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TURISMO E ESTÉTICA DA MERCADORIA

3. SOBRE A CRÍTICA DA ESTÉTICA DA MERCADORIA

3.2 A padronização da sensualidade dos consumidores

É a partir das necessidades do indivíduo, em sua faina de realizar seu “ser”, que uma “padronização da sensualidade”, nos termos de Haug (1997), se opera como uma estratégia da estética da mercadoria. Esta padronização diz respeito ao modo pelo qual as forças produtivas impõem um padrão de consumo, na medida em que molda desejos e vontades dos consumidores, seduzindo-os e induzindo-os à compra. De acordo com Haug (1997, p. 126),

Dizer que a estética da mercadoria padroniza sobremaneira a sensualidade humana significa apenas lançar uma luz de parte da sedução sobre o modo como as pessoas são levadas a assumir comportamentos conformes ao sistema da sociedade capitalista. Elas vivenciam a sua existência na sociedade, enquanto situação natural apolítica. Para sua sorte, elas não são obrigadas a isso; cada uma

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Não é diferente na produção do turismo, também preocupada com a venda de suas mercadorias, como na infinidade de ofertas de viagem a serem pagas a prazo, como vemos na página inicial do website da operadora brasileira de turismo “CVC”, que tem nessa a estratégia o meio principal para alcançar o maior número possível de clientes 21. Fragmentos do texto publicado em outubro de 2010, também no website da empresa, na página “Palavra do Presidente” (Guilherme Paulus, Presidente do Conselho Administrativo da CVC), e que se referem à temporada de verão 2010-2011, sintetizam esta estratégia de massificação por meio do crédito: “Será uma grande temporada de viagens - a melhor e a maior de toda a nossa história de 38 anos. Isso porque são muitas as promoções e as facilidades de compra de pacotes de viagens, que estão possibilitando, a um número cada vez maior de famílias, a inserção do produto 'viagem' em suas cestas de consumo (...). Sonhe com o mundo. A gente leva você”.

pode se tornar bem-aventurada a seu modo. Elas se distanciam por si mesmas da necessidade material e se voltam para aquilo que satisfaz as necessidades imediatas e que, além disso, seduz.

Oferecidas como meios de representação da beleza e da amabilidade, as mercadorias são valorizadas pela estética da mercadoria que usa, entre outros meios, do galanteio amoroso enquanto gênero de estímulo dos consumidores. As mercadorias retiram a sua linguagem estética do galanteio amoroso que existe entre os seres humanos e, invertendo esta relação, fazem com que as pessoas retirem a sua expressão estética das mercadorias, ou seja, segundo Haug (1997, p. 30),

(...) ocorre aqui uma primeira reação conjunta da forma de uso das mercadorias motivada pela valorização sobre a sensualidade humana. A possibilidade de expressão de sua estrutura impulsiva não só se modifica como também a sua ênfase se desloca: um forte estímulo estético, o valor de troca e a libido amoldam- se (...) e os meios de expressão tornam-se valiosos, custando também uma fortuna. E tal como o burguês ‘em sua luxúria atribui ao nobre uma amplitude maior, adulando-o em suas produções – seus produtos são igualmente pequenos cumprimentos aos prazeres do esbanjador -, do mesmo modo ele sabe se apropriar do poder que o outro está perdendo’.

O domínio sobre as pessoas exercido em função da fascinação pelas aparências artificiais tecnicamente produzidas é denominado por Haug (1997, p. 67) de “tecnocracia da sensualidade”. Esse domínio aparece na fascinação de formas estéticas, que arrebatam as sensações humanas, fazendo com que os próprios sentidos passem a dominar o indivíduo fascinado. Inventada com base na perspectiva de posse do valor de uso, a aparência na qual caímos é um desejo impulsivo. “É como um espelho, onde o desejo se vê e se reconhece como objetivo” (HAUG, 1997, p. 77).

Defrontamo-nos com sequências de aparências atraentes e prazerosas das mercadorias, que atuam sobre nós como espelhos que observam nossa intimidade e evidenciam nossas insatisfações. A aparência se oferece, como se fosse capaz de satisfazer, de adivinhar, de ler os desejos nos olhos, de trazê-los a luz através do aspecto exterior da mercadoria (HAUG, 1986, p. 266). A aparência estética da mercadoria se oferece enquanto satisfação, como se soubesse de nossos segredos e os mostrasse na superfície aparente da mercadoria. Para Haug (1997, p. 78), “o ideal da estética da mercadoria seria manifestar o que mais nos agrada, do que falamos, o que procuramos, o que não esquecemos, o que

todos querem, o que sempre quisemos”. À medida que a estética da mercadoria interpreta, nesse sentido, o “ser” das pessoas, de acordo com Haug (1997, p. 76), ocorre que,

A tendência progressiva de seus impulsos, de seus desejos em busca de satisfação, prazer e alegria parece desviada. O impulso parece estar atrelado e ter se tornado um estímulo para a adaptação. Vários críticos da cultura veem nisso um processo de corrupção que atinge diretamente a espécie. Gehlen fala de sua degeneração, à medida que ela se adapta “a condições de vida demasiado cômodas”. De fato, há certa perfídia na adulação exercida pelas mercadorias: o que elas acionam ao se oferecerem acaba sendo predominante. Os indivíduos servidos pelo capitalismo acabam sendo, ao final, seus servidores inconscientes. Eles não são apenas mimados, distraídos, alimentados e corrompidos.

Interpretando os homens, a aparência com a qual se apresenta a mercadoria lhes dá uma língua para a interpretação de si mesmo e do mundo (HAUG, 1986, p. 266). A interpretação do “ser” das pessoas se manifesta na publicidade que, segundo Gunn (2005, p. 41), na maioria das vezes, explora os pontos vulneráveis de seu “público-alvo”, para convencê-lo que o produto ou serviço oferecido é realmente necessário. “O que importa são as vendas”. Gunn (2005, p. 41) dá como exemplos, a publicidade de produtos alimentares, higiênicos e de limpeza para um público-alvo feminino, que utiliza o estereótipo da “mulher magra, bonita, bem-sucedida, que cuida da família, trabalha e é feliz”, e a publicidade de cervejas para os homens, que usa a imagem da mulher para mexer com a virilidade masculina, explorando vaidades e desejos de sucesso.

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