• Nenhum resultado encontrado

Detectores de características

Se a apresentação de um estímulo visual leva ao processamento detalhado de suas ca- racterísticas básicas, somos capazes de identificar as células corticais envolvidas nesse processamento. Hubel e Wiesel (1962) estudaram as células em várias partes do córtex occipital (na parte de trás do cérebro) envolvidas nos estágios iniciais do processamento visual. Algumas células respondiam de duas maneiras diferentes a um ponto de luz de- pendendo de qual parte da célula era afetada:

1. Uma resposta “ligar” com uma taxa aumentada de ativação quando a luz estava acesa.

2. Uma resposta “desligar” com a luz causando uma taxa reduzida de ativação. Hubel e Wiesel (p. ex., 1979) descobriram dois tipos de neurônios no córtex visual primário: células simples e células complexas. As células simples têm regiões de “ligar” e “desligar”, e cada uma é retangular. Essas células respondem preponderantemente a barras escuras em um campo de luz, a barras de luz em um campo escuro ou a bordas retas entre áreas de luz e escuras. Cada célula específica responde intensamente apenas a estímulos de uma orientação particular. Por conseguinte, provavelmente as respostas dessas células são relevantes para a detecção das características.

As células complexas se assemelham às células simples ao responderem maxima- mente a estímulos em linha reta em uma orientação particular. No entanto, as células complexas apresentam grandes campos receptores e respondem mais a contornos em movimento. Cada célula complexa é ativada por várias células simples que apresentam a mesma preferência de orientação e campos receptores estreitamente sobrepostos (Alon- so & Martinez, 1998). Também existem células com inibição terminal. Sua capacidade de resposta depende da extensão e da orientação do estímulo.

CONTEÚDO ON-LINE

em inglês

Weblink:

Hubel e Wiesel (1962)

NO MUNDO REAL: IMPRESSÃO DIGITAL

Uma forma importante de reconhecimento de padrões no mundo real envolve os especialistas que comparam as impressões digitais de criminosos (a impressão latente) com registros armazenados de impressões digitais. Um siste- ma de identificação automatizada de impressão digital (automatic fingerprint identification system [AFIS]) rastreia as imensas bases de dados (p. ex., o FBI tem as impressões digitais de mais de 60 milhões de indivíduos). Isso produz um pequeno número de possíveis combinações com a impressão digital obtida da cena do crime classificada em ter- mos de semelhança com a impressão digital do criminoso. Os especialistas identificam a impressão digital na base de dados (se houver) que combina com a do criminoso.

O AFIS se concentra nas características em dois níveis. Há três padrões gerais de impressões digitais: loops, arcos e espirais (círculos). As impressões digitais também contêm características mais específicas. Temos padrões de cristas e sulcos conhecidos como cristas de fricção nas mãos. De particular importância são as minúcias – os pontos onde uma crista de fricção termina abruptamente ou uma crista se divide em duas ou mais cristas. Os especialistas recebem infor- mações do AFIS, mas também fazem uso de microcaracterísticas (p. ex., a amplitude de cristas particulares).

Você poderá observar algumas das complexidades na identificação da impressão digital decidindo se as duas impressões digitais apresentadas na Figura 3.2 provêm da mesma pessoa. Quatro especialistas em impressão digital concluíram que elas provinham da mesma pessoa, a saber, o terrorista envolvido no ataque terrorista em Madri, em 11 de março de 2004. Na verdade, as impressões digitais são de duas pessoas diferentes. A da esquerda é do terrorista de Madri (Ouhane Daoud), mas a da direita é de Brandon Mayfield, um advogado americano que foi preso por engano.

Achados

Acredita-se comumente que a identificação da impressão digital é muito precisa, com o caso do terrorista de Madri sen- do uma rara exceção. De fato, isso não corresponde inteiramente à verdade. Cole (2005) revisou 22 casos da vida real envolvendo falsa identificação por parte de especialistas. Em mais da metade dos casos, a falsa identificação original

84 PARTE I Percepção visual e atenção

de um especialista foi confirma- da por um ou mais especialistas. Dror e colaboradores (2012) pe- diram que especialistas listassem todas as minucias em 10 impres- sões digitais e depois repetissem o exercício alguns meses mais tarde. Somente em 16% das ve- zes houve concordância total en- tre suas duas avaliações da mes- ma impressão digital.

Muitos erros são cometidos por causa da complexidade in- trínseca e do caráter incompleto das impressões digitais latentes. No entanto, processos top-down também contribuem para os er- ros de identificação. Muitos des- ses erros envolvem o viés de confirmação forense, que Kassin e colaboradores (2013, p. 45) definiram como “a classe de efeitos por meio da qual crenças preexistentes, expectativas, motivos e contexto situacional de um indivíduo influen- ciam a coleta, a percepção e a interpretação das evidências”.

Dror e colaboradores (2006) relataram evidências de viés de confirmação forense. Especialistas julgaram se duas impressões digitais combinavam, tendo sido informados incorretamente de que as impressões eram as que foram as- sociadas de forma errônea pelo FBI às do terrorista de Madri. Sem que os especialistas soubessem, vários anos antes eles haviam julgado essas impressões digitais como uma combinação clara e definitiva. A informação enganosa que lhes foi dada levou 60% dos especialistas a julgarem que as impressões definitivamente não combinavam! Portanto, os processos top-down desencadeados pela informação contextual podem distorcer a identificação da impressão digital.

Evidências adicionais do viés de confirmação forense foram relatadas por Langenburg e colaboradores (2009). Eles estudaram os efeitos do contexto (p. ex., supostas conclusões de um especialista respeitado internacionalmente) na identificação da impressão digital. Tanto os especialistas quanto os não especialistas foram influenciados pela infor- mação contextual, mas os não especialistas foram mais influenciados.

Por que os especialistas são melhores do que os não especialistas ao decidirem com exatidão que duas impres- sões digitais combinam? De acordo com a teoria de detecção de sinal (p. ex., Phillips et al., 2001), existem duas pos- sibilidades. Primeira, os especialistas podem ter uma habilidade excelente para discriminar entre as impressões que combinam e as que não combinam. Segunda, eles apresentam um viés de resposta leniente, significando que têm uma forte tendência a responder “combina” a cada par de impressões independentemente de haver uma combinação real. A prova de fogo para a qual a explicação é mais aplicável é o índice de alarme falso – a tendência a responder “combina” incorretamente a pares de impressões semelhantes, mas que não combinam. A boa discriminação está associada a um baixo índice de alarme falso, enquanto um viés de resposta leniente está associado a um alto índice de alarme falso.

Thompson e colaboradores (2014) realizaram um estudo sobre especialistas e novatos usando impressões de uma cena de crime genuína. Os dois grupos responderam “combina” com exatidão aproximada de 70% dos ensaios nos quais havia uma combinação genuína. No entanto, houve uma diferença substancial na taxa de alarmes falsos. Os novatos responderam “combina” incorretamente quando duas impressões eram semelhantes, mas não combinavam, em 57% dos ensaios, comparados a apenas 1,65% no caso dos especialistas. Esses achados indicam que os especialistas têm muito melhor discriminação do que os novatos. Eles também têm um viés de resposta muito mais conservador do que os novatos, significando que são mais relutantes em responderem “combina”.

Figura 3.2

A identificação errada do FBI do terrorista de Madri. A impressão digital da cena do crime à esquerda. A impressão digital do suspeito inocente (identificado posi- tivamente por vários especialistas em impressões digitais) à direita.

CAPÍTULO 3 Reconhecimento de objetos e faces 85

Todos estes tipos de células estão envolvidos na detecção de características. En- tretanto, não devemos exagerar sua utilidade. Essas células fornecem informações am- bíguas, porque respondem da mesma maneira a estímulos diferentes. Por exemplo, uma célula pode responder igualmente a uma linha horizontal que se move de modo rápido e a uma linha quase horizontal que se move de forma lenta. Precisamos combinar as infor- mações provenientes de muitos neurônios para remover as ambiguidades.

A descrição teórica de Hubel e Wiesel precisa ser ampliada para levar em conta o achado de que os neurônios diferem em sua reatividade a diferentes frequências espa- ciais (ver posteriormente a seção intitulada “Frequência espacial”). Conforme veremos, vários fenômenos na percepção visual dependem dessa reatividade diferencial.