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O que acontece com estímulos visuais não atendidos

Não é de causar surpresa que estímulos visuais não atendidos recebam menos proces- samento do que os atendidos. Martinez e colaboradores (1999) compararam ERPs (ver Glossário) para estímulos visuais atendidos e não atendidos. Os ERPs para os estímulos visuais atendidos foram comparáveis aos dos estímulos visuais não atendidos entre 50 e 55 ms após o início de apresentação do estímulo. Depois disso, no entanto, os ERPs de estímulos atendidos foram maiores do que os de estímulos não atendidos. Dessa forma, a atenção seletiva influencia todos os estágios do processamento, exceto os estágios muito iniciais.

Como todos nós já descobrimos à nossa custa, com frequência é difícil ou impossí- vel ignorar estímulos irrelevantes para a tarefa. A seguir, vamos examinar os fatores que determinam se o desempenho da tarefa é afetado adversamente pelos estímulos distratores.

Teoria da carga

A teoria da carga de Lavie (2005, 2010) é uma abordagem muito influente para a com- preensão dos efeitos da distração. Ela defendeu que a extensão com que somos dis- traídos por estímulos irrelevantes para a tarefa depende das demandas perceptuais da tarefa atual. As tarefas de alta carga requerem quase toda a nossa capacidade perceptual, enquanto as tarefas de baixa carga não requerem. Em tarefas de baixa carga, há recursos atencionais excedentes e, dessa forma, estímulos irrelevantes para a tarefa são mais pro- váveis de serem processados do que em tarefas de alta carga.

Até aqui discutimos a carga perceptual. Entretanto, Lavie (2005) argumentou que a carga cognitiva (p. ex., demandas da memória de trabalho) também é importante. Os efeitos da distração são maiores quando a carga cognitiva é alta. Por que é assim? A alta

CAPÍTULO 5 Atenção e desempenho 167

carga cognitiva reduz a habilidade da pessoa de usar o controle cognitivo para discrimi- nar entre o alvo e os estímulos distratores.

Em suma, os efeitos da carga perceptual sobre os processos atencionais são re- lativamente automáticos. Todavia, efeitos da carga cognitiva envolvem processos con- trolados não automáticos. Assim, as cargas perceptual e cognitiva envolvem processos diferentes, e presume-se que seus efeitos na atenção sejam independentes uns dos outros.

Achados

Há um grande apoio para a hipótese de que a alta carga perceptual reduz os efeitos da distração. Forster e Lavie (2008) apresentaram seis letras em um círculo, e os partici- pantes decidiam qual letra-alvo (X ou N) estava presente. As cinco letras não alvo se pareciam mais com a letra-alvo quanto à forma na condição de alta carga. Em alguns ensaios, a figura de um personagem de desenho animado (p. ex., Bob Esponja) era apre- sentada como um distrator. Os distratores interferiram no desempenho da tarefa somente em condições de baixa carga.

Pesquisas de neuroimagem apoiam a importância da carga perceptual. Schwartz e colaboradores (2005) avaliaram a ativação cerebral do distrator, um tabuleiro de damas piscante, enquanto os participantes realizavam uma tarefa que envolvia carga perceptual alta ou baixa. Os distratores produziram menos ativação em várias áreas relacionadas ao processamento visual quando havia alta carga perceptual.

A maioria das pesquisas testando a hipótese de que alta carga perceptual reduz o processamento dos distratores envolveu a modalidade visual. Em contraste, Murphy e colaboradores (2013) testaram a hipótese usando a modalidade auditiva. Os achados fo- ram muito diferentes dos relacionados à visão – a extensão do processamento do distra- tor não estava relacionada à carga perceptual. Murphy e colaboradores defenderam que essa diferença entre as duas modalidades dos sentidos provavelmente ocorre porque o sistema auditivo não permite a focalização específica da capacidade de atenção possível dentro do sistema visual.

Até agora nos concentramos na distração causada por estímulos externos. No en- tanto, também podemos ser distraídos por estímulos internos (p. ex., pensamentos irre- levantes para a tarefa). Os participantes tinham significativamente menos pensamentos irrelevantes para a tarefa quando realizavam algo que envolvia alta carga perceptual do que quando envolvia baixa carga (Forster & Lavie, 2009).

A previsão de que os efeitos dos distratores deviam ser mais perturbadores quando a carga da memória de trabalho é alta foi testada por de Fockert e colaboradores (2001). Os participantes classificaram nomes por escrito de pessoas famosas, como pop stars ou políticos, sob alta ou baixa carga de memória de trabalho (envolvendo relembrar séries de dígitos). A distração foi causada por faces de famosos. Essas faces prejudicavam mais o desempenho da tarefa com alta carga na memória de trabalho. Além disso, houve mais atividade relacionada às faces no córtex visual na condição da alta carga.

Lavie (2005) pressupunha que a carga cognitiva reduz o controle cognitivo ou atencional. Nesse caso, esperaríamos que os indivíduos com fraco controle da atenção resistiriam menos à distração do que aqueles com bom controle da atenção. Eysenck e colaboradores (2007) apresentaram a teoria do controle da atenção com base na su- posição de que indivíduos com personalidades ansiosas têm fraco controle da atenção. Conforme previsto por eles (e pela teoria da carga), Moser e colaboradores (2012a) demonstraram que indivíduos ansiosos eram muito mais suscetíveis à distração do que os não ansiosos.

Vários achados indicam que a teoria da carga é supersimplificada. Em primeiro lugar, Hains e Baillargeon (2011) usaram faces humanas como distratores e constataram que elas não podiam ser ignoradas mesmo quando a carga perceptual era alta. Isso pro- vavelmente acontecia em razão da importância de prestarmos atenção a faces humanas em nossa vida diária.

168 PARTE I Percepção visual e atenção

Em segundo, como mencionado, a teoria da carga pressupõe que os efeitos da carga perceptual e cognitiva são inteiramente independentes. Linnell e Caparos (2011) testaram essa suposição. Eles descobriram que os processos perceptuais e cognitivos interagiam entre si e, portanto, não eram independentes. Mais especificamente, a car- ga perceptual apenas influenciava a atenção, conforme previsto pela teoria da carga, quando a carga cognitiva era baixa. Assim, os efeitos da carga perceptual não são auto- máticos como presumido pela teoria da carga, mas dependem dos recursos cognitivos disponíveis.

Avaliação

A teoria da carga se estabeleceu como a principal teoria da atenção. A distinção entre carga cognitiva e perceptual provou ser muito útil. Há muito apoio para as previsões de que a alta carga perceptual irá reduzir a distração causada por estímulos externos e inter- nos desde que sejam usadas tarefas visuais. Também há apoio para a previsão de que alta carga cognitiva produz maior suscetibilidade à distração.

Quais são as limitações da teoria da carga? Em primeiro lugar, a alta carga per- ceptual não reduz os efeitos da distração na modalidade auditiva. Em segundo, alguns estímulos irrelevantes para a tarefa (faces) causam distração mesmo quando a carga per- ceptual é alta. Em terceiro, a noção de que as cargas perceptual e cognitiva têm efeitos totalmente separados na atenção é incorreta (Linnell & Caparos, 2011). Em quarto, a teoria é supersimplificada, porque ignora vários fatores que influenciam a atenção visual seletiva. Esses fatores incluem a saliência ou a evidência dos estímulos distratores, bem como a distância entre eles e os estímulos da tarefa (Khetrapal, 2010).