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Mas a teoria dos sistemas não se deteve nas plagas da Sociologia Jurídica Avançou para os planos dogmáticos e ingressou nos domínios da Ciência do Direito

§ 5º PRESSUPOSTOS DE INVESTIGAÇÃO

IV. Mas a teoria dos sistemas não se deteve nas plagas da Sociologia Jurídica Avançou para os planos dogmáticos e ingressou nos domínios da Ciência do Direito

propriamente dita, alçando foros de hegemonia.

Em tais domínios, conquanto já se falasse de “interpretação sistemática” desde SAVIGNY e o seu método jurídico168, 169 (o que importava reconhecer, àquela altura, que o

167 Karl Larenz, Metodologia…, pp.320-325 (especialmente p.325 ― g.n.). Para ousar mais, diríamos: “de

dentro para fora” e “de fora para dentro” do (sub) sistema jurídico. Sem considerar esse movimento, a dogmática jurídica será sempre uma sombra deliberadamente parcial e deformada de seu próprio objeto.

168 Cf. Friedrich Carl von Savigny, System des heutigen Römischen Rechts, Berlin, Veit, 1840, v. I, pp.206 e

ss. (cap. 4), 214, 262-263. Na obra, SAVIGNY definiu sistema (= “[d]as systematische Element”) como a

“concatenação interior que liga todos os institutos jurídicos e as regras de Direito em uma grande unidade”

(p.214: “zu einer Groβen Einheit verknüpft”) e desenvolveu, por completo, os seus quatro cânones de interpretação jurídica, a saber, o elemento gramatical, o elemento lógico, o elemento histórico e o elemento sistemático, de que a Hermenêutica é, ainda hoje, tributária (= teoria clássica da interpretação). Em SAVIGNY, “filosófico” ― em acepção jurídico-científica (i.e., Ciência do Direito como “ciência filosófica”)

― chega a ser sinonímia de “sistemático”, ao menos nos primeiros estudos (cf. Karl Larenz, Metodologia…,

p.10). O método jurídico de SAVIGNY mereceu, de ARTHUR KAUFMANN e alguns outros, a designação de “metodologia tradicional” (cf., por todos, Arthur Kaufmann, “A problemática…, p.162).

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sistema jurídico comporta-se sistematicamente), pode-se afirmar, com segurança, que a nova sistemática jurídica ― como hoje a conhecemos ― só veio a ganhar maturidade nos últimos trinta anos do século XX, com os estudos metodológicos de FIKENTSCHER170 e de CANARIS171, entre outros.

Não se tratou, evidentemente, de uma mera transposição da teoria geral dos sistemas para o mundo do Direito. Na realidade, os cultores da sistemática jurídica nem ao menos se reportam a BERTALANFFY, BOUDING, HEMPEL e que tais. Provavelmente não o tenham feito pelo peculiar obstáculo da linguagem (em BERTALANFFY, p. ex., várias demonstrações da teoria geral dos sistemas são basicamente algébricas172). Entendemos,

169 Em termos mais rigorosos, dir-se-ia que a problemática jurídica dos sistemas é ainda anterior,

acompanhando a Jurisprudência europeia continental desde as suas origens modernas. Na dicção de VIEHWEG, “La problemática de los sistemas, de la que ya se ocupó Gaius en el 1er. libro de su

“Introducción” , no ha dejado nunca de ser objeto de reflexiones por parte de la jurisprudencia europeo- continental, desde que ésta surgió a fines del siglo XI. A comienzos de la Epoca Moderna, se manifestó con especial claridad en la crítica humanista a la jurisprudencia escolástica. En el derecho racional de los siglos XVII y XVIII, se intentó solucionarla con modelos de sistemas de estructura deductiva. Estos modelos fueron desarrollados aun más, sobre todo, por la pandectística alemana del siglo XIX. A menudo, determinan también hoy nuestra actitud con respecto a los problemas sistémicos” (Theodor Viehweg, Tópica y filosofía del derecho, trad. Jorge M. Seña, 2ª ed., Barcelona, Gedisa, 1997, p.71).

170 Wolfgang Fikentscher, Methoden des Rechts…, passim (vide, supra, nota n. 121). 171

Claus-Wilhelm Canaris, Systemdenken und Systembegriff in der Jurisprudenz, 2. Aufl., Berlim, Duncker & Humblot, 1983, passim. Utilizaremos, doravante, a tradução portuguesa: Claus-Wilhelm Canaris, Pensamento

sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito, trad. A. Menezes Cordeiro, 3ª ed., Lisboa, Calouste

Gulbenkian, 2002, passim.

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Associando cibernética e matemática, BERTALANFFY observa, a certa altura, que “os conjuntos de

equações diferenciais simultâneas como meio de “modelar” ou definir um sistema são, quando lineares, de solução fatigante, mesmo no caso de haver poucas variáveis. Quando não lineares são insolúveis, exceto em casos especiais. […] Por esta razão, os computadores inauguraram um novo enfoque na pesquisa dos sistemas, não somente por facilitarem os cálculos que, a não ser assim, excederiam o tempo e a energia disponíveis, substituindo a engenhosidade matemática por procedimentos de rotina, mas também abrindo campos onde não existiam teorias matemáticas ou meios de solução. Assim, sistemas que excedem de muito a matemática convencional podem ser submetidos à computação” (Teoria Geral dos Sistemas, pp.39-40).

Constata-se, pois, que a linguagem primordial, na abordagem dos sistemas (com conceitos como não

interação e linearidade), está radicada na matemática pura, estendendo-se daí para a ciência da computação.

Pouco antes, asseverava que “em muitos fenômenos biológicos e também nas ciências sociais e do

comportamento são aplicáveis os modelos e as expressões matemáticas. Estes, evidentemente, não se incluem entre as entidades da física e da química e nesse sentido transcendem a física como paradigma da “ciência exata”. […] Tornou-se aparente a semelhança estrutural desses modelos e seu isomorfismo em diferentes campos, e justamente revelaram-se centrais os problemas de ordem, organização totalidade, teleologia, etc., que eram excluídos dos programas da ciência mecanicista. Esta foi, portanto, a ideia da “teoria geral dos sistemas”” (p.30). Noutra passagem, demonstrando a reorientação de sentido que a teoria dos sistemas

proporciona (especialmente em relação às teorias reativas), BERTALANFFY anotou: “The system concept

tries to bring the psychophysiological organism as a whole into the focus of the scientific endeavour. [...] In contrast to the model of the reactive organism expressed by the S-R [stimulus-response] scheme behaviour as gratification of needs, relaxation of tensions, reestablishment of homeostatic equilibrium, its utilitarian and environmentalistic interpretations, etc. we come rather to consider the psychophysical organism as a

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todavia, que o conceito mesmo de sistema não se desprega da concepção original da teoria geral dos sistemas; e como tal, admite aplicação a quaisquer escaninhos da enciclopédia científica. Para mais, conceber a sistemática jurídica como uma metodologia tributária da teoria geral dos sistemas é uma atitude intelectual que, “vis-à-vis” da comunidade científica internacional, contribui para disseminar a aceitação da Ciência do Direito como disciplina genuinamente científica173 (natureza que, não poucas vezes, foi-lhe já negada174). Daí porque, onde houver pertinência, não descuraremos de esquadrinhar o pensamento jurídico-sistemático à luz da teoria geral dos sistemas. Passemos a ele.

V. A nova sistemática jurídica supõe um Direito (objetivo) dinamicamente

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