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Direito Internacional Privado no Brasil

DENOMINAÇÃO E MÉTODO DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E A DISCIPLINA NO BRASIL

3.5 Direito Internacional Privado no Brasil

Falar em DIPr em nosso país é recordar o maior jurista brasileiro do século XIX e precursor da disciplina, Augusto Teixeira de Freitas, considerado um dos maiores expoentes do direito de seu tempo em toda a América.8

3.5.1 Primeiros tempos

Antes da Independência, vigiam no Brasil as leis portuguesas em todos os campos do Direito. As

Ordenações Afonsinas, Manuelinas e, por período mais longo, as Filipinas, eram a legislação que

regulava a vida jurídica em nosso território. Essas normas estavam impregnadas, no que se refere ao campo do Direito Internacional Privado, da inspiração estatutária oriunda da Europa, tendo como base o princípio do locus regit actum para os contratos e a necessidade de prova do direito estrangeiro.

3.5.2 Augusto Teixeira de Freitas

O Regulamento n. 737, de 25 de novembro de 1850, complementava o princípio acima, determinando a lei do lugar da execução para os contratos comerciais. O artigo 406 da Consolidação das Leis Civis, de Teixeira de Freitas, de 1857, estabelecia que “as leis e usos de países estrangeiros regem a forma dos atos neles ajustados”.9

Essa obra foi publicada no Rio de Janeiro e nela Augusto Teixeira de Freitas, após pouco mais de dois anos de trabalho, ordenou, classificou e atualizou o direito legislado, esparso, confuso e impreciso, então vigente no Brasil. Tratava-se de leis, decretos, assentos, alvarás, resoluções, regulamentos e demais preceitos jurídicos, desde as ordenações portuguesas, muitas delas já revogadas na terra lusa, até as normas jurídicas brasileiras das três primeiras décadas após a Independência. Haroldo Valladão considerou tal obra como a Carta magna da independência jurídica brasileira.10 Três anos depois, Freitas publica o Esboço do Código Civil do Império.

Disciplinado, inteligente, estudioso, humanista e dotado de profundo senso de justiça, Teixeira de Freitas deixou uma obra que imortalizou seu nome, honrou o Brasil e enobreceu sua época, servindo ainda de ponto de convergência na legislação civil entre os povos irmãos que, um século após sua morte, se integrariam no Mercado Comum do Sul, o Mercosul.

O insigne jurista teve notável influência na codificação do Direito Civil sul-americano, tendo o Código Civil da Argentina e o do Paraguai, que foi adaptação daquele, sido inspirados no seu Esboço. Outros países do continente, como o Uruguai e o Peru, buscaram luzes jurídicas no seu trabalho.

A originalidade e completude do Esboço deram organicidade às normas de DIPr. Acentua Valladão o admirável método de Freitas na solução das questões dos conflitos de leis, no espaço ou no tempo,

inspirando-se na teoria de Savigny, mas a aperfeiçoando com ideias próprias.11

Teixeira de Freitas adotou o domicílio como principal elemento de conexão. Assim: “A capacidade ou incapacidade das pessoas não domiciliadas no Império devem ser julgadas pelas leis dos países de seus respectivos domicílios”.12 O domicílio, ausente no Código Civil de 1916, que optou pela nacionalidade, seria integrado ao ordenamento jurídico brasileiro com a Lei de Introdução ao Código Civil (LICC), de 1942, sendo até hoje a conexão adotada. Acentue-se que a LICC teve sua denominação alterada para “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro” (LINDB), pela Lei n. 12.376, de 31 de dezembro de 2010.

3.5.3 José Antônio Pimenta Bueno

Outro notável estudioso lança, em 1863, a obra Direito internacional privado e aplicação de seus

princípios com referência às leis particulares do Brasil. Trata-se de José Antônio Pimenta Bueno,

paulista de Santos e magistrado nessa cidade e no Maranhão, que é tido por muitos autores como o primeiro tratadista brasileiro de DIPr. Inspirado pela obra de Foelix e pelo Código Napoleônico, fez uma exposição sistematizada da matéria, tendo sido intransigente defensor da nacionalidade como principal

elemento de conexão.

Considerando-se a contemporaneidade dos trabalhos de Teixeira de Freitas e de Pimenta Bueno, incontestáveis precursores do DIPr no Brasil, defrontou-se o nosso Direito com duas correntes doutrinárias quanto ao elemento de conexão: uma defendendo o domicílio e outra a nacionalidade.

3.5.4 Notáveis tratadistas

Segue-se, já no século XX, a prevalência da figura de Clóvis Beviláqua no estudo dos postulados de DIPr. Em 1906, publicou Princípios de direito internacional privado, no qual defendeu o princípio da nacionalidade por entender mais duradoura e de mais fácil determinação do que o domicílio. Foi o principal autor do Código Civil brasileiro de 1916, em cuja Introdução consagrou-se a nacionalidade como o motivo de ligação mais importante no conflito de leis no espaço.

A LICC, agora LINDB, como afirmado, adotou o domicílio como principal elemento de conexão, dando assim razão à tese historicamente defendida por Teixeira de Freitas. Deve-se ressaltar que a mudança ocorreu em plena II Guerra Mundial, período em que o número de alemães, italianos e japoneses residentes no Brasil era expressivo, podendo, pela legislação então vigente, verem-se aplicadas em nosso país leis de nações tornadas inimigas. Embora essa situação não impeça, por si só, o emprego de lei estrangeira no direito interno – até porque o jurídico não se deve submeter ao político –, a comprovação do conteúdo e da vigência das normas desses Estados quando invocadas pelas partes ficava extremamente prejudicada pela ausência de órgãos desses países no Brasil.

Lugar especial no estudo, no magistério e na doutrina de DIPr no Brasil cabe a Haroldo Teixeira

Valladão, por vezes referido como o maior internacionalista do continente americano no século XX. Com

dedicação à nossa disciplina, participação em eventos em diversos países, cursos e palestras proferidos, ao lado de sua obra clássica Direito Internacional Privado, em três volumes, e do anteprojeto de

Código de Aplicação das Normas Jurídicas, conquistou merecido respeito e admiração no mundo

jurídico. Essa iniciativa, a exemplo do Projeto de Código de Direito Internacional Privado, de Lafayette Rodrigues Pereira, apresentado várias décadas antes, infelizmente não logrou se transformar em lei.

de Castro, reconhecidos internacionalmente como expoentes da matéria, sendo a consulta aos seus trabalhos uma imposição e uma necessidade.

Na história do Direito Internacional Privado, devemos referir ainda Rodrigo Otávio, Eduardo

Espínola, Pontes de Miranda e Carvalho Santos, este com notável estudo sobre a Introdução ao Código

Civil de 1916, em seu clássico Código Civil brasileiro interpretado. Espínola é autor, com Eduardo Espínola Filho, de magistral trabalho em três volumes, A Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, publicado em 1943, sendo reeditado, a partir de 1995, constituindo-se em verdadeiro clássico no gênero.

3.5.5 Atualidade do DIPr brasileiro

Nas últimas décadas, uma gama de autores esmera-se na busca de conhecimentos e de maiores contribuições ao DIPr, publicando-se a cada ano novos trabalhos ou reedições de obras que se firmam como essenciais. Agenor Pereira de Andrade e Osíris Rocha, laboriosos e acatados mestres de Minas Gerais, são exemplos de especialistas que enriquecem a matéria, constituindo, com Amílcar de Castro, o importante Grupo Mineiro da disciplina.

Jacob Dolinger, Luís Ivani de Amorim Araújo, Irineu Strenger, João Grandino Rodas, Carmem Tibúrcio, Marilda Rosado de Sá Ribeiro e Edgar Carlos de Amorim têm enriquecido nossa disciplina no Brasil e contribuído para manter o alto conceito conquistado no contexto doutrinário sul-americano e mundial.

Confirmando a maturidade do Direito Internacional Privado brasileiro, queremos destacar a participação dos professores Cláudia Lima Marques, Nadia de Araújo e Luiz Otávio Pimentel, nas Conferências Interamericanas de Direito Internacional Privado (CIDIPs) e nos Encontros Internacionais de Direito da América do Sul (EIDAS), que tanto contribuíram para o enriquecimento do DIPr e disciplinas afins como Direito do Comércio Internacional e Direito da Integração. Augusto Jaeger Junior e Sílvio Javier Battello, cujos doutoramentos se centraram em temas correlatos (concorrência e falência internacionais), também merecem referência.