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O PROCESSO DE ALBABETIZAÇÃO: ASPECTOS HISTÓTICOS, CONCEITUAIS E PRÁTICAS ALFABETIZADORAS

No Brasil, a preocupação com a sistematização das práticas de ensino da leitura e da escrita coincide com a institucionalização da escola popular, no final do século XIX, com a proclamação da República. A escola assume um importante papel como instrumento necessário para a instauração de uma nova ordem política e social visto que passa a ofertar as práticas da leitura e da escrita às massas populares que, até então, não tinham acesso a essa aprendizagem. É preciso lembrar que a escola era restrita a poucos e acontecia de forma assistemática no âmbito privado do lar, utilizando os métodos sintéticos de alfabetização, que toma com ponto de partida as unidades menores para chegar às unidades maiores. (MORTATTI, 2006).

Nessa época, os métodos sintéticos de soletração (alfabético), fônico e da silabação eram os únicos métodos utilizados para ensinar a leitura e a escrita. Após a institucionalização da escola para as massas, que passou a ensinar a todos ao mesmo tempo e em um mesmo espaço, surge a necessidade de buscar estratégias eficientes para a aprendizagem.

Nesse contexto histórico – em que as práticas de leitura e de escrita passam a ser escolarizadas, ensinadas e aprendidas em uma instituição pública, sujeita a organização metódica e sistemática – situa-se a discussão sobre métodos de alfabetização, que se consolida fundamentando as ideias que dão base a seleção dos “[...] conteúdos específicos da língua a serem ensinados a crianças, no processo inicial de apropriação da escrita” (FRADE, 2007, p.22).

Com a institucionalização da escola, que passou a ofertar a instrução pública, surge a neces- sidade de buscar respostas didático-pedagógicas e, com isso, professores passaram a defender o método analítico para o ensino da leitura que tem como ponto de partida unidades maiores como a palavra, a frase e o texto, ou seja, iniciando pelo todo, para depois chegar as partes constitutivas. Desse modo, segundo Frade (2007), este método procura romper com o princípio da decifração utilizada nos métodos sintéticos.

MEMÓRIAS DO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

Francicleide Cesário de Oliveira (UERN) / Keutre Gláudia da Conceição Soares Bezerra (UERN) / Maria Lúcia Pessoa Sampaio (UERN

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método para alfabetizar seus alunos. Nesse ponto, havia os defensores do então novo e revolucionário método analítico e os que continuavam a defender e a utilizar os tradicionais métodos sintéticos. Para Fontes (2013), essa disputa entre os pesquisadores e os professores da área de alfabetização, discutindo quais seriam os métodos mais eficientes, persistiu por décadas do século XX.

Segundo Fontes (2013), o processo de alfabetização baseado nos métodos sintéticos ou analíticos, considera a leitura e a escrita mera aquisição técnica com ênfase nos aspectos grafofônicos da língua. Assim, o conceito de alfabetização estaria restrito as técnicas de codificação e decodificação mecâ- nicas que habilitava “[...] a criança a estabelecer as relações entre as letras e os sons [...]”. (FONTES, 2013, p.70).

No desenvolvimento das práticas alfabetizadoras baseadas nos métodos “[...] a primeira tarefa da criança seria a de internalizar padrões regulares de correspondência entre som e soletração. [...]” (BRAGGIO, 1992, p.10). Em outras palavras, para a autora, ler com significado seria uma tarefa para quando a criança já tivesse desenvolvido a habilidade técnica da relação soletração/som. Essa prática de supervalorização da decodificação mecânica da linguagem escrita traz como consequência prejuízos com relação ao significado do processo de aprendizagem da língua escrita.

As práticas pedagógicas alfabetizadoras desse contexto educacional fundamentavam-se nos métodos tradicionais e mecânicos de ensino que se apoiavam na psicologia behaviorista, propostas por linguistas influenciados pelo comportamentalismo (BRAGGIO, 1992). Assim, o desenvolvimento das práticas pedagógicas não contribuía para uma formação que oportunizasse a participação ativa e a reflexão, visto que [...] o aluno era visto como um ser passivo no processo de aprendizagem da língua escrita, pois a ele não era dada a oportunidade de participar desse processo de forma ativa como um sujeito aprendente. [...]” (FONTES, 2013, p.63).

Além disso, não havia interesse ou preocupação em inserir o aluno em situações que consi- dera as diferentes funções da escrita nos contextos sociais. A língua escrita era tratada de forma descontextualizada, de modo que as práticas pedagógicas não atribuíam significado às atividades e, como consequência, não visava formar leitores que compreendessem a realidade, visto que as letras, palavras, frases ou pequenos textos trabalhados eram descontextualizados das vivências dos alunos.

Nesse sentido, no final da década de 1970, concomitante ao contexto de lutas pela democrati- zação das oportunidades sociais e educacionais, pesquisadores da área da educação e da linguagem passaram desenvolver pesquisas e a refletir sobre as consequências das novas práticas sociais e do uso da linguagem na sociedade. É quando ganham destaque os estudos sobre a psicogênese da língua escrita desenvolvidos por Emília Ferreiro e colaboradores. Os resultados das investigações acerca desses estudos, segunda Mortatti (2000, p.266, grifo da autora), são considerados “[...] uma ‘revolução conceitual’ em relação às concepções tradicionais sobre alfabetização [...]”. Esses estudos possibilitaram uma nova compreensão sobre o que é a alfabetização, ampliando seu conceito que passa a ser percebido como um processo complexo de elaboração de hipóteses a respeito da língua escrita, e não mais como a apropriação de um código e que se resumia a habilidade técnica da codificação e decodificação.

Na década de 1980, com o advento dos estudos sobre o letramento, novos aspectos passam a ser considerados no processo de alfabetização e na compreensão da língua escrita. Ora, o conceito de alfabetização restrito a habilidade de estabelecer as relações entre as letras e seus sons não dá conta de atender as novas exigências sócio-comunicativas da sociedade letrada, caracterizada como a sociedade da comunicação e da informação.

Nesse sentido, Colello (2004) afirma que os estudos acerca do letramento trazem impactos significativos às pesquisas acerca da alfabetização, contribuindo para redimensionar as compreensões

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Francicleide Cesário de Oliveira (UERN) / Keutre Gláudia da Conceição Soares Bezerra (UERN) / Maria Lúcia Pessoa Sampaio (UERN

sobre o ensinar e o aprender a ler e a escrever, o que como consequência, exige o redimensionamento das práticas pedagógicas alfabetizadoras.

Isso significa dizer que sob a necessidade de responder as novas exigências sociais do mundo letrado, pesquisadores, estudiosos e educadores da área alfabetização passam a perceber, não é mais concebível compreender o processo de alfabetização apenas como “[...] a simples consciência fonológica que permitia aos sujeitos associar sons e letras para produzir/interpretar palavras [...]” (COLELLO, 2004, p.108). Ou seja, não é mais suficiente dizer que o sujeito está alfabetizado quando faz somente associação dos sons das letras para formar palavras, pois a sociedade letrada exige a compreensão das funções da língua escrita para que possa fazer uso em diferentes contextos.

Desse modo, com base na compreensão de Soares (2012, p.16, grifo da autora), entendemos que, hoje, alfabetização é “[...] um processo de representação de fonemas em grafemas, e vice-versa, mas é também um processo de compreensão/expressão de significados por meio do código escrito. [...]”. Dito de outra forma, não basta desenvolver as habilidades técnicas de da leitura e da escrita, é preciso ir além, dominar a consciência fonológica, mas também saber compreender o que leu e saber se expressar de forma escrita sobre o que leu.

Nesse pensamento, a sociedade atual exige que os sujeitos sejam ao mesmo tempo, alfabetizados e letrados, que saibam ler, escrever, compreender, saber expressar por meio da escrita, fazer uso social da leitura e da escrita nos mais diversos contextos de vivência. Pois de acordo com Fontes (2013),

[...] letrar tem a função de inserir e familiarizar a criança com as diversas práticas e usos sociais da leitura e da escrita que se concretizam através da apropriação e uso dessas dentro da sociedade compreendendo quais as funções da língua escrita, para que serve, que utilidade tem em sua vida, onde e por que usá-la, etc., tornando a escrita como parte da própria vida como forma de expressão e de comunicação. (FONTES, 2013, p.71).

Ao introduzir o letramento nas práticas alfabetizadoras, estamos permitindo que ao aprender a ler e a escrever, os sujeitos têm a “[...] possibilidade de usar esse conhecimento em benefício de formas de expressão e comunicação, possíveis, reconhecidas, necessárias e legítimas em um determinado contexto cultural. [...]” (COLELLO, 2004, p.110).

Desse modo, as demandas sociais atuais exigem que as práticas pedagógicas alfabetizadoras sejam desenvolvidas considerando o alfabetizar letrando. O desenvolvimento dessas práticas envolve uma base de saberes docentes relacionados ao redimensionamento e ampliação do conceito de alfa- betização com os impactos dos estudos acerca do letramento.

Portanto, compreendermos que o processo de alfabetização em seus aspectos históricos, concei- tuais e no que se refere as práticas pedagógicas, desde as últimas décadas do século XX, tem passado por mudanças significativas que são frutos das pesquisas relacionadas a psicogênese da língua escrita e ao letramento, as quais possibilitaram uma ampliação no modo de entender e desenvolver as práticas pedagógicas alfabetizadoras.

AS MEMÓRIAS SOBRE O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: DOS

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