do Artigo 57.º, Lei nº 31/2014 de 30 de Maio).

TABELA 1. Referências a monitorização e indicadores nas Leis de Bases do Am- biente e do Ordenamento

Lei de Bases da Política de Ambiente

“As políticas públicas de ambiente estão ainda subordinadas, no- meadamente, aos seguintes princípios: (…) e) Da informação e da participação, que obrigam ao envolvimento dos cidadãos nas polí- ticas ambientais, privilegiando a divulgação e a partilha de dados e estudos, a adoção de ações de monitorização das políticas, o

fomento de uma cultura de transparência e de responsabilidade, na busca de um elevado grau de respeito dos valores ambientais pela comunidade, ao mesmo tempo que assegura aos cidadãos o direito pleno de intervir na elaboração e no acompanhamento da aplicação das políticas ambientais.” (Artigo 4.º)

“A monitorização do estado do ambiente e a avaliação dos resul-

tados das políticas nesta matéria obrigam a assegurar a recolha, o tratamento e a análise dos dados ambientais, de forma a obter informações objetivas, fiáveis e comparáveis.” (Artigo 15.º)

“Constituem instrumentos de planeamento no âmbito da política de ambiente e do desenvolvimento sustentável, as estratégias, os programas e os planos de âmbito nacional, regional, local ou sec- torial, que fixam orientações, objetivos, medidas e ações, metas e indicadores e que determinam as entidades responsáveis pela

sua execução e os financiamentos adequados.” (Artigo 16.º) “O Estado exerce o controlo das atividades suscetíveis de ter um impacte negativo no ambiente, acompanhando a sua execução através da monitorização, fiscalização e inspeção, visando, no-

meadamente, assegurar o cumprimento das condições estabele- cidas nos instrumentos e normativos ambientais e prevenir ilícitos ambientais.” (Artigo 21.º)

Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Orde- namento do Territó- rio e de Urbanismo

“Todos os programas e planos territoriais devem definir parâmetros e in- dicadores que permitam monitorizar a respetiva estratégia, objetivos e resultados da sua execução.” (Artigo 57.º)

Adicionalmente o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial pu- blicado no Decreto-Lei n.º 80/2015 de 14 de maio, desenvolve a matéria, explicitando

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nomeadamente que “os programas e os planos territoriais devem conter os indicadores

qualitativos e quantitativos para efeitos da avaliação” (art. 4º). Refere também que “as entidades da administração devem promover permanente avaliação da adequação e concretização da disciplina consagrada nos programas e planos, (…) suportada nos indicadores qualitativos e quantitativos neles previstos”. Prevê também que “nos progra- mas e planos sujeitos a avaliação ambiental, deve ser garantida a avaliação dos efeitos significativos da sua execução no ambiente, por forma a identificar os efeitos negativos imprevistos e aplicar as necessárias medidas corretivas previstas na declaração am- biental” (art. 187º), assunto que retomaremos na próxima secção.

O quadro legislativo nacional determina, de forma evidente, a necessidade de avaliar periodicamente as políticas, planos e programas com implicações sobre o territó- rio e o ambiente, tal como referido no capítulo anterior. A monitorização dos efeitos das políticas e programas tem sido realizada maioritariamente de forma indirecta, através da monitorização do estado do território e do ambiente. A escala local, contudo, é aquela onde convergem directa e indirectamente os efeitos das políticas, planos e programas. Por este motivo, os municípios possuem um papel fundamental na monitorização do território já que é a escala através da qual é mais fácil recolher e visualizar informação. Pese embora as crescentes responsabilidades dos municípios em diversas áreas da governação, como é a promoção do desenvolvimento, do ordenamento do território e do urbanismo, não é ainda evidente no Regime Jurídico das Autarquias Locais (Lei n.º 75/2013 de 12 de Setembro) a preocupação com a monitorização. Num quadro jurídico de ordenamento do território em que todos os programas têm que ser traduzidos nos PDM para se tornarem eficazes junto dos particulares, reforçando assim o carácter ins- trumental dos PDM para a implementação das políticas publicas com expressão territo- rial, vale a pena dedicar especial atenção aos sistemas de monitorização e de adopção de indicadores que facilitem, com rigor e coerência, a respectiva avaliação dos efeitos.

Em zonas estuarinas sobretudo aquelas onde existem valores ambientais clas- sificados e sobre elas convergem múltiplos usos do solo nas zonas envolventes, como é o caso da Ria de Aveiro, a monitorização dos efeitos dos diversos programas e planos sobre os valores ambientais e a prossecução do desenvolvimento sustentável assume especial importância (Fidélis e Carvalho, 2014). As zonas estuarinas concentram em ge- ral conjuntos complexos de valores, bem como de utilizações, de utilizadores e entidades numa matriz nem sempre clara de políticas, objectivos e responsabilidades. São territó- rios onde os espaços de solo e de água se intersectam e são objecto de uso pela socie- dade para uma multiplicidade de actividades humanas. Por estes motivos, têm também associados inúmeras interpretações de valor associados às especificidades territoriais e ambientais, fazendo com que os processos de tomada de decisão assumam contornos de significativa complexidade. Ao lado das características, dos conflitos e das dificulda- des em promover processos de planeamento integrados, é também frequente a existên- cia de uma grande ambivalência dos discursos dos diversos actores associados, sejam

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de cidadãos, organizações não-governamentais, empresas ou câmaras municipais, que facilmente flutuam entre o desenvolvimento, a utilização dos recursos ou a conservação da natureza (ver Sumares e Fidélis, 2013). De acordo com aqueles autores, são vários argumentos que constituem componentes de narrativas condicionantes à protecção da Ria de Aveiro. Entre outros argumentos, encontram-se o facto de dominarem as visões fragmentadas e pouco solidárias sobre um território que é, de um ponto de vista biofísico e social, fortemente integrado. Em contrapartida, nas narrativas que se revelam mais favoráveis à protecção da Ria de Aveiro estão argumentos em que é notória a expansão do discurso de que o desenvolvimento local deve valorizar as raízes socioeconómicas e novas formas de as explorar. De certa forma estas narrativas mostram que uma maior atenção sobre os efeitos do desenvolvimento sobre a Ria pode transformar-se simulta- neamente num motor de protecção dos valores da ria e de promoção de um modelo de desenvolvimento consonante com a zona estuarina (Sumares e Fidélis, 2013). As ten- sões identificadas através dos problemas e das narrativas sugerem fragilidades, tanto ao nível da percepção dos valores, como ao nível do conhecimento sobre os efeitos que o actual modelo de desenvolvimento, ou dos modelos das diversas políticas sectoriais ou municipais, exercem sobre a sustentabilidade deste território. Os processos cogniti- vos, interpretativos e decisórios, mais ou menos conscientes, mais ou menos formais, que determinam a protecção, utilização e valorização da Ria assentam, entre outros aspectos, na falta de um rigoroso sistema de informação que evidencie de forma clara e pública os efeitos, e a distribuição dos custos e dos benefícios resultantes das diver- sas utilizações e modelos de desenvolvimento envolventes sobre os valores e recur- sos ambientais classificados. É certo que, em contextos complexos onde se colocam valores territoriais partilhados como é o caso da envolvente à Ria, o quadro legislativo nacional já incentiva a adopção de planos directores intermunicipais capazes de articular e concertar estratégias locais.

Recorde-se que em 2004, depois de diversas tentativas goradas de adopção de um plano integrado em torno da Ria, identificadas na figura 1, foi aprovado o Plano Intermunicipal de Ordenamento do Território da Ria de Aveiro, conhecido por “unir@ria”. Em contraste com as outras tentativas de planeamento, essencialmente promovidas pela administração central e que nunca chegaram a ser aprovadas, este plano foi promovido pela Associação de Municípios envolvente à Ria (Fidélis e Carvalho, 2014).

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FIGURA 1. Tentativas de planeamento integrado na Ria de Aveiro

O plano tem como objectivo integrar as estratégias de desenvolvimento territorial dos municípios. Na prática, contudo, apesar de constituir um importante passo no sen- tido da concertação de estratégias municipais em torno da Ria, em pouco ultrapassou a acomodação num único documento das estratégias de desenvolvimento local e dos projectos previstos por cada município (Fidélis e Carvalho, 2014). Este plano de carácter estratégico, constituiu um passo importante, mas não incluiu qualquer sistema de indi- cadores de acompanhamento. Também não foi sujeito a um processo de AAE capaz de propor um conjunto de indicadores de acompanhamento, que há data ainda não estava consagrado na legislação nacional.

Presentemente, a par da elaboração dos Relatórios do Estado do Ordenamento do Território que precedem a revisão dos PDM, começam também a ser referidos no próprio conteúdo do plano os indicadores a adoptar para o respectivo acompanhamento e monitorização. A necessidade de uma robusta articulação entre uns e outros é eviden- te e, na prática, mostra ainda espaço para aperfeiçoamento em relação às temáticas abordadas e à coerência na formulação dos indicadores entre municípios diferentes. A coerência passa, entre outros aspectos, por garantir que a par das especificidades muni- cipais são também contempladas dimensões ambientais e territoriais transversais, como é o caso dos indicadores que permitam avaliar o efeito da implementação dos modelos de desenvolvimento preconizados sobre os valores estuarinos anteriormente referidos, por exemplo. Adicionalmente, previamente ao processo de elaboração dos PDM, existe o processo de AAE que propõe também um conjunto de indicadores de monitorização da respectiva implementação e que deverão ser articulados com os anteriores. A secção seguinte expõe de forma sintética os objectivos da AAE de PDM e a importância dos sistemas de indicadores associados.

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