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Chapter 11 gives special attention to the issue of air quality “Air quality, exposure and health, as indicators of development and quality of life in cities: the case of Estarre-

6. O dever de monitorização na legislação ambiental

Porém, é irrazoável pretender impor deveres de monitorização redundantes, que onerem excessivamente os operadores económicos, os atores sociais e a própria admi-

119 Artigo 4 e) da Lei n. 19/2014, de 14 de abril, que define as Bases da Política de Ambiente, sobre Princípios

das políticas públicas ambientais: “da informação e da participação, que obrigam ao envolvimento dos cida- dãos nas políticas ambientais, privilegiando a divulgação e a partilha de dados e estudos, a adoção de ações de monitorização das políticas, o fomento de uma cultura de transparência e de responsabilidade, na busca de um elevado grau de respeito dos valores ambientais pela comunidade, ao mesmo tempo que assegura aos cidadãos o direito pleno de intervir na elaboração e no acompanhamento da aplicação das políticas ambientais”.

120 Artigo 15 n.2 da Lei de Bases do Ambiente: “A monitorização do estado do ambiente e a avaliação dos

resultados das políticas nesta matéria obrigam a assegurar a recolha, o tratamento e a análise dos dados ambientais, de forma a obter informações objetivas, fiáveis e comparáveis”.

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nistração. Com o alargamento e a complexificação das políticas públicas — das quais a ambiental é o exemplo flagrante — obrigar a monitorizar permanentemente o estado do ambiente, da sociedade, da economia e da governância, pode ser a gota de água que faz transbordar o copo da tolerabilidade burocrática.

Por isso, sempre que possível, devem ser utilizados dados que já existam, sem necessidade de desenvolver atividade significativa de “recolha”. Daí a importância da análise da legislação ambiental, que está pejada de deveres de monitorização.

Apesar de não existir no ordenamento jurídico português, uma lei geral de en- quadramento das ações de monitorização do desenvolvimento sustentável, sabemos que a monitorização é um dever omnipresente, regulamentado com elevado grau de detalhe na legislação ambiental. Por isso, vamos percorrer a legislação aplicável aos diferentes setores ambientais (água, ar, clima, resíduos, biodiversidade) e também a legislação ambiental transversal (avaliação ambiental estratégica, avaliação de impacte ambiental e prevenção e controlo integrados da poluição) para, a partir de uma leitura das disposições pertinentes constantes desta legislação, procurar pistas relativamente ao conteúdo do dever legal de monitorização. Vamos assim procurar decantar, por indu- ção a partir da análise das disposições legislativas, as principais linhas orientadoras da monitorização ambiental, para sobre ela erigir o dever geral de monitorização do desen- volvimento sustentável, com um certo conteúdo ideal.

Desta leitura resultou a ideia de que os fins da monitorização, independentemen- te do setor de que estejamos a falar, devem passar sempre por aferir o grau de execução e a adequação das medidas públicas ou privadas adotadas em prol do desenvolvimento sustentável, evitando surpresas, antevendo reações adversas, prevenindo efeitos nega- tivos indesejáveis.

Naturalmente que, entre as várias leis ambientais, encontramos níveis diferen- ciados de centralidade atribuída à monitorização.

Por exemplo, a avaliação de impacte ambiental é o caso mais emblemático

de legislação em que a monitorização tem lugar de destaque e configura até uma fase autónoma do procedimento, que é a pós-avaliação122. É nesta lei que encontramos referências ao estabelecimento de diretrizes de monitorização, à necessidade de iden- tificar os parâmetros a avaliar, as fases em que deve decorrer, a duração e a periodici- dade da monitorização.

122 Decreto-lei n. 151-B/2013 de 31 de outubro (na versão atual alterada duas vezes, a última das quais em

2015) sobre avaliação de impacte ambiental. Artigo 26 “Pós-avaliação (…) 2. O procedimento de pós-avaliação abrange as fases referidas no número anterior e inclui, designadamente: a) A análise dos relatórios de mo- nitorização e de outra documentação relevante; 3. Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, compete ao proponente realizar a monitorização do projeto nos termos fixados na DIA ou na decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, ou, na falta destes, de acordo com os elementos referidos no n. 1 do artigo 16 ou no n. 1 do artigo 21, e remeter à autoridade de AIA os respetivos relatórios ou outros documentos que retratem a evolução do projeto ou eventuais alterações do mesmo”.

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No âmbito da lei de conservação da natureza, a monitorização é uma das

ações de suporte da conservação, a par de acompanhamento, cadastro, fiscalização, apoio às acções de conservação ativa, visitação, comunicação e vigilância dos valores naturais classificados123.

Por seu turno, o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial prevê

a institucionalização do dever de monitorização através de uma Comissão Nacional do Território124 que tem como atribuições “coordenar a execução da política nacional do ordenamento do território, sustentada em indicadores qualitativos e quantitativos dos instrumentos de gestão territorial, restrições de utilidade pública e servidões adminis- trativas”125 e mais especificamente “acompanhar e monitorizar a elaboração do relatório nacional sobre o estado do ordenamento do território”126.

Após esta abordagem mais geral, vamos respigar toda a legislação setorial na busca de arrimos positivos que nos ajudem a identificar quais os requisitos mínimos das ações de monitorização — com especial incidência na monitorização ambiental — nos termos da lei.

6.1. Conteúdo ideal do dever de monitorização ambiental

Aquilo que procuramos é identificar a linha média ou conteúdo ideal do dever de monitorização ambiental, respondendo às seguintes questões-chave: “o que deve ser mo-

nitorizado”? “quem deve monitorizar”? “para quê monitorizar”? e “como monitorizar”?127

6.1.1. Monitorizar o quê?

O dever de monitorização das dimensões ambientais do desenvolvimento sus- tentável tem um âmbito alargado e atualmente incide sobre fatores ambientaisi, emissões poluentesii, substâncias perigosasiii, riscos naturaisiv e tecnológicosv, instalações e equi- pamentos em funcionamentovi ou encerradosvii, períodos transitóriosviii, metas ambientai- six e planos e programasx.

123 Decreto-lei n. 142/2008, de 24 de julho, que estabelece o regime jurídico da conservação da natureza e

da biodiversidade. Artigo 6 “Acções de conservação activa e de suporte - A conservação da natureza e da biodiversidade compreende o exercício: (…) b) De acções de suporte, que correspondem à regulamentação, ordenamento, monitorização, acompanhamento, cadastro, fiscalização, apoio às acções de conservação acti- va, visitação, comunicação e vigilância dos valores naturais classificados”.

124 O anterior regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial previa igualmente a institucionalização do

dever de monitorização mas através da criação de um observatório, o qual nunca veio a ser criado (artigo 144 do Decreto-lei n. 380/99 de 22 de setembro).

125 Artigo 184 n.1 do Decreto-lei n. 80/2015 de 14 de maio. 126 Artigo 184 n.3 do Decreto-lei n. 80/2015 de 14 de maio.

127 A fim de facilitar a leitura do texto do presente sub-capítulo inseriremos as restantes referências legislativas

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6.1.2. Quem deve monitorizar?

O dever de monitorizar deve, antes de mais, ficar a cargo das autoridades pú- blicasxi. As autoridades devem reutilizar, para efeito de monitorização, os dados que es- tejam na sua possexii, provenientes de monitorizações obrigatórias pré-existentesxiii ou de outras atividades que cheguem ao seu conhecimento, como denúnciasxiv, auditorias periódicasxv, inspeções, fiscalizaçõesxvi ou procedimentos de autocontroloxvii.

Mas o dever de monitorização impende igualmente sobre os operadoresxviii, os quais devem suportar os custos inerentesxix. Este dever é especialmente reforçado no caso de atividades que envolvem riscosxx.

6.1.3. Para quê monitorizar?

Os dados da monitorização não devem ser guardados, mas antes devem ser tratados e comunicados.

Mais, o dever de monitorização inclui o dever de elaborar relatóriosxxi com base nos dados da monitorização, para interpretar, explicar e comunicar esses dados, deven- do a informação produzida ser coerente, exaustiva, homogénea, operacional, atualxx com periodicidadexxiii e duraçãoxxiv adequadas, objetiva, rigorosaxxv e comprovável, podendo ser submetida a entidadesxxvi ou verificadores independentesxxvii e certificadosxxviii, ou a inspeçõesxxix, ou ainda carecer de informação complementar para comprovar a sua qua- lidade e integridadexxx.

Inclui ainda o dever de comunicar o resultado da monitorização (o operador às autoridadesxxxi, as autoridades às instituições europeiasxxxii); o dever de cooperação hori- zontal (entre entidades públicas para aceder aos dados existentesxxxiii e entre diferentes níveis da administraçãoxxxiv), e vertical (entre a administração e a comunidade científi- caxxxv, entre a administração e os cidadãosxxxvi) e não pode deixar de contemplar o dever de disponibilizar ao público o resultado da monitorização, incluindo a metodologia e me- tadados (frequência da medição, processos de obtenção de dados, etc.) xxxvii.

Por último, o dever de monitorização tem como fins permitir fazer comparaçõesxxxviii e permitir reações tempestivasxxxix e precocesxl tendo como consequência o reforço da eficáciaxli das políticas.

6.1.4. Como monitorizar?

O dever de monitorização pode ser cumprido recorrendo a diferentes técnicas e métodos, sempre que possível estandardizadosxlii: medições fixasxliii, modelaçãoxliv, me- dições indicativasxlv, estimativas objetivasxlvi, amostragemxlvii, indicadoresxlviii, medição em contínuo para atividades perigosasxlix. Tudo, se possível com tratamento eletrónico de dados apresentados em versão digitall.

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Ele envolve igualmente o dever de planear antecipadamenteli e participadamen- telii a monitorização definindo as questões relevantes e significativas que serão objeto de monitorização e ainda o dever de efetuar uma monitorização dinâmica (evoluindo em função das alterações relevantes detetadasliii) e consequente (retirando consequências da avaliação feitaliv).

6.2. Apreciação conclusiva

Uma interpretação sistemática das normas dispersas, que impõem deveres de conteúdo diversificado, permite entendê-las como indícios inquestionáveis da existência de um dever geral de monitorização do desenvolvimento sustentável. Mais, a partir da legislação considerada, é possível retirar indicações quanto ao âmbito, sujeitos, fins, conteúdo e métodos deste dever, contribuindo assim para ultrapassar as discrepâncias entre regimes legais, para outorgar um efeito útil reforçado às normas em causa e para assegurar uma maior coerência sistemática à atuação dos poderes públicos128.

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