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Chapter 11 gives special attention to the issue of air quality “Air quality, exposure and health, as indicators of development and quality of life in cities: the case of Estarre-

2. A invocação do segredo estatístico

2.1. O segredo estatístico, relativo a informações que possam identificar, directa

ou indirectamente, os titulares cujos dados são recolhidos e tratados estatisticamente, sejam estas fruto de imposição legal de resposta, ou resultado de ato voluntário, garante, como princípio geral, que as informações objecto das operações estatísticas não serão

10 Veja-se o que estabelece o artigo 26.º da LSEN.

11 Artigo 267.º da Constituição. Também sustentando que a Constituição Portuguesa faz referência aos prin-

cípios da eficiência e/ou eficácia: Canotilho, J. J. G. & Moreira, V. (2010). Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª Edição. Coimbra: Coimbra Editora, p. 810; Loureiro, J. (1995). O Procedimento Administrativo entre a eficiência e a Garantia dos Particulares. Coimbra: Coimbra Editora, p. 133; Figueiredo Dias, J. E. (2014). A Reinvenção da Autorização Administrativa no Direito do Ambiente. Coimbra: Coimbra Editora, p. 706.

12 Artigo 9.º, alíneas d) e g) – São tarefas fundamentais do Estado promover o bem-estar e a qualidade de vida

do povo…, promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional…; artigo 66.º, n.º 2 – Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado…

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divulgadas, cedidas a outras entidades ou por estas examinadas, nem utilizadas para outras finalidades diversas14. Tal significa, no estrito cumprimento do princípio da finali- dade do tratamento dos dados, que as informações prestadas para finalidade estatística não podem servir para fins fiscais, administrativos, judiciais, ou outros, não sendo possí- vel a sua utilização de modo a afectar direitos ou benefícios dos seus titulares.

O dever de confidencialidade vincula, quer as entidades públicas que produzem informação estatística, quer outras entidades que, em virtude das suas funções, tomem conhecimento das mesmas, ficando os respectivos funcionários sujeitos a segredo pro- fissional (artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da LSEN)15. Ou seja, a confidencialidade dos dados é salvaguardada, também, mediante imposição de um dever de segredo profissional.

Deve salientar-se que a confidencialidade não respeita, naturalmente, às infor- mações estatísticas em si mesmas consideradas, por natureza produzidas para pública divulgação e acesso, mas somente aos dados que permitem extrair as informações es- tatísticas, tornando possível a identificação directa da unidade estatística (pessoa sin- gular ou coletiva), ou a sua identificação indirecta, desde que as operações para a sua identificação não sejam demasiado onerosas. O segredo protege os “dados estatísticos individuais” relativos a pessoas singulares ou entidades privadas, i.e. “os dados que permitem a identificação directa das unidades estatísticas ou que, pela sua natureza, estrutura, conteúdo, importância, número, relação com outros dados ou grau de desa- gregação, permitam, sem envolver um esforço e custo desproporcionados, a sua identi- ficação indirecta”16.

Note-se que este dever de segredo, contrapartida do fornecimento de informação, se reveste de especial importância em matérias relativamente às quais o original processa- dor de informação está, ele próprio, obrigado a segredo. Por essa razão, o já mencionado artigo 4.º, n.º 2, da LSEN, prevê que a obrigação de fornecimento de informações às auto- ridades estatísticas prevaleça sobre eventuais limitações ou deveres de sigilo constantes de regimes especiais (pense-se nos dados bancários, fiscais ou de saúde).

Em virtude da especial natureza das pessoas coletivas públicas, das suas fun- ções, e do especial regime de transparência a que estão constitucionalmente sujeitas, o segredo estatístico não protege os dados que lhes digam directa e exclusivamente respeito. Daí que a LSEN estabeleça, no artigo 6.º, n.º 3, que “salvo disposição legal em contrário, os dados estatísticos individuais sobre a Administração Pública não es- tão abrangidos pelo dever de sigilo”. Significa isto que as entidades administrativas não podem invocar o segredo estatístico quanto aos dados desagregados que, sobre a sua organização ou atividade, remetam, ainda que por obrigação legal, ao Sistema Estatísti- co Nacional. Uma tal isenção de confidencialidade não abrange, naturalmente, os dados

14 A LSEN assume, como a Lei da Proteção de Dados, o princípio da finalidade como um princípio retor dos

tratamentos de dados. Veja-se o que se estabelece, nomeadamente, no artigo 4.º, n.º 4, bem como no artigo 18.º, n.º 3, alínea c).

15 A LSEN faz referência a responsabilidade contraordenacional, disciplinar e criminal (artigo 26.º, n.º 1 e artigo 32.º). 16 Artigo 2.º, alínea c), da LSEN.

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relativos a pessoas singulares ou coletivas que interajam com a Administração Pública, e que, por essa via, vejam os seus dados ser objecto de tratamento estatístico, relativa- mente aos quais valerão as condições gerais de segredo.

2.2. É possível identificar três grandes finalidades prosseguidas com a imposi-

ção do segredo estatístico.

A primeira, a que já se fez referência breve, prevista na parte final do n.º 1, do artigo 6.º, da LSEN, consiste em, através deste dever de segredo, garantir a confiança dos informadores/unidades estatísticas no Sistema Estatístico17. Outro objetivo é a sal- vaguarda da privacidade dos cidadãos, como determinado na 1.ª parte do mesmo artigo. Por fim, a garantia do segredo estatístico permite, ainda, a preservação da livre e leal concorrência entre agentes económicos.

2.2.1. A garantia da confiança dos informadores/unidades estatísticas no Siste-

ma Estatístico Nacional está na base do funcionamento de todo o sistema. O segredo das informações fornecidas é a contrapartida para o dever de resposta, e de garantia de resposta verídica, exata e suficiente. A imposição de confidencialidade assegura o forne- cimento de informação fiável, pertinente e atual, condições indispensáveis à sua quali- dade e utilidade e, assim, ao cumprimento cabal das finalidades da produção estatística.

2.2.2. No caso especial das informações que permitam identificar, de modo

directo ou indirecto, as pessoas singulares a que respeitem, a sua confidencialidade decorre, desde logo, da consagração, no artigo 35.º da Constituição, de um direito fun- damental à proteção de dados pessoais18. Um tal direito, que, nomeadamente, proíbe aos responsáveis pelos tratamentos de dados a divulgação de dados pessoais de tercei- ros, salvo em condições excecionais legalmente previstas (n.º 4), encontra, igualmente, respaldo em diversos instrumentos de direito internacional e europeu19. Recentemente, o Regulamento Europeu de Protecção de Dados Pessoais veio dispor em matéria de proteção de dados pessoais, substituindo a anterior diretiva20. Na legislação nacional, para além do disposto no artigo 6.º da LSEN, a Lei n.º 67/98, de 26 de outubro, de prote- ção de dados pessoais, também estabelece este dever de confidencialidade, que onera os responsáveis por qualquer tratamento de dados pessoais, mesmo após o exercício

17 O mesmo se afirma noutros lugares jurídicos conexos. Por exemplo, no Considerando 23 do Regulamento

(CE) 223/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março, relativo às estatísticas europeias. So- bre o assunto pode ver-se, entre outros: Mira, N. G. (2005). Investigação Científica e Segredo Estatístico, 2005, acessível em https://www.ine.pt/ine_novidades/semin/prin_seg_estat/ficha/comunica10.pdf.

18 Mas que, mesmo no caso de dados especialmente sensíveis, admite o seu tratamento para efeitos estatísti-

cos, quando se trate de dados não individualmente identificáveis (artigo 35.º, n.º 3, da Constituição).

19 Veja-se, por exemplo, o artigo 7.º (respeito pela vida privada e familiar) e, em especial, o artigo 8.º (proteção

dos dados de carácter pessoal), da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia. Atente-se nos comen- tários de: Sarmento e Castro, C., (2013). Comentário ao artigo 8.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. In Silveira, A. & Canotilho, M. (Ed.), Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia Comentada.

Coimbra: Almedina, p.120 e ss.; e Perez Fernandes, S. (2013). Comentário ao artigo 7.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. In Silveira, A. & Canotilho, M. (Ed.), Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia Comentada. Coimbra: Almedina, p. 103 e ss.

20 Regulamento (UE) 2016/679, de 27 de abril, relativo à proteção de pessoas singulares no que diz respeito ao

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de funções21. Em virtude do disposto em matéria de proteção de dados pessoais, nas normas específicas, o segredo estatístico assume um cariz mais protector dos dados relativos às pessoas singulares. A LSEN confirma esta proteção acrescida já que é mais restritiva, no caso de pessoas singulares, na concessão de acesso, sempre excepcional, a tais informações.

2.2.3. A atual LSEN, ao contrário da lei anterior22, deixou de prever expressamen- te a garantia da concorrência leal entre os agentes económicos como um dos objetivos do segredo estatístico. O facto de não ter, contudo, deixado de proteger as informações que permitam identificar pessoas coletivas privadas, bem como a manutenção do enqua- dramento constitucional, fazem com que se deva entender que a reserva, relativamente a dados que permitam identificar pessoas coletivas privadas, também visa protegê-las de intromissões que pudessem atentar contra os seus direitos e interesses, ou contra a equilibrada concorrência entre agentes económicos. Assim, o segredo estatístico serve a preservação da confidencialidade em esferas especialmente atinentes às pessoas co- letivas privadas que possam por em causa “segredos comerciais, industriais ou sobre a sua vida interna”, cuja revelação agravaria a sua posição concorrencial. Por outro lado, a concorrência salutar entre agentes económicos, indispensável ao eficiente funcionamen- to dos mercados, princípio que encontra guarida na alínea f), do artigo 81.º, e nas alí- neas a) e c) do artigo 99.º da Constituição, é garantia institucional da ordem económica constitucional que funda a proibição de práticas que pudessem traduzir-se em desvios à concorrência23. Em suma, as pretensões de tutela dos direitos de propriedade, como a propriedade industrial (por exemplo, derivados de patentes), e os direitos de livre inicia- tiva económica com estes relacionados, com consagração constitucional enquanto direi- tos fundamentais de que são titulares estas entidades coletivas, bem como o ambiente de concorrência em que estes agentes económico atuam, competindo com outros na mesma área de intervenção económica, obrigam a que também os dados desagregados relacionados com pessoas coletivas privadas, recolhidos para finalidades estatísticas, devam ser objeto de proteção, gozando do regime de segredo estatístico24. Todavia, como, aliás resulta da regulação legal, este regime é menos garantístico, quando compa- rado com a salvaguarda das informações relativas a pessoas singulares, especialmente protegidas pelas disposições em matéria de proteção de dados pessoais.

21 O artigo 14.º da Lei da Proteção de Dados refere-se à segurança dos tratamentos de dados; o artigo 17.º,

ao sigilo profissional.

22 A Lei n.º 6/89, de 15 de abril.

23 Veja-se, por exemplo, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 545/2015, disponível em www.tribunalconsti-

tucional.pt.

24 Mesmo quando os dados relativos a pessoas coletivas são tratados por entidades administrativas, sujeitas

ao princípio da Administração aberta, o próprio regime do acesso aos documentos administrativos condiciona a divulgação de informação relativa a pessoas coletivas. O artigo 6.º, n.º 6, da Lei n.º 46/2007, de 24 de agosto, estabelece que “Um terceiro só tem direito de acesso a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa se estiver munido de autorização escrita desta ou demonstrar interesse direto, pessoal e legítimo suficientemente relevante segundo o princípio da proporcio- nalidade.”. E, no artigo 18.º, alínea b), o mesmo diploma fixa limites à reutilização de documentos, para proteção

da propriedade literária, artística ou científica, restringindo o acesso quando estes sejam “documentos cujos direitos de autor ou direitos conexos pertençam a terceiros ou cuja reprodução, difusão ou utilização possam configurar práticas de concorrência desleal”.

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3.

Deveres de publicidade e de transparência e segredo estatístico

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