pologia. É no entanto evidente que algumas tendências dos anos 1980 se consolidaram, em ambos esses aspectos. A incerteza, ou ambivalência, tomou-se um elemento típico (alguns diriam uma afetação) da vida intelectual. Caracteristicamente, Henrietta Moo- re, uma das antropólogas britânicas mais influentes da geração atual, introduz o seu Anthropological Theoiy Today, um titulo ambicioso, com a frase: “É muito tentador começar um livro desta natureza afirmando que não existe algo como uma teoria antro pológica” (Moore 1999: 1). Em seguida, ela comenta rapidamente que os projetos crí ticos dos anos 1970 e 1980 levaram, nos anos 1990, a um recuo generalizado da teoria para a etnografia e, em alguns casos, “mesmo do projeto da antropologia em si” (1999: 1). Detalhando a questão um pouco mais, ela diz que não há mais nada (se é que já hou ve) que se assemelhe a uma antropologia única e, além disso, que o status de teoria como tal é cada vez mais questionável. “A teoria é hoje um conjunto diversificado de estratégias críticas que incorpora em si um a crítica de suas próprias localizações, posi ções e interesses: isto é, ela é altamente reflexiva” (Moore 1999: 9).
A impressão que se tem disso e de outras tentativas de oferecer sínteses amplas da antropologia dos anos 1990 é que a disciplina está irremediavelmente fragmenta da e em profunda desordem. Simultaneamente, foi extraordinário o sucesso da antro pologia durante essa década. O aumento de publicações e de conferências foi formi dável, o envolvimento em pesquisas aplicadas nunca foi tão vasto, e em muitos paí ses a antropologia foi uma área dos cursos de graduação imensamente popular. Na Universidade de Oslo, em tomo de 75 universitários eram esperados para o primeiro ano na primavera de 1990. Quando os professores entraram no auditório para recep cionar os novos alunos, fomos recebidos por uma platéia de 330, muitos dos quais continuaram estudos de pós-graduação ao longo da década. Existem algumas razões
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óbvias para esse aumento de popularidade da antropologia. Assim como a sociologia marxista ofereceu meios para compreender os interesses ocultos da opressão de clas ses e gêneros nos anos politizados de 1970, a antropologia ofereceu uma compreensão da variação cultural numa década em que jovens em países ricos viajavam muito mais do que seus pais ou avós haviam viajado, e em que o multiculturalismo, a política de identidade, a discriminação étnica e a guerra nacionalista eram pontos importantes na agenda de políticos, de movimentos populares, de ONGs e de meios de comunicação em quase toda parte. Ironicamente, o tradicional conceito antropológico de cultura fi- nalmente parecia ter entrado na esfera pública aproximadamente na mesma época em que a maioria dos antropólogos alimentava outras idéias sobre a questão.
Os dados demográficos da disciplina aumentavam em complexidade, mas a an tropologia continuava mais ampla e variada nos Estados Unidos do que em outros países. Nos fins dos anos 1990 a Associação A ntropológica Am ericana registra va um número aproximado de 10.000 membros, enquanto a Associação Inglesa de Antropólogos Sociais contava com menos de um décimo desse número, e are- cém-fundada Associação Européia de Antropólogos Sociais talvez tivesse 2.000. A predominância da língua inglesa no discurso acadêmico, que estivera em ascensão desde os anos intermediários entre as duas grandes guerras, fortaleceu-se ainda mais nos anos 1990. Num país como o Brasil, há muito mais antropólogos ativos do que na Inglaterra, mas com poucas exceções, como a obra de Roberto DaMatta (1991), suas publicações são desconhecidas para quem não lê português. Do mesmo modo, há corpos importantes de literatura antropológica e/ou etnográfica em idioma espanhol, russo, polonês e outros da Europa Central, em japonês e - cada vez mais - em chinês. Existe também uma importante literatura antropológica em língua inglesa na índia, praticamente desconhecida fora dos círculos especializados.
Finalmente, durante os anos 1990, antropologias européias não metropolitanas receberam atenção crescente graças à fundação da Associação Européia de Antropó logos Sociais em 1988. Criada por iniciativa de Adam Kuper na Universidade Bru nei, um dos objetivos priucipais da Easa (European Association of Social Anthropo logists) era congregar antropólogos do norte da Europa (protestante/germànico) e do sul da Europa (católico/românico). Então, no fim de 1989, enquanto os antropólogos se ocupavam com o planejamento da primeira conferência da Easa (a ser realizada em Coimbra, Portugal, em 1990), o mundo foi surpreendido pelo que se tomaria o acontecimento definidor dos anos 1990: a queda da Cortina de Ferro (logo seguida pela dissolução da União Soviética) e a conseqüente liberalização cultural e intelec tual na maior parte da Europa Central e Oriental. As mudanças políticas e econômi cas que seguiram na esteira desses sobressaltos seriam muitas e paradoxais - e desde
o primeiro momento abririam uma região etnográfica totalmente nova e de dimen sões continentais para a pesquisa antropológica (ver p. 203ss). Mas para os planeja dores da Easa a preocupação imediata foi a oportunidade de contatos acadêmicos in tensos com co-antropólogos nesses países. Agora era possível desenvolver relações com tradições antropológicas que estiveram praticamente desconhecidas na acade m ia ocidental durante anos. Na ex-União Soviética foi descoberta uma etnografia que combinava a abordagem histórica da tradição difusionista alemã com o evolucio- nismo marxista (ver Dunn e Dunn 1974). Na Polônia a metodologia de Znaniecki (capítulo 4), inspirada na Escola de Chicago, havia se desenvolvido e transformado numa microssociologia urbana sofisticada (ver Wedel 1986). Assim, a Easa enfren tou desde o início o desafio não só de estabelecer ligações entre o norte e o sul da Eu ropa, mas também de integrar as antropologias da Europa Oriental e Ocidental.
Com a participação de antropólogos de todo o continente nas conferências da Easa, e por meio de painéis periódicos sobre a história da antropologia européia (ver Vermeulen e Roldán 1995), compôs-se um quadro do passado da disciplina que é muito mais complexo do que o apresentado neste livro. A etnologia sueca, o surrea lismo polonês, o Volkskunde esloveno, o estruturalismo eslovaco dos anos 1930 e a importância pennanente de Bastian na Alemanha e em outros lugares são apenas al guns exemplos das possíveis novas genealogias da antropologia européia.
Podemos traçar brevemente o destino de uma dessas tradições. Como vimos (ca pítulo 2), a antropologia da Rússia pré-revolucionária estava estreitamente ligada à tradição alemã. Esse foco teórico foi mantido durante a década de 1920 e início dos anos 1930, mas os etnógrafos soviéticos, em sua maioria, eram ao mesmo tempo tra balhadores práticos, envolvidos em tarefas como atividades literárias, educação e serviços de saúde. Os antropólogos foram instrumentos no desenvolvimento das pri meiras línguas escritas para muitas minorias analfabetas da União Soviética. Sob Sta lin, tanto a etnografia teórica como a aplicada foram impiedosamente reprimidas, mui tos praticantes foram assassinados e a profissão foi efetivamente reduzida a mera do cumentação empírica (por exemplo, de cultura material). As décadas de 1960 e 1970 viram um ressurgimento da pesquisa analítica. Y uliy Bromley desenvolveu uma sofis
ticada teoria da etnicidade na Academia de Ciências de Moscou (ver Banks 1996); V. V. Pimenov realizou trabalho inovador sobre modelagem estatística da coesão cul tural (Leningrado); e Yuliy V. Arutyunyan efetuou levantamentos etnossociológicos de larga escala (Moscou). No Ocidente todos esses trabalhos eram muito pouco co nhecidos, apesar dos esforços de algumas pessoas, como Stephen P. Dunn, ex-aluno de Morton Fried em Colúmbia, que fundou e durante 25 anos editou Soviet Anthro pology and Archaeology’, uma revista de traduções que verteu uma grande variedade
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de publicações soviéticas para o inglês. Durante os anos 1990 a antropologia russa passou por um estado de conflito e desordem (ver Tislikov 1992). Enquanto antropólo gos de gerações mais velhas, muitos dos quais ocupam posições de prestígio em insti tuições proeminentes em Moscou, São Petersburgo e Novosibirsk, tendem a continuar as tradições da etnografia soviética, muitos antropólogos mais jovens (alguns dos quais não tiveram formação em antropologia), voltam-se para o Ocidente em busca de ins piração (ver Condee 1995 para exemplos). Em São Petersburgo a fundação da nova Universidade Européia, financiada pelo bilionário húngaro-americano George Soros, cristalizou até certo ponto esse litígio, com mais antropólogos de orientação ociden tal reunindo-se em tomo de Nikolai B. Vakhtin na Universidade Soros.
Esse breve esboço dá uma idéia da diversidade entre as várias antropologias na cionais que se tomaram cada vez mais notórias durante os anos 1990. Ele também mostra o que talvez seja a maior limitação deste livro. Nossa narrativa se concentrou fortemente na antropologia como ela emergiu durante o século vinte em três áreas linguísticas: o alemão (até os anos entre as duas grandes guerras), o francês e o inglês (britânico e americano). Fizemos essa escolha porque essas tradições definiram real mente a corrente predominante do desenvolvimento teórico e metodológico na disci plina. Em parte, essa é uma questão de poder defmicional, e se o melhor da antropo logia brasileira, digamos, tivesse sido traduzido regularmente para o francês e para o inglês, a história da disciplina como um todo poderia muito bem ter sido diferente (embora, como vimos acima, na ausência de contatos pessoais regulares, a tradução pode ser insuficiente).
Quer se goste ou não, porém, a situação atual é que o inglês está assumindo cada vez mais o papel de uma língua franca antropológica em todo o mundo; e a falta de proficiência em inglês está se tornando uma desvantagem muito grande. Nas confe rências bienais da Easa, tanto o inglês como 0 francês são idiomas oficiais, mas o in glês é de longe o mais usado; nesses eventos, mesmo antropólogos franceses apre sentam seus trabalhos em inglês. Durante os anos 1980 e 1990 jovens estudiosos em países com fortes tradições antropológicas nativas foram sendo sempre mais estimu lados a publicar seus trabalhos em inglês. Conquanto existam razões acadêmicas perfeitamente saudáveis para isso, a situação também cria uma assimetria de poder peculiar, visto que o inglês de não-nativos em geral é um instrumento muito mais po bre de comunicação do que sua língua nativa. Outra questão, relacionada a essa - para a qual deveria haver uma resposta qualificada, antropologicamente fundamen tada - é se a convergência linguística atual da disciplina irá fmalmente conduzir à ho mogeneização ou à heterogeneizaçao. Por um lado, estudiosos em áreas mais diver sificadas, escrevendo a partir de diferentes tradições nacionais, conhecem mais os
trabalhos uns dos outros através do meio de uma língua comum. Por outro, a própria transposição desse trabalho para uma língua estrangeira inevitavelmente remove al gumas de suas qualidades {ver Wierzbicka 1989). Todo antropólogo que trabalha com duas línguas - e os autores deste livro pertencem a esse grupo - sabe que a riqueza e nuança de expressão que ele cultiva em sua própria língua nativa é difícil de transplan tar para uma língua estrangeira, que muitas vezes inclusive não dispõe de conceitos para o que ele quer dizer. Poucos são dotados com os talentos linguísticos de um Mal i- nowski, e mesmo ele nem sempre estava “à vontade” entre os trobriandeses.
Levando em consideração esses inconvenientes - a história progressivamente mais complexa da matéria (à medida que relatos de comunidades de língua não m e tropolitana são sempre mais publicados em inglês) e a falta atual de coerência teórica na disciplina - voltamo-nos agora para um esboço tentativo de algumas das princi pais tendências na antropologia da década de 1990. De certos modos, as continui dades com o passado são esperançosas - ou inquietantes, dependendo do ponto de vista adotado. A observação participante intensiva continuou sem contestações como método de escolha para obter conhecimento confiável e detalhado sobre ou tros povos, apesar de ser cada vez mais suplementada com uma ampla variedade de outros métodos, e agora era ponto pacífico que o trabalho de campo em sociedades complexas levantava diferentes questões metodológicas em comparação com o tra balho de campo nas aldeias. A idéia de que o mundo que habitamos é construído so cial e culturalmente também continuou sendo aceita pela maioria dos antropólogos - muito embora com uma mistura variável de relativismo pós-moderno. Em geral, os anos 1990 também viram um recuo com relação aposições pós-modemas extre mas (à medida que a revolução pós-m odema, como muitas outras antes dela, foi sendo assimilada pela corrente predominante da disciplina) e um a volta a um “rea lism o” etnográfico mais equilibrado, o que comprovou que o conhecimento antro pológico pode muito bem ser relativo, mas nem por isso se toma menos relevante. Na mesma linha, o particularismo e o relativismo cultural extremos dos anos 1980 parecem ter sido suplantados por um interesse mais equilibrado por estudos empí ricos da relação entre o universalmente humano e o culturalmente particular. Como resultado, algumas controvérsias antigas da disciplina reapareceram em novas rou pagens; e alguns novos campos de pesquisa envolveram a redescobcrta de trabalhos de um passado mais distante - durante as décadas de 1980 e 1990, por exemplo, Mauss foi redescoberto em pelo menos três contextos: como teórico da moralidade de troca (Thomas 1991; Weíner 1992), como teórico da condição de pessoa (Carrithers et a i 1985) e como teórico do corpo (ver Mauss 1979 [1934]). Os três campos foram im portantes durante a década de 1990.
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Entretanto, algumas novas características próprias da antropologia dos anos 1990 precisam ser mencionadas. Antes de mais nada, alguns exemplos mais evidentes. Pri meiro, como vimos no capítulo anterior, qualquer distinção simples entre nós e eles, ou observador e observado, se tomou praticamente indefensável. “Nativos” são perfeita mente capazes de identificar a si mesmos e se mostram cada vez mais avessos a tentati vas antropológicas que se propõem a ditar quem eles ■'realmente” são. Essa percepção contribuiu para um a consciência mais aguçada das questões éticas na antropologia, que veio aumentando desde que a Associação Antropológica Americana - no auge da revolução do trabalho de campo - publicou sua “Declaração sobre a ética” em 1971. Hoje, reflexões éticas integram habitualmente trabalhos dos próprios alunos. Outra ra zão para isso é que a “antropologia em casa" não é mais uma curiosidade, mas uma parte perfeitamente normal do empreendimento - e dilemas éticos são naturalmente mais compreensíveis e mais prementes quando estamos perto deles.
Segundo, qualquer dicotomia simples “tradicional-moderno” também se tomou quase indefensável, seja por razões epistemológieas ou puramente empíricas. Com efeito, parece a estes autores que essa aversão a qualquer coisa que soasse a evolucio- nismo era tão forte na antropologia da década de 1990 que ela poderia equivaler a um ponto cego. Assim, como os neo-evolucionistas demonstraram nas décadas de 1950 e 1960, é fácil documentar diferenças empíricas marcantes entre (por exemplo) so ciedades de caçadores-coletores de pequena escala e sociedades pós-industriais m o dernas, em termos de medições quantitativas como o fluxo de energia per capita. O motivo por que questões assim devem interessar-nos é que o homo sapiens sapiens habitou a Terra como caçador-coletor durante aproximadamente 150.000 anos, ao passo que a sociedade moderna é extremamente recente (o quanto recente é questão de gosto teórico e foco empírico). Como menos de nm décimo por cento da história humana transcorreu em sociedades “modernas”, é evidente que teorias gerais de so ciabilidade humana se beneficiariam com o entendimento da diferença entre siste mas sociais “primitivos” e “modernos”.
Terceiro, o mundo assistiu a um crescimento fenomenal em conexões transnacio- nais de toda espécie - da migração ao turismo, de mercados de valores internacionais à Internet. Essa aceleração poderosa da mobilidade social através de grandes distân cias geográficas levou muitos antropólogos a questionar o elo muitas vezes conside rado como fato consumado enfie grupos de pessoas e localidades geográficas limita das a que eles “pertencem ”. Todo o conceito de espaço de repente precisa ser repen sado, à medida que os antropólogos estudam cada vez mais grupos globalmente dis persos, como refugiados e m igrantes, trabalhadores numa empresa multinacional ou comunidades na Internet. Os estudos sincrônicos clássicos num sitio único, numa
sociedade única, que constituíam a marca característica da antropologia, estão se tor nando cada vez mais raros, e espera-se que os antropólogos contextualizem rotinei ramente seu trabalho tanto histórica como regionalmente. Logo voltaremos a algu mas idéias teóricas que surgiram disso. Em discussões de métodos, um novo termo começou a aparecer recentemente - trabalho de campo de sítios múltiplos - que pa rece referir-se a diversos tipos diferentes de estudos não localizados, desde estudos de redes dispersas em cidades ou instituições até estudos de comunidades migrantes intercontinentais.
Quarto, e como parte do “repensar o espaço” a que nos referimos acima, vimos um novo interesse nos territórios físicos ocupados pelas pessoas, sejam eles ecossis temas tradicionais, paisagens urbanas ou paisagens cibernéticas virtuais - os quais haviam parecido irrelevantes aos constmcionistas sociais radicais do pós-modemis- mo. Sentimos uma afinidade entre esse interesse pelo ambiente físico e a orientação para o corpo humano (físico) enfatizada pelos teóricos da prática (capítulo 8), e, efe tivamente, Bourdieu dá igual realce às imediações físicas e ao corpo físico em sua te oria do habitus. Essa afinidade sugere que o novo rapprochement entre antropologia e realidade física está acontecendo em termos muito diferentes do que durante o mo vimento cultural ecológico dos anos 1960.
Finalmente, o desgaste do conceito de cultura que ocorreu desde a década de 1960 havia, até o fim da década de 1990, desacreditado com sucesso a antiga idéia de “um povo” possuindo “uma cultura em comum”. Assim, por um lado, a idéia do todo social foi enfraquecida, uma vez que a “sociedade” é relativizada e se dissolve em re des dispersas e sobrepostas. Por outro lado, como indicamos acima, a idéia do mundo físico (e do corpo) alcançou uma proeminência maior no pensamento antropológico. Esse paradoxo poderia sugerir um afastamento de longa duração com relação às no ções durkheimianas de sociedade como sistema autônomo e um movimento na dire ção de noções correntes em algumas ciências naturais.
Essa última tendência é uma entre duas que selecionamos para reflexão especial neste último capítulo de nossa história da antropologia, junto com a tendência para estudos de globalização e lugar, Nossa escolha desses dois assuntos em particular é mais ou menos arbitrária. Existem muitas outras tendências que poderíamos ter ana lisado com igual justificativa. Assim, vimos um crescimento marcante na pesquisa antropológica sobre troca, tanto na área central tradicional da disciplina (como a Me- lanésia; Barraud et al. 1984; Strathem 1988; Weiner 1992; Godelier 1999) e “em casa” (como uma rua no norte dc Londres; Miller 1998), Também foram realizados muitos trabalhos sobre simbolismo, história e poder, inspirados de modo particular pela obra de Marx, Gramsci e Foucault (Eferzfeld 1992; Trouillot 1995; Gledlnll
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2000). Vimos uma tendência para um reflorescimento da antropologia econômica, informada pela teoria pós-estruturalista. pela obra recentemente redescoberta de Simmel e pelo marxismo (Cam er 1997: Lutz e Nonini 1999). Estudos importantes foram feitos sobre antropologia da violência política (Malkki 1995; Nordstrom e Robben 1995; Tambiah 1996) e direitos humanos (Wilson 1997); novas áreas de pes quisa que podem se tomar decisivas para o futuro da antropologia.
A decisão de dirigir nossa atenção para os estudos de globalização e para os estu dos de biologia e cultura não significa que consideramos esses campos como mais importantes do que um ou outro dos que acabamos de citar. Não obstante, considera mos as duas tendências especialmente interessantes no contexto da história da disci plina - em parte, porque ambas ultrapassam os limites da antropologia da corrente principal de formas visíveis; em parte, porque ambas foram um solo fértil importante nos anos 1990. As duas tendências também nos oferecem inúmeros contrastes e so breposições dignos de nota. Falando de modo geral, poderiamos dizer que elas res pondem ao estado atual da antropologia e do mundo de dois modos diferentes - mo dos, porém, que são, em ambos os casos, fiéis à história da disciplina. A primeira ten dência parece distanciar-se da história e das complexidades atuais para reapresentar a antiga pergunta “O que é o ser humano?” - revitalizando assim a controvérsia natu- reza/educação, que na sua época foi constitutiva da antropologia moderna. A segun da tendência nos remete novamente às duas outras perguntas clássicas “O que é so ciedade”? e “O que é cultura?” - mas agora num contexto de fluxo global.