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Chapter 11 gives special attention to the issue of air quality “Air quality, exposure and health, as indicators of development and quality of life in cities: the case of Estarre-

2. Sustentabilidade: um objetivo jurídico fundamental

Além de servir para esverdear os programas de governo e tornar politicamente

corretos os discursos políticos, o desenvolvimento sustentável é o quadro geral no âmbi-

to do qual se desenvolvem as políticas públicas.

Procederemos em seguida à análise da consagração do nobre objetivo do desen- volvimento sustentável8, ao mais alto nível. Primeiro, como objetivo constitucionalmente consagrado do Estado português; depois, como fim convencional da União Europeia.

2.1. A Sustentabilidade na Constituição Portuguesa

Numa Constituição que ainda mantém, nalguma medida, as marcas históricas do período em que nasceu — a década de 70 do século passado — não seria surpreen- dente que o desenvolvimento sustentável não figurasse como um fim constitucional au- tónomo do Estado. Com efeito, numa primeira leitura não encontramos, na Constituição portuguesa, uma proclamação genérica da busca da sustentabilidade entre as tarefas fundamentais do Estado9, nem uma referência geral à sustentabilidade como atributo na caracterização do Estado10.

No entanto, uma leitura transversal, mais cuidada e contextualizada, não pode deixar de revelar a sustentabilidade como um objetivo primordial do Estado português. Neste sentido vai também o entendimento doutrinal dominante11.

8 Apesar do consenso em torno da sustentabilidade no plano político-legislativo, no plano doutrinal o conceito

e conteúdo de desenvolvimento sustentável são menos pacíficos. Vejam-se algumas das discussões em torno do desenvolvimento sustentável na perspetiva da proteção das gerações futuras em Fairness and Futurity. Essays on environmental sustainability and Social Justice, Oxford University Press, 2004, editado por Andrew

Dobson.

9 “Artigo 9 (Tarefas fundamentais do Estado) São tarefas fundamentais do Estado:

a) Garantir a independência nacional e criar as condições políticas, económicas, sociais e culturais que a promovam;

b) Garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito demo- crático;

c) Defender a democracia política, assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais;

d) Promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e mo- dernização das estruturas económicas e sociais;

e) Proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preser- var os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território;

f) Assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa;

g) Promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta, designadamente, o carácter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira;

h) Promover a igualdade entre homens e mulheres”.

10 “Artigo 2 (Estado de direito democrático) A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado

na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa”.

11 Por todos ver Gomes Canotilho, O Princípio da sustentabilidade como Princípio estruturante do Direito Cons-

titucional (http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/tek/n13/n13a02) e “Estado Constitucional Ecológico e Democra- cia Sustentada”, RevCEDOUA n 8, ano IV, 2, 2001 (https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/5732/1/revce- doua8%20art.%201%20JJGC.pdf).

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No âmbito económico e social é uma das incumbências prioritárias do Estado. Vejamos alguns argumentos em apoio deste entendimento:

1. O desenvolvimento sustentável é referido como um objetivo expresso da proteção ambiental no capítulo II da Constituição, sobre direitos e deveres sociais, a propósito do direito ao ambiente e qualidade de vida. “2. Para asse- gurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos (…)”. O desenvolvimento sustentável é portanto o pano de fundo no contexto do qual a proteção ambiental há de realizar-se. 2. Já na parte II da Constituição, relativa à organização económica, o desen- volvimento sustentável volta a ser expressamente referido como uma incum- bência prioritária do Estado no âmbito económico e social: “incumbe priori- tariamente ao Estado no âmbito económico e social: a) promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratégia de desen- volvimento sustentável (…)”12. Mais do que uma vaga norma programática, o desenvolvimento sustentável é aqui configurado como uma estratégia mais concreta, implicando visão, objetivos e planeamento integrado13.

3. Diversos outros conceitos constitucionais podem reconduzir-se à ideia de desenvolvimento sustentável, na medida em que constituem afloramentos de algumas das suas várias dimensões14 e contribuem, articulando-se, para a sua operacionalização. É o caso dos conceitos de:

• “bem-estar” e “qualidade de vida”, presentes entre as tarefas fundamen- tais do Estado15 e entre as incumbências prioritárias do Estado no pla- no económico e social16, como objetivo dos planos de desenvolvimento económico e social17, como finalidade do direito de ação popular18 e como finalidade da política fiscal19;

12 Artigo 81, sobre incumbências prioritárias do Estado. 13 Voltaremos a este tema na parte 2.

14 Para uma visão global das diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável ver a obra editada por

John Kirkby, Phil O’Keefe e Lloyd Timberlake, The Earthscan Reader in Sustainable Development, Earthscan, London, 1999.

15 Artigo 9, d) “promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses,

bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais”.

16 Artigo 81 a) “promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em

especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável”.

17 Artigo 90 “os planos de desenvolvimento económico e social têm por objectivo promover o crescimento

económico, o desenvolvimento harmonioso e integrado de sectores e regiões, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com as políticas social, educativa e cultural, a defesa do mundo rural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português”.

18 Artigo 52 n. 3 a) “promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde

pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida, a preservação do ambiente e do património cultura”.

19 Artigo 66 n. 2 h) “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente

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• “desenvolvimento harmonioso”, como tarefa fundamental do Estado20 e como objetivo dos planos de desenvolvimento económico e social; • “coesão económica, social e territorial” como finalidade da integração de

Portugal na União Europeia21 e como incumbência prioritária do Estado no plano económico e social22;

• “princípio de solidariedade entre gerações” como tarefa do Estado no âmbito ambiental23;

• “participação das populações na vida administrativa local” como forma de exercício do poder local através de associações de moradores24; • “participação dos interessados na sua gestão efetiva” como forma de

estruturar a administração pública25;

• “participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações” como forma de processamento da atividade administrativa26;

• “integração dos objetivos ambientais nas várias políticas de âmbito sec- torial” como forma de assegurar a efetiva tomada em consideração das dimensões ambientais do desenvolvimento.

2.2. A Sustentabilidade na União Europeia

Na União Europeia a sustentabilidade é — tanto ou mais do que no plano cons- titucional português — o fulcro de toda a atuação das instituições.

20 Artigo 9 g) “promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta, designa-

damente, o carácter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira”.

21 Artigo 7 n. 6 “Portugal pode, em condições de reciprocidade, com respeito pelos princípios fundamentais

do Estado de direito democrático e pelo princípio da subsidiariedade e tendo em vista a realização da coesão económica, social e territorial, de um espaço de liberdade, segurança e justiça e a definição e execução de uma política externa, de segurança e de defesa comuns, convencionar o exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia”.

22 Artigo 81 d) “promover a coesão económica e social de todo o território nacional, orientando o desenvolvi-

mento no sentido de um crescimento equilibrado de todos os sectores e regiões e eliminando progressivamente as diferenças económicas e sociais entre a cidade e o campo e entre o litoral e o interior”.

23 Artigo 66 d) “promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade

de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações”.

24 Artigo 263 n. 1: “A fim de intensificar a participação das populações na vida administrativa local podem ser

constituídas organizações de moradores residentes em área inferior à da respectiva freguesia”.

25 Artigo 267 n.1: “a Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os ser-

viços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de moradores e outras formas de representação democrática”.

26 Artigo 267 n. 5: “o processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará

a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”.

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Desde as disposições preambulares27 até às denominadas missões da União28, o desenvolvimento sustentável está omnipresente nos Tratados, orientando tanto a ação interna, como internacional, da União. Por isso, “nas suas relações com o resto do mun- do, a União afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a proteção dos seus cidadãos. Contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equita- tivo, a erradicação da pobreza e a protecção dos direitos do Homem, em especial os da criança, bem como a rigorosa observância e o desenvolvimento do Direito Internacional, incluindo o respeito dos princípios da Carta das Nações Unidas”29. Aliás, na sua ação externa, a União tem como objetivos “apoiar o desenvolvimento sustentável nos planos económico, social e ambiental dos países em desenvolvimento, tendo como principal ob- jectivo erradicar a pobreza” e “contribuir para o desenvolvimento de medidas internacio- nais para preservar e melhorar a qualidade do ambiente e a gestão sustentável dos re- cursos naturais à escala mundial, a fim de assegurar um desenvolvimento sustentável”30. Mas é no plano interno que a União vai mais longe na indicação das formas de le- var à prática o objetivo do desenvolvimento sustentável. No Tratado sobre o Funcionamen- to da União é enunciada a integração do ambiente no âmbito de todas as outras políticas setoriais europeias como fator-chave do desenvolvimento sustentável31. A mesma ideia é reafirmada na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: “todas as políticas da União devem integrar um elevado nível de proteção do ambiente e a melhoria da sua qualidade, e assegurá-los de acordo com o princípio do desenvolvimento sustentável”32.

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