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TURISMO E ESTÉTICA DA MERCADORIA

4. GÊNESE E DIFUSÃO DO TURISMO

4.1 A condição urbana do turismo

Segundo Thomas (1988, p. 298), na Inglaterra dos inícios do período moderno, o gosto pelo campo foi intensificado pelo enorme crescimento de Londres. “Em meados do século 18, os donos de hospedarias, vendas de cervejas e estalagens em Hampstead, Chelsea e outras localidades nos limites de Londres, podiam sustentar um florescente negócio, fornecendo refeições para os enxames de excursionistas vindos da cidade nos finais de semana” (THOMAS, 1988, p. 296) 25. Conta Thomas que, no século 18, tornara-se lugar comum sustentar que o campo era mais bonito que a cidade e, em parte, essa convicção se devia à deterioração do ambiente urbano, existindo desde então queixas quanto à qualidade do ar londrino, devido ao uso crescente do carvão para fins industriais e domésticos, que criara um sério problema de poluição.

Guglielmo (1968, p. 217) afirma que a intensificação do trabalho, a degradação das condições de vida urbana, o ritmo trepidante das cidades provocam um desgaste nervoso, para o qual se procura compensação em formas de repouso, como na fuga generalizada em fins de semana e durante o período de férias. Se referindo as cidades industriais de meados do século 20, George (1970a, p. 134) afirma que as paisagens urbanas invadem, progressivamente, um espaço que outrora se reputava precioso para a agricultura, bem como aniquilam florestas e enfeiam irremediavelmente as praias. “Prisioneiro desse universo ingrato, inquieto ao ver ensombrecer-se o céu e carregar-se de fuligem e de óleo o ar que respira, o citadino quer reconquistar a natureza ou o que lhe dá a ilusão de natureza”

25

No entanto, as viagens de um dia para as massas, nasceram na década de 1850, para ser mais preciso, de acordo com Hobsbawm (2009, p. 285), na “grande exibição” de 1851, que atraiu um grande número de visitantes para Londres, encorajado pelas estradas de ferro com bilhetes a preços especiais e organizado por membros de sociedades locais, igrejas e comunidades. Segundo Hobsbawm, Thomas Cook (cujo nome iria tornar-se sinônimo de turismo nos 25 anos seguintes) começou sua carreira fazendo tais organizações de viagem, um tipo de negócio que desenvolveu negócios a partir de 1851. De acordo com Urry (1996, p. 43), esta organização foi fundada em 1841, quando Thomas Cook fretou um trem de Leicester para Loughborough, para um encontro sobre temperança e sua primeira excursão de prazer foi organizada em 1844, um “pacote” que incluía um guia que acompanhava o grupo a lojas recomendadas e para locais de interesse histórico que mereciam ser “olhados”. A agência de viagens de Thomas Cook ainda existe. Ver http://www.thomascook.com

(GEORGE, 1970a, p. 134). Entre os aspectos da vida social urbana, George (1983, p. 200) inclui a “evasão”, já que, segundo ele, a cidade aparece como um local repulsivo quanto ao lazer.

Segundo George (1983, p. 200), o citadino suporta muito mal a obrigação de viver de maneira constante no interior da cidade, onde os lazeres dispõem de um mínimo de soluções organizadas: jardins, campos de entretenimento e estádios para competições e espetáculos. “A urbanização fez nascer o turismo de massa”, afirmou George (1983, p. 201), com os automóveis e os ciclomotores permitindo a evasão coletiva em pistas “enfumaçadas” pelos gases dos motores e pelas longas horas de espera na estrada. Residir nas grandes aglomerações humanas, afirma George (1970 b, p. 231), gera outras necessidades, mas, sobretudo, a necessidade de escapar, periodicamente, das armações de cimento, da atmosfera do escapamento de gás, da monotonia de uma paisagem geométrica de detalhes uniformes 26.

Para George (1970b, p. 231), a vida nas grandes cidades implica necessidade de introduzir lazeres periódicos nos ritmos de vida, os quais permitem a evasão temporária que, de certo modo, substitui o contato diário que o habitante de uma pequena cidade pode ter com o meio natural. Nesse sentido, afirma George, exige-se a criação de reservas de áreas verdes em volta da cidade, que se transformam em zona de repousos e distrações, o que evitaria que toda a população urbana seja tentada a realizar migrações maciças de maior ou menor distância todo fim de semana. Segundo Cazes e Courade (2004, p. 247), o turismo é uma forma de “nomadismo”, uma mobilidade temporária que encontra ritmo nas estações do ano e da vida, como a dos escolares e trabalhadores ou o “lazer de contra-estação” da terceira idade e a temporalidade do turismo de negócios.

Ligado à industrialização e a elevação do nível de vida no “Norte e nos países emergentes”, dizem Cazes e Courade (2004, p. 247), o turismo se entende a todo o planeta, alcançando inúmeros “países do Sul”, onde podem provocar “desgastes” ou trazer certo

26 Segundo George (1983, p. 200), em geral, as cidades “abocanharam” progressivamente seus espaços verdes, pensando em transformar margens de rios, esplanadas, lugares abertos e pátios de monumentos públicos em estacionamentos para automóveis. Ricas em tesouros culturais, capazes de suprir todos os lazeres de massas ávidas de conhecimento, essas riquezas das cidades “são mal exploradas, não se atrai a atenção e a curiosidade do citadino para eles. Os museus são mais centros de atrações para os estrangeiros do que instrumentos de cultura para a própria cidade e o mesmo poder-se-ia dizer dos espetáculos de qualidade” (GEORGE, 1983, pp. 200-201). De acordo com George é excepcional é a situação de uma cidade com mais de 500 mil habitantes, que disponha de jardins, bosques e praias, como Haia (Holanda) ou Estocolmo (Suécia), essa com mais de um milhão de habitantes, que oferece aos seus moradores, além de jardins e parques, distrações aquáticas ou no gelo.

desenvolvimento, pois ele se baseia em “falsas aparências” e mascara realidades, como estar cada vez mais nas mãos de multinacionais. De acordo com Cazes e Courade (2004, p. 248), a atual fase de “globalização” do turismo, iniciada nos anos 1970, se realiza por meio de uma melhor cobertura aérea mundial (que se monopoliza), da expansão dos voos charters e de companhias “low-cost”, bem como pelo desenvolvimento de tecnologias de informação que facilitam a organização da viagem, permitindo comprar “just-in-time” pacotes de viagem, alojamentos hoteleiros, etc.

No início do século 21, Condès (2004, p. 271) fala das principais formas de turismo comuns a um conjunto de países: uma primeira segmentação distingue o turismo de negócios (reuniões de negócios, congressos, feiras, salões, viagens de incentivo, etc.) do turismo de lazer. O turismo de negócios permite amenizar o efeito da sazonalidade, comum ao turismo de lazer, por meio de contratos anuais assinados com empresas, reduzindo assim as incertezas sobre a vinda de turistas. Outra segmentação, citada por Condès (2004, p. 271), opõe o turismo individual ao de grupo e, assim como na preferência do turista de negócios ao de lazer, mais uma vez, o desafio consiste, para o capital, de aperfeiçoar as receitas priorizando o cliente individual, “mais rentável” que o em grupo, pois esse se beneficia de tarifas negociadas e gera um volume maior de atividades.

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